Passos Coelho tropeçou num dia normal

25-03-2011
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Se Sócrates caiu por falta de confiança dos mercados, a incoerência de Passos não vai suprir essa necessidade

No dia a seguir à queda do Governo aconteceu quase tudo o que se previa: os juros da dívida pública mantiveram a sua trajectória de subida, as agências de notação agravaram ou prometeram agravar o rating da República e os parceiros do euro voltaram a pressionar o Governo para que recorra à ajuda do fundo de socorro do euro e do FMI. O que houve de diferente não veio por isso do temido colapso do mercado, mas do desnorte do PSD. Em menos de um ano, Pedro Passos Coelho esqueceu-se do que tinha dito sobre as "injustiças" do IVA e estatelou-se. Preferir impostos sobre o consumo em detrimento das taxas sobre o rendimento é uma opção que apenas vem provar que o programa do PSD para a crise não é, nem pode ser, diferente do apresentado pelo PS. Sem conseguir as reformas constitucionais que permitiriam rever os encargos do Estado com políticas públicas como as da Educação ou da Saúde, Passos Coelho e seus pares sabem que só têm a manta dos impostos para cobrir o défice. Depois, em vésperas de uma cimeira europeia onde Portugal iria aparecer como o parente pobre do euro, percebe-se que Passos Coelho tenha sentido necessidade de abrir o jogo e de tentar apaziguar a impaciência europeia com medidas concretas para fazer esquecer o chumbo do PEC. Mas teve todo o tempo do mundo para não cair no inacreditável vaivém sobre o IVA. Por distracção ou amnésia, não o fez, pelo que, se o mundo não ruiu ontem, o PSD sofreu com a incoerência um abalo sísmico. Anteontem, na AR, Manuela Ferreira Leite afirmou que o Governo caía por não gerar confiança aos mercados; convenhamos que piruetas como as de Passos não têm o dom de suprir essa necessidade.

Líbia, o avesso da insurreição egípcia

No Egipto, imitando a Tunísia, a revolta espalhou-se pelas comunicações: as redes sociais, os telemóveis, a Internet, substituíram com eficácia as armas letais, e foram elas que permitiram as avassaladoras concentrações populares e a queda do regime. Mas, esmaecidas já as esperanças iniciais num "dominó árabe" que fizesse cair regimes ditatoriais e corruptos com o mínimo derrame de sangue, na Líbia vive-se hoje o avesso dessa miragem "tecnológica": no terreno, enquanto se abatem aviões e se bombardeiam alvos com duvidosa eficácia, as comunicações primam pela ausência. Como escreve hoje o nosso enviado, Paulo Moura, a partir de Bengasi, as duas únicas operadoras de telemóveis líbias deixaram de funcionar, não há linhas de telefone terrestres nem Internet (com raras excepções) e já ninguém, entre os combatentes, sabe exactamente onde acaba o território amigo e começa o inimigo. No meio deste caos, ecoam ainda nos nossos ouvidos as declarações de Khadafi, ao dizer não que estaria disposto a morrer pela Líbia ou pelo seu povo, mas sim que o seu povo (homens, mulheres e até crianças) estão dispostos a morrer por ele. O que, em breve síntese, diz bem do seu carácter. A verdade é que o mundo tem pela frente uma guerra que lhe vai sair cara.

Se Sócrates caiu por falta de confiança dos mercados, a incoerência de Passos não vai suprir essa necessidade

No dia a seguir à queda do Governo aconteceu quase tudo o que se previa: os juros da dívida pública mantiveram a sua trajectória de subida, as agências de notação agravaram ou prometeram agravar o rating da República e os parceiros do euro voltaram a pressionar o Governo para que recorra à ajuda do fundo de socorro do euro e do FMI. O que houve de diferente não veio por isso do temido colapso do mercado, mas do desnorte do PSD. Em menos de um ano, Pedro Passos Coelho esqueceu-se do que tinha dito sobre as "injustiças" do IVA e estatelou-se. Preferir impostos sobre o consumo em detrimento das taxas sobre o rendimento é uma opção que apenas vem provar que o programa do PSD para a crise não é, nem pode ser, diferente do apresentado pelo PS. Sem conseguir as reformas constitucionais que permitiriam rever os encargos do Estado com políticas públicas como as da Educação ou da Saúde, Passos Coelho e seus pares sabem que só têm a manta dos impostos para cobrir o défice. Depois, em vésperas de uma cimeira europeia onde Portugal iria aparecer como o parente pobre do euro, percebe-se que Passos Coelho tenha sentido necessidade de abrir o jogo e de tentar apaziguar a impaciência europeia com medidas concretas para fazer esquecer o chumbo do PEC. Mas teve todo o tempo do mundo para não cair no inacreditável vaivém sobre o IVA. Por distracção ou amnésia, não o fez, pelo que, se o mundo não ruiu ontem, o PSD sofreu com a incoerência um abalo sísmico. Anteontem, na AR, Manuela Ferreira Leite afirmou que o Governo caía por não gerar confiança aos mercados; convenhamos que piruetas como as de Passos não têm o dom de suprir essa necessidade.

Líbia, o avesso da insurreição egípcia

No Egipto, imitando a Tunísia, a revolta espalhou-se pelas comunicações: as redes sociais, os telemóveis, a Internet, substituíram com eficácia as armas letais, e foram elas que permitiram as avassaladoras concentrações populares e a queda do regime. Mas, esmaecidas já as esperanças iniciais num "dominó árabe" que fizesse cair regimes ditatoriais e corruptos com o mínimo derrame de sangue, na Líbia vive-se hoje o avesso dessa miragem "tecnológica": no terreno, enquanto se abatem aviões e se bombardeiam alvos com duvidosa eficácia, as comunicações primam pela ausência. Como escreve hoje o nosso enviado, Paulo Moura, a partir de Bengasi, as duas únicas operadoras de telemóveis líbias deixaram de funcionar, não há linhas de telefone terrestres nem Internet (com raras excepções) e já ninguém, entre os combatentes, sabe exactamente onde acaba o território amigo e começa o inimigo. No meio deste caos, ecoam ainda nos nossos ouvidos as declarações de Khadafi, ao dizer não que estaria disposto a morrer pela Líbia ou pelo seu povo, mas sim que o seu povo (homens, mulheres e até crianças) estão dispostos a morrer por ele. O que, em breve síntese, diz bem do seu carácter. A verdade é que o mundo tem pela frente uma guerra que lhe vai sair cara.

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