Macroscopio: A manta do Bocage e a nova responsabilidade política. O poema a Água -

24-01-2011
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Sempre ouvi dizer que em matéria de gestão de dinheiros aplica-se a metáfora da manta do Bocage, já que quando tapamos a cabeça destapamos os pés, e quando cobrimos os pés destapamos a cabeça. Com isto se prova que não há almoços grátis e que temos sempre de tomar opções, seguir prioridades dado que que os recursos são finitos. Raramente conseguimos tapar a cabeça e os péssimultaneamente.
Por maioria de razão esta equação se aplica ao Orçamento de Estado - até pelas elevadas verbas em questão e pelas necessidades de financiamento das políticas sociais, económicas, financeiras e ambientais que esse instrumento de política global tem que salvaguardar, sob pena de a máquina do Estado e de toda a administração congelar a sua actividade, com a agravante de que em Portugal o sector privado também se encontra muito dependente dos investimentos públicos. De modo que quando estes não avançam o sector privado retrai-se automáticamente. O sector da construção é um desses casos paradigmáticos.
Sucede que, e este é ponto que pretendemos frisar, num espaço público e numa economia pequena, volátil e profundamente clientelista como é a economia portuguesa, altamente pedinchona relativamente às adjudicações do Estado, é difícil que em redor das negociações deste OE possam estar representados os interesses das gerações futuras, daí que o que esteja em causa - cumulativamente - é também o conceito emergente de responsabilidade social - que deverá passar a contemplar no seu seio uma dimensão de futuro que hoje, manifestamente, não tem.
E nisso é que Sócrates falhou, como, aliás, referem jornais como o The Economist e o Finantial Times (via jn), jornais insuspeitos.
Numa palavra: o conceito emergente de responsabilidade política com este Orçamento altamente problemático -, talvez o pior desde a fundação do regime democrático nesta III República (envergonhada!!!) - suscita à comunidade dos investigadores em CSH um alargamento do seu âmbito jurídico, social, moral e, naturalmente, político.
Pelo que o conceito de responsabilidade será revisto na sua base, doravante terá que alterar a sua base temporal e normativa, sob pena de continuar a produzir danos sociais graves mediante a sobrecarga de impostos às populações por erros de gestão macroeconómica, esbanjamento no funcionamento das instituições e empresas do Estado e o resto de derrapagens que [já] conhecemos.
E com isto regressamos à manta do Bocage: quando tapamos a cabeça...
E por falar em Bocage, valerá a pena recuperar o boião de cultura e relembrar este belo poema do proficiente represente representante do arcadismo lusitano, figura que fez a transição do estilo clássico para o estilo romântico e que teve uma forte presença na literatura nacional em todo o séc. XIX.
Vejamos esta pérola: Água - a que subtrai o vernáculo para não melindrar nenhuma alminha que por aqui passe.

Água - Poema de Bocage "A Água", - de Manuel Maria Barbosa du Bocage.

Um clássico da literatura portuguesa

"A Água"

Meus senhores eu sou a água

que lava a cara, que lava os olhos

que lava a rata e os entrefolhos

que lava a nabiça e os agriões

que lava a piça e os colh...

que lava as damas e o que está vago

pois lava as mamas e por onde ca..

Meus senhores aqui está a água

que rega a salsa e o rabanete

que lava a língua a quem faz m.....

que lava o chibo mesmo da raspa

tira o cheiro a bacalhau rasca

que bebe o homem, que bebe o cão

que lava a c... e o berbigão.

Meus senhores aqui está a água

que lava os olhos e os grelinhos

que lava a c... e os paninhos

que lava o sangue das grandes lutas

que lava sérias e lava p....

apaga o lume e o borralho

e que lava as guelras ao c......

Meus senhores aqui está a água

que rega rosas e manjericos

que lava o bidé, que lava penicos

tira mau cheiro das algibeiras

dá de beber ás fressureiras

lava a tromba a qualquer fantoche e

lava a boca depois de um b....
Etiquetas: Evocação de Bocage, Responsabilidade política

Sempre ouvi dizer que em matéria de gestão de dinheiros aplica-se a metáfora da manta do Bocage, já que quando tapamos a cabeça destapamos os pés, e quando cobrimos os pés destapamos a cabeça. Com isto se prova que não há almoços grátis e que temos sempre de tomar opções, seguir prioridades dado que que os recursos são finitos. Raramente conseguimos tapar a cabeça e os péssimultaneamente.
Por maioria de razão esta equação se aplica ao Orçamento de Estado - até pelas elevadas verbas em questão e pelas necessidades de financiamento das políticas sociais, económicas, financeiras e ambientais que esse instrumento de política global tem que salvaguardar, sob pena de a máquina do Estado e de toda a administração congelar a sua actividade, com a agravante de que em Portugal o sector privado também se encontra muito dependente dos investimentos públicos. De modo que quando estes não avançam o sector privado retrai-se automáticamente. O sector da construção é um desses casos paradigmáticos.
Sucede que, e este é ponto que pretendemos frisar, num espaço público e numa economia pequena, volátil e profundamente clientelista como é a economia portuguesa, altamente pedinchona relativamente às adjudicações do Estado, é difícil que em redor das negociações deste OE possam estar representados os interesses das gerações futuras, daí que o que esteja em causa - cumulativamente - é também o conceito emergente de responsabilidade social - que deverá passar a contemplar no seu seio uma dimensão de futuro que hoje, manifestamente, não tem.
E nisso é que Sócrates falhou, como, aliás, referem jornais como o The Economist e o Finantial Times (via jn), jornais insuspeitos.
Numa palavra: o conceito emergente de responsabilidade política com este Orçamento altamente problemático -, talvez o pior desde a fundação do regime democrático nesta III República (envergonhada!!!) - suscita à comunidade dos investigadores em CSH um alargamento do seu âmbito jurídico, social, moral e, naturalmente, político.
Pelo que o conceito de responsabilidade será revisto na sua base, doravante terá que alterar a sua base temporal e normativa, sob pena de continuar a produzir danos sociais graves mediante a sobrecarga de impostos às populações por erros de gestão macroeconómica, esbanjamento no funcionamento das instituições e empresas do Estado e o resto de derrapagens que [já] conhecemos.
E com isto regressamos à manta do Bocage: quando tapamos a cabeça...
E por falar em Bocage, valerá a pena recuperar o boião de cultura e relembrar este belo poema do proficiente represente representante do arcadismo lusitano, figura que fez a transição do estilo clássico para o estilo romântico e que teve uma forte presença na literatura nacional em todo o séc. XIX.
Vejamos esta pérola: Água - a que subtrai o vernáculo para não melindrar nenhuma alminha que por aqui passe.

Água - Poema de Bocage "A Água", - de Manuel Maria Barbosa du Bocage.

Um clássico da literatura portuguesa

"A Água"

Meus senhores eu sou a água

que lava a cara, que lava os olhos

que lava a rata e os entrefolhos

que lava a nabiça e os agriões

que lava a piça e os colh...

que lava as damas e o que está vago

pois lava as mamas e por onde ca..

Meus senhores aqui está a água

que rega a salsa e o rabanete

que lava a língua a quem faz m.....

que lava o chibo mesmo da raspa

tira o cheiro a bacalhau rasca

que bebe o homem, que bebe o cão

que lava a c... e o berbigão.

Meus senhores aqui está a água

que lava os olhos e os grelinhos

que lava a c... e os paninhos

que lava o sangue das grandes lutas

que lava sérias e lava p....

apaga o lume e o borralho

e que lava as guelras ao c......

Meus senhores aqui está a água

que rega rosas e manjericos

que lava o bidé, que lava penicos

tira mau cheiro das algibeiras

dá de beber ás fressureiras

lava a tromba a qualquer fantoche e

lava a boca depois de um b....
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