Farmacêuticas facturaram 5300 milhões em três anos mas só pagaram nove de IRC

23-10-2010
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Verbas pagas pelos laboratórios representam apenas 0,16 por cento do total do volume de negócios que as empresas declararam entre 2005 e 2007. Associação do sector não comenta

O sector da indústria farmacêutica declarou um volume de negócios que ultrapassou os 5300 milhões de euros entre 2005 e 2007, mas o que pagou, para efeitos de IRC, ficou "aquém dos nove milhões de euros", de acordo com um relatório de auditoria da Inspecção-Geral de Finanças (IGF), a que o PÚBLICO teve acesso.

Feitas as contas, os 195 laboratórios farmacêuticos que operavam em Portugal no final de 2007 pagaram, em três anos, apenas 0,16 por cento do que facturaram neste período. Os valores do IRC de 2007 revelam que o peso médio do imposto liquidado sobre o volume de negócios ronda 1 por cento. Ou seja, cinco vezes mais do que o verificado na indústria farmacêutica.

Este indicador não é habitualmente usado para medir a taxa efectiva de tributação dos diversos sectores. Mas, apesar disso, a relação entre o volume de negócios e o imposto dá uma ideia do hiato entre os recursos conseguidos com a sua actividade e a sua contribuição para a sociedade.

O PÚBLICO confrontou o director executivo da Apifarma, Rui Ivo, com o teor desta auditoria, mas o responsável da associação que representa a maioria dos laboratórios não quis tecer nenhum comentário, alegando desconhecer o relatório da IGF.

O contributo fiscal do sector fica igualmente aquém do contributo dos seus trabalhadores e dos consumidores dos seus produtos. Nos exercícios em análise, a receita fiscal gerada pela indústria farmacêutica "resulta, fundamentalmente, de retenções de imposto sobre rendimentos que atinge cerca de 145 milhões de euros, na sua quase totalidade (94 por cento), correspondentes a IRS devido por remunerações de trabalho dependente".

Um terço com processos

Em sede de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA), o relatório da Inspecção-Geral de Finanças concluiu que "os mais de 138 milhões de euros apurados no período para efeitos de reembolso ou de excesso a reportar decorrerão da especificidade da actividade do sector, dada a frequente conjugação da aplicação de taxas reduzidas nas operações tributáveis efectuadas e deduções à taxa normal pela aquisição de bens ou serviços ou pela importação".

Mas a relação entre o Estado e a indústria não parece ser fácil. Outra das conclusões a que a IGF chegou foi que os laboratórios farmacêuticos "acusam um significativo nível de incumprimento tributário", na medida em que "um terço" das empresas "confronta-se com processos de execução fiscal pendentes, para cobrança coerciva de uma dívida de perto de 7,3 milhões de euros, concentrada em 15 processos contra 11 empresas".

A Inspecção-Geral de Finanças salienta que estes processos estão "em fase de suspensão, aconselhando, deste modo, acautelar a legitimidade destas pendências, em fase da existência de garantia ou penhora que garantam a totalidade da quantia exequenda e do acrescido".

Quase metade (48 por cento) dos sujeitos passivos registados "acusa processos de contra-ordenação fiscal, cujas principais irregularidades respeitam ao incumprimento de obrigações declarativas", revela ainda o relatório de auditoria, que constatou ainda que "alguns desses processos que pendem nos serviços de finanças em fase de audição/defesa e investigação/instrução indiciam algum atraso na sua tramitação".

Só sete empresas com I&D

Ao contrário do discurso do Ministério da Saúde, da Associação Portuguesa da Indústria Farmacêutica (Apifarma) e dos próprios laboratórios em relação à aposta na Investigação e Desenvolvimento (I&D), "a verdade é que, no triénio analisado, apenas sete empresas registam despesas de investimento neste domínio", lê-se no relatório.

A auditoria constatou ainda, no âmbito do mecenato, "uma diminuição das entidades doadoras". Em 2007, foram apenas 13. Ainda assim, foram apurados "cerca de 10,4 milhões de euros" de donativos.

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A IGF concluiu ainda que "a Direcção-Geral dos Impostos (DGCI), ainda que sem um carácter dirigido, tem vindo efectivamente a assegurar o controlo tributário do sector", tendo em conta "o considerável número de acções inspectivas realizadas e, em particular, o bom grau de cobertura" do universo (quase um terço) das empresas que operam no sector.

As 447 inspecções realizadas pela Inspecção-Geral de Finanças levaram, ainda assim, a "assinaláveis correcções" de imposto, as quais atingiram um total de cerca de 4,8 milhões de euros, maioritariamente relativos a IRC (56 por cento), apesar de grande parte das acções desenvolvidas "se ter saldado pela ausência de resultados directos (86 por cento)".

A IGF recomenda à DGCI que assegure "a legitimidade da suspensão" das execuções fiscais movidas contra as 11 empresas para a cobrança coerciva da dívida de 7,3 milhões de euros e "atente para os indícios de atrasos na tramitação de processos de contra-ordenação pendentes nos serviços de finanças". com Romana Borja-Santos

Verbas pagas pelos laboratórios representam apenas 0,16 por cento do total do volume de negócios que as empresas declararam entre 2005 e 2007. Associação do sector não comenta

O sector da indústria farmacêutica declarou um volume de negócios que ultrapassou os 5300 milhões de euros entre 2005 e 2007, mas o que pagou, para efeitos de IRC, ficou "aquém dos nove milhões de euros", de acordo com um relatório de auditoria da Inspecção-Geral de Finanças (IGF), a que o PÚBLICO teve acesso.

Feitas as contas, os 195 laboratórios farmacêuticos que operavam em Portugal no final de 2007 pagaram, em três anos, apenas 0,16 por cento do que facturaram neste período. Os valores do IRC de 2007 revelam que o peso médio do imposto liquidado sobre o volume de negócios ronda 1 por cento. Ou seja, cinco vezes mais do que o verificado na indústria farmacêutica.

Este indicador não é habitualmente usado para medir a taxa efectiva de tributação dos diversos sectores. Mas, apesar disso, a relação entre o volume de negócios e o imposto dá uma ideia do hiato entre os recursos conseguidos com a sua actividade e a sua contribuição para a sociedade.

O PÚBLICO confrontou o director executivo da Apifarma, Rui Ivo, com o teor desta auditoria, mas o responsável da associação que representa a maioria dos laboratórios não quis tecer nenhum comentário, alegando desconhecer o relatório da IGF.

O contributo fiscal do sector fica igualmente aquém do contributo dos seus trabalhadores e dos consumidores dos seus produtos. Nos exercícios em análise, a receita fiscal gerada pela indústria farmacêutica "resulta, fundamentalmente, de retenções de imposto sobre rendimentos que atinge cerca de 145 milhões de euros, na sua quase totalidade (94 por cento), correspondentes a IRS devido por remunerações de trabalho dependente".

Um terço com processos

Em sede de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA), o relatório da Inspecção-Geral de Finanças concluiu que "os mais de 138 milhões de euros apurados no período para efeitos de reembolso ou de excesso a reportar decorrerão da especificidade da actividade do sector, dada a frequente conjugação da aplicação de taxas reduzidas nas operações tributáveis efectuadas e deduções à taxa normal pela aquisição de bens ou serviços ou pela importação".

Mas a relação entre o Estado e a indústria não parece ser fácil. Outra das conclusões a que a IGF chegou foi que os laboratórios farmacêuticos "acusam um significativo nível de incumprimento tributário", na medida em que "um terço" das empresas "confronta-se com processos de execução fiscal pendentes, para cobrança coerciva de uma dívida de perto de 7,3 milhões de euros, concentrada em 15 processos contra 11 empresas".

A Inspecção-Geral de Finanças salienta que estes processos estão "em fase de suspensão, aconselhando, deste modo, acautelar a legitimidade destas pendências, em fase da existência de garantia ou penhora que garantam a totalidade da quantia exequenda e do acrescido".

Quase metade (48 por cento) dos sujeitos passivos registados "acusa processos de contra-ordenação fiscal, cujas principais irregularidades respeitam ao incumprimento de obrigações declarativas", revela ainda o relatório de auditoria, que constatou ainda que "alguns desses processos que pendem nos serviços de finanças em fase de audição/defesa e investigação/instrução indiciam algum atraso na sua tramitação".

Só sete empresas com I&D

Ao contrário do discurso do Ministério da Saúde, da Associação Portuguesa da Indústria Farmacêutica (Apifarma) e dos próprios laboratórios em relação à aposta na Investigação e Desenvolvimento (I&D), "a verdade é que, no triénio analisado, apenas sete empresas registam despesas de investimento neste domínio", lê-se no relatório.

A auditoria constatou ainda, no âmbito do mecenato, "uma diminuição das entidades doadoras". Em 2007, foram apenas 13. Ainda assim, foram apurados "cerca de 10,4 milhões de euros" de donativos.

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A IGF concluiu ainda que "a Direcção-Geral dos Impostos (DGCI), ainda que sem um carácter dirigido, tem vindo efectivamente a assegurar o controlo tributário do sector", tendo em conta "o considerável número de acções inspectivas realizadas e, em particular, o bom grau de cobertura" do universo (quase um terço) das empresas que operam no sector.

As 447 inspecções realizadas pela Inspecção-Geral de Finanças levaram, ainda assim, a "assinaláveis correcções" de imposto, as quais atingiram um total de cerca de 4,8 milhões de euros, maioritariamente relativos a IRC (56 por cento), apesar de grande parte das acções desenvolvidas "se ter saldado pela ausência de resultados directos (86 por cento)".

A IGF recomenda à DGCI que assegure "a legitimidade da suspensão" das execuções fiscais movidas contra as 11 empresas para a cobrança coerciva da dívida de 7,3 milhões de euros e "atente para os indícios de atrasos na tramitação de processos de contra-ordenação pendentes nos serviços de finanças". com Romana Borja-Santos

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