Resolução Política do XVIII Congresso do PCP

07-08-2010
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XVIII Congresso do PCP Início Intervenções/Moções Secretário-geral do PCP Secretariado do CC do PCP Comissão Política do CC do PCP Comissão Central de Controlo Comité Central do PCP Intervenção de Abertura Moção sobre Leis dos Partidos Funcionamento do Congresso Órgãos do Congresso Informações Úteis Resolução Política do XVIII Congresso do PCP Resolução do CC do PCP Regulamento para debate e eleição de delegados Grafismos PCP no Campo Pequeno Resolução Política do XVIII Congresso do PCP Aprovada com uma abstenção 1.Internacional I - Situação Internacional I - Situação Internacional 0. Introdução

1. A economia mundial e a crise do capitalismo

2. A ofensiva do imperialismo

3. «Resistir é já vencer!» A luta dos comunistas, dos trabalhadores e dos povos

4. O socialismo, alternativa necessária e possível 0. Introdução O XVIII Congresso realiza-se numa situação internacional de grande instabilidade e incerteza em que avulta, como traço particularmente marcante, o desenvolvimento de uma crise económica e financeira do sistema capitalista de grandes proporções que está a assolar o mundo. Apesar dos reveses sofridos, a violenta ofensiva do imperialismo não dá sinais de recuo, antes se acentuam os seus traços fundamentais - exploração, opressão, agressão, militarismo e guerra. O perigo de respostas violentas do capitalismo à sua profunda crise estrutural e a pretensão do imperialismo de impor ao mundo a sua hegemonia, fazem crescer perigos de dramáticas consequências para o futuro dos povos. Mas o imperialismo não tem as mãos totalmente livres, está condicionado pelas suas próprias dificuldades e contradições, e por toda a parte prossegue a resistência e a luta, que se diversifica nas suas formas e conteúdos, e se traduz mesmo em situações de avanço progressista. Está em curso um processo de rearrumação de forças a nível de Estados e estruturas de cooperação internacionais. O quadro é de uma multifacetada agudização da luta de classes, com a possibilidade de rápidos e imprevistos desenvolvimentos, em que grandes perigos para a paz, a liberdade e a soberania dos povos coexistem com reais potencialidades de desenvolvimento progressista e mesmo revolucionário. Perante a tragédia que o processo de reprodução do capital significa para o mundo, perante a evidência da crise com que o sistema capitalista se debate, reforça-se a necessidade dos Partidos Comunistas e da sua cooperação internacionalista, e a actualidade do seu projecto de uma nova sociedade livre da exploração do homem pelo homem, o socialismo, como a única e real alternativa ao capitalismo e resposta aos problemas da Humanidade. A tenacidade na construção de partidos revolucionários de vanguarda e a firmeza na luta ideológica adquirem, nas actuais circunstâncias, uma acrescida e decisiva importância. 1. A economia mundial e a crise do capitalismo O XVIII Congresso do PCP realiza-se no contexto de uma das mais graves crises do capitalismo, a maior desde a «grande depressão» desencadeada pelo crash bolsista de 1929, e cujo impacto mundial não se relevou ainda em toda a sua extensão. Esta crise resulta da contradição entre a sobreprodução e sobre-acumulação de meios de produção, por um lado, e a contracção de mercados e níveis de consumo decorrentes das desvalorizações salariais e abismais assimetrias de rendimentos, por outro. Esta crise, ao mesmo tempo que confirma a incapacidade do capitalismo para se libertar das crises que periodicamente o abalam, é reveladora de uma crise bem mais profunda, de natureza estrutural e sistémica que, como o PCP tem assinalado, evidencia os limites históricos do sistema capitalista e coloca a sua superação revolucionária como uma exigência do nosso tempo. No final de 2008 o sistema financeiro dos EUA abriu brechas profundas com a falência ou colapso de algumas das maiores instituições de Wall Street. Os efeitos da derrocada financeira propagaram-se rapidamente aos mercados bolsistas e à esfera produtiva. Países apregoados como exemplos positivos da globalização capitalista (como a Islândia) estão hoje em bancarrota. A economia capitalista mundial entrou num grave período recessivo, cujas consequências dolorosas para os trabalhadores e os povos do mundo irão marcar os próximos anos. A classe dominante e os governos ao seu serviço procuram responder à crise com gigantescas operações de transferência das dívidas para o erário público e com a nacionalização (mais ou menos explícita) dos prejuízos das instituições falidas, mas sem porem em causa os lucros passados e presentes do grande capital. Sendo ainda incerta a eficácia destas medidas para evitar o colapso do sistema financeiro e uma recessão de enormes proporções, certo é que elas representam uma tentativa de fazer pagar aos trabalhadores e aos povos os custos da crise gerada pelo grande capital, mantendo inalterado o poder e domínio daqueles que são responsáveis pela crise. O aumento espectacular na dívida pública dos principais Estados capitalistas, resultante dos multimilionários subsídios e «planos de salvação» do sistema financeiro e dos interesses do grande capital, representam um gigantesco fardo para os povos e, em alguns casos, colocam em dúvida a própria solvência dos Estados. No caso dos EUA representam um agravamento qualitativo de algumas das causas que geraram esta explosão de crise. As análises à economia mundial e aos traços fundamentais e tendências de evolução do sistema capitalista feitas nos XV, XVI e XVII Congressos, foram confirmadas pela vida e mantêm uma flagrante actualidade. A actual crise, de dimensão internacional, tem como epicentro os EUA. É uma crise profunda, que se inscreve num processo que tem como momentos mais próximos a crise do peso mexicano de 1994/95, a crise «asiática» de 1996/97, a crise na Rússia e nos países do Leste europeu de 1998, a crise no Brasil e Argentina em 1999 e 2001, a crise da «nova economia» de 2001/2003, e a crise do sector imobiliário norte-americano desencadeada em Agosto de 2007. A sua expressão financeira e rápida expansão resultam do grau de financeirização atingido pelo sistema em resposta ao longo ciclo de estagnação económica iniciado nos anos 70, e que tem vindo a manifestar-se por uma desaceleração das taxas de crescimento do produto, de década para década, no centro capitalista desenvolvido. A centralização e concentração do capital e da riqueza realizam-se a um ritmo sem precedentes, impulsionadas pelos Estados ao seu serviço, pela guerra, pelas instâncias formais e informais de articulação internacional do capitalismo, pelas políticas de «competitividade» e «livre mercado» que aceleram a ruína das empresas não monopolistas e a destruição das economias menos desenvolvidas e dependentes, pelo acelerado processo de fusões e aquisições, que quintuplicaram desde final da década de 80, e também como resultado da nova fase da crise que se abriu em Setembro de 2008. Reforça-se o peso das grandes empresas multinacionais que controlam 2/3 do comércio mundial, algumas das quais com um peso económico superior ao de alguns Estados. A financeirização da economia continua a acentuar-se com a explosão do crédito e do capital fictício. A própria dinâmica da exploração gera uma massa de capitais sob a forma de dinheiro, excedentária e em crescimento que, face às dificuldades de obtenção das taxas de lucro esperadas na esfera produtiva, se desloca para a esfera financeira e especulativa em detrimento do investimento produtivo, contribuindo para a transferência e concentração das mais-valias geradas. Uma tal situação é acompanhada da criação e crescimento de mercados cada vez mais distantes da economia produtiva (como os de «futuros» e outros instrumentos financeiros) que, no quadro da livre circulação de capitais, da desregulamentação e integração dos mercados financeiros, das deslocalizações e criação artificial da procura pelo crédito fácil, acentuam a irracionalidade e a anarquia do sistema capitalista, tornando-se factor maior da instabilidade monetária, bolhas especulativas e colapsos bolsistas, e tendem a tornar as crises cíclicas, inerentes ao sistema capitalista, mais globais e mais destruidoras. A presente crise é uma concludente expressão desta realidade. Intensifica-se a exploração dos trabalhadores com a extensão do uso da força de trabalho e a redução, por todos os meios possíveis, da sua remuneração, visando arrecadar a maior fatia possível de mais-valia, tirando partido do enfraquecimento temporário do movimento comunista e operário. São eixos centrais desta ofensiva a redução dos salários reais, a intensificação dos ritmos de trabalho, a apropriação dos ganhos de produtividade do trabalho pelo capital, a desregulamentação e o aumento do horário de trabalho, o aumento da idade de reforma e diminuição dos valores de reformas e pensões, a desregulamentação das relações laborais. A linha de ataque ao sindicalismo de classe e à contratação colectiva constitui uma das mais graves expressões da política exploradora e reaccionária do grande capital e da ofensiva imperialista. Altíssimas taxas de desemprego, generalização do trabalho precário, particularmente entre as novas gerações de trabalhadores, regressão de direitos sociais e laborais, sobre-exploração dos trabalhadores migrantes, são realidades que estão a ser falsamente apresentadas como inelutáveis, realidades que contribuem, nomeadamente, para o aumento do exército de reserva e para a redução do peso dos salários no rendimento criado. Aprofunda-se a polarização social, tanto dentro de cada país, a começar pelos EUA e outras grandes potências capitalistas, como, à escala mundial, ainda que com contradições, entre o centro capitalista desenvolvido e a periferia subdesenvolvida. A flagrante contradição entre os gigantescos avanços da ciência e da técnica e as terríveis regressões sociais que percorrem o mundo contemporâneo constitui uma condenação política e moral do sistema capitalista. Segundo as próprias estatísticas da ONU, cerca de mil milhões de pessoas sofrem de fome crónica e cem mil morrem todos os dias em consequência directa ou indirecta de subnutrição. Intensifica-se o ataque sistemático a funções sociais do Estado conquistadas pela luta, ao mesmo tempo que se reforça a sua componente coerciva (forças armadas, polícias, serviços de informação, tribunais) e os mecanismos de domínio do capital e de sujeição aos centros do imperialismo. Mercantilizam-se todas as esferas da vida social, numa lógica de privatizar tudo quanto possa gerar maiores remunerações ao capital (saúde, educação, segurança social, cultura, tempos livres) e de transformar em negócio a própria satisfação das necessidades mais elementares da existência humana (alimentação, água, natureza). Face à deterioração das condições ambientais resultante do modo de produção capitalista, desenvolve-se uma sofisticada ofensiva ideológica de cobertura à pilhagem de recursos naturais, e de criação de novos mercados, como o da reconversão ambiental e das energias alternativas. A evolução do capitalismo suporta-se na exploração do trabalho humano e, paralelamente, na exploração irrestrita de recursos naturais à escala planetária para além do seu ritmo de renovação e da possibilidade da sua disponibilidade futura, gerando fluxos de resíduos e impactos ambientais que são ameaças destrutivas para a biosfera e a sobrevivência da sociedade humana. Acentua-se o carácter parasitário e decadente do capitalismo, com a instalação no poder do crime organizado e o florescimento de todo o género de tráficos criminosos (armas, droga, prostituição, trabalho escravo, órgãos humanos, mulheres e crianças) com a cobertura e cumplicidade da banca internacional e seus sofisticados instrumentos de circulação e branqueamento de capitais, em que avultam os offshores. A expansão lucrativa assenta na multiplicação de situações de miséria e brutal destruição de relações sociais estáveis, provocadas pelas políticas de saque associadas à globalização imperialista e às ingerências e agressões militares do imperialismo. A evolução do capitalismo no terreno económico e social é acompanhada de desenvolvimentos no plano político, cultural, ideológico e militar, de sentido profundamente reaccionário, e mesmo fascizante, envolvendo o ataque às liberdades e direitos democráticos; o reforço do controlo dos aparelhos ideológicos; a subordinação dos aparelhos legais e judiciários aos interesses do capital; a ofensiva contra a soberania dos Estados e de recolonização do planeta; o desenvolvimento do militarismo e uma nova corrida aos armamentos. Neste pano de fundo, que caracteriza a evolução do sistema capitalista, verificaram-se, após o XVII Congresso, alguns desenvolvimentos que, para além da sua importância conjuntural, expressam novas arrumações de forças e tendências que importa sublinhar: - A crise desencadeada nos EUA pôs em evidência os gravíssimos problemas de uma economia altamente deficitária, endividada e crescentemente dominada pelo complexo militar-industrial, com disparidades e problemas sociais gravíssimos, em que cerca de 35 milhões de pessoas vivem em situação de pobreza. A dívida externa atinge quase 90% do PIB. Mais do que «locomotiva» da economia mundial, os EUA têm sido um ilimitado sorvedouro da mais-valia criada pelos trabalhadores de todo o mundo, assim como dos recursos naturais. Representando somente 4,6% da população mundial, consomem mais de 20% dos recursos energéticos, sendo responsáveis por cerca de 21% das emissões de CO 2. . A superioridade militar, o potencial científico e tecnológico e a hegemonia dos EUA nos mecanismos de criação e difusão da ideologia dominante, são inegáveis. Mas o seu poderio económico e a sua posição privilegiada como principal centro financeiro mundial estão enfraquecidos, com expressão na desvalorização e descredibilização do dólar e do seu papel de moeda de reserva internacional, papel este que já está a ser abertamente contestado. A economia norte-americana confirmou-se como o principal factor de instabilidade e crise da economia mundial. - O reforço da União Europeia como bloco imperialista, sem subestimar as fragilidades e contradições que o processo de integração capitalista na Europa envolve, torna ainda mais clara a natureza de classe da UE como instrumento do grande capital e das grandes potências capitalistas da Europa Ocidental, caindo por terra duas teses centrais com que se pretende enganar as massas: a de que a integração capitalista europeia visaria contrariar os «excessos da globalização», e a que pretende que uma «Política Externa e de Segurança Comum» e respectivos instrumentos militares, tornaria a UE mais segura e um obstáculo ao «unilateralismo» dos EUA. De facto, o que está a verificar-se, e com uma inquietante rapidez, é a intensificação e refinamento das políticas neoliberais orientadas para o aumento da exploração e do poder do grande capital e, no imediato, quer directamente quer via NATO, o reforço da aliança estratégica com os EUA e um intervencionismo cada vez mais agressivo e ambicioso. - O desenvolvimento económico da China e o seu crescente peso internacional (com a perspectiva de se tornar nas próximas décadas a primeira potência económica mundial), a par da emergência de outros grandes países com altas taxas de crescimento como a Índia, o Brasil, a Rússia e outros. Ao mesmo tempo, desenvolvem-se alianças e processos de cooperação e integração regional que, situando-se em geral numa lógica de expansão das relações capitalistas de produção, tendem ainda assim (como nos casos do MERCOSUL, da UNASUR - a União das Nações Sul Americanas, ou da Organização da Alternativa Bolivariana para as Américas - ALBA, impulsionado pela Venezuela, ou da Organização de Cooperação de Xangai) a contrariar as pretensões hegemónicas dos EUA e das duas outras grandes potências da «Tríade», a UE e o Japão. Estes processos, que expressam o desenvolvimento desigual do capitalismo e geram contradições inter-imperialistas, têm pesado positivamente na arrumação de forças no plano internacional e na resistência dos povos ao imperialismo. - A acentuação do carácter predador do capitalismo e as consequências da recolonização planetária em curso revelam-se particularmente no agravamento dos problemas agro-alimentar, energético e ambiental. A rapina das multinacionais, assente nas políticas de ajustamento estrutural do Fundo Monetário Internacional (FMI) e do Banco Mundial (BM), na liberalização do comércio mundial impulsionada pela Organização Mundial do Comércio (OMC), numa desenfreada especulação bolsista, está a provocar insuportáveis aumentos de preços e a empurrar o mundo para situações de grave crise sem solução no quadro do capitalismo. Os «motins da fome», que têm tido lugar em numerosos países, contra os aumentos dos preços dos bens alimentares (mais de 37% em 2007 e 14% em 2006), constituem uma inequívoca condenação das imposições neocoloniais e da política das multinacionais do sector agro-alimentar (incluindo a afectação de vastas áreas parar a produção de biocombustíveis), que assentam os seus fabulosos lucros nos mais cínicos mecanismos de reprodução capitalista da fome e da miséria. O capitalismo é o modo de produção e a formação socioeconómica dominante e a dinâmica das suas contradições marca decisivamente toda a evolução mundial. Mas esta influência não é absoluta. Há forças sociais e políticas, incluindo Estados, que intervêm na configuração do mundo em que vivemos e na correlação de forças de classe em que lutamos, que pesarão tanto mais quanto maior partido tirarem das dificuldades e contradições do capitalismo. No momento actual impõe-se passar à ofensiva no plano da luta das ideias, tirando as necessárias ilações políticas e ideológicas da crise económica e financeira do capitalismo: ela está a abrir uma brecha profunda no fundamentalismo e na tecnocracia neoliberal; representa um rude golpe no triunfalismo capitalista dos anos 90, resultante das derrotas do socialismo; deita por terra toda uma propaganda visando fazer crer que o capitalismo se tornou capaz de dominar as suas contradições e furtar-se às sempre destruidoras crises cíclicas inerentes ao próprio modo de produção capitalista e ao sentido destrutivo da sua evolução. No ano em que se assinalam os 160 anos do Manifesto do Partido Comunista e o 190º aniversário do nascimento de Marx uma conclusão se impõe da observação do mundo actual: não obstante as grandes transformações por que passou o sistema capitalista, a análise marxista do capitalismo mantém uma extraordinária vitalidade e as leis fundamentais da reprodução do capital formuladas por Marx e Engels revelam-se de uma flagrante actualidade. Tal é o caso da lei do valor e da teoria da mais-valia que desvenda os mecanismos da exploração capitalista e da lei da baixa tendencial da taxa de lucro, que o capital tudo faz para contrariar, intensificando quanto possa e a correlação de forças lho permita, a exploração do proletariado, e que determina a financeirização crescente da economia. Tal é também o caso da lei da pauperização relativa, que ilumina as causas de fundo inultrapassáveis pelo capitalismo das crises de sobreprodução. E tal é o caso da validade das teses de Lenine sobre o imperialismo, nomeadamente da lei do desenvolvimento desigual do capitalismo, que mostra a impossibilidade de constituição de um mecanismo único capitalista (um «super-imperialismo») que anule a concorrência dos monopólios e as contradições inter-imperialistas, causa primeira do militarismo, da agressão e da guerra. A resposta do capitalismo à crise em que se debate tende para expressões de força cada vez mais violentas. O que não significa que, quando necessário, como na presente crise, o Estado capitalista não procure recorrer a medidas de tipo keynesiano, visando a salvaguarda dos interesses do grande capital, com os quais a social-democracia se encontra estruturalmente comprometida. É uma perigosa ilusão pensar que, mantendo intocável o poder económico e político do grande capital e a hegemonia do capital financeiro, é possível dar resposta aos anseios dos trabalhadores e dos povos e preservar a Humanidade de terríveis convulsões e regressões de civilização. Só profundas transformações de carácter antimonopolista e anticapitalista impostas e defendidas pelas massas o podem conseguir. 2. A ofensiva do imperialismo Os últimos quatro anos foram marcados pela intensificação da ofensiva imperialista, com o avanço do militarismo e multiplicação das guerras imperialistas; o crescente e articulado ataque à soberania dos Estados, ao direito internacional e ao exercício pelos povos do direito à sua autodeterminação, e a abertura de frentes simultâneas de conflito diversificadas quanto aos seus objectivos, métodos utilizados e países e povos visados. Dando corpo a um revanchista e violento processo de ajuste de contas com a luta dos trabalhadores e dos povos, e com a História do século XX, o imperialismo procura por todos os meios perverter o edifício legal saído da II Guerra Mundial, de natureza fundamentalmente pacífica e antifascista, que, apesar dos retrocessos e alterações verificadas, nomeadamente no mapa político da Europa, continua a ser um obstáculo às pretensões hegemónicas do imperialismo dos EUA e seus aliados. Sendo certo que o aprofundamento da ofensiva revela uma correlação de forças ainda muito desfavorável, não é menos certo que a incapacidade do imperialismo em derrotar resistências e mistificar ou esconder os aspectos mais violentos da sua ofensiva, revela dificuldades e perda de margem de manobra no plano político e ideológico, favoráveis à luta anti-imperialista. Dando expressão aos objectivos económicos centrais da ofensiva imperialista de alimentar os lucros das grandes multinacionais e de globalizar a exploração capitalista, são hoje particularmente nítidos os grandes objectivos geo-estratégicos que visam expandir o domínio das principais potências imperialistas a todo o globo: dar cobertura política e militar à expansão e instalação das multinacionais; assegurar o controlo directo das fontes e dos fluxos energéticos, das reservas de minérios, água e terras aráveis, das comunicações e principais vias de transporte de mercadorias a nível mundial; aprofundar o cerco geo-estratégico e militar às «potências emergentes» com especial destaque para a Rússia e a China, e conter processos de afirmação de relações económicas, políticas e estratégicas que fujam ao férreo controlo do imperialismo. Esta é uma ofensiva que visa conter ou «domesticar» expressões autónomas de afirmação de soberania, como as que se verificam na América Latina mas também em África, no Médio Oriente e no continente asiático; prevenir revoltas sociais e sobretudo a sua transformação em movimentos de luta política que ponham em causa os interesses da classe dominante; criminalizar forças revolucionárias e focos de resistência anti-imperialista. Multiplicam-se os ataques ao direito internacional e à soberania dos Estados numa estratégia global que, por via do reforço de relações de natureza colonial, do desmembramento de países e da criação de protectorados, como é exemplo o caso do Kosovo, visam a recolonização do planeta e redesenhar o mapa político mundial em favor dos interesses hegemónicos do imperialismo. Com ou sem cobertura da ONU, o objectivo é assegurar às multinacionais fontes de matérias-primas, mão-de-obra barata e mercados e impedir, com a corrupção e a ajuda das classes dominantes dos respectivos países, uma segunda vaga do movimento de libertação nacional e social. O fortalecimento de directórios de potências; a promoção e «institucionalização» de centros de concertação e decisão do grande capital (como o G7 ou o Fórum de Davos); o papel das instituições económicas internacionais do imperialismo (OCDE, FMI, BM, OMC) como rolos compressores das economias nacionais e carrascos dos direitos sociais e laborais dos trabalhadores e povos; a afirmação de instituições internacionais - como o Conselho da Europa - como centros de diversão ideológica profundamente anticomunistas; o processo de transformação da Organização de Segurança e Cooperação na Europa (OSCE) num instrumento da cavalgada do imperialismo para Leste desencadeada após a desagregação da URSS; a instrumentalização da ONU pelas grandes potências da NATO, subvertendo o seu papel de garante do cumprimento do direito internacional e de defesa da paz, são preocupantes expressões de uma política de crescente centralização do poder político e da sua submissão ao poder económico e às estratégias de militarização das relações internacionais. Insere-se nesta linha a evolução na União Europeia que corresponde a uma nova fase da intervenção imperialista da Alemanha e de outras grandes potências europeias que se constituem como um bloco político, económico e militar, intimamente coordenado com a NATO, um pólo imperialista que, não obstante reais rivalidades e contradições inter-imperialistas, concerta e partilha com os EUA zonas de influência e intervenção. Apresentado como um «espaço de democracia» e de «defesa dos direitos humanos», trata-se na realidade de um centro político-ideológico do imperialismo, profundamente antidemocrático na sua essência e desrespeitador dos direitos dos trabalhadores e dos povos de todo o mundo. Tentando ocultar a sua natureza exploradora, o imperialismo aprofunda e diversifica a ofensiva ideológica. Intensificam-se os processos de concentração dos meios de comunicação social e de instrumentalização das novas tecnologias da informação para impor aos povos um pensamento e um padrão cultural e comportamental únicos. Promove-se o consumismo, o individualismo e a apatia e estimulam-se comportamentos anti-sociais. Projecta-se o conformismo e animam-se factores de divisão de classe como o racismo e a xenofobia. Instrumentalizando o conceito de solidariedade, impulsionam-se organizações e eventos altamente mediatizados que, visando substituir o respeito de direitos por práticas caritativas, desencorajam a luta e favorecem os mecanismos de exploração. Conceitos como «guerra de civilizações» ou «valores ocidentais» e a instrumentalização das questões étnicas, religiosas, ambientais e de direitos humanos, convergem numa estratégia para submeter países e povos. O carácter profundamente reaccionário das políticas económicas, sociais e de relações internacionais, e a conversão da social-democracia ao neoliberalismo, afirmando-se como um pilar fundamental da ofensiva imperialista, são factores que, cruzados com as consequências sociais, económicas e demográficas da exploração capitalista, estão intimamente ligados a expressões de ressurgimento do fascismo e ao acesso de forças neofascistas ao poder em vários países, nomeadamente na Europa. Paralelamente, prossegue a reescrita da História, com o branqueamento das ditaduras fascistas e a obscena equiparação entre fascismo e comunismo, e aposta-se no anticomunismo, na criminalização dos que resistem ao imperialismo e na perseguição às forças que, das mais variadas formas, resistem à exploração, à opressão e à guerra, ou lutam pela transformação revolucionária da sociedade. A militarização das relações internacionais foi a vertente da ofensiva imperialista que mais se desenvolveu nos últimos anos. O mundo está hoje profundamente instável e inseguro. A retórica capitalista sobre a paz, que se sucedeu ao desaparecimento da URSS e do socialismo como sistema mundial, é desmentida por uma realidade assente na multiplicação de guerras imperialistas de ocupação e na afirmação do militarismo como arma política e económica das maiores potências capitalistas. Os conceitos fascizantes contidos na «Estratégia de Segurança Nacional dos Estados Unidos da América», adoptada entretanto pela NATO e pela União Europeia, foram assimilados pelas legislações ditas «anti-terroristas» de vários países. Generalizou-se a teoria da «guerra preventiva» e desenvolvem-se sofisticadas campanhas mundiais de banalização da violência e de tolerância de práticas criminosas como a tortura, os campos de concentração, as detenções ilegais, o rapto e o tráfico ilegal de prisioneiros (efectuados, em muitos casos, através do território e do espaço aéreo nacionais), o apoio a grupos paramilitares e a protecção a confessos terroristas. Tal ofensiva militarista e securitária é sustentada no discurso do combate ao «terrorismo global». O terrorismo, sob todas as suas formas, incluindo o terrorismo de Estado, é profundamente contrário aos interesses dos trabalhadores e povos. A História e a actualidade demonstram que o imperialismo promove e alimenta o terrorismo, invocando-o depois para difundir uma falsa dicotomia entre segurança e liberdade, e para fortalecer a componente repressiva dos Estados e a devassa e controlo da vida dos cidadãos e das relações sociais. O rasgar de tratados internacionais essenciais para o equilíbrio estratégico (como o Tratado ABM); a agressão e desmantelamento da Jugoslávia; a instalação do chamado «sistema de defesa anti-míssil» norte-americano na Europa e a expansão da NATO e das bases militares do EUA para as fronteiras da Rússia; a militarização da Alemanha; a ofensiva política e militar nos países da bacia do mar Cáspio e no Cáucaso; as provocações contra a China; o «regresso a África» de várias potências militares, com destaque para os EUA, e a instalação do comando militar AFRICOM; a reactivação da IV Esquadra norte-americana na América Latina; o rearmamento do Japão e a revisão militarista da sua Constituição; os acordos nucleares com a Índia e as manobras de desestabilização e ingerência em Timor Leste, por parte da Austrália e EUA, são exemplos elucidativos do carácter global da ofensiva militar e geo-estratégica do imperialismo e dos intentos recolonizadores que lhe estão associados. O Médio Oriente e o continente asiático mantêm-se como os principais focos de instabilidade. O prosseguimento da ocupação imperialista do Iraque e dos crimes sionistas de Israel na Palestina; a intensificação da guerra no Afeganistão e o seu progressivo alastramento ao Paquistão; as provocações e ameaças de intervenção ou provocação militar contra o Irão e a Síria por parte de Israel e dos EUA; as ingerências e agressões no Líbano; as ameaças à República Popular Democrática da Coreia; a instabilidade política provocada no Sri Lanka, Bangladesh e Myanmar, configuram um perigoso cenário para a paz mundial, que assume dimensões potencialmente explosivas com a recente escalada bélica no Cáucaso por parte de uma Geórgia totalmente enfeudada ao imperialismo e por este instrumentalizada. A realidade evidencia que é dos centros políticos e militares do imperialismo que emanam a insegurança e os perigos que caracterizam a situação internacional. O facto de as despesas militares mundiais terem aumentado, desde 1998, cerca de 45%, e de os orçamentos militares dos EUA e dos principais aliados da NATO atingirem valores recorde, demonstram bem a aposta numa nova corrida armamentista que alimenta os fabulosos lucros da sua indústria - como o comprova o aumento superior a 100% das vendas das 100 maiores empresas do complexo militar industrial na última década (74 das quais de Estados membros da NATO) - e de um conjunto de empresas de recrutamento de mercenários e de logística que florescem num novo fenómeno de «privatização» dos conflitos militares. As declarações de inquietação com o investimento militar por parte de países em desenvolvimento são cabalmente desmascaradas pelo facto de os EUA e a NATO dominarem quase hegemonicamente as capacidades militares mundiais, incluindo a produção e o comércio de armas. Só o orçamento militar dos EUA representa cerca de metade das despesas militares mundiais, envolvendo 761 bases e outras instalações militares em território estrangeiro. Num quadro de grandes inquietações quanto à possibilidade de generalização de conflitos com consequências imprevisíveis para a Humanidade, a questão nuclear readquire uma importância crescente. As principais potências imperialistas desenvolvem programas multimilionários de modernização dos seus arsenais nucleares e de sistemas de mísseis estratégicos. Ao mesmo tempo que procura impedir o desenvolvimento da indústria nuclear para fins pacíficos por parte de países que recusam a sua hegemonia, o imperialismo admite criminosamente utilizar novamente a arma nuclear. A um rápido desenvolvimento do militarismo e do carácter multifacetado da ofensiva imperialista tem correspondido um fortalecimento das estruturas de coordenação estratégico-militares do imperialismo. A NATO, na sua cimeira de Riga, em Novembro de 2006, acentuou a sua natureza de organização global de carácter ofensivo, concretizando, na Cimeira de Bucareste de 2008, a sua expansão nos Balcãs e a linha estratégica de futura inclusão da Ucrânia e Geórgia nos planos de dominação do Cáucaso e mar Negro. Paralelamente, desenvolve um vasto conjunto de acordos de «parceria» nos continentes asiático e africano, alargando a sua esfera de influência e tentando submeter o maior número de países possível. Os objectivos, métodos e evolução da NATO comprovam o seu carácter de «polícia de choque» do imperialismo e reforçam, de acordo com a própria Constituição da República Portuguesa, a exigência de dissolução desta organização agressiva, de cuja estrutura militar Portugal deve progressivamente desvincular-se. A ofensiva do imperialismo desenvolve-se num quadro de acelerada mutação e rearrumação de forças, quer no plano da luta de classes quer dentro do próprio campo imperialista, que tende a acentuar-se com a crise capitalista. Adquire, neste contexto, particular importância a interpretação das dinâmicas inter-imperialistas em que, num quadro de crescentes e sobretudo mais visíveis rivalidades entre os dois mais importantes pólos da «Tríade» - União Europeia e Estados Unidos da América - em torno da competição por mercados, áreas de influência e recursos, subsistem aspectos centrais de concertação de classe e de partilha de poder. A principal potência imperialista mundial - os EUA - confirmou-se nos últimos quatro anos como a ponta de lança do militarismo e belicismo imperialistas com a política fascizante da Administração Bush. Esse papel não será abandonado sem uma profunda alteração da correlação de forças no plano mundial, em favor da paz e do progresso social e sem uma profunda alteração do sistema económico e político dominantes na sociedade norte-americana. A eleição de Obama e a projecção internacional que lhe foi atribuída, suportada numa intensa e sofisticada campanha mediática, não pode ser dissociada da operação que, a propósito das eleições presidenciais norte-americanas, se desenvolveu para procurar reverter o crescente isolamento e descrédito dos EUA no plano internacional. Reflectindo a ampla rejeição popular das políticas da Administração Bush, a eleição de Obama está longe de corresponder às expectativas que, no plano interno e internacional, em torno dela se geraram quanto a uma possível alteração substancial das orientações, conteúdos e objectivos da política dos EUA. A realidade demonstra que, a não ser travada, a ofensiva do imperialismo pode pôr em causa a própria existência da Humanidade. O mundo está confrontado com grandes perigos que não devem ser subestimados. Simultaneamente, tais perigos coexistem com uma forte resistência dos trabalhadores e dos povos e com reais potencialidades de desenvolvimento progressista e mesmo revolucionário. 3. «Resistir é já vencer!» A luta dos comunistas, dos trabalhadores e dos povos A intensificação da ofensiva do imperialismo deparou-se com uma crescente resistência dos trabalhadores e dos povos. Face ao generalizado agravamento das condições de vida das massas trabalhadoras, às limitações ou destruição de importantes conquistas sociais e direitos democráticos, aos ataques às soberanias nacionais, a luta de classes agudizou-se e intensificou-se em diversas frentes, assumindo formas, conteúdos e objectivos muito diferenciados convergindo na condenação e rejeição das políticas do grande capital e do imperialismo. Apesar da correlação de forças se manter desfavorável, prosseguiu por toda a parte a luta das forças do progresso social, de libertação nacional, da paz e do socialismo. A luta dos trabalhadores pelas suas reivindicações e por uma sociedade mais justa, envolvendo a classe operária e outras camadas de assalariados, no sector público e privado, traduziu-se em importantes movimentos grevistas, manifestações e jornadas nacionais de luta. Em todos os continentes milhões de trabalhadores associaram a luta reivindicativa nos locais de trabalho a manifestações de rua por trabalho com direitos, valorização dos salários, liberdade sindical, segurança social, justiça fiscal, e contra as privatizações, o encerramento e deslocalização de empresas, o ataque aos serviços públicos. As greves gerais em numerosos países são apenas alguns exemplos de lutas que se travam diariamente por todo o mundo e que a comunicação social dominante, ao serviço do capital, se esforça por ocultar. A resistência à ofensiva exploradora do capital, em que, a par da destruição de conquistas históricas dos trabalhadores, sobressai a dramática situação de pobreza para que são empurrados cada vez mais milhões de seres humanos, assumiu novas expressões em sectores e países muito diversos, como a manifestação de crianças trabalhadoras no Bangladesh e a marcha dos pobres na Índia, ou os motins contra o brutal aumento dos preços dos bens alimentares e, mais recentemente, os protestos populares contra os efeitos das falências bancárias. A organização da classe operária e dos trabalhadores e, em primeiro lugar, a existência de um combativo movimento sindical unitário, de classe e de massas, é de decisiva importância para uma correcta orientação no desenvolvimento e eficácia da luta. Particular projecção assumiu a luta dos trabalhadores imigrantes, nomeadamente nos EUA e na Europa, contra as leis racistas e xenófobas, pela legalização e igualdade de direitos e contra a sobre-exploração. Fortemente atingidas pela ofensiva do grande capital estão as massas camponesas que, face às orientações da OMC, ao desenvolvimento da agro-indústria e dos agro-combustíveis, vêem a sua sobrevivência ameaçada pelo negócio e a especulação capitalistas. As reivindicações dos camponeses e do proletariado agrícola pelo direito a produzir, por preços compensadores à produção, contra a utilização dos transgénicos, pelo direito à terra, têm estado no centro da luta de classes em numerosos países, como testemunham as grandes manifestações no Paraguai, no Brasil ou na Índia, e têm sido o motor de profundas transformações políticas e sociais, como na Bolívia e no Equador, em defesa das comunidades indígenas e das produções tradicionais, em defesa da água pública e do meio ambiente. A exploração crescente das massas camponesas pelas multinacionais da indústria alimentar e a especulação em torno dos preços dos alimentos trouxeram para primeiro plano da situação internacional o flagelo da fome, potenciando-a como geradora de novos conflitos e confirmando a soberania e segurança alimentar como componente fundamental da independência nacional e do progresso social. A questão da propriedade da terra e da reforma agrária, de acordo com o lema «a terra a quem a trabalha», é de redobrada actualidade. A crise do sistema também se reflectiu sobre a pequena e média burguesia urbana, nomeadamente sobre os micro, pequenos e médios empresários, que reagem de forma mais organizada aos efeitos da concentração capitalista em todas as áreas de actividade. Destaque merece também a luta dos intelectuais e quadros técnicos que, como camada cada vez mais proletarizada, sofre a perda de direitos, o espectro do desemprego e a degradação dos rendimentos. A luta das mulheres, integrando as mais diversas organizações ou através dos seus próprios movimentos, assume cada vez maior importância, desde logo contra a exploração da mão-de-obra feminina e em defesa dos seus direitos específicos, na solidariedade com as mulheres vítimas das mais diversas formas de violência, e da ofensiva agressiva do imperialismo. As lutas da juventude adquirem uma enorme importância não apenas na defesa dos seus interesses imediatos pelo direito ao trabalho e em defesa da escola pública, mas também na defesa dos mais amplos direitos dos trabalhadores, da liberdade, da democracia e da paz. A luta contra o imperialismo conheceu um desenvolvimento particularmente importante nos últimos anos. A resistência à política de ingerência, agressão e guerra, em particular dos EUA, foi um traço marcante da luta dos povos em defesa da sua soberania e do direito inalienável a decidir dos seus destinos. No Iraque, no Afeganistão, na Palestina, no Líbano, em Cuba, na Venezuela, na Bolívia, no Equador, assim como na Síria, no Irão, na R.D.P. da Coreia, nos Balcãs, na Colômbia ou em Chipre, prosseguem processos e batalhas decisivos para o futuro desses povos e para a estabilidade nas respectivas regiões que merecem a activa solidariedade dos comunistas portugueses. Nelas intervêm forças muito distintas na sua origem, objectivos e formas de luta, mas dispondo de real apoio de massas e convergindo na rejeição de arrogantes e humilhantes imposições externas e na defesa da cultura e soberania nacionais. A luta contra a integração capitalista europeia é parte integrante deste vasto movimento. O movimento da paz, após uma ampla e combativa expressão associada às ameaças dos EUA ao Iraque e ao desencadear da guerra, tem agora manifestações mais dispersas. Mas há sinais positivos que importa encorajar. Na Europa desenvolveu-se a oposição à acelerada militarização da UE e a luta contra a instalação do sistema anti-míssil dos EUA e o alargamento da NATO para Leste. Desenvolveu-se a luta contra as bases militares estrangeiras, e grandes manifestações contra o militarismo tiveram lugar no Japão e na Índia. O Conselho Mundial da Paz reforçou-se e desempenha hoje um papel mais activo. Mas, não estando o movimento da paz à altura da gravidade da situação, é necessário prestar-lhe mais atenção e intensificar a solidariedade com todos os povos vítimas das ingerências e das agressões do imperialismo. Em particular é necessário expressar activa solidariedade à luta dos povos pela sua autodeterminação e independência, como na Palestina, Saara Ocidental, Chipre, ou pela consolidação de processos democráticos de independência nacional, como em Timor-Leste, assim como para com corajosos processos de afirmação de soberania que encerram um grande significado político e apontam para uma rearrumação de forças em detrimento do imperialismo. Tal é o caso do continente latino-americano onde os EUA, depois de sérios reveses, e com a ajuda de governos fascizantes como na Colômbia, estão a lançar uma perigosa contra ofensiva que é necessário denunciar e derrotar. A evolução da situação na América Latina num sentido progressista e anti-imperialista, apesar de traços contraditórios e da própria diversidade e originalidade dos processos, constitui um dos mais encorajadores exemplos de avanço libertador desde o XVII Congresso. As mudanças a nível do poder em numerosos países, impulsionadas e sustentadas por poderosos movimentos populares, com tradução em importantes vitórias eleitorais, têm revertido na adopção de importantes medidas de carácter democrático e social. Foram abandonadas algumas orientações neoliberais e sustidos alguns dos seus aspectos mais agressivos, o que possibilitou a rejeição da Área de Livre Comércio das Américas (ALCA) e avanços num processo de integração latino-americana de sentido global positivo. Com múltiplas expressões, desde o Mercosul que, inscrevendo-se num funcionamento capitalista, afronta objectivamente a hegemonia norte-americana, até à ALBA - com um conteúdo vincadamente solidário e anti-imperialista -, outros instrumentos de cooperação têm sido criados na base de relações mais equitativas e justas. Procurando reverter tais desenvolvimentos e depor governos democraticamente eleitos, os EUA desenvolvem intensa actividade subversiva apoiando as forças mais reaccionárias, como os recentes acontecimentos da Bolívia revelam. O exemplo revolucionário de Cuba socialista, a defesa intransigente da sua soberania, face a ameaças e actos terroristas por parte do imperialismo e a um feroz e prolongado bloqueio, e a sua activa solidariedade com os povos e processos em desenvolvimento na América Latina, tem constituído precioso estímulo para as transformações progressistas na Venezuela bolivariana, no Equador, na Bolívia e outros países. A luta em defesa da soberania nacional, o seu carácter popular e de massas, envolvendo forças sociais, políticas e religiosas muito diversas, sendo uma importante expressão da luta libertadora dos povos, é, no actual contexto da globalização imperialista uma expressão viva da luta de classes, assumindo um incontornável conteúdo internacionalista e pondo em evidência a importância do marco nacional da luta de transformação social e emancipação dos povos. Importante realidade do quadro internacional, nomeadamente pelo seu papel de resistência à «nova ordem» imperialista, são os países que definem como orientação e objectivo a construção duma sociedade socialista - Cuba, China, Vietname, Laos e R.D.P. da Coreia. Com percursos diversos, experiências históricas próprias, evoluções distintas, problemas e contradições inerentes ao processo de transformação social num quadro de relações capitalistas dominantes, estes países estão sujeitos pelo imperialismo a uma intensa campanha de pressões económicas, ameaças militares e operações de desestabilização e intoxicação mediática que encerram graves perigos para a segurança internacional e que, a vingarem, significariam um grave retrocesso na luta libertadora. Independentemente das avaliações diferenciadas em relação ao caminho e às características destes processos - a exigir uma permanente e cuidada observação e análise - e das inquietações e discordâncias, por vezes de princípio, que suscitam à luz das concepções programáticas próprias do Partido, o PCP considera que não há vias únicas de transformação social e reafirma o inalienável direito destes países e dos seus povos, como de todos os povos do mundo, a decidir livremente sobre o seu próprio caminho. É esse o interesse da causa do progresso social e da paz em todo o mundo. A revolução cubana, que assinalará na viragem do ano o seu 50º aniversário, defrontando ao longo deste meio século permanentes campanhas de ingerência, desestabilização e agressão, projecta-se no mundo pelas conquistas políticas, económicas, sociais e culturais alcançadas, pela defesa intransigente da sua soberania nacional, pelo seu exemplo de patriotismo e internacionalismo, e pela sua posição de vanguarda nos domínios da saúde e da educação. A solidariedade com Cuba socialista é um imperativo de todas as forças revolucionárias e amantes da paz. A convergência da luta dos povos pela sua libertação nacional e social com a luta da classe operária e dos trabalhadores e de outras camadas antimonopolistas é hoje uma tarefa central de todas as forças que se opõem à hegemonia do imperialismo. A frente anti-imperialista alargou-se e diversificou-se. Com componentes sociais e políticas muito diferenciadas, nela se incorporam correntes ideológicas distintas e até antagónicas nos seus objectivos estratégicos, o que torna difícil a unidade na acção, mesmo quando intervêm com idênticas reivindicações. É necessário precisar e potenciar conteúdos e formas de intervenção que favoreçam a acção comum ou convergente e a eficácia na resistência à ofensiva do grande capital e do imperialismo, e por uma nova ordem internacional, democrática, pacífica, respeitadora da soberania dos povos. No actual quadro de crescente agressividade do imperialismo, assume-se como prioritária a frente da luta pela paz e a solidariedade com os povos vítimas da ingerência e da agressão do imperialismo. Frente que comporta nomeadamente a luta contra o militarismo e a guerra e contra o recurso à força nas relações internacionais; contra o alargamento e pela dissolução da NATO e outros blocos político-militares, designadamente contra a militarização da UE e o militarismo japonês; pelo desarmamento e a proibição da arma nuclear e todas as armas de destruição massiva; contra a instalação de sistemas anti-míssil e a militarização do espaço; pela democratização da ONU e o respeito pelos princípios da sua Carta e do direito internacional. Com o desenvolvimento da crise do capitalismo ganha ainda maior relevo a luta contra a exploração e as tentativas de transferir para os trabalhadores e os povos os custos da crise. Tal objectivo insere-se na luta mais geral por relações económicas internacionais mais equitativas e mais justas; contra as políticas neoliberais de desmantelamento dos direitos dos trabalhadores e de destruição dos serviços públicos; contra o subdesenvolvimento e pela erradicação dos flagelos da fome, da doença e do analfabetismo; em defesa do meio ambiente. No quadro do fortalecimento das diversificadas expressões da frente anti-imperialista valoriza-se o papel desempenhado por organizações unitárias internacionais surgidas no fluxo da vitória sobre o nazi-fascismo na II Guerra Mundial como o Conselho Mundial da Paz, a Federação Mundial da Juventude Democrática (incluindo o amplamente unitário movimento dos Festivais Mundiais da Juventude e dos Estudantes, com o seu carácter anti-imperialista e de massas, por ela impulsionado), a Federação Democrática Internacional das Mulheres, a Federação Sindical Mundial, sendo importante agir para que se reforce a sua intervenção e alargue a sua dimensão de massas. O «movimento anti-globalização», no seio do qual se tem travado uma intensa luta ideológica, para a qual o PCP tem dado activa contribuição, combatendo a sua instrumentalização por forças social-democratizantes e defendendo a acentuação da sua componente anticapitalista e anti-imperialista, vive hoje um período de menor impacto. A realidade da luta de classes, e da importância decisiva da luta no marco nacional, pôs em evidência os limites do movimentismo e do chamado «novo internacionalismo» daqueles que semeiam a ilusão de que é possível «humanizar» a globalização capitalista. O PCP, que desde o início caracterizou tal movimento como expressão do estreitamento da base social de apoio do capitalismo na sua forma actual, continua a considerar de grande importância a acção convergente de todos os que sofrem as consequências da contra-ofensiva exploradora e agressiva do grande capital. É também importante valorizar e acompanhar os mais variados movimentos em torno de temas específicos e objectivos concretos que ganharam força nos últimos anos no quadro dos progressos da ciência e da técnica e da globalização capitalista, como sejam os movimentos em torno das questões ambientais, do software e bases de informação livres e muitos outros. Num tempo que é ainda de resistência e de acumulação de forças, mas também de fortes potencialidades progressistas e revolucionárias, enormes responsabilidades recaem sobre os partidos comunistas e o movimento comunista e revolucionário internacional. A par da defesa intransigente dos interesses dos trabalhadores, cabe-lhes identificar os conteúdos unificadores para as alianças necessárias da classe operária com as diferentes componentes sociais e políticas que integram a frente anti-imperialista, e colocar com confiança a perspectiva da alternativa, mesmo que no imediato se coloquem apenas objectivos limitados e etapas intermédias de luta pelo socialismo e pelo comunismo. Contrariando aqueles que há duas décadas anunciaram o fim da história e da luta de classes, é cada vez mais evidente a impossibilidade do capitalismo em dar resposta aos problemas e anseios dos trabalhadores, que a classe operária continua no centro da luta de classes e que, para a superação revolucionária do capitalismo, os trabalhadores assalariados e outras classes e camadas antimonopolistas devem contar com fortes partidos comunistas. O fortalecimento dos partidos comunistas e o reforço da sua cooperação e solidariedade recíproca, tendo como núcleo o internacionalismo proletário, são exigências historicamente comprovadas para o êxito da luta. A aproximação e cooperação entre partidos comunistas e operários, de que o processo dos Encontros Internacionais (cuja oitava edição se realizou em Lisboa e que vai já na sua décima edição) é uma importante expressão, tem progredido, e o PCP fará o que estiver ao seu alcance para que progrida ainda mais no futuro, para criar as condições para formas mais estáveis e eficazes de articulação. Esta realidade não anula, contudo, as enormes debilidades, dificuldades e problemas que persistem no movimento comunista. Ainda muito marcado pelas negativas consequências das derrotas do socialismo, assiste-se, por um lado, a valiosos processos de resistência, afirmação e recuperação de partidos comunistas, mas, por outro lado, continuam a desenvolver-se tendências revisionistas e reformistas envolvendo processos de degenerescência, autoliquidação e diluição em frentismos de «esquerda», com o abandono das referências ideológicas e objectivos revolucionários que definem os comunistas como corrente revolucionária necessária ao fortalecimento da frente anti-imperialista, e insubstituível para a liquidação do capitalismo e para a construção de uma nova sociedade sem exploradores nem explorados. Neste sentido, o Partido da Esquerda Europeia, que o PCP não integrou pela sua lógica supranacional e natureza ideológica, não só se confirmou como uma falsa resposta ao reconhecidamente necessário reforço da cooperação das forças de esquerda anticapitalistas na Europa, como introduziu factores de divisão, afastamento e preconceito, que se manifestaram nomeadamente no Grupo da Esquerda Unitária Europeia / Esquerda Verde Nórdica no Parlamento Europeu. A luta pelo reforço dos partidos comunistas defronta-se com rápidas mudanças socioeconómicas, suas repercussões na classe operária e na sua condição (desemprego, precariedade, deslocalização, e/imigração) e com a enorme pressão ideológica do grande capital, só ultrapassável pela firmeza de convicções e pelo seu enraizamento na classe operária e nas massas populares, impulsionando a sua luta, apontando a perspectiva revolucionária de transformação social e dando combate a posições oportunistas que negam a luta de classes. Apesar da crescente compreensão da necessidade dos partidos comunistas e da sua estreita cooperação, o movimento comunista vive ainda uma fase de grande instabilidade e continua a ser difícil definir, com rigor, as suas componentes e fronteiras. A diversidade de situações e tarefas imediatas, experiências, culturas, de avaliação da História, sempre foram características do movimento comunista, e a existência hoje de profundas diferenças exige que a cooperação, visando a unidade na acção, assente nos princípios de igualdade de direitos, soberania e não ingerência nos assuntos internos, rejeitando tanto nacionalismos e particularismos redutores, como «modelos» e concepções uniformizadores sem correspondência com a realidade. Perante a crise do capitalismo, e os perigos que esta encerra, cabe ao movimento comunista e revolucionário desenvolver a mais ampla cooperação das forças progressistas e revolucionárias anti-imperialistas, intercambiando experiências, análises e opiniões, vencendo atrasos, combatendo o reformismo e o espontaneísmo, e dando vigoroso combate à ideologia dominante. A ofensiva imperialista só poderá ser travada com a conjugação da luta dos povos, das forças comunistas e progressistas e dos países que assimilem, no desenvolvimento da luta, a condição essencial de associar à luta anti-imperialista o objectivo da superação revolucionária do capitalismo e da construção do socialismo. 4. O socialismo, alternativa necessária e possível O socialismo, objectivo programático do PCP, tendo no horizonte o comunismo, não só traduz a superioridade dos valores de liberdade e justiça social que animam os comunistas de todo o mundo na sua luta contra o capital, como constitui, na actualidade, uma possibilidade real cada vez mais necessária e urgente. Esta profunda convicção do PCP assenta em três pilares fundamentais. Em primeiro lugar, numa concepção materialista e dialéctica da história, para cuja elaboração científica consequente Marx e Engels trouxeram contribuições decisivas, que, desvendando as leis gerais do desenvolvimento social e o papel nele reservado ao proletariado, fundamenta a transitoriedade do capitalismo como modo de produção e de reprodução do viver, bem como a possibilidade real e a exigência prática da sua superação revolucionária, exigência e possibilidade que Lenine aprofundou na época do imperialismo, e a que a Grande Revolução Socialista de Outubro deu vida pela primeira vez na história. Em segundo lugar, no significado histórico universal da Revolução de Outubro, no empreendimento pioneiro de uma nova sociedade na URSS e demais experiências históricas do socialismo. Experiências que, todas elas com graus diferenciados de criatividade revolucionária, maior ou menor consideração das especificidades nacionais, maior ou menor peso de factores de ordem externa, foram fruto de grandes batalhas de classe e de situações de crise revolucionária que impuseram transformações anticapitalistas profundas. Experiências inseparáveis da criação pelo proletariado do seu partido de vanguarda, e só possíveis pela abnegação e prestígio dos comunistas e pela entusiástica adesão e participação populares que suscitaram. Experiências que se traduziram em realizações e conquistas de grande valor, que já demonstraram a superioridade do poder dos trabalhadores e da nova sociedade sem exploradores nem explorados, do socialismo sobre o capitalismo. A contribuição da URSS e, posteriormente, do campo dos países socialistas, para os grandes avanços de civilização verificados no século XX foi gigantesca. Países atrasados transformaram-se num curto prazo de tempo em países altamente industrializados e socialmente avançados em que foram alcançados direitos historicamente inéditos. As conquistas sociais e democráticas do movimento operário dos países capitalistas, vulgarmente identificadas com o «Estado social», a derrocada dos impérios coloniais e o impetuoso avanço do movimento de libertação nacional dos povos de África, Ásia e América Latina, são inseparáveis da existência e das realizações da URSS e dos países socialistas. Sejam quais forem as tentativas de negar e subverter a verdade, a vitória sobre o nazi-fascismo ficará para sempre gravada na História como um feito para o qual o povo soviético e os comunistas na Europa e em todo o mundo deram a mais heróica e decisiva contribuição. A política de paz e de solidariedade internacionalista da URSS e a conquista do equilíbrio militar estratégico entre a URSS e os EUA e entre o campo socialista e o imperialismo, foram decisivas para a contenção da natureza agressiva do imperialismo, a salvaguarda da segurança na Europa e da paz mundial, o avanço das forças do progresso social. Como tantas outras, a revolução portuguesa do 25 de Abril enquadra-se no clima europeu e internacional de desanuviamento da década de setenta, e o povo português contou com a solidariedade internacionalista dos povos da União Soviética e demais países socialistas. A caminhada da Humanidade para o socialismo e o comunismo sofreu profundos reveses no findar do século com as derrotas do socialismo na URSS e no Leste da Europa. O estudo das suas causas e consequências prossegue no movimento comunista e no campo progressista, e o PCP deverá consagrar-lhe ainda mais atenção para tirar todas as experiências e ensinamentos que comporte, a fim de prosseguir a luta com reforçada confiança. Temos muito de valioso já adquirido pela elaboração e reflexão colectivas do Partido desde o XIII e XIV Congressos. Revelou-se particularmente fecunda a tese avançada pelo PCP de que (ao contrário do que pretendeu a violenta campanha desencadeada pelos nossos adversários sobre a «morte do comunismo» e o «declínio irreversível dos partidos comunistas») o que foi derrotado não foram os ideais e o projecto comunistas mas um «modelo» historicamente configurado, que se afastou, e entrou mesmo em contradição com características fundamentais de uma sociedade socialista, sempre proclamadas pelos comunistas, relativas ao poder dos trabalhadores, à democracia política, às estruturas socioeconómicas, ao papel do Partido, à teoria. Tendo como base as análises e orientações do XIII e XIV Congressos, é necessário continuar a aprofundar a reflexão. A construção do socialismo na URSS, e ulteriormente noutros países da Europa, Ásia e América Latina, enfrentou desde o primeiro momento o cerco e a agressão do imperialismo, continuadas operações de provocação e desestabilização interna, sofisticadas campanhas de diversão e subversão ideológica. Tudo isto impôs pesados sacrifícios, obrigou ao desvio de recursos imensos para a esfera militar, levou a distorções e desequilíbrios no desenvolvimento socioeconómico socialista, e mesmo a situações de crise. Tudo isto influenciou os caminhos e as soluções encontradas no processo de construção do socialismo e contribuiu, em medida considerável, para os atrasos, erros e deformações que se verificaram com violação de princípios essenciais do socialismo. Graves cedências e capitulações ideológicas, políticas e de classe que se manifestaram sobretudo a partir de meados da década de 80, acabaram por determinar que, da aguda competição e confrontação entre os dois sistemas, resultasse temporariamente um sério retrocesso no caminho do progresso social. Perante os complexos problemas que se manifestaram na construção do socialismo na URSS, assim como noutros países do Leste da Europa, o PCP expressou compreensão e solidariedade para com os esforços e orientações que proclamavam visar a sua superação, alertando simultaneamente para o desenvolvimento de forças anti-socialistas e para a escalada de ingerências imperialistas, confiando em que, apesar das dificuldades e deformações, existiam forças capazes de defender o poder e as conquistas dos trabalhadores e promover a necessária renovação socialista da sociedade. Mas certas medidas tomadas agravaram os problemas ao ponto de provocar uma crise geral. O abandono de posições de classe e de uma estreita ligação com os trabalhadores, o apagamento do marxismo-leninismo e a penetração em profundidade da ideologia social-democrata, a claudicação das pressões e chantagens, a rejeição do imperialismo, a desvalorização e mesmo rejeição do heróico património histórico dos comunistas e do povo soviético e, finalmente, a traição de altos responsáveis do Partido e do Estado, desorientaram e desarmaram os comunistas e as massas para a defesa do socialismo, possibilitando o rápido desenvolvimento e triunfo da contra-revolução com a reconstituição do capitalismo. Esta dura realidade não anula, porém, o alcance libertador do empreendimento inédito de construção de uma sociedade nova, sem exploradores nem explorados, iniciada com a Revolução de Outubro. O valor das suas realizações ressalta ainda mais com as trágicas consequências destas derrotas. Para estes países, com o terrível retrocesso social provocado pela contra-revolução, a perda de soberania, a invasão exploradora das multinacionais e o esbulho das suas riquezas, a anexação pela NATO e pela UE, os ataques a direitos e liberdades fundamentais, o avanço de forças fascistas e do anticomunismo. Para o mundo, com o desequilíbrio da correlação de forças daí resultante e a contra-ofensiva desencadeada pelo grande capital e pelo imperialismo contra os trabalhadores e contra os povos. A vida demonstrou de modo dramático que o desaparecimento do poderoso factor de contenção que a URSS representava deixou o mundo mais exposto à natureza exploradora e agressiva do capitalismo, tornando-o mais injusto e perigoso. Em terceiro lugar, a convicção do PCP de que o socialismo é na actualidade cada vez mais necessário e urgente, assenta na análise do sistema capitalista e das suas tendências de desenvolvimento actual. O capitalismo tem revelado capacidades de adaptação e de recuperação por vezes inesperadas, mas está ferido de insanáveis contradições e, como a crise actual evidencia, são patentes os seus limites históricos. Com as derrotas do socialismo lançou uma gigantesca campanha visando apresentar-se como sistema terminal sem alternativa. Mas o mito do «fim da História» - e com ele do «fim» do comunismo, dos partidos comunistas, da luta de classes, da revolução, das ideologias e outros - durou pouco. O triunfalismo capitalista dos anos 90 que, frente às derrotas do socialismo, anunciava mais liberdade, mais paz e segurança internacionais, mais progresso social, não resistiu à prova dos factos. As receitas do neoliberalismo e as teses justificativas da globalização capitalista, incluindo as da chamada «terceira via», embora ainda dominantes, desacreditaram-se rapidamente. O capitalismo não só se revela incapaz de dar satisfação aos interesses e aspirações dos trabalhadores e dos povos como põe em perigo a própria Humanidade. A contradição entre as imensas potencialidades das conquistas da ciência e da técnica e as terríveis regressões que percorrem o mundo contemporâneo - desemprego, fome, doença, analfabetismo, degradação dos recursos naturais, catástrofes ambientais - constitui, em si mesma, uma violenta acusação ao sistema capitalista. A necessidade e possibilidade do socialismo estão inscritas nas próprias contradições do sistema que o capitalismo contemporâneo tende a agudizar extraordinariamente. O antagonismo entre o capital e o trabalho, com o brutal agravamento da exploração e a proletarização acelerada da pequena burguesia e camadas intermédias da população. A não correspondência entre o desenvolvimento das forças produtivas e as relações de produção capitalistas que entravam o seu desenvolvimento e pervertem a sua utilidade social. A contradição entre o carácter social (cada vez mais acentuado) da produção e a propriedade privada (cada vez mais concentrada) dos grandes meios de produção. A actual crise capitalista comprova a necessidade de rupturas que coloquem a economia ao serviço dos trabalhadores e dos povos. A extraordinária centralização e concentração de capital, a formação de gigantescos monopólios que, isoladamente ou em aliança, dominam ramos inteiros da produção, do comércio e serviços e das finanças, os próprios mecanismos de regulação internacional do capitalismo, são expressão de reais processos de socialização que mostram a necessidade do socialismo, como solução racional necessária à desumana anarquia e concorrência capitalistas. A solução dos grandes problemas que afectam toda a Humanidade, a começar pelo problema da paz, mas também os problemas dos recursos naturais, da energia, do ambiente, da pobreza e outros, exige a utilização de métodos racionais de planeamento inerentes ao socialismo. Estão objectivamente interessadas na superação histórica do capitalismo monopolista como modo de produção dominante, todas as classes e camadas não monopolistas. Mais do que nunca é o próprio futuro da Humanidade que está ameaçado pela desenfreada corrida ao máximo lucro. Nunca foi tão verdadeira a tese marxista de que, libertando-se, a classe operária liberta simultaneamente todas as outras classes e camadas oprimidas pelo capital monopolista, o que hoje significa libertar a Humanidade. Sem dúvida que o caminho do socialismo se revelou mais complexo e mais acidentado e demorado do que os grandes avanços libertadores alcançados no caminho aberto pela Revolução de Outubro faziam prever. E que o movimento comunista e revolucionário não recuperou ainda de grandes retrocessos da década de 90. Nada disso anula, porém, a realidade de que a época em que vivemos é a época da passagem do capitalismo ao socialismo, inaugurada pela Revolução de Outubro, que o capitalismo não só não resolve como agrava os graves problemas do nosso tempo, que só o socialismo pode responder às mais profundas aspirações dos trabalhadores e dos povos e salvar a Humanidade da catástrofe anunciada pela insaciável e destrutiva gula do capital. É com esta profunda convicção que o PCP aponta, para Portugal e para o mundo, o socialismo como possibilidade real e a mais sólida perspectiva de evolução da Humanidade. 2.Nacional II - Situação nacional 0. Introdução

1. Evolução da União Europeia

2. Situação económica e social

3. A evolução política e o regime democrático

4. A política necessária

0. Introdução A formação do Governo PS, suportado na Assembleia da República por uma maioria absoluta e a eleição de Cavaco Silva para a Presidência da República traduzem, no plano político-institucional, a afirmação e consolidação de um bloco de poder ao serviço dos grandes grupos económicos e financeiros. A realização das eleições legislativas antecipadas de Fevereiro de 2005, na sequência da dissolução da Assembleia da República, correspondeu, ainda que tardiamente, a uma ampla e crescente aspiração popular, e culminou um largo processo de resistência à ofensiva prosseguida pelos governos do PSD e CDS-PP de Durão Barroso, Paulo Portas e Santana Lopes. A vinculação do PS à política de direita, agravada pela obtenção de uma maioria absoluta gorou a possibilidade que das eleições resultasse, não apenas a mudança de governo e a derrota do PSD e CDS-PP, mas a criação de condições que contribuíssem para a derrota da política de direita e o alcançar de uma efectiva e verdadeira política alternativa. Os três anos e meio de Governo PS ficam marcados por uma nova fase, quer pela intensidade, quer pelo seu carácter global de uma ofensiva dirigida para a destruição dos direitos sociais, para o aumento da exploração do trabalho e para a concretização dos interesses do capital. No quadro do prosseguimento e desenvolvimento da política de direita dos últimos trinta e dois anos, o actual Governo tem em curso uma acção não apenas destinada a reduzir e a liquidar direitos e a impor retrocessos no plano social, mas também dirigida contra o regime democrático consagrado na Constituição. O processo de reconfiguração da estrutura e papel do Estado aos interesses do capital monopolista e o ataque a direitos no plano económico e social têm-se traduzido no empobrecimento da democracia política e na crescente restrição às liberdades e garantias dos cidadãos. Suportados numa relação de crescente promiscuidade e comprometimento com o Governo, e pela «cooperação estratégica» oferecida pelo Presidente da República à sua acção, sectores e estruturas proeminentes do grande capital inscreveram na sua agenda e objectivos já não só a reclamação de políticas económicas e sociais mais favoráveis aos seus interesses, mas a apresentação de uma verdadeira agenda de subversão do regime político e constitucional. Três décadas de política de direita, de reconstituição do capitalismo monopolista, traduzidas no agravamento das condições de vida dos trabalhadores e do povo, na crescente dependência e subordinação externa do país e num inquietante empobrecimento do regime democrático, colocam como grande questão da actualidade política e do futuro do país a exigência de ruptura com estas políticas e a construção de um novo rumo para o país. 1. Evolução da União Europeia A recente evolução da União Europeia é inseparável do conjunto de processos económicos, sociais e políticos que marcam a fase actual do capitalismo. A evolução da União Europeia nos últimos quatro anos, a par do prosseguimento e aprofundamento das suas políticas neoliberais, federalistas e militaristas, foi significativamente marcada pela rejeição, em 2005, da chamada «constituição europeia» pelos povos da Holanda e da França e pela rejeição, pelo povo irlandês, da segunda tentativa para a sua imposição, agora na versão denominada «Tratado de Lisboa». Uma rejeição que representa para o grande capital e as grandes potências um significativo revés nos seus projectos de aprofundamento da integração capitalista europeia. No plano nacional, constitui uma significativa derrota do PS e do PSD e da sua opção de retirarem ao povo português o direito de debater e se pronunciar sobre o real conteúdo e objectivo de uma proposta de Tratado contra o qual o PCP firmemente se bateu, e contra o qual vai continuar a lutar. As manobras que procuraram impedir a realização de novos referendos nos países da UE, ou onde não puderam impedir a sua realização, a pressão para a sua repetição até um resultado favorável, bem como as que antecederam e se seguiram ao referendo na Irlanda expõem o carácter profundamente antidemocrático da integração europeia e do desrespeito das suas instituições supranacionais pela vontade dos povos. No quadro da agudização da crise estrutural do sistema capitalista avançou a denominada «Estratégia de Lisboa» com a intensificação da sua agenda e prioridades, sistematizada com a criação dos «Planos Nacionais de Acção», a adopção da directiva de liberalização dos serviços e de novas etapas na liberalização e privatização dos serviços públicos (energia, água, transportes, correios, educação) e no desmantelamento da administração pública, a desregulamentação do mercado de trabalho, promovendo a dita «flexigurança», os acórdãos do Tribunal de Justiça Europeu no sentido de impor a liberalização dos mercados e a concorrência capitalista, nomeadamente colocando em causa legislações laborais nacionais, para além de uma política monetária ao serviço dos grandes interesses financeiros, que promove a moderação salarial e a transferência crescente dos ganhos de produtividade do trabalho para o capital. Prosseguiu a liberalização da agricultura, com a desvinculação das ajudas da produção, decidida na reforma da Política Agrícola Comum de 2003, e o desmantelamento das organizações comuns de mercado (vinho), acentuando as desigualdades na distribuição das ajudas entre produtores, produções e países. Promoveu-se uma Política Comum de Pescas orientada para a destruição do sector e a entrega da gestão dos recursos biológicos marinhos nacionais às instituições supranacionais da UE. Políticas comuns que comprometem estes sectores estratégicos do país e a sua soberania e segurança alimentares. Intensificou-se uma política de relações comerciais bilaterais, regionais e multilaterais que visa a liberalização do comércio mundial, seja ao nível da Organização Mundial do Comércio ou da criação de zonas e regiões de livre comércio, privilegiando, apesar de contradições, uma parceria estratégica com os EUA. O quadro financeiro comunitário para 2007-2013, adoptado em 2006, estabeleceu, por imposição das potências da União Europeia, na sua ofensiva contra os trabalhadores e os povos, um limite de 1% do Rendimento Nacional Bruto ao nível da UE para o orçamento comunitário, penalizando os países economicamente menos desenvolvidos - como Portugal, que perde cerca de 15% de verbas face ao quadro comunitário anterior - e condicionando a utilização destes meios à concretização da agenda neoliberal da «Estratégia de Lisboa». Foram dados novos passos no sentido de uma política comum da justiça e assuntos internos, subtraindo competências à soberania dos Estados, adoptando um amplo conjunto de medidas securitárias que, a pretexto da «luta contra o terrorismo», colocam em causa direitos, liberdades e garantias fundamentais dos cidadãos e reforçam o aparelho repressivo na União Europeia. Foi sendo implementada a política de imigração ao nível da UE, de cariz securitário, selectivo, repressivo e criminalizador dos imigrantes, que os reduz a uma mão-de-obra barata, desprovida de direitos e descartável, de que são exemplos a recém aprovada directiva europeia de retorno, bem como o Pacto Europeu de Imigração e Asilo, onde se integra o «cartão azul». Aprofundou-se a militarização da União Europeia que, adoptando o conceito ofensivo da NATO, se confirma como o seu pilar europeu, desenvolvendo a sua «Estratégia de Segurança», assente na militarização das relações internacionais e na violação do direito internacional. A UE avançou no reforço e criação de novas capacidades militares e na prossecução de «missões militares» que, como em África ou no Kosovo, visam o domínio de mercados e de recursos naturais e a partilha de zonas geo-estratégicas. Pelas suas políticas e objectivos, a União Europeia confirma-se plenamente como o instrumento de classe do capitalismo transnacional e das grandes potências, bem evidente na coincidência das prioridades e decisões das suas instituições supranacionais com os interesses do grande capital e no domínio dos processos de decisão por parte das grandes potências da UE. Uma «integração» que tem contado, em questões centrais (de que são exemplo os Tratados, a Estratégia de Lisboa ou a «flexigurança»), com o acordo da Confederação Europeia de Sindicatos (CES). A evolução recente da União Europeia confirma que, apesar dos importantes e graves avanços verificados no sentido da sua consolidação como pólo imperialista, não está isenta de contradições e resistências que resultam do confronto do grande capital com a enorme massa dos assalariados, em particular dos sectores operários, e outras camadas sociais profundamente atingidas pelas políticas de direita. Contradições inerentes ao choque de interesses políticos e económicos entre as grandes potências e as que tenderão a desenvolver-se entre estas e os restantes países, e que, inevitavelmente, crescerão à medida que a «crise financeira» se aprofunda, criando sérias dificuldades à manutenção de países com economias mais débeis no espartilho do euro, e à medida que a União Europeia violente direitos de soberania, interesses nacionais e identidades culturais profundamente enraizadas. Às contradições e aos obstáculos que o desenvolvimento do processo de integração capitalista gera, os mentores da integração capitalista europeia respondem ocultando e escamoteando a sua origem, apontando falsas soluções e saídas e procurando assegurar uma dinâmica de factos consumados para novas e perigosas fugas em frente. A panóplia de mistificações e sofismas que sustenta a constante investida ideológica dita «europeísta» - como as teses dos «egoísmos nacionais» versus «interesse europeu», da «falta de líderes europeus com a dimensão política dos fundadores», da UE «anã política», do «método comunitário» versus «federalismo», do federalismo como resposta alternativa e diferente ao directório, do federalismo encapotado de «europeísmo de esquerda» ou ainda a alegada «falta» de uma «base constituinte na elaboração de uma Constituição europeia» - procura iludir a questão essencial: a de que a União Europeia é, no actual quadro internacional, um pólo imperialista orientado para o aumento da exploração e do intervencionismo agressivo. O PCP, consequente com as suas posições de combate à integração capitalista europeia, reafirma que recusa e dará firme combate a qualquer dita «solução» que - sustentada, ou não, na criação de um «núcleo duro» -, reforce a natureza federal das instituições da União Europeia e, consequentemente, o domínio do conjunto das grandes potências nos processos de tomada de decisão, nomeadamente através da valorização de critérios demográficos, em detrimento da representação de Estados soberanos e do princípio da igualdade entre estes, da eliminação das presidências semestrais rotativas do Conselho Europeu, do fim do princípio de um comissário permanente por país, da redução do número de deputados no Parlamento Europeu, da ampliação da co-decisão e da adopção de decisões por maioria qualificada no Conselho, em prejuízo de países como Portugal, e do seu poder de veto na salvaguarda de interesses fundamentais. O PCP reafirma que rejeita e dará firme combate a uma qualquer dita «solução» que represente possibilidades acrescidas para a ofensiva neoliberal contra os trabalhadores e os povos, e que se traduza na perda de direitos sociais e civilizacionais, na agudização das desigualdades sociais, na multiplicação de assimetrias entre países e regiões, na multiplicação dos problemas ambientais e no reforço das dependências dos países como Portugal. O PCP reafirma que recusa e dará firme combate a uma qualquer dita «solução» que tenha como objectivo alicerçar um bloco político-militar que visa a disputa concorrencial de mercados, matérias-primas e mão-de-obra, integrando ou não articulações, alianças e acordos de partilha com os outros pólos da Tríade, Japão e EUA. Mais de vinte anos após o Acto Único, quinze após o Tratado de Maastricht e dez após a União Económica e Monetária (com os seus BCE, Pacto de Estabilidade e Euro), os resultados dos referendos realizados em França, na Holanda e na Irlanda colocam em evidência a ampliada rejeição de uma «integração europeia», que desrespeita as soberanias, as economias nacionais e a democracia e agride as conquistas sociais dos trabalhadores, a segurança e a paz. As lutas dos trabalhadores e dos povos em defesa da democracia, da soberania e independência nacionais e de conquistas políticas, económicas, sociais e culturais em cada país, são uma contribuição para o aumento da consciência política quanto ao carácter de classe da União Europeia e para abrir o caminho de uma outra Europa, de cooperação, progresso e paz. A rejeição consequente e determinada desta «integração europeia» exige que, em cada país, se reforcem as forças políticas que, explorando as contradições e obstáculos, e conjugando a luta de massas com a acção institucional, dão frontal e coerente combate à sua dinâmica federalista, neoliberal e militarista. As importantes mobilizações e significativas lutas que ocorreram por toda a Europa revelam e reafirmam a necessidade do reforço da cooperação, designadamente por parte das forças de esquerda vinculadas aos interesses dos trabalhadores - claramente demarcadas da social-democracia rendida ao neoliberalismo -, e da convergência de todos quantos lutam, na base de objectivos de transformação social anticapitalista, por um novo caminho para a Europa. O PCP continuará a assumir como sua prioridade o prosseguimento e reforço da cooperação dos comunistas e de outras forças de esquerda e progressistas na Europa, com respeito pelas diferenças de situação, reflexão e proposta, colocando no primeiro plano a acção comum ou convergente em torno das questões mais sentidas pelos trabalhadores e outros sectores e camadas sociais afectados pela «integração europeia», e afirmando e projectando à escala europeia acções e propostas comuns. Com a convicção de que a necessária expressão europeia e internacional da luta adquirirá uma dimensão e um significado tanto mais representativos quanto mais enraizada e organizada ela for a nível de cada país. O PCP continuará profundamente empenhado no desenvolvimento da cooperação e convergência dos partidos comunistas, forças e partidos progressistas e de esquerda, nomeadamente: na salvaguarda, consolidação, forte intervenção e afirmação do carácter unitário, confederal e progressista do Grupo Confederal da Esquerda Unitária Europeia/Esquerda Verde Nórdica, do Parlamento Europeu; no desenvolvimento de iniciativas comuns de expressão europeia; na dinamização e apoio à luta dos trabalhadores e outros sectores e forças sociais pelas conquistas e direitos sociais, contra as políticas do capitalismo, pela paz, contra o militarismo e a guerra, pela democracia e a soberania nacional, contra o federalismo e o domínio das grandes potências. Ao longo das últimas duas décadas, PS e PSD e CDS-PP, numa elucidativa e constante convergência de posições, foram os responsáveis pela condução, e aprofundamento sucessivo, da integração de Portugal na CEE/UE, participando activamente na definição, defesa e implementação das suas políticas e orientações neoliberais, federalistas e militaristas. Uma convergência responsável pela alienação de componentes essenciais da soberania nacional; pela submissão perante as instituições da União Europeia e as grandes potências; pela aceitação de imposições e medidas gravosas para o país; pela entrega de sectores estratégicos da economia nacional ao capital estrangeiro; pela ideia da fatalidade das políticas da União Europeia; pela apresentação dos problemas e das dificuldades do país como a moeda de troca aos ditos «benefícios» dos fundos comunitários; pela não consulta do povo português sobre questões fundamentais; pela não utilização da margem de manobra de que, apesar de tudo, Portugal ainda dispõe pela aplicação, entre outros, do denominado «princípio da subsidiariedade» e do direito de veto. Também o Bloco de Esquerda, com o seu denominado «europeísmo de esquerda», atrás do qual esconde o seu federalismo, se confirma como uma das forças políticas favoráveis ao avanço do carácter supranacional da União Europeia, desvalorizando e menosprezando a importância central da preservação da soberania nacional como alicerce incontornável do desenvolvimento do país e instrumento indispensável para a luta por uma outra Europa. A União Europeia surge como um dos principais alicerces da política de classe realizada em Portugal e como um dos principais esteios e pretextos da ofensiva contra os direitos e conquistas sócio-económicas dos trabalhadores que coloca em causa o interesse nacional e o projecto de desenvolvimento patriótico e internacionalista consagrado na Constituição da República Portuguesa. Uma política externa de diversificação das relações internacionais e de cooperação, paz e amizade com todos os povos, a salvaguarda da soberania nacional e a promoção dos interesses de Portugal e dos portugueses constituem orientações fundamentais para a intervenção do país num projecto de cooperação na Europa. Perante o processo de integração da União Europeia, a soberania nacional constitui ponto de partida inegociável e uma questão central e decisiva para a afirmação dos interesses de Portugal e dos portugueses. A defesa e afirmação da soberania nacional exigem a consagração institucional da possibilidade da reversibilidade e da alteração de acordos e tratados que regem a integração europeia, ajustando o estatuto de cada país à vontade do seu povo e à sua real situação, incluindo o direito à decisão soberana sobre a desvinculação da UE. Não há arquitectura institucional no quadro do figurino federal (uma ou duas Câmaras, mais ou menos comissários, mais ou menos poder do Parlamento Europeu, este ou aquele sistema de votação) que resolva a desigualdade de poder resultante das significativas diferenças entre os Estados-membros. E as suas dimensões neoliberal e militarista são intrínsecas à sua natureza de integração capitalista, indissociável no plano institucional de soluções federalistas. Cada nova etapa e avanço deste processo consolidam um poder político e económico favorável ao grande capital e às grandes potências e fortalece o seu «super-Estado», para melhor explorar os trabalhadores e os povos, nas suas relações de concorrência e convergência, económicas e políticas, com os outros dois pólos da «Tríade» da globalização capitalista, Japão e EUA. Estes factos consolidam a ideia de que a União Europeia, na sua essência, não é reformável. O PCP, pese a análise e avaliação que faz do processo da integração capitalista europeia, continuará, nas instituições nacionais e comunitárias, nomeadamente no Parlamento Europeu, um intransigente combate pelos interesses nacionais, pelos direitos dos trabalhadores e outras camadas não monopolistas, pela cooperação entre todos povos europeus e por uma relação de paz e cooperação da União Europeia com todos os outros povos do mundo, na perspectiva de outra Europa. Outra Europa não só é possível como necessária. O caminho para outra Europa faz-se e afirma-se no combate intransigente à integração capitalista configurada pela União Europeia. Combatendo cada novo passo no seu aprofundamento federalista, neoliberal e militarista. Apresentando alternativas concretas de ruptura. Trabalhando pela convergência das forças de esquerda e progressistas, pelo esclarecimento e mobilização dos trabalhadores e dos povos, por transformações progressistas e na perspectiva de um futuro socialista para a Europa. A uma União Europeia federal, onde se consolida a assimetria de poder a favor das grandes potências, contrapomos uma Europa de cooperação de Estados e povos, soberanos e iguais em direitos, que respeite a identidade cultural e a independência de Portugal e de todos os países. A uma União Europeia onde prevalecem os interesses do capital e se acentuam as diferenças entre países e as assimetrias regionais e sociais, contrapomos uma Europa dos trabalhadores e de outras camadas laboriosas, que favoreça o desenvolvimento assente na relação sustentável entre natureza e a sociedade e na convergência económica e no progresso social, com o objectivo de coesão de cada país e entre todos os países. A uma União Europeia militarista, bloco político-militar com pretensões imperiais, convergindo estrategicamente com o imperialismo norte-americano, promovendo e alargando a intervenção da aliança agressiva NATO, contrapomos uma Europa empenhada na promoção da paz e desanuviamento no continente europeu e no Mundo e na cooperação para o desenvolvimento com todos os povos do planeta. 2. Situação económica e social O enquadramento da situação económica nacional é inseparável da fase actual do desenvolvimento do capitalismo, com os seus principais traços, tendências e contradições. As relações económicas externas do país - fluxos de capitais, mercadorias, bens e serviços, e posições nas estruturas de regulação económica mundial - são crescentemente condicionadas pela integração comunitária e também por outros centros de articulação supranacional do imperialismo. Condicionamento reforçado pela colaboração activa de sucessivos governos do PSD e PS, com uma evolução da União Europeia que conflitua com o necessário desenvolvimento do país, na completa submissão às orientações económicas comunitárias e na total abdicação e ausência de afirmação de uma estratégia de defesa dos interesses e soberania nacionais. Três vectores no actual quadro comunitário conflituam de forma cada vez mais determinante com a economia nacional e o próprio futuro do país, a sua independência e soberania nacionais: o acentuar da configuração federal sob o comando político e económico das grandes potências; a consolidação da zona euro e da sua gestão pelo BCE; e o domínio das políticas e orientações neoliberais estruturantes da Estratégia de Lisboa. A acentuada e crescente dependência estrutural externa, bem patente no elevado endividamento líquido externo (90% do PIB em 2007) e na importância do capital transnacional no tecido económico português, nomeadamente através da subcontratação e do peso na estrutura accionista de empresas e sectores estratégicos (EDP, 48%, PT, 64%, GALP, 50%, CIMPOR, 30%, BCP, 36% e outras, como a BRISA, SEMAPA, BES, BPI, SOMAGUE), é outro factor que conflitua com a independência e soberania nacionais, agravando a vulnerabilidade face a centros de decisão estrangeiros/capital transnacional. O crescente federalismo das instituições comunitárias reduz, ou mesmo anula, a capacidade para influenciar a condução das políticas económicas por parte dos países como Portugal, como sucede no comércio externo da União Europeia, nomeadamente na OMC em torno da agricultura e do sector têxtil. A União Económica e Monetária (UEM), com a perda das políticas monetária e cambial, com as limitações impostas à política orçamental, pela sua submissão aos critérios de convergência nominal no Pacto de Estabilidade, a estrita política monetarista levada a cabo pelo Banco Central Europeu (BCE) por um euro fortemente valorizado e a gestão da taxa de juro nessa óptica, e com o objectivo máximo da estabilidade dos preços/moderação salarial, constituiu um fortíssimo constrangimento para uma economia com as debilidades da portuguesa. A última versão da «Estratégia de Lisboa», reforçando os seus fundamentos neoliberais de privatização e liberalização de serviços públicos, sectores estratégicos e do mercado de trabalho, a negociação da agenda neoliberal da OMC e de vários tratados comerciais bilaterais pela União Europeia e, em geral, as orientações respeitantes à Política Agrícola Comum (PAC) e Política Comum das Pescas (PCP), amplia os problemas e fragilidades da economia nacional e acentuam a sua dependência e défices estruturais. O processo de alargamento da União Europeia, já realizado ou em curso, a países com uma mão-de-obra mais barata e mais qualificada, veio reforçar a falência da estratégia de sucessivos governos de fazer de Portugal localização privilegiada de unidades produtivas de trabalho intensivo, assentes em baixos salários e de baixo valor acrescentado. Um processo que se adiciona e converge com outras políticas comunitárias para uma divisão do trabalho no espaço europeu altamente desvantajosa para o país, com crescente e negativo impacto na economia nacional, cada vez mais periférica e «iberizada». A deslocalização de empresas do sector produtivo, acompanhada crescentemente pela deslocalização de serviços, causam não só graves problemas sociais (desemprego, encargos para a segurança social), como tem contribuído para a perda de importantes unidades produtivas. Esta situação, para além de criar sérios constrangimentos ao desenvolvimento económico do país - em particular pela extrema dependência externa da economia nacional e pela condução, através de órgãos comunitários ou entidades ditas independentes, como o BCE, de determinantes políticas (agrícola, pescas e outras) que defendem interesses e objectivos das grandes potências europeias e do grande capital europeu -, estabelece a perda ou limitações drásticas, no âmbito do uso de importantes instrumentos económicos como a moeda, a taxa de câmbio, as taxas de juro, a gestão orçamental e o comércio externo. Estes condicionamentos e limitações exigem a afirmação clara e inequívoca da soberania nacional como princípio inalienável da inserção e relacionamento de Portugal na Europa e no Mundo, nomeadamente na reconsideração do enquadramento e integração da economia portuguesa no âmbito da UE e suas determinações. A sociedade portuguesa tem hoje uma estrutura económico-social determinada pela ditadura dos grupos económicos monopolistas associados ao capital transnacional. Uma poderosa oligarquia financeira (associada a outros sectores da grande burguesia portuguesa e estrangeira) assegura, através da titularidade desses grupos a continuidade, reprodução e expansão do seu poder político, económico, social e ideológico, exercendo o que configura um autêntico poder absoluto sobre a generalidade das outras camadas sociais e sob diversos ângulos. Estruturados e representados por grupos familiares velhos conhecidos (que suportaram e apoiaram a ditadura fascista) ou que despontaram com a contra-revolução, tecem entre si, e com o capital estrangeiro, uma densa rede de ligações económicas e financeiras, sociais e políticas. Trinta e quatro anos depois das transformações revolucionárias de Abril, esse conjunto de grupos económicos, resultante da política de recuperação capitalista e monopolista, tem um papel dominante e determinante no quadro das relações de produção capitalista da sociedade portuguesa. Existem em Portugal 139 grandes grupos económicos, 78% dos quais criados nos últimos 18 anos, em resultado directo do processo de privatização e consequente restauração dos grandes grupos monopolistas. As operações de privatização efectuadas nas duas últimas décadas pelos vários governos fizeram regressar às mãos do sector privado, em condições altamente vantajosas, sectores estratégicos como a banca, seguros, energia, telecomunicações, transportes colectivos rodoviários, cimentos, pasta de papel e sector químico. Sucessivos aumentos de capital reforçaram a presença do grande capital nacional e abriram portas a capital estrangeiro. A análise dos maiores grupos económicos nacionais no final de 2005, mostra-nos que dos doze grupos com lucros mais elevados, com um valor superior a 250 milhões de euros, apenas dois se encontram ligados predominantemente à actividade produtiva de bens transaccionáveis (cimentos - Cimpor e papel - Semapa). Este conjunto de grupos económicos, ao mesmo tempo que o PIB crescia a um ritmo médio de apenas 1,3% entre 2004 e 2007, viu os seus lucros aumentarem de 75%, atingindo os 6,8 mil milhões de euros - 4,2% do PIB. A evolução tão díspar entre os grandes grupos económicos e o restante tecido produtivo nacional, espelha uma das características mais marcantes da evolução desigual da nossa economia nos últimos anos - enquanto o sector produtivo fornecedor dos chamados bens transaccionáveis vem evoluindo a ritmos de crescimento muito baixos, quase nulos, o sector dos bens não transaccionáveis - financeiro, energia, imobiliário, telecomunicações, serviços - cresce a ritmos elevados, reproduzindo lucros sobre lucros. Esta terciarização da economia nacional tem também profundos impactos ao nível do emprego com a destruição continuada de postos de trabalho no sector dos bens transaccionáveis. Com um poder fortemente monopolista sobre um conjunto de sectores e áreas estratégicas para o país e para o restante tecido económico, e particularmente activos nas operações de privatização do que resta do Sector Empresarial do Estado, estes grupos vêem reforçada esta natureza monopolista, quer pela destruição e absorção de concorrentes nacionais, quer por associações em que cruzam participações e/ou repartição de mercados e concertação de preços, quer pela aliança privilegiada com poderosas transnacionais. É também significativo a sua profunda articulação com o capital transnacional, através da posse de grande parte dos activos - em muitos casos superior a 50% da estrutura accionista - dos grandes grupos económicos nacionais por parte de capitais estrangeiros. Uma situação que é insustentável, já que coloca a economia portuguesa nas mãos dos capitais externos e, no limite, põe em causa a soberania nacional. Os acordos de exclusividade promovidos pelo Governo com algumas multinacionais, como sucedeu com a Microsoft, com a compra de software para os sectores públicos, reforçam essa dependência. A extraordinária dimensão e poder económico actual destes grupos capitalistas e monopolistas consolida-se e desenvolve-se em permanente articulação, cumplicidade e promiscuidade com o poder político e os partidos que o exercem desde 1976 - PS, PSD e CDS-PP. O poder económico remunera-se através dos dividendos, lucros e vencimentos fabulosos dos seus representantes, o poder político através dos vencimentos e privilégios da sua clientela e dos negócios lícitos ou até ilícitos) que a sua presença na administração desses grupos, conjugada com o poder político que detêm, lhes vão proporcionando. A utilização do Estado, nomeadamente da sua componente legislativa, como instrumento de reforço do domínio dos grupos monopolistas e do capital transnacional, explica a ampla produção legislativa da Assembleia da República e dos governos, destinada a consagrar os seus interesses de classe, designadamente através do desequilíbrio, a favor do grande patronato, das relações laborais e níveis salariais, da condução das políticas orçamental e fiscal, do favorecimento dos mecanismos de transferência de rendimento e mercados dos micro, pequenos e médios empresários para esses grupos, e da apropriação de património e mercados públicos, com as privatizações e liberalizações feitas à medida das capacidades de encaixe desses grupos. A generalidade dos grandes grupos económicos possui hoje imensas capacidades e instrumentos para o exercício de um efectivo poder ideológico, através de meios para a produção e transmissão, directa e indir

XVIII Congresso do PCP Início Intervenções/Moções Secretário-geral do PCP Secretariado do CC do PCP Comissão Política do CC do PCP Comissão Central de Controlo Comité Central do PCP Intervenção de Abertura Moção sobre Leis dos Partidos Funcionamento do Congresso Órgãos do Congresso Informações Úteis Resolução Política do XVIII Congresso do PCP Resolução do CC do PCP Regulamento para debate e eleição de delegados Grafismos PCP no Campo Pequeno Resolução Política do XVIII Congresso do PCP Aprovada com uma abstenção 1.Internacional I - Situação Internacional I - Situação Internacional 0. Introdução

1. A economia mundial e a crise do capitalismo

2. A ofensiva do imperialismo

3. «Resistir é já vencer!» A luta dos comunistas, dos trabalhadores e dos povos

4. O socialismo, alternativa necessária e possível 0. Introdução O XVIII Congresso realiza-se numa situação internacional de grande instabilidade e incerteza em que avulta, como traço particularmente marcante, o desenvolvimento de uma crise económica e financeira do sistema capitalista de grandes proporções que está a assolar o mundo. Apesar dos reveses sofridos, a violenta ofensiva do imperialismo não dá sinais de recuo, antes se acentuam os seus traços fundamentais - exploração, opressão, agressão, militarismo e guerra. O perigo de respostas violentas do capitalismo à sua profunda crise estrutural e a pretensão do imperialismo de impor ao mundo a sua hegemonia, fazem crescer perigos de dramáticas consequências para o futuro dos povos. Mas o imperialismo não tem as mãos totalmente livres, está condicionado pelas suas próprias dificuldades e contradições, e por toda a parte prossegue a resistência e a luta, que se diversifica nas suas formas e conteúdos, e se traduz mesmo em situações de avanço progressista. Está em curso um processo de rearrumação de forças a nível de Estados e estruturas de cooperação internacionais. O quadro é de uma multifacetada agudização da luta de classes, com a possibilidade de rápidos e imprevistos desenvolvimentos, em que grandes perigos para a paz, a liberdade e a soberania dos povos coexistem com reais potencialidades de desenvolvimento progressista e mesmo revolucionário. Perante a tragédia que o processo de reprodução do capital significa para o mundo, perante a evidência da crise com que o sistema capitalista se debate, reforça-se a necessidade dos Partidos Comunistas e da sua cooperação internacionalista, e a actualidade do seu projecto de uma nova sociedade livre da exploração do homem pelo homem, o socialismo, como a única e real alternativa ao capitalismo e resposta aos problemas da Humanidade. A tenacidade na construção de partidos revolucionários de vanguarda e a firmeza na luta ideológica adquirem, nas actuais circunstâncias, uma acrescida e decisiva importância. 1. A economia mundial e a crise do capitalismo O XVIII Congresso do PCP realiza-se no contexto de uma das mais graves crises do capitalismo, a maior desde a «grande depressão» desencadeada pelo crash bolsista de 1929, e cujo impacto mundial não se relevou ainda em toda a sua extensão. Esta crise resulta da contradição entre a sobreprodução e sobre-acumulação de meios de produção, por um lado, e a contracção de mercados e níveis de consumo decorrentes das desvalorizações salariais e abismais assimetrias de rendimentos, por outro. Esta crise, ao mesmo tempo que confirma a incapacidade do capitalismo para se libertar das crises que periodicamente o abalam, é reveladora de uma crise bem mais profunda, de natureza estrutural e sistémica que, como o PCP tem assinalado, evidencia os limites históricos do sistema capitalista e coloca a sua superação revolucionária como uma exigência do nosso tempo. No final de 2008 o sistema financeiro dos EUA abriu brechas profundas com a falência ou colapso de algumas das maiores instituições de Wall Street. Os efeitos da derrocada financeira propagaram-se rapidamente aos mercados bolsistas e à esfera produtiva. Países apregoados como exemplos positivos da globalização capitalista (como a Islândia) estão hoje em bancarrota. A economia capitalista mundial entrou num grave período recessivo, cujas consequências dolorosas para os trabalhadores e os povos do mundo irão marcar os próximos anos. A classe dominante e os governos ao seu serviço procuram responder à crise com gigantescas operações de transferência das dívidas para o erário público e com a nacionalização (mais ou menos explícita) dos prejuízos das instituições falidas, mas sem porem em causa os lucros passados e presentes do grande capital. Sendo ainda incerta a eficácia destas medidas para evitar o colapso do sistema financeiro e uma recessão de enormes proporções, certo é que elas representam uma tentativa de fazer pagar aos trabalhadores e aos povos os custos da crise gerada pelo grande capital, mantendo inalterado o poder e domínio daqueles que são responsáveis pela crise. O aumento espectacular na dívida pública dos principais Estados capitalistas, resultante dos multimilionários subsídios e «planos de salvação» do sistema financeiro e dos interesses do grande capital, representam um gigantesco fardo para os povos e, em alguns casos, colocam em dúvida a própria solvência dos Estados. No caso dos EUA representam um agravamento qualitativo de algumas das causas que geraram esta explosão de crise. As análises à economia mundial e aos traços fundamentais e tendências de evolução do sistema capitalista feitas nos XV, XVI e XVII Congressos, foram confirmadas pela vida e mantêm uma flagrante actualidade. A actual crise, de dimensão internacional, tem como epicentro os EUA. É uma crise profunda, que se inscreve num processo que tem como momentos mais próximos a crise do peso mexicano de 1994/95, a crise «asiática» de 1996/97, a crise na Rússia e nos países do Leste europeu de 1998, a crise no Brasil e Argentina em 1999 e 2001, a crise da «nova economia» de 2001/2003, e a crise do sector imobiliário norte-americano desencadeada em Agosto de 2007. A sua expressão financeira e rápida expansão resultam do grau de financeirização atingido pelo sistema em resposta ao longo ciclo de estagnação económica iniciado nos anos 70, e que tem vindo a manifestar-se por uma desaceleração das taxas de crescimento do produto, de década para década, no centro capitalista desenvolvido. A centralização e concentração do capital e da riqueza realizam-se a um ritmo sem precedentes, impulsionadas pelos Estados ao seu serviço, pela guerra, pelas instâncias formais e informais de articulação internacional do capitalismo, pelas políticas de «competitividade» e «livre mercado» que aceleram a ruína das empresas não monopolistas e a destruição das economias menos desenvolvidas e dependentes, pelo acelerado processo de fusões e aquisições, que quintuplicaram desde final da década de 80, e também como resultado da nova fase da crise que se abriu em Setembro de 2008. Reforça-se o peso das grandes empresas multinacionais que controlam 2/3 do comércio mundial, algumas das quais com um peso económico superior ao de alguns Estados. A financeirização da economia continua a acentuar-se com a explosão do crédito e do capital fictício. A própria dinâmica da exploração gera uma massa de capitais sob a forma de dinheiro, excedentária e em crescimento que, face às dificuldades de obtenção das taxas de lucro esperadas na esfera produtiva, se desloca para a esfera financeira e especulativa em detrimento do investimento produtivo, contribuindo para a transferência e concentração das mais-valias geradas. Uma tal situação é acompanhada da criação e crescimento de mercados cada vez mais distantes da economia produtiva (como os de «futuros» e outros instrumentos financeiros) que, no quadro da livre circulação de capitais, da desregulamentação e integração dos mercados financeiros, das deslocalizações e criação artificial da procura pelo crédito fácil, acentuam a irracionalidade e a anarquia do sistema capitalista, tornando-se factor maior da instabilidade monetária, bolhas especulativas e colapsos bolsistas, e tendem a tornar as crises cíclicas, inerentes ao sistema capitalista, mais globais e mais destruidoras. A presente crise é uma concludente expressão desta realidade. Intensifica-se a exploração dos trabalhadores com a extensão do uso da força de trabalho e a redução, por todos os meios possíveis, da sua remuneração, visando arrecadar a maior fatia possível de mais-valia, tirando partido do enfraquecimento temporário do movimento comunista e operário. São eixos centrais desta ofensiva a redução dos salários reais, a intensificação dos ritmos de trabalho, a apropriação dos ganhos de produtividade do trabalho pelo capital, a desregulamentação e o aumento do horário de trabalho, o aumento da idade de reforma e diminuição dos valores de reformas e pensões, a desregulamentação das relações laborais. A linha de ataque ao sindicalismo de classe e à contratação colectiva constitui uma das mais graves expressões da política exploradora e reaccionária do grande capital e da ofensiva imperialista. Altíssimas taxas de desemprego, generalização do trabalho precário, particularmente entre as novas gerações de trabalhadores, regressão de direitos sociais e laborais, sobre-exploração dos trabalhadores migrantes, são realidades que estão a ser falsamente apresentadas como inelutáveis, realidades que contribuem, nomeadamente, para o aumento do exército de reserva e para a redução do peso dos salários no rendimento criado. Aprofunda-se a polarização social, tanto dentro de cada país, a começar pelos EUA e outras grandes potências capitalistas, como, à escala mundial, ainda que com contradições, entre o centro capitalista desenvolvido e a periferia subdesenvolvida. A flagrante contradição entre os gigantescos avanços da ciência e da técnica e as terríveis regressões sociais que percorrem o mundo contemporâneo constitui uma condenação política e moral do sistema capitalista. Segundo as próprias estatísticas da ONU, cerca de mil milhões de pessoas sofrem de fome crónica e cem mil morrem todos os dias em consequência directa ou indirecta de subnutrição. Intensifica-se o ataque sistemático a funções sociais do Estado conquistadas pela luta, ao mesmo tempo que se reforça a sua componente coerciva (forças armadas, polícias, serviços de informação, tribunais) e os mecanismos de domínio do capital e de sujeição aos centros do imperialismo. Mercantilizam-se todas as esferas da vida social, numa lógica de privatizar tudo quanto possa gerar maiores remunerações ao capital (saúde, educação, segurança social, cultura, tempos livres) e de transformar em negócio a própria satisfação das necessidades mais elementares da existência humana (alimentação, água, natureza). Face à deterioração das condições ambientais resultante do modo de produção capitalista, desenvolve-se uma sofisticada ofensiva ideológica de cobertura à pilhagem de recursos naturais, e de criação de novos mercados, como o da reconversão ambiental e das energias alternativas. A evolução do capitalismo suporta-se na exploração do trabalho humano e, paralelamente, na exploração irrestrita de recursos naturais à escala planetária para além do seu ritmo de renovação e da possibilidade da sua disponibilidade futura, gerando fluxos de resíduos e impactos ambientais que são ameaças destrutivas para a biosfera e a sobrevivência da sociedade humana. Acentua-se o carácter parasitário e decadente do capitalismo, com a instalação no poder do crime organizado e o florescimento de todo o género de tráficos criminosos (armas, droga, prostituição, trabalho escravo, órgãos humanos, mulheres e crianças) com a cobertura e cumplicidade da banca internacional e seus sofisticados instrumentos de circulação e branqueamento de capitais, em que avultam os offshores. A expansão lucrativa assenta na multiplicação de situações de miséria e brutal destruição de relações sociais estáveis, provocadas pelas políticas de saque associadas à globalização imperialista e às ingerências e agressões militares do imperialismo. A evolução do capitalismo no terreno económico e social é acompanhada de desenvolvimentos no plano político, cultural, ideológico e militar, de sentido profundamente reaccionário, e mesmo fascizante, envolvendo o ataque às liberdades e direitos democráticos; o reforço do controlo dos aparelhos ideológicos; a subordinação dos aparelhos legais e judiciários aos interesses do capital; a ofensiva contra a soberania dos Estados e de recolonização do planeta; o desenvolvimento do militarismo e uma nova corrida aos armamentos. Neste pano de fundo, que caracteriza a evolução do sistema capitalista, verificaram-se, após o XVII Congresso, alguns desenvolvimentos que, para além da sua importância conjuntural, expressam novas arrumações de forças e tendências que importa sublinhar: - A crise desencadeada nos EUA pôs em evidência os gravíssimos problemas de uma economia altamente deficitária, endividada e crescentemente dominada pelo complexo militar-industrial, com disparidades e problemas sociais gravíssimos, em que cerca de 35 milhões de pessoas vivem em situação de pobreza. A dívida externa atinge quase 90% do PIB. Mais do que «locomotiva» da economia mundial, os EUA têm sido um ilimitado sorvedouro da mais-valia criada pelos trabalhadores de todo o mundo, assim como dos recursos naturais. Representando somente 4,6% da população mundial, consomem mais de 20% dos recursos energéticos, sendo responsáveis por cerca de 21% das emissões de CO 2. . A superioridade militar, o potencial científico e tecnológico e a hegemonia dos EUA nos mecanismos de criação e difusão da ideologia dominante, são inegáveis. Mas o seu poderio económico e a sua posição privilegiada como principal centro financeiro mundial estão enfraquecidos, com expressão na desvalorização e descredibilização do dólar e do seu papel de moeda de reserva internacional, papel este que já está a ser abertamente contestado. A economia norte-americana confirmou-se como o principal factor de instabilidade e crise da economia mundial. - O reforço da União Europeia como bloco imperialista, sem subestimar as fragilidades e contradições que o processo de integração capitalista na Europa envolve, torna ainda mais clara a natureza de classe da UE como instrumento do grande capital e das grandes potências capitalistas da Europa Ocidental, caindo por terra duas teses centrais com que se pretende enganar as massas: a de que a integração capitalista europeia visaria contrariar os «excessos da globalização», e a que pretende que uma «Política Externa e de Segurança Comum» e respectivos instrumentos militares, tornaria a UE mais segura e um obstáculo ao «unilateralismo» dos EUA. De facto, o que está a verificar-se, e com uma inquietante rapidez, é a intensificação e refinamento das políticas neoliberais orientadas para o aumento da exploração e do poder do grande capital e, no imediato, quer directamente quer via NATO, o reforço da aliança estratégica com os EUA e um intervencionismo cada vez mais agressivo e ambicioso. - O desenvolvimento económico da China e o seu crescente peso internacional (com a perspectiva de se tornar nas próximas décadas a primeira potência económica mundial), a par da emergência de outros grandes países com altas taxas de crescimento como a Índia, o Brasil, a Rússia e outros. Ao mesmo tempo, desenvolvem-se alianças e processos de cooperação e integração regional que, situando-se em geral numa lógica de expansão das relações capitalistas de produção, tendem ainda assim (como nos casos do MERCOSUL, da UNASUR - a União das Nações Sul Americanas, ou da Organização da Alternativa Bolivariana para as Américas - ALBA, impulsionado pela Venezuela, ou da Organização de Cooperação de Xangai) a contrariar as pretensões hegemónicas dos EUA e das duas outras grandes potências da «Tríade», a UE e o Japão. Estes processos, que expressam o desenvolvimento desigual do capitalismo e geram contradições inter-imperialistas, têm pesado positivamente na arrumação de forças no plano internacional e na resistência dos povos ao imperialismo. - A acentuação do carácter predador do capitalismo e as consequências da recolonização planetária em curso revelam-se particularmente no agravamento dos problemas agro-alimentar, energético e ambiental. A rapina das multinacionais, assente nas políticas de ajustamento estrutural do Fundo Monetário Internacional (FMI) e do Banco Mundial (BM), na liberalização do comércio mundial impulsionada pela Organização Mundial do Comércio (OMC), numa desenfreada especulação bolsista, está a provocar insuportáveis aumentos de preços e a empurrar o mundo para situações de grave crise sem solução no quadro do capitalismo. Os «motins da fome», que têm tido lugar em numerosos países, contra os aumentos dos preços dos bens alimentares (mais de 37% em 2007 e 14% em 2006), constituem uma inequívoca condenação das imposições neocoloniais e da política das multinacionais do sector agro-alimentar (incluindo a afectação de vastas áreas parar a produção de biocombustíveis), que assentam os seus fabulosos lucros nos mais cínicos mecanismos de reprodução capitalista da fome e da miséria. O capitalismo é o modo de produção e a formação socioeconómica dominante e a dinâmica das suas contradições marca decisivamente toda a evolução mundial. Mas esta influência não é absoluta. Há forças sociais e políticas, incluindo Estados, que intervêm na configuração do mundo em que vivemos e na correlação de forças de classe em que lutamos, que pesarão tanto mais quanto maior partido tirarem das dificuldades e contradições do capitalismo. No momento actual impõe-se passar à ofensiva no plano da luta das ideias, tirando as necessárias ilações políticas e ideológicas da crise económica e financeira do capitalismo: ela está a abrir uma brecha profunda no fundamentalismo e na tecnocracia neoliberal; representa um rude golpe no triunfalismo capitalista dos anos 90, resultante das derrotas do socialismo; deita por terra toda uma propaganda visando fazer crer que o capitalismo se tornou capaz de dominar as suas contradições e furtar-se às sempre destruidoras crises cíclicas inerentes ao próprio modo de produção capitalista e ao sentido destrutivo da sua evolução. No ano em que se assinalam os 160 anos do Manifesto do Partido Comunista e o 190º aniversário do nascimento de Marx uma conclusão se impõe da observação do mundo actual: não obstante as grandes transformações por que passou o sistema capitalista, a análise marxista do capitalismo mantém uma extraordinária vitalidade e as leis fundamentais da reprodução do capital formuladas por Marx e Engels revelam-se de uma flagrante actualidade. Tal é o caso da lei do valor e da teoria da mais-valia que desvenda os mecanismos da exploração capitalista e da lei da baixa tendencial da taxa de lucro, que o capital tudo faz para contrariar, intensificando quanto possa e a correlação de forças lho permita, a exploração do proletariado, e que determina a financeirização crescente da economia. Tal é também o caso da lei da pauperização relativa, que ilumina as causas de fundo inultrapassáveis pelo capitalismo das crises de sobreprodução. E tal é o caso da validade das teses de Lenine sobre o imperialismo, nomeadamente da lei do desenvolvimento desigual do capitalismo, que mostra a impossibilidade de constituição de um mecanismo único capitalista (um «super-imperialismo») que anule a concorrência dos monopólios e as contradições inter-imperialistas, causa primeira do militarismo, da agressão e da guerra. A resposta do capitalismo à crise em que se debate tende para expressões de força cada vez mais violentas. O que não significa que, quando necessário, como na presente crise, o Estado capitalista não procure recorrer a medidas de tipo keynesiano, visando a salvaguarda dos interesses do grande capital, com os quais a social-democracia se encontra estruturalmente comprometida. É uma perigosa ilusão pensar que, mantendo intocável o poder económico e político do grande capital e a hegemonia do capital financeiro, é possível dar resposta aos anseios dos trabalhadores e dos povos e preservar a Humanidade de terríveis convulsões e regressões de civilização. Só profundas transformações de carácter antimonopolista e anticapitalista impostas e defendidas pelas massas o podem conseguir. 2. A ofensiva do imperialismo Os últimos quatro anos foram marcados pela intensificação da ofensiva imperialista, com o avanço do militarismo e multiplicação das guerras imperialistas; o crescente e articulado ataque à soberania dos Estados, ao direito internacional e ao exercício pelos povos do direito à sua autodeterminação, e a abertura de frentes simultâneas de conflito diversificadas quanto aos seus objectivos, métodos utilizados e países e povos visados. Dando corpo a um revanchista e violento processo de ajuste de contas com a luta dos trabalhadores e dos povos, e com a História do século XX, o imperialismo procura por todos os meios perverter o edifício legal saído da II Guerra Mundial, de natureza fundamentalmente pacífica e antifascista, que, apesar dos retrocessos e alterações verificadas, nomeadamente no mapa político da Europa, continua a ser um obstáculo às pretensões hegemónicas do imperialismo dos EUA e seus aliados. Sendo certo que o aprofundamento da ofensiva revela uma correlação de forças ainda muito desfavorável, não é menos certo que a incapacidade do imperialismo em derrotar resistências e mistificar ou esconder os aspectos mais violentos da sua ofensiva, revela dificuldades e perda de margem de manobra no plano político e ideológico, favoráveis à luta anti-imperialista. Dando expressão aos objectivos económicos centrais da ofensiva imperialista de alimentar os lucros das grandes multinacionais e de globalizar a exploração capitalista, são hoje particularmente nítidos os grandes objectivos geo-estratégicos que visam expandir o domínio das principais potências imperialistas a todo o globo: dar cobertura política e militar à expansão e instalação das multinacionais; assegurar o controlo directo das fontes e dos fluxos energéticos, das reservas de minérios, água e terras aráveis, das comunicações e principais vias de transporte de mercadorias a nível mundial; aprofundar o cerco geo-estratégico e militar às «potências emergentes» com especial destaque para a Rússia e a China, e conter processos de afirmação de relações económicas, políticas e estratégicas que fujam ao férreo controlo do imperialismo. Esta é uma ofensiva que visa conter ou «domesticar» expressões autónomas de afirmação de soberania, como as que se verificam na América Latina mas também em África, no Médio Oriente e no continente asiático; prevenir revoltas sociais e sobretudo a sua transformação em movimentos de luta política que ponham em causa os interesses da classe dominante; criminalizar forças revolucionárias e focos de resistência anti-imperialista. Multiplicam-se os ataques ao direito internacional e à soberania dos Estados numa estratégia global que, por via do reforço de relações de natureza colonial, do desmembramento de países e da criação de protectorados, como é exemplo o caso do Kosovo, visam a recolonização do planeta e redesenhar o mapa político mundial em favor dos interesses hegemónicos do imperialismo. Com ou sem cobertura da ONU, o objectivo é assegurar às multinacionais fontes de matérias-primas, mão-de-obra barata e mercados e impedir, com a corrupção e a ajuda das classes dominantes dos respectivos países, uma segunda vaga do movimento de libertação nacional e social. O fortalecimento de directórios de potências; a promoção e «institucionalização» de centros de concertação e decisão do grande capital (como o G7 ou o Fórum de Davos); o papel das instituições económicas internacionais do imperialismo (OCDE, FMI, BM, OMC) como rolos compressores das economias nacionais e carrascos dos direitos sociais e laborais dos trabalhadores e povos; a afirmação de instituições internacionais - como o Conselho da Europa - como centros de diversão ideológica profundamente anticomunistas; o processo de transformação da Organização de Segurança e Cooperação na Europa (OSCE) num instrumento da cavalgada do imperialismo para Leste desencadeada após a desagregação da URSS; a instrumentalização da ONU pelas grandes potências da NATO, subvertendo o seu papel de garante do cumprimento do direito internacional e de defesa da paz, são preocupantes expressões de uma política de crescente centralização do poder político e da sua submissão ao poder económico e às estratégias de militarização das relações internacionais. Insere-se nesta linha a evolução na União Europeia que corresponde a uma nova fase da intervenção imperialista da Alemanha e de outras grandes potências europeias que se constituem como um bloco político, económico e militar, intimamente coordenado com a NATO, um pólo imperialista que, não obstante reais rivalidades e contradições inter-imperialistas, concerta e partilha com os EUA zonas de influência e intervenção. Apresentado como um «espaço de democracia» e de «defesa dos direitos humanos», trata-se na realidade de um centro político-ideológico do imperialismo, profundamente antidemocrático na sua essência e desrespeitador dos direitos dos trabalhadores e dos povos de todo o mundo. Tentando ocultar a sua natureza exploradora, o imperialismo aprofunda e diversifica a ofensiva ideológica. Intensificam-se os processos de concentração dos meios de comunicação social e de instrumentalização das novas tecnologias da informação para impor aos povos um pensamento e um padrão cultural e comportamental únicos. Promove-se o consumismo, o individualismo e a apatia e estimulam-se comportamentos anti-sociais. Projecta-se o conformismo e animam-se factores de divisão de classe como o racismo e a xenofobia. Instrumentalizando o conceito de solidariedade, impulsionam-se organizações e eventos altamente mediatizados que, visando substituir o respeito de direitos por práticas caritativas, desencorajam a luta e favorecem os mecanismos de exploração. Conceitos como «guerra de civilizações» ou «valores ocidentais» e a instrumentalização das questões étnicas, religiosas, ambientais e de direitos humanos, convergem numa estratégia para submeter países e povos. O carácter profundamente reaccionário das políticas económicas, sociais e de relações internacionais, e a conversão da social-democracia ao neoliberalismo, afirmando-se como um pilar fundamental da ofensiva imperialista, são factores que, cruzados com as consequências sociais, económicas e demográficas da exploração capitalista, estão intimamente ligados a expressões de ressurgimento do fascismo e ao acesso de forças neofascistas ao poder em vários países, nomeadamente na Europa. Paralelamente, prossegue a reescrita da História, com o branqueamento das ditaduras fascistas e a obscena equiparação entre fascismo e comunismo, e aposta-se no anticomunismo, na criminalização dos que resistem ao imperialismo e na perseguição às forças que, das mais variadas formas, resistem à exploração, à opressão e à guerra, ou lutam pela transformação revolucionária da sociedade. A militarização das relações internacionais foi a vertente da ofensiva imperialista que mais se desenvolveu nos últimos anos. O mundo está hoje profundamente instável e inseguro. A retórica capitalista sobre a paz, que se sucedeu ao desaparecimento da URSS e do socialismo como sistema mundial, é desmentida por uma realidade assente na multiplicação de guerras imperialistas de ocupação e na afirmação do militarismo como arma política e económica das maiores potências capitalistas. Os conceitos fascizantes contidos na «Estratégia de Segurança Nacional dos Estados Unidos da América», adoptada entretanto pela NATO e pela União Europeia, foram assimilados pelas legislações ditas «anti-terroristas» de vários países. Generalizou-se a teoria da «guerra preventiva» e desenvolvem-se sofisticadas campanhas mundiais de banalização da violência e de tolerância de práticas criminosas como a tortura, os campos de concentração, as detenções ilegais, o rapto e o tráfico ilegal de prisioneiros (efectuados, em muitos casos, através do território e do espaço aéreo nacionais), o apoio a grupos paramilitares e a protecção a confessos terroristas. Tal ofensiva militarista e securitária é sustentada no discurso do combate ao «terrorismo global». O terrorismo, sob todas as suas formas, incluindo o terrorismo de Estado, é profundamente contrário aos interesses dos trabalhadores e povos. A História e a actualidade demonstram que o imperialismo promove e alimenta o terrorismo, invocando-o depois para difundir uma falsa dicotomia entre segurança e liberdade, e para fortalecer a componente repressiva dos Estados e a devassa e controlo da vida dos cidadãos e das relações sociais. O rasgar de tratados internacionais essenciais para o equilíbrio estratégico (como o Tratado ABM); a agressão e desmantelamento da Jugoslávia; a instalação do chamado «sistema de defesa anti-míssil» norte-americano na Europa e a expansão da NATO e das bases militares do EUA para as fronteiras da Rússia; a militarização da Alemanha; a ofensiva política e militar nos países da bacia do mar Cáspio e no Cáucaso; as provocações contra a China; o «regresso a África» de várias potências militares, com destaque para os EUA, e a instalação do comando militar AFRICOM; a reactivação da IV Esquadra norte-americana na América Latina; o rearmamento do Japão e a revisão militarista da sua Constituição; os acordos nucleares com a Índia e as manobras de desestabilização e ingerência em Timor Leste, por parte da Austrália e EUA, são exemplos elucidativos do carácter global da ofensiva militar e geo-estratégica do imperialismo e dos intentos recolonizadores que lhe estão associados. O Médio Oriente e o continente asiático mantêm-se como os principais focos de instabilidade. O prosseguimento da ocupação imperialista do Iraque e dos crimes sionistas de Israel na Palestina; a intensificação da guerra no Afeganistão e o seu progressivo alastramento ao Paquistão; as provocações e ameaças de intervenção ou provocação militar contra o Irão e a Síria por parte de Israel e dos EUA; as ingerências e agressões no Líbano; as ameaças à República Popular Democrática da Coreia; a instabilidade política provocada no Sri Lanka, Bangladesh e Myanmar, configuram um perigoso cenário para a paz mundial, que assume dimensões potencialmente explosivas com a recente escalada bélica no Cáucaso por parte de uma Geórgia totalmente enfeudada ao imperialismo e por este instrumentalizada. A realidade evidencia que é dos centros políticos e militares do imperialismo que emanam a insegurança e os perigos que caracterizam a situação internacional. O facto de as despesas militares mundiais terem aumentado, desde 1998, cerca de 45%, e de os orçamentos militares dos EUA e dos principais aliados da NATO atingirem valores recorde, demonstram bem a aposta numa nova corrida armamentista que alimenta os fabulosos lucros da sua indústria - como o comprova o aumento superior a 100% das vendas das 100 maiores empresas do complexo militar industrial na última década (74 das quais de Estados membros da NATO) - e de um conjunto de empresas de recrutamento de mercenários e de logística que florescem num novo fenómeno de «privatização» dos conflitos militares. As declarações de inquietação com o investimento militar por parte de países em desenvolvimento são cabalmente desmascaradas pelo facto de os EUA e a NATO dominarem quase hegemonicamente as capacidades militares mundiais, incluindo a produção e o comércio de armas. Só o orçamento militar dos EUA representa cerca de metade das despesas militares mundiais, envolvendo 761 bases e outras instalações militares em território estrangeiro. Num quadro de grandes inquietações quanto à possibilidade de generalização de conflitos com consequências imprevisíveis para a Humanidade, a questão nuclear readquire uma importância crescente. As principais potências imperialistas desenvolvem programas multimilionários de modernização dos seus arsenais nucleares e de sistemas de mísseis estratégicos. Ao mesmo tempo que procura impedir o desenvolvimento da indústria nuclear para fins pacíficos por parte de países que recusam a sua hegemonia, o imperialismo admite criminosamente utilizar novamente a arma nuclear. A um rápido desenvolvimento do militarismo e do carácter multifacetado da ofensiva imperialista tem correspondido um fortalecimento das estruturas de coordenação estratégico-militares do imperialismo. A NATO, na sua cimeira de Riga, em Novembro de 2006, acentuou a sua natureza de organização global de carácter ofensivo, concretizando, na Cimeira de Bucareste de 2008, a sua expansão nos Balcãs e a linha estratégica de futura inclusão da Ucrânia e Geórgia nos planos de dominação do Cáucaso e mar Negro. Paralelamente, desenvolve um vasto conjunto de acordos de «parceria» nos continentes asiático e africano, alargando a sua esfera de influência e tentando submeter o maior número de países possível. Os objectivos, métodos e evolução da NATO comprovam o seu carácter de «polícia de choque» do imperialismo e reforçam, de acordo com a própria Constituição da República Portuguesa, a exigência de dissolução desta organização agressiva, de cuja estrutura militar Portugal deve progressivamente desvincular-se. A ofensiva do imperialismo desenvolve-se num quadro de acelerada mutação e rearrumação de forças, quer no plano da luta de classes quer dentro do próprio campo imperialista, que tende a acentuar-se com a crise capitalista. Adquire, neste contexto, particular importância a interpretação das dinâmicas inter-imperialistas em que, num quadro de crescentes e sobretudo mais visíveis rivalidades entre os dois mais importantes pólos da «Tríade» - União Europeia e Estados Unidos da América - em torno da competição por mercados, áreas de influência e recursos, subsistem aspectos centrais de concertação de classe e de partilha de poder. A principal potência imperialista mundial - os EUA - confirmou-se nos últimos quatro anos como a ponta de lança do militarismo e belicismo imperialistas com a política fascizante da Administração Bush. Esse papel não será abandonado sem uma profunda alteração da correlação de forças no plano mundial, em favor da paz e do progresso social e sem uma profunda alteração do sistema económico e político dominantes na sociedade norte-americana. A eleição de Obama e a projecção internacional que lhe foi atribuída, suportada numa intensa e sofisticada campanha mediática, não pode ser dissociada da operação que, a propósito das eleições presidenciais norte-americanas, se desenvolveu para procurar reverter o crescente isolamento e descrédito dos EUA no plano internacional. Reflectindo a ampla rejeição popular das políticas da Administração Bush, a eleição de Obama está longe de corresponder às expectativas que, no plano interno e internacional, em torno dela se geraram quanto a uma possível alteração substancial das orientações, conteúdos e objectivos da política dos EUA. A realidade demonstra que, a não ser travada, a ofensiva do imperialismo pode pôr em causa a própria existência da Humanidade. O mundo está confrontado com grandes perigos que não devem ser subestimados. Simultaneamente, tais perigos coexistem com uma forte resistência dos trabalhadores e dos povos e com reais potencialidades de desenvolvimento progressista e mesmo revolucionário. 3. «Resistir é já vencer!» A luta dos comunistas, dos trabalhadores e dos povos A intensificação da ofensiva do imperialismo deparou-se com uma crescente resistência dos trabalhadores e dos povos. Face ao generalizado agravamento das condições de vida das massas trabalhadoras, às limitações ou destruição de importantes conquistas sociais e direitos democráticos, aos ataques às soberanias nacionais, a luta de classes agudizou-se e intensificou-se em diversas frentes, assumindo formas, conteúdos e objectivos muito diferenciados convergindo na condenação e rejeição das políticas do grande capital e do imperialismo. Apesar da correlação de forças se manter desfavorável, prosseguiu por toda a parte a luta das forças do progresso social, de libertação nacional, da paz e do socialismo. A luta dos trabalhadores pelas suas reivindicações e por uma sociedade mais justa, envolvendo a classe operária e outras camadas de assalariados, no sector público e privado, traduziu-se em importantes movimentos grevistas, manifestações e jornadas nacionais de luta. Em todos os continentes milhões de trabalhadores associaram a luta reivindicativa nos locais de trabalho a manifestações de rua por trabalho com direitos, valorização dos salários, liberdade sindical, segurança social, justiça fiscal, e contra as privatizações, o encerramento e deslocalização de empresas, o ataque aos serviços públicos. As greves gerais em numerosos países são apenas alguns exemplos de lutas que se travam diariamente por todo o mundo e que a comunicação social dominante, ao serviço do capital, se esforça por ocultar. A resistência à ofensiva exploradora do capital, em que, a par da destruição de conquistas históricas dos trabalhadores, sobressai a dramática situação de pobreza para que são empurrados cada vez mais milhões de seres humanos, assumiu novas expressões em sectores e países muito diversos, como a manifestação de crianças trabalhadoras no Bangladesh e a marcha dos pobres na Índia, ou os motins contra o brutal aumento dos preços dos bens alimentares e, mais recentemente, os protestos populares contra os efeitos das falências bancárias. A organização da classe operária e dos trabalhadores e, em primeiro lugar, a existência de um combativo movimento sindical unitário, de classe e de massas, é de decisiva importância para uma correcta orientação no desenvolvimento e eficácia da luta. Particular projecção assumiu a luta dos trabalhadores imigrantes, nomeadamente nos EUA e na Europa, contra as leis racistas e xenófobas, pela legalização e igualdade de direitos e contra a sobre-exploração. Fortemente atingidas pela ofensiva do grande capital estão as massas camponesas que, face às orientações da OMC, ao desenvolvimento da agro-indústria e dos agro-combustíveis, vêem a sua sobrevivência ameaçada pelo negócio e a especulação capitalistas. As reivindicações dos camponeses e do proletariado agrícola pelo direito a produzir, por preços compensadores à produção, contra a utilização dos transgénicos, pelo direito à terra, têm estado no centro da luta de classes em numerosos países, como testemunham as grandes manifestações no Paraguai, no Brasil ou na Índia, e têm sido o motor de profundas transformações políticas e sociais, como na Bolívia e no Equador, em defesa das comunidades indígenas e das produções tradicionais, em defesa da água pública e do meio ambiente. A exploração crescente das massas camponesas pelas multinacionais da indústria alimentar e a especulação em torno dos preços dos alimentos trouxeram para primeiro plano da situação internacional o flagelo da fome, potenciando-a como geradora de novos conflitos e confirmando a soberania e segurança alimentar como componente fundamental da independência nacional e do progresso social. A questão da propriedade da terra e da reforma agrária, de acordo com o lema «a terra a quem a trabalha», é de redobrada actualidade. A crise do sistema também se reflectiu sobre a pequena e média burguesia urbana, nomeadamente sobre os micro, pequenos e médios empresários, que reagem de forma mais organizada aos efeitos da concentração capitalista em todas as áreas de actividade. Destaque merece também a luta dos intelectuais e quadros técnicos que, como camada cada vez mais proletarizada, sofre a perda de direitos, o espectro do desemprego e a degradação dos rendimentos. A luta das mulheres, integrando as mais diversas organizações ou através dos seus próprios movimentos, assume cada vez maior importância, desde logo contra a exploração da mão-de-obra feminina e em defesa dos seus direitos específicos, na solidariedade com as mulheres vítimas das mais diversas formas de violência, e da ofensiva agressiva do imperialismo. As lutas da juventude adquirem uma enorme importância não apenas na defesa dos seus interesses imediatos pelo direito ao trabalho e em defesa da escola pública, mas também na defesa dos mais amplos direitos dos trabalhadores, da liberdade, da democracia e da paz. A luta contra o imperialismo conheceu um desenvolvimento particularmente importante nos últimos anos. A resistência à política de ingerência, agressão e guerra, em particular dos EUA, foi um traço marcante da luta dos povos em defesa da sua soberania e do direito inalienável a decidir dos seus destinos. No Iraque, no Afeganistão, na Palestina, no Líbano, em Cuba, na Venezuela, na Bolívia, no Equador, assim como na Síria, no Irão, na R.D.P. da Coreia, nos Balcãs, na Colômbia ou em Chipre, prosseguem processos e batalhas decisivos para o futuro desses povos e para a estabilidade nas respectivas regiões que merecem a activa solidariedade dos comunistas portugueses. Nelas intervêm forças muito distintas na sua origem, objectivos e formas de luta, mas dispondo de real apoio de massas e convergindo na rejeição de arrogantes e humilhantes imposições externas e na defesa da cultura e soberania nacionais. A luta contra a integração capitalista europeia é parte integrante deste vasto movimento. O movimento da paz, após uma ampla e combativa expressão associada às ameaças dos EUA ao Iraque e ao desencadear da guerra, tem agora manifestações mais dispersas. Mas há sinais positivos que importa encorajar. Na Europa desenvolveu-se a oposição à acelerada militarização da UE e a luta contra a instalação do sistema anti-míssil dos EUA e o alargamento da NATO para Leste. Desenvolveu-se a luta contra as bases militares estrangeiras, e grandes manifestações contra o militarismo tiveram lugar no Japão e na Índia. O Conselho Mundial da Paz reforçou-se e desempenha hoje um papel mais activo. Mas, não estando o movimento da paz à altura da gravidade da situação, é necessário prestar-lhe mais atenção e intensificar a solidariedade com todos os povos vítimas das ingerências e das agressões do imperialismo. Em particular é necessário expressar activa solidariedade à luta dos povos pela sua autodeterminação e independência, como na Palestina, Saara Ocidental, Chipre, ou pela consolidação de processos democráticos de independência nacional, como em Timor-Leste, assim como para com corajosos processos de afirmação de soberania que encerram um grande significado político e apontam para uma rearrumação de forças em detrimento do imperialismo. Tal é o caso do continente latino-americano onde os EUA, depois de sérios reveses, e com a ajuda de governos fascizantes como na Colômbia, estão a lançar uma perigosa contra ofensiva que é necessário denunciar e derrotar. A evolução da situação na América Latina num sentido progressista e anti-imperialista, apesar de traços contraditórios e da própria diversidade e originalidade dos processos, constitui um dos mais encorajadores exemplos de avanço libertador desde o XVII Congresso. As mudanças a nível do poder em numerosos países, impulsionadas e sustentadas por poderosos movimentos populares, com tradução em importantes vitórias eleitorais, têm revertido na adopção de importantes medidas de carácter democrático e social. Foram abandonadas algumas orientações neoliberais e sustidos alguns dos seus aspectos mais agressivos, o que possibilitou a rejeição da Área de Livre Comércio das Américas (ALCA) e avanços num processo de integração latino-americana de sentido global positivo. Com múltiplas expressões, desde o Mercosul que, inscrevendo-se num funcionamento capitalista, afronta objectivamente a hegemonia norte-americana, até à ALBA - com um conteúdo vincadamente solidário e anti-imperialista -, outros instrumentos de cooperação têm sido criados na base de relações mais equitativas e justas. Procurando reverter tais desenvolvimentos e depor governos democraticamente eleitos, os EUA desenvolvem intensa actividade subversiva apoiando as forças mais reaccionárias, como os recentes acontecimentos da Bolívia revelam. O exemplo revolucionário de Cuba socialista, a defesa intransigente da sua soberania, face a ameaças e actos terroristas por parte do imperialismo e a um feroz e prolongado bloqueio, e a sua activa solidariedade com os povos e processos em desenvolvimento na América Latina, tem constituído precioso estímulo para as transformações progressistas na Venezuela bolivariana, no Equador, na Bolívia e outros países. A luta em defesa da soberania nacional, o seu carácter popular e de massas, envolvendo forças sociais, políticas e religiosas muito diversas, sendo uma importante expressão da luta libertadora dos povos, é, no actual contexto da globalização imperialista uma expressão viva da luta de classes, assumindo um incontornável conteúdo internacionalista e pondo em evidência a importância do marco nacional da luta de transformação social e emancipação dos povos. Importante realidade do quadro internacional, nomeadamente pelo seu papel de resistência à «nova ordem» imperialista, são os países que definem como orientação e objectivo a construção duma sociedade socialista - Cuba, China, Vietname, Laos e R.D.P. da Coreia. Com percursos diversos, experiências históricas próprias, evoluções distintas, problemas e contradições inerentes ao processo de transformação social num quadro de relações capitalistas dominantes, estes países estão sujeitos pelo imperialismo a uma intensa campanha de pressões económicas, ameaças militares e operações de desestabilização e intoxicação mediática que encerram graves perigos para a segurança internacional e que, a vingarem, significariam um grave retrocesso na luta libertadora. Independentemente das avaliações diferenciadas em relação ao caminho e às características destes processos - a exigir uma permanente e cuidada observação e análise - e das inquietações e discordâncias, por vezes de princípio, que suscitam à luz das concepções programáticas próprias do Partido, o PCP considera que não há vias únicas de transformação social e reafirma o inalienável direito destes países e dos seus povos, como de todos os povos do mundo, a decidir livremente sobre o seu próprio caminho. É esse o interesse da causa do progresso social e da paz em todo o mundo. A revolução cubana, que assinalará na viragem do ano o seu 50º aniversário, defrontando ao longo deste meio século permanentes campanhas de ingerência, desestabilização e agressão, projecta-se no mundo pelas conquistas políticas, económicas, sociais e culturais alcançadas, pela defesa intransigente da sua soberania nacional, pelo seu exemplo de patriotismo e internacionalismo, e pela sua posição de vanguarda nos domínios da saúde e da educação. A solidariedade com Cuba socialista é um imperativo de todas as forças revolucionárias e amantes da paz. A convergência da luta dos povos pela sua libertação nacional e social com a luta da classe operária e dos trabalhadores e de outras camadas antimonopolistas é hoje uma tarefa central de todas as forças que se opõem à hegemonia do imperialismo. A frente anti-imperialista alargou-se e diversificou-se. Com componentes sociais e políticas muito diferenciadas, nela se incorporam correntes ideológicas distintas e até antagónicas nos seus objectivos estratégicos, o que torna difícil a unidade na acção, mesmo quando intervêm com idênticas reivindicações. É necessário precisar e potenciar conteúdos e formas de intervenção que favoreçam a acção comum ou convergente e a eficácia na resistência à ofensiva do grande capital e do imperialismo, e por uma nova ordem internacional, democrática, pacífica, respeitadora da soberania dos povos. No actual quadro de crescente agressividade do imperialismo, assume-se como prioritária a frente da luta pela paz e a solidariedade com os povos vítimas da ingerência e da agressão do imperialismo. Frente que comporta nomeadamente a luta contra o militarismo e a guerra e contra o recurso à força nas relações internacionais; contra o alargamento e pela dissolução da NATO e outros blocos político-militares, designadamente contra a militarização da UE e o militarismo japonês; pelo desarmamento e a proibição da arma nuclear e todas as armas de destruição massiva; contra a instalação de sistemas anti-míssil e a militarização do espaço; pela democratização da ONU e o respeito pelos princípios da sua Carta e do direito internacional. Com o desenvolvimento da crise do capitalismo ganha ainda maior relevo a luta contra a exploração e as tentativas de transferir para os trabalhadores e os povos os custos da crise. Tal objectivo insere-se na luta mais geral por relações económicas internacionais mais equitativas e mais justas; contra as políticas neoliberais de desmantelamento dos direitos dos trabalhadores e de destruição dos serviços públicos; contra o subdesenvolvimento e pela erradicação dos flagelos da fome, da doença e do analfabetismo; em defesa do meio ambiente. No quadro do fortalecimento das diversificadas expressões da frente anti-imperialista valoriza-se o papel desempenhado por organizações unitárias internacionais surgidas no fluxo da vitória sobre o nazi-fascismo na II Guerra Mundial como o Conselho Mundial da Paz, a Federação Mundial da Juventude Democrática (incluindo o amplamente unitário movimento dos Festivais Mundiais da Juventude e dos Estudantes, com o seu carácter anti-imperialista e de massas, por ela impulsionado), a Federação Democrática Internacional das Mulheres, a Federação Sindical Mundial, sendo importante agir para que se reforce a sua intervenção e alargue a sua dimensão de massas. O «movimento anti-globalização», no seio do qual se tem travado uma intensa luta ideológica, para a qual o PCP tem dado activa contribuição, combatendo a sua instrumentalização por forças social-democratizantes e defendendo a acentuação da sua componente anticapitalista e anti-imperialista, vive hoje um período de menor impacto. A realidade da luta de classes, e da importância decisiva da luta no marco nacional, pôs em evidência os limites do movimentismo e do chamado «novo internacionalismo» daqueles que semeiam a ilusão de que é possível «humanizar» a globalização capitalista. O PCP, que desde o início caracterizou tal movimento como expressão do estreitamento da base social de apoio do capitalismo na sua forma actual, continua a considerar de grande importância a acção convergente de todos os que sofrem as consequências da contra-ofensiva exploradora e agressiva do grande capital. É também importante valorizar e acompanhar os mais variados movimentos em torno de temas específicos e objectivos concretos que ganharam força nos últimos anos no quadro dos progressos da ciência e da técnica e da globalização capitalista, como sejam os movimentos em torno das questões ambientais, do software e bases de informação livres e muitos outros. Num tempo que é ainda de resistência e de acumulação de forças, mas também de fortes potencialidades progressistas e revolucionárias, enormes responsabilidades recaem sobre os partidos comunistas e o movimento comunista e revolucionário internacional. A par da defesa intransigente dos interesses dos trabalhadores, cabe-lhes identificar os conteúdos unificadores para as alianças necessárias da classe operária com as diferentes componentes sociais e políticas que integram a frente anti-imperialista, e colocar com confiança a perspectiva da alternativa, mesmo que no imediato se coloquem apenas objectivos limitados e etapas intermédias de luta pelo socialismo e pelo comunismo. Contrariando aqueles que há duas décadas anunciaram o fim da história e da luta de classes, é cada vez mais evidente a impossibilidade do capitalismo em dar resposta aos problemas e anseios dos trabalhadores, que a classe operária continua no centro da luta de classes e que, para a superação revolucionária do capitalismo, os trabalhadores assalariados e outras classes e camadas antimonopolistas devem contar com fortes partidos comunistas. O fortalecimento dos partidos comunistas e o reforço da sua cooperação e solidariedade recíproca, tendo como núcleo o internacionalismo proletário, são exigências historicamente comprovadas para o êxito da luta. A aproximação e cooperação entre partidos comunistas e operários, de que o processo dos Encontros Internacionais (cuja oitava edição se realizou em Lisboa e que vai já na sua décima edição) é uma importante expressão, tem progredido, e o PCP fará o que estiver ao seu alcance para que progrida ainda mais no futuro, para criar as condições para formas mais estáveis e eficazes de articulação. Esta realidade não anula, contudo, as enormes debilidades, dificuldades e problemas que persistem no movimento comunista. Ainda muito marcado pelas negativas consequências das derrotas do socialismo, assiste-se, por um lado, a valiosos processos de resistência, afirmação e recuperação de partidos comunistas, mas, por outro lado, continuam a desenvolver-se tendências revisionistas e reformistas envolvendo processos de degenerescência, autoliquidação e diluição em frentismos de «esquerda», com o abandono das referências ideológicas e objectivos revolucionários que definem os comunistas como corrente revolucionária necessária ao fortalecimento da frente anti-imperialista, e insubstituível para a liquidação do capitalismo e para a construção de uma nova sociedade sem exploradores nem explorados. Neste sentido, o Partido da Esquerda Europeia, que o PCP não integrou pela sua lógica supranacional e natureza ideológica, não só se confirmou como uma falsa resposta ao reconhecidamente necessário reforço da cooperação das forças de esquerda anticapitalistas na Europa, como introduziu factores de divisão, afastamento e preconceito, que se manifestaram nomeadamente no Grupo da Esquerda Unitária Europeia / Esquerda Verde Nórdica no Parlamento Europeu. A luta pelo reforço dos partidos comunistas defronta-se com rápidas mudanças socioeconómicas, suas repercussões na classe operária e na sua condição (desemprego, precariedade, deslocalização, e/imigração) e com a enorme pressão ideológica do grande capital, só ultrapassável pela firmeza de convicções e pelo seu enraizamento na classe operária e nas massas populares, impulsionando a sua luta, apontando a perspectiva revolucionária de transformação social e dando combate a posições oportunistas que negam a luta de classes. Apesar da crescente compreensão da necessidade dos partidos comunistas e da sua estreita cooperação, o movimento comunista vive ainda uma fase de grande instabilidade e continua a ser difícil definir, com rigor, as suas componentes e fronteiras. A diversidade de situações e tarefas imediatas, experiências, culturas, de avaliação da História, sempre foram características do movimento comunista, e a existência hoje de profundas diferenças exige que a cooperação, visando a unidade na acção, assente nos princípios de igualdade de direitos, soberania e não ingerência nos assuntos internos, rejeitando tanto nacionalismos e particularismos redutores, como «modelos» e concepções uniformizadores sem correspondência com a realidade. Perante a crise do capitalismo, e os perigos que esta encerra, cabe ao movimento comunista e revolucionário desenvolver a mais ampla cooperação das forças progressistas e revolucionárias anti-imperialistas, intercambiando experiências, análises e opiniões, vencendo atrasos, combatendo o reformismo e o espontaneísmo, e dando vigoroso combate à ideologia dominante. A ofensiva imperialista só poderá ser travada com a conjugação da luta dos povos, das forças comunistas e progressistas e dos países que assimilem, no desenvolvimento da luta, a condição essencial de associar à luta anti-imperialista o objectivo da superação revolucionária do capitalismo e da construção do socialismo. 4. O socialismo, alternativa necessária e possível O socialismo, objectivo programático do PCP, tendo no horizonte o comunismo, não só traduz a superioridade dos valores de liberdade e justiça social que animam os comunistas de todo o mundo na sua luta contra o capital, como constitui, na actualidade, uma possibilidade real cada vez mais necessária e urgente. Esta profunda convicção do PCP assenta em três pilares fundamentais. Em primeiro lugar, numa concepção materialista e dialéctica da história, para cuja elaboração científica consequente Marx e Engels trouxeram contribuições decisivas, que, desvendando as leis gerais do desenvolvimento social e o papel nele reservado ao proletariado, fundamenta a transitoriedade do capitalismo como modo de produção e de reprodução do viver, bem como a possibilidade real e a exigência prática da sua superação revolucionária, exigência e possibilidade que Lenine aprofundou na época do imperialismo, e a que a Grande Revolução Socialista de Outubro deu vida pela primeira vez na história. Em segundo lugar, no significado histórico universal da Revolução de Outubro, no empreendimento pioneiro de uma nova sociedade na URSS e demais experiências históricas do socialismo. Experiências que, todas elas com graus diferenciados de criatividade revolucionária, maior ou menor consideração das especificidades nacionais, maior ou menor peso de factores de ordem externa, foram fruto de grandes batalhas de classe e de situações de crise revolucionária que impuseram transformações anticapitalistas profundas. Experiências inseparáveis da criação pelo proletariado do seu partido de vanguarda, e só possíveis pela abnegação e prestígio dos comunistas e pela entusiástica adesão e participação populares que suscitaram. Experiências que se traduziram em realizações e conquistas de grande valor, que já demonstraram a superioridade do poder dos trabalhadores e da nova sociedade sem exploradores nem explorados, do socialismo sobre o capitalismo. A contribuição da URSS e, posteriormente, do campo dos países socialistas, para os grandes avanços de civilização verificados no século XX foi gigantesca. Países atrasados transformaram-se num curto prazo de tempo em países altamente industrializados e socialmente avançados em que foram alcançados direitos historicamente inéditos. As conquistas sociais e democráticas do movimento operário dos países capitalistas, vulgarmente identificadas com o «Estado social», a derrocada dos impérios coloniais e o impetuoso avanço do movimento de libertação nacional dos povos de África, Ásia e América Latina, são inseparáveis da existência e das realizações da URSS e dos países socialistas. Sejam quais forem as tentativas de negar e subverter a verdade, a vitória sobre o nazi-fascismo ficará para sempre gravada na História como um feito para o qual o povo soviético e os comunistas na Europa e em todo o mundo deram a mais heróica e decisiva contribuição. A política de paz e de solidariedade internacionalista da URSS e a conquista do equilíbrio militar estratégico entre a URSS e os EUA e entre o campo socialista e o imperialismo, foram decisivas para a contenção da natureza agressiva do imperialismo, a salvaguarda da segurança na Europa e da paz mundial, o avanço das forças do progresso social. Como tantas outras, a revolução portuguesa do 25 de Abril enquadra-se no clima europeu e internacional de desanuviamento da década de setenta, e o povo português contou com a solidariedade internacionalista dos povos da União Soviética e demais países socialistas. A caminhada da Humanidade para o socialismo e o comunismo sofreu profundos reveses no findar do século com as derrotas do socialismo na URSS e no Leste da Europa. O estudo das suas causas e consequências prossegue no movimento comunista e no campo progressista, e o PCP deverá consagrar-lhe ainda mais atenção para tirar todas as experiências e ensinamentos que comporte, a fim de prosseguir a luta com reforçada confiança. Temos muito de valioso já adquirido pela elaboração e reflexão colectivas do Partido desde o XIII e XIV Congressos. Revelou-se particularmente fecunda a tese avançada pelo PCP de que (ao contrário do que pretendeu a violenta campanha desencadeada pelos nossos adversários sobre a «morte do comunismo» e o «declínio irreversível dos partidos comunistas») o que foi derrotado não foram os ideais e o projecto comunistas mas um «modelo» historicamente configurado, que se afastou, e entrou mesmo em contradição com características fundamentais de uma sociedade socialista, sempre proclamadas pelos comunistas, relativas ao poder dos trabalhadores, à democracia política, às estruturas socioeconómicas, ao papel do Partido, à teoria. Tendo como base as análises e orientações do XIII e XIV Congressos, é necessário continuar a aprofundar a reflexão. A construção do socialismo na URSS, e ulteriormente noutros países da Europa, Ásia e América Latina, enfrentou desde o primeiro momento o cerco e a agressão do imperialismo, continuadas operações de provocação e desestabilização interna, sofisticadas campanhas de diversão e subversão ideológica. Tudo isto impôs pesados sacrifícios, obrigou ao desvio de recursos imensos para a esfera militar, levou a distorções e desequilíbrios no desenvolvimento socioeconómico socialista, e mesmo a situações de crise. Tudo isto influenciou os caminhos e as soluções encontradas no processo de construção do socialismo e contribuiu, em medida considerável, para os atrasos, erros e deformações que se verificaram com violação de princípios essenciais do socialismo. Graves cedências e capitulações ideológicas, políticas e de classe que se manifestaram sobretudo a partir de meados da década de 80, acabaram por determinar que, da aguda competição e confrontação entre os dois sistemas, resultasse temporariamente um sério retrocesso no caminho do progresso social. Perante os complexos problemas que se manifestaram na construção do socialismo na URSS, assim como noutros países do Leste da Europa, o PCP expressou compreensão e solidariedade para com os esforços e orientações que proclamavam visar a sua superação, alertando simultaneamente para o desenvolvimento de forças anti-socialistas e para a escalada de ingerências imperialistas, confiando em que, apesar das dificuldades e deformações, existiam forças capazes de defender o poder e as conquistas dos trabalhadores e promover a necessária renovação socialista da sociedade. Mas certas medidas tomadas agravaram os problemas ao ponto de provocar uma crise geral. O abandono de posições de classe e de uma estreita ligação com os trabalhadores, o apagamento do marxismo-leninismo e a penetração em profundidade da ideologia social-democrata, a claudicação das pressões e chantagens, a rejeição do imperialismo, a desvalorização e mesmo rejeição do heróico património histórico dos comunistas e do povo soviético e, finalmente, a traição de altos responsáveis do Partido e do Estado, desorientaram e desarmaram os comunistas e as massas para a defesa do socialismo, possibilitando o rápido desenvolvimento e triunfo da contra-revolução com a reconstituição do capitalismo. Esta dura realidade não anula, porém, o alcance libertador do empreendimento inédito de construção de uma sociedade nova, sem exploradores nem explorados, iniciada com a Revolução de Outubro. O valor das suas realizações ressalta ainda mais com as trágicas consequências destas derrotas. Para estes países, com o terrível retrocesso social provocado pela contra-revolução, a perda de soberania, a invasão exploradora das multinacionais e o esbulho das suas riquezas, a anexação pela NATO e pela UE, os ataques a direitos e liberdades fundamentais, o avanço de forças fascistas e do anticomunismo. Para o mundo, com o desequilíbrio da correlação de forças daí resultante e a contra-ofensiva desencadeada pelo grande capital e pelo imperialismo contra os trabalhadores e contra os povos. A vida demonstrou de modo dramático que o desaparecimento do poderoso factor de contenção que a URSS representava deixou o mundo mais exposto à natureza exploradora e agressiva do capitalismo, tornando-o mais injusto e perigoso. Em terceiro lugar, a convicção do PCP de que o socialismo é na actualidade cada vez mais necessário e urgente, assenta na análise do sistema capitalista e das suas tendências de desenvolvimento actual. O capitalismo tem revelado capacidades de adaptação e de recuperação por vezes inesperadas, mas está ferido de insanáveis contradições e, como a crise actual evidencia, são patentes os seus limites históricos. Com as derrotas do socialismo lançou uma gigantesca campanha visando apresentar-se como sistema terminal sem alternativa. Mas o mito do «fim da História» - e com ele do «fim» do comunismo, dos partidos comunistas, da luta de classes, da revolução, das ideologias e outros - durou pouco. O triunfalismo capitalista dos anos 90 que, frente às derrotas do socialismo, anunciava mais liberdade, mais paz e segurança internacionais, mais progresso social, não resistiu à prova dos factos. As receitas do neoliberalismo e as teses justificativas da globalização capitalista, incluindo as da chamada «terceira via», embora ainda dominantes, desacreditaram-se rapidamente. O capitalismo não só se revela incapaz de dar satisfação aos interesses e aspirações dos trabalhadores e dos povos como põe em perigo a própria Humanidade. A contradição entre as imensas potencialidades das conquistas da ciência e da técnica e as terríveis regressões que percorrem o mundo contemporâneo - desemprego, fome, doença, analfabetismo, degradação dos recursos naturais, catástrofes ambientais - constitui, em si mesma, uma violenta acusação ao sistema capitalista. A necessidade e possibilidade do socialismo estão inscritas nas próprias contradições do sistema que o capitalismo contemporâneo tende a agudizar extraordinariamente. O antagonismo entre o capital e o trabalho, com o brutal agravamento da exploração e a proletarização acelerada da pequena burguesia e camadas intermédias da população. A não correspondência entre o desenvolvimento das forças produtivas e as relações de produção capitalistas que entravam o seu desenvolvimento e pervertem a sua utilidade social. A contradição entre o carácter social (cada vez mais acentuado) da produção e a propriedade privada (cada vez mais concentrada) dos grandes meios de produção. A actual crise capitalista comprova a necessidade de rupturas que coloquem a economia ao serviço dos trabalhadores e dos povos. A extraordinária centralização e concentração de capital, a formação de gigantescos monopólios que, isoladamente ou em aliança, dominam ramos inteiros da produção, do comércio e serviços e das finanças, os próprios mecanismos de regulação internacional do capitalismo, são expressão de reais processos de socialização que mostram a necessidade do socialismo, como solução racional necessária à desumana anarquia e concorrência capitalistas. A solução dos grandes problemas que afectam toda a Humanidade, a começar pelo problema da paz, mas também os problemas dos recursos naturais, da energia, do ambiente, da pobreza e outros, exige a utilização de métodos racionais de planeamento inerentes ao socialismo. Estão objectivamente interessadas na superação histórica do capitalismo monopolista como modo de produção dominante, todas as classes e camadas não monopolistas. Mais do que nunca é o próprio futuro da Humanidade que está ameaçado pela desenfreada corrida ao máximo lucro. Nunca foi tão verdadeira a tese marxista de que, libertando-se, a classe operária liberta simultaneamente todas as outras classes e camadas oprimidas pelo capital monopolista, o que hoje significa libertar a Humanidade. Sem dúvida que o caminho do socialismo se revelou mais complexo e mais acidentado e demorado do que os grandes avanços libertadores alcançados no caminho aberto pela Revolução de Outubro faziam prever. E que o movimento comunista e revolucionário não recuperou ainda de grandes retrocessos da década de 90. Nada disso anula, porém, a realidade de que a época em que vivemos é a época da passagem do capitalismo ao socialismo, inaugurada pela Revolução de Outubro, que o capitalismo não só não resolve como agrava os graves problemas do nosso tempo, que só o socialismo pode responder às mais profundas aspirações dos trabalhadores e dos povos e salvar a Humanidade da catástrofe anunciada pela insaciável e destrutiva gula do capital. É com esta profunda convicção que o PCP aponta, para Portugal e para o mundo, o socialismo como possibilidade real e a mais sólida perspectiva de evolução da Humanidade. 2.Nacional II - Situação nacional 0. Introdução

1. Evolução da União Europeia

2. Situação económica e social

3. A evolução política e o regime democrático

4. A política necessária

0. Introdução A formação do Governo PS, suportado na Assembleia da República por uma maioria absoluta e a eleição de Cavaco Silva para a Presidência da República traduzem, no plano político-institucional, a afirmação e consolidação de um bloco de poder ao serviço dos grandes grupos económicos e financeiros. A realização das eleições legislativas antecipadas de Fevereiro de 2005, na sequência da dissolução da Assembleia da República, correspondeu, ainda que tardiamente, a uma ampla e crescente aspiração popular, e culminou um largo processo de resistência à ofensiva prosseguida pelos governos do PSD e CDS-PP de Durão Barroso, Paulo Portas e Santana Lopes. A vinculação do PS à política de direita, agravada pela obtenção de uma maioria absoluta gorou a possibilidade que das eleições resultasse, não apenas a mudança de governo e a derrota do PSD e CDS-PP, mas a criação de condições que contribuíssem para a derrota da política de direita e o alcançar de uma efectiva e verdadeira política alternativa. Os três anos e meio de Governo PS ficam marcados por uma nova fase, quer pela intensidade, quer pelo seu carácter global de uma ofensiva dirigida para a destruição dos direitos sociais, para o aumento da exploração do trabalho e para a concretização dos interesses do capital. No quadro do prosseguimento e desenvolvimento da política de direita dos últimos trinta e dois anos, o actual Governo tem em curso uma acção não apenas destinada a reduzir e a liquidar direitos e a impor retrocessos no plano social, mas também dirigida contra o regime democrático consagrado na Constituição. O processo de reconfiguração da estrutura e papel do Estado aos interesses do capital monopolista e o ataque a direitos no plano económico e social têm-se traduzido no empobrecimento da democracia política e na crescente restrição às liberdades e garantias dos cidadãos. Suportados numa relação de crescente promiscuidade e comprometimento com o Governo, e pela «cooperação estratégica» oferecida pelo Presidente da República à sua acção, sectores e estruturas proeminentes do grande capital inscreveram na sua agenda e objectivos já não só a reclamação de políticas económicas e sociais mais favoráveis aos seus interesses, mas a apresentação de uma verdadeira agenda de subversão do regime político e constitucional. Três décadas de política de direita, de reconstituição do capitalismo monopolista, traduzidas no agravamento das condições de vida dos trabalhadores e do povo, na crescente dependência e subordinação externa do país e num inquietante empobrecimento do regime democrático, colocam como grande questão da actualidade política e do futuro do país a exigência de ruptura com estas políticas e a construção de um novo rumo para o país. 1. Evolução da União Europeia A recente evolução da União Europeia é inseparável do conjunto de processos económicos, sociais e políticos que marcam a fase actual do capitalismo. A evolução da União Europeia nos últimos quatro anos, a par do prosseguimento e aprofundamento das suas políticas neoliberais, federalistas e militaristas, foi significativamente marcada pela rejeição, em 2005, da chamada «constituição europeia» pelos povos da Holanda e da França e pela rejeição, pelo povo irlandês, da segunda tentativa para a sua imposição, agora na versão denominada «Tratado de Lisboa». Uma rejeição que representa para o grande capital e as grandes potências um significativo revés nos seus projectos de aprofundamento da integração capitalista europeia. No plano nacional, constitui uma significativa derrota do PS e do PSD e da sua opção de retirarem ao povo português o direito de debater e se pronunciar sobre o real conteúdo e objectivo de uma proposta de Tratado contra o qual o PCP firmemente se bateu, e contra o qual vai continuar a lutar. As manobras que procuraram impedir a realização de novos referendos nos países da UE, ou onde não puderam impedir a sua realização, a pressão para a sua repetição até um resultado favorável, bem como as que antecederam e se seguiram ao referendo na Irlanda expõem o carácter profundamente antidemocrático da integração europeia e do desrespeito das suas instituições supranacionais pela vontade dos povos. No quadro da agudização da crise estrutural do sistema capitalista avançou a denominada «Estratégia de Lisboa» com a intensificação da sua agenda e prioridades, sistematizada com a criação dos «Planos Nacionais de Acção», a adopção da directiva de liberalização dos serviços e de novas etapas na liberalização e privatização dos serviços públicos (energia, água, transportes, correios, educação) e no desmantelamento da administração pública, a desregulamentação do mercado de trabalho, promovendo a dita «flexigurança», os acórdãos do Tribunal de Justiça Europeu no sentido de impor a liberalização dos mercados e a concorrência capitalista, nomeadamente colocando em causa legislações laborais nacionais, para além de uma política monetária ao serviço dos grandes interesses financeiros, que promove a moderação salarial e a transferência crescente dos ganhos de produtividade do trabalho para o capital. Prosseguiu a liberalização da agricultura, com a desvinculação das ajudas da produção, decidida na reforma da Política Agrícola Comum de 2003, e o desmantelamento das organizações comuns de mercado (vinho), acentuando as desigualdades na distribuição das ajudas entre produtores, produções e países. Promoveu-se uma Política Comum de Pescas orientada para a destruição do sector e a entrega da gestão dos recursos biológicos marinhos nacionais às instituições supranacionais da UE. Políticas comuns que comprometem estes sectores estratégicos do país e a sua soberania e segurança alimentares. Intensificou-se uma política de relações comerciais bilaterais, regionais e multilaterais que visa a liberalização do comércio mundial, seja ao nível da Organização Mundial do Comércio ou da criação de zonas e regiões de livre comércio, privilegiando, apesar de contradições, uma parceria estratégica com os EUA. O quadro financeiro comunitário para 2007-2013, adoptado em 2006, estabeleceu, por imposição das potências da União Europeia, na sua ofensiva contra os trabalhadores e os povos, um limite de 1% do Rendimento Nacional Bruto ao nível da UE para o orçamento comunitário, penalizando os países economicamente menos desenvolvidos - como Portugal, que perde cerca de 15% de verbas face ao quadro comunitário anterior - e condicionando a utilização destes meios à concretização da agenda neoliberal da «Estratégia de Lisboa». Foram dados novos passos no sentido de uma política comum da justiça e assuntos internos, subtraindo competências à soberania dos Estados, adoptando um amplo conjunto de medidas securitárias que, a pretexto da «luta contra o terrorismo», colocam em causa direitos, liberdades e garantias fundamentais dos cidadãos e reforçam o aparelho repressivo na União Europeia. Foi sendo implementada a política de imigração ao nível da UE, de cariz securitário, selectivo, repressivo e criminalizador dos imigrantes, que os reduz a uma mão-de-obra barata, desprovida de direitos e descartável, de que são exemplos a recém aprovada directiva europeia de retorno, bem como o Pacto Europeu de Imigração e Asilo, onde se integra o «cartão azul». Aprofundou-se a militarização da União Europeia que, adoptando o conceito ofensivo da NATO, se confirma como o seu pilar europeu, desenvolvendo a sua «Estratégia de Segurança», assente na militarização das relações internacionais e na violação do direito internacional. A UE avançou no reforço e criação de novas capacidades militares e na prossecução de «missões militares» que, como em África ou no Kosovo, visam o domínio de mercados e de recursos naturais e a partilha de zonas geo-estratégicas. Pelas suas políticas e objectivos, a União Europeia confirma-se plenamente como o instrumento de classe do capitalismo transnacional e das grandes potências, bem evidente na coincidência das prioridades e decisões das suas instituições supranacionais com os interesses do grande capital e no domínio dos processos de decisão por parte das grandes potências da UE. Uma «integração» que tem contado, em questões centrais (de que são exemplo os Tratados, a Estratégia de Lisboa ou a «flexigurança»), com o acordo da Confederação Europeia de Sindicatos (CES). A evolução recente da União Europeia confirma que, apesar dos importantes e graves avanços verificados no sentido da sua consolidação como pólo imperialista, não está isenta de contradições e resistências que resultam do confronto do grande capital com a enorme massa dos assalariados, em particular dos sectores operários, e outras camadas sociais profundamente atingidas pelas políticas de direita. Contradições inerentes ao choque de interesses políticos e económicos entre as grandes potências e as que tenderão a desenvolver-se entre estas e os restantes países, e que, inevitavelmente, crescerão à medida que a «crise financeira» se aprofunda, criando sérias dificuldades à manutenção de países com economias mais débeis no espartilho do euro, e à medida que a União Europeia violente direitos de soberania, interesses nacionais e identidades culturais profundamente enraizadas. Às contradições e aos obstáculos que o desenvolvimento do processo de integração capitalista gera, os mentores da integração capitalista europeia respondem ocultando e escamoteando a sua origem, apontando falsas soluções e saídas e procurando assegurar uma dinâmica de factos consumados para novas e perigosas fugas em frente. A panóplia de mistificações e sofismas que sustenta a constante investida ideológica dita «europeísta» - como as teses dos «egoísmos nacionais» versus «interesse europeu», da «falta de líderes europeus com a dimensão política dos fundadores», da UE «anã política», do «método comunitário» versus «federalismo», do federalismo como resposta alternativa e diferente ao directório, do federalismo encapotado de «europeísmo de esquerda» ou ainda a alegada «falta» de uma «base constituinte na elaboração de uma Constituição europeia» - procura iludir a questão essencial: a de que a União Europeia é, no actual quadro internacional, um pólo imperialista orientado para o aumento da exploração e do intervencionismo agressivo. O PCP, consequente com as suas posições de combate à integração capitalista europeia, reafirma que recusa e dará firme combate a qualquer dita «solução» que - sustentada, ou não, na criação de um «núcleo duro» -, reforce a natureza federal das instituições da União Europeia e, consequentemente, o domínio do conjunto das grandes potências nos processos de tomada de decisão, nomeadamente através da valorização de critérios demográficos, em detrimento da representação de Estados soberanos e do princípio da igualdade entre estes, da eliminação das presidências semestrais rotativas do Conselho Europeu, do fim do princípio de um comissário permanente por país, da redução do número de deputados no Parlamento Europeu, da ampliação da co-decisão e da adopção de decisões por maioria qualificada no Conselho, em prejuízo de países como Portugal, e do seu poder de veto na salvaguarda de interesses fundamentais. O PCP reafirma que rejeita e dará firme combate a uma qualquer dita «solução» que represente possibilidades acrescidas para a ofensiva neoliberal contra os trabalhadores e os povos, e que se traduza na perda de direitos sociais e civilizacionais, na agudização das desigualdades sociais, na multiplicação de assimetrias entre países e regiões, na multiplicação dos problemas ambientais e no reforço das dependências dos países como Portugal. O PCP reafirma que recusa e dará firme combate a uma qualquer dita «solução» que tenha como objectivo alicerçar um bloco político-militar que visa a disputa concorrencial de mercados, matérias-primas e mão-de-obra, integrando ou não articulações, alianças e acordos de partilha com os outros pólos da Tríade, Japão e EUA. Mais de vinte anos após o Acto Único, quinze após o Tratado de Maastricht e dez após a União Económica e Monetária (com os seus BCE, Pacto de Estabilidade e Euro), os resultados dos referendos realizados em França, na Holanda e na Irlanda colocam em evidência a ampliada rejeição de uma «integração europeia», que desrespeita as soberanias, as economias nacionais e a democracia e agride as conquistas sociais dos trabalhadores, a segurança e a paz. As lutas dos trabalhadores e dos povos em defesa da democracia, da soberania e independência nacionais e de conquistas políticas, económicas, sociais e culturais em cada país, são uma contribuição para o aumento da consciência política quanto ao carácter de classe da União Europeia e para abrir o caminho de uma outra Europa, de cooperação, progresso e paz. A rejeição consequente e determinada desta «integração europeia» exige que, em cada país, se reforcem as forças políticas que, explorando as contradições e obstáculos, e conjugando a luta de massas com a acção institucional, dão frontal e coerente combate à sua dinâmica federalista, neoliberal e militarista. As importantes mobilizações e significativas lutas que ocorreram por toda a Europa revelam e reafirmam a necessidade do reforço da cooperação, designadamente por parte das forças de esquerda vinculadas aos interesses dos trabalhadores - claramente demarcadas da social-democracia rendida ao neoliberalismo -, e da convergência de todos quantos lutam, na base de objectivos de transformação social anticapitalista, por um novo caminho para a Europa. O PCP continuará a assumir como sua prioridade o prosseguimento e reforço da cooperação dos comunistas e de outras forças de esquerda e progressistas na Europa, com respeito pelas diferenças de situação, reflexão e proposta, colocando no primeiro plano a acção comum ou convergente em torno das questões mais sentidas pelos trabalhadores e outros sectores e camadas sociais afectados pela «integração europeia», e afirmando e projectando à escala europeia acções e propostas comuns. Com a convicção de que a necessária expressão europeia e internacional da luta adquirirá uma dimensão e um significado tanto mais representativos quanto mais enraizada e organizada ela for a nível de cada país. O PCP continuará profundamente empenhado no desenvolvimento da cooperação e convergência dos partidos comunistas, forças e partidos progressistas e de esquerda, nomeadamente: na salvaguarda, consolidação, forte intervenção e afirmação do carácter unitário, confederal e progressista do Grupo Confederal da Esquerda Unitária Europeia/Esquerda Verde Nórdica, do Parlamento Europeu; no desenvolvimento de iniciativas comuns de expressão europeia; na dinamização e apoio à luta dos trabalhadores e outros sectores e forças sociais pelas conquistas e direitos sociais, contra as políticas do capitalismo, pela paz, contra o militarismo e a guerra, pela democracia e a soberania nacional, contra o federalismo e o domínio das grandes potências. Ao longo das últimas duas décadas, PS e PSD e CDS-PP, numa elucidativa e constante convergência de posições, foram os responsáveis pela condução, e aprofundamento sucessivo, da integração de Portugal na CEE/UE, participando activamente na definição, defesa e implementação das suas políticas e orientações neoliberais, federalistas e militaristas. Uma convergência responsável pela alienação de componentes essenciais da soberania nacional; pela submissão perante as instituições da União Europeia e as grandes potências; pela aceitação de imposições e medidas gravosas para o país; pela entrega de sectores estratégicos da economia nacional ao capital estrangeiro; pela ideia da fatalidade das políticas da União Europeia; pela apresentação dos problemas e das dificuldades do país como a moeda de troca aos ditos «benefícios» dos fundos comunitários; pela não consulta do povo português sobre questões fundamentais; pela não utilização da margem de manobra de que, apesar de tudo, Portugal ainda dispõe pela aplicação, entre outros, do denominado «princípio da subsidiariedade» e do direito de veto. Também o Bloco de Esquerda, com o seu denominado «europeísmo de esquerda», atrás do qual esconde o seu federalismo, se confirma como uma das forças políticas favoráveis ao avanço do carácter supranacional da União Europeia, desvalorizando e menosprezando a importância central da preservação da soberania nacional como alicerce incontornável do desenvolvimento do país e instrumento indispensável para a luta por uma outra Europa. A União Europeia surge como um dos principais alicerces da política de classe realizada em Portugal e como um dos principais esteios e pretextos da ofensiva contra os direitos e conquistas sócio-económicas dos trabalhadores que coloca em causa o interesse nacional e o projecto de desenvolvimento patriótico e internacionalista consagrado na Constituição da República Portuguesa. Uma política externa de diversificação das relações internacionais e de cooperação, paz e amizade com todos os povos, a salvaguarda da soberania nacional e a promoção dos interesses de Portugal e dos portugueses constituem orientações fundamentais para a intervenção do país num projecto de cooperação na Europa. Perante o processo de integração da União Europeia, a soberania nacional constitui ponto de partida inegociável e uma questão central e decisiva para a afirmação dos interesses de Portugal e dos portugueses. A defesa e afirmação da soberania nacional exigem a consagração institucional da possibilidade da reversibilidade e da alteração de acordos e tratados que regem a integração europeia, ajustando o estatuto de cada país à vontade do seu povo e à sua real situação, incluindo o direito à decisão soberana sobre a desvinculação da UE. Não há arquitectura institucional no quadro do figurino federal (uma ou duas Câmaras, mais ou menos comissários, mais ou menos poder do Parlamento Europeu, este ou aquele sistema de votação) que resolva a desigualdade de poder resultante das significativas diferenças entre os Estados-membros. E as suas dimensões neoliberal e militarista são intrínsecas à sua natureza de integração capitalista, indissociável no plano institucional de soluções federalistas. Cada nova etapa e avanço deste processo consolidam um poder político e económico favorável ao grande capital e às grandes potências e fortalece o seu «super-Estado», para melhor explorar os trabalhadores e os povos, nas suas relações de concorrência e convergência, económicas e políticas, com os outros dois pólos da «Tríade» da globalização capitalista, Japão e EUA. Estes factos consolidam a ideia de que a União Europeia, na sua essência, não é reformável. O PCP, pese a análise e avaliação que faz do processo da integração capitalista europeia, continuará, nas instituições nacionais e comunitárias, nomeadamente no Parlamento Europeu, um intransigente combate pelos interesses nacionais, pelos direitos dos trabalhadores e outras camadas não monopolistas, pela cooperação entre todos povos europeus e por uma relação de paz e cooperação da União Europeia com todos os outros povos do mundo, na perspectiva de outra Europa. Outra Europa não só é possível como necessária. O caminho para outra Europa faz-se e afirma-se no combate intransigente à integração capitalista configurada pela União Europeia. Combatendo cada novo passo no seu aprofundamento federalista, neoliberal e militarista. Apresentando alternativas concretas de ruptura. Trabalhando pela convergência das forças de esquerda e progressistas, pelo esclarecimento e mobilização dos trabalhadores e dos povos, por transformações progressistas e na perspectiva de um futuro socialista para a Europa. A uma União Europeia federal, onde se consolida a assimetria de poder a favor das grandes potências, contrapomos uma Europa de cooperação de Estados e povos, soberanos e iguais em direitos, que respeite a identidade cultural e a independência de Portugal e de todos os países. A uma União Europeia onde prevalecem os interesses do capital e se acentuam as diferenças entre países e as assimetrias regionais e sociais, contrapomos uma Europa dos trabalhadores e de outras camadas laboriosas, que favoreça o desenvolvimento assente na relação sustentável entre natureza e a sociedade e na convergência económica e no progresso social, com o objectivo de coesão de cada país e entre todos os países. A uma União Europeia militarista, bloco político-militar com pretensões imperiais, convergindo estrategicamente com o imperialismo norte-americano, promovendo e alargando a intervenção da aliança agressiva NATO, contrapomos uma Europa empenhada na promoção da paz e desanuviamento no continente europeu e no Mundo e na cooperação para o desenvolvimento com todos os povos do planeta. 2. Situação económica e social O enquadramento da situação económica nacional é inseparável da fase actual do desenvolvimento do capitalismo, com os seus principais traços, tendências e contradições. As relações económicas externas do país - fluxos de capitais, mercadorias, bens e serviços, e posições nas estruturas de regulação económica mundial - são crescentemente condicionadas pela integração comunitária e também por outros centros de articulação supranacional do imperialismo. Condicionamento reforçado pela colaboração activa de sucessivos governos do PSD e PS, com uma evolução da União Europeia que conflitua com o necessário desenvolvimento do país, na completa submissão às orientações económicas comunitárias e na total abdicação e ausência de afirmação de uma estratégia de defesa dos interesses e soberania nacionais. Três vectores no actual quadro comunitário conflituam de forma cada vez mais determinante com a economia nacional e o próprio futuro do país, a sua independência e soberania nacionais: o acentuar da configuração federal sob o comando político e económico das grandes potências; a consolidação da zona euro e da sua gestão pelo BCE; e o domínio das políticas e orientações neoliberais estruturantes da Estratégia de Lisboa. A acentuada e crescente dependência estrutural externa, bem patente no elevado endividamento líquido externo (90% do PIB em 2007) e na importância do capital transnacional no tecido económico português, nomeadamente através da subcontratação e do peso na estrutura accionista de empresas e sectores estratégicos (EDP, 48%, PT, 64%, GALP, 50%, CIMPOR, 30%, BCP, 36% e outras, como a BRISA, SEMAPA, BES, BPI, SOMAGUE), é outro factor que conflitua com a independência e soberania nacionais, agravando a vulnerabilidade face a centros de decisão estrangeiros/capital transnacional. O crescente federalismo das instituições comunitárias reduz, ou mesmo anula, a capacidade para influenciar a condução das políticas económicas por parte dos países como Portugal, como sucede no comércio externo da União Europeia, nomeadamente na OMC em torno da agricultura e do sector têxtil. A União Económica e Monetária (UEM), com a perda das políticas monetária e cambial, com as limitações impostas à política orçamental, pela sua submissão aos critérios de convergência nominal no Pacto de Estabilidade, a estrita política monetarista levada a cabo pelo Banco Central Europeu (BCE) por um euro fortemente valorizado e a gestão da taxa de juro nessa óptica, e com o objectivo máximo da estabilidade dos preços/moderação salarial, constituiu um fortíssimo constrangimento para uma economia com as debilidades da portuguesa. A última versão da «Estratégia de Lisboa», reforçando os seus fundamentos neoliberais de privatização e liberalização de serviços públicos, sectores estratégicos e do mercado de trabalho, a negociação da agenda neoliberal da OMC e de vários tratados comerciais bilaterais pela União Europeia e, em geral, as orientações respeitantes à Política Agrícola Comum (PAC) e Política Comum das Pescas (PCP), amplia os problemas e fragilidades da economia nacional e acentuam a sua dependência e défices estruturais. O processo de alargamento da União Europeia, já realizado ou em curso, a países com uma mão-de-obra mais barata e mais qualificada, veio reforçar a falência da estratégia de sucessivos governos de fazer de Portugal localização privilegiada de unidades produtivas de trabalho intensivo, assentes em baixos salários e de baixo valor acrescentado. Um processo que se adiciona e converge com outras políticas comunitárias para uma divisão do trabalho no espaço europeu altamente desvantajosa para o país, com crescente e negativo impacto na economia nacional, cada vez mais periférica e «iberizada». A deslocalização de empresas do sector produtivo, acompanhada crescentemente pela deslocalização de serviços, causam não só graves problemas sociais (desemprego, encargos para a segurança social), como tem contribuído para a perda de importantes unidades produtivas. Esta situação, para além de criar sérios constrangimentos ao desenvolvimento económico do país - em particular pela extrema dependência externa da economia nacional e pela condução, através de órgãos comunitários ou entidades ditas independentes, como o BCE, de determinantes políticas (agrícola, pescas e outras) que defendem interesses e objectivos das grandes potências europeias e do grande capital europeu -, estabelece a perda ou limitações drásticas, no âmbito do uso de importantes instrumentos económicos como a moeda, a taxa de câmbio, as taxas de juro, a gestão orçamental e o comércio externo. Estes condicionamentos e limitações exigem a afirmação clara e inequívoca da soberania nacional como princípio inalienável da inserção e relacionamento de Portugal na Europa e no Mundo, nomeadamente na reconsideração do enquadramento e integração da economia portuguesa no âmbito da UE e suas determinações. A sociedade portuguesa tem hoje uma estrutura económico-social determinada pela ditadura dos grupos económicos monopolistas associados ao capital transnacional. Uma poderosa oligarquia financeira (associada a outros sectores da grande burguesia portuguesa e estrangeira) assegura, através da titularidade desses grupos a continuidade, reprodução e expansão do seu poder político, económico, social e ideológico, exercendo o que configura um autêntico poder absoluto sobre a generalidade das outras camadas sociais e sob diversos ângulos. Estruturados e representados por grupos familiares velhos conhecidos (que suportaram e apoiaram a ditadura fascista) ou que despontaram com a contra-revolução, tecem entre si, e com o capital estrangeiro, uma densa rede de ligações económicas e financeiras, sociais e políticas. Trinta e quatro anos depois das transformações revolucionárias de Abril, esse conjunto de grupos económicos, resultante da política de recuperação capitalista e monopolista, tem um papel dominante e determinante no quadro das relações de produção capitalista da sociedade portuguesa. Existem em Portugal 139 grandes grupos económicos, 78% dos quais criados nos últimos 18 anos, em resultado directo do processo de privatização e consequente restauração dos grandes grupos monopolistas. As operações de privatização efectuadas nas duas últimas décadas pelos vários governos fizeram regressar às mãos do sector privado, em condições altamente vantajosas, sectores estratégicos como a banca, seguros, energia, telecomunicações, transportes colectivos rodoviários, cimentos, pasta de papel e sector químico. Sucessivos aumentos de capital reforçaram a presença do grande capital nacional e abriram portas a capital estrangeiro. A análise dos maiores grupos económicos nacionais no final de 2005, mostra-nos que dos doze grupos com lucros mais elevados, com um valor superior a 250 milhões de euros, apenas dois se encontram ligados predominantemente à actividade produtiva de bens transaccionáveis (cimentos - Cimpor e papel - Semapa). Este conjunto de grupos económicos, ao mesmo tempo que o PIB crescia a um ritmo médio de apenas 1,3% entre 2004 e 2007, viu os seus lucros aumentarem de 75%, atingindo os 6,8 mil milhões de euros - 4,2% do PIB. A evolução tão díspar entre os grandes grupos económicos e o restante tecido produtivo nacional, espelha uma das características mais marcantes da evolução desigual da nossa economia nos últimos anos - enquanto o sector produtivo fornecedor dos chamados bens transaccionáveis vem evoluindo a ritmos de crescimento muito baixos, quase nulos, o sector dos bens não transaccionáveis - financeiro, energia, imobiliário, telecomunicações, serviços - cresce a ritmos elevados, reproduzindo lucros sobre lucros. Esta terciarização da economia nacional tem também profundos impactos ao nível do emprego com a destruição continuada de postos de trabalho no sector dos bens transaccionáveis. Com um poder fortemente monopolista sobre um conjunto de sectores e áreas estratégicas para o país e para o restante tecido económico, e particularmente activos nas operações de privatização do que resta do Sector Empresarial do Estado, estes grupos vêem reforçada esta natureza monopolista, quer pela destruição e absorção de concorrentes nacionais, quer por associações em que cruzam participações e/ou repartição de mercados e concertação de preços, quer pela aliança privilegiada com poderosas transnacionais. É também significativo a sua profunda articulação com o capital transnacional, através da posse de grande parte dos activos - em muitos casos superior a 50% da estrutura accionista - dos grandes grupos económicos nacionais por parte de capitais estrangeiros. Uma situação que é insustentável, já que coloca a economia portuguesa nas mãos dos capitais externos e, no limite, põe em causa a soberania nacional. Os acordos de exclusividade promovidos pelo Governo com algumas multinacionais, como sucedeu com a Microsoft, com a compra de software para os sectores públicos, reforçam essa dependência. A extraordinária dimensão e poder económico actual destes grupos capitalistas e monopolistas consolida-se e desenvolve-se em permanente articulação, cumplicidade e promiscuidade com o poder político e os partidos que o exercem desde 1976 - PS, PSD e CDS-PP. O poder económico remunera-se através dos dividendos, lucros e vencimentos fabulosos dos seus representantes, o poder político através dos vencimentos e privilégios da sua clientela e dos negócios lícitos ou até ilícitos) que a sua presença na administração desses grupos, conjugada com o poder político que detêm, lhes vão proporcionando. A utilização do Estado, nomeadamente da sua componente legislativa, como instrumento de reforço do domínio dos grupos monopolistas e do capital transnacional, explica a ampla produção legislativa da Assembleia da República e dos governos, destinada a consagrar os seus interesses de classe, designadamente através do desequilíbrio, a favor do grande patronato, das relações laborais e níveis salariais, da condução das políticas orçamental e fiscal, do favorecimento dos mecanismos de transferência de rendimento e mercados dos micro, pequenos e médios empresários para esses grupos, e da apropriação de património e mercados públicos, com as privatizações e liberalizações feitas à medida das capacidades de encaixe desses grupos. A generalidade dos grandes grupos económicos possui hoje imensas capacidades e instrumentos para o exercício de um efectivo poder ideológico, através de meios para a produção e transmissão, directa e indir

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