Da Literatura: NOTAS SOBRE O CRASH

31-05-2010
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No domingo 9 de Maio, o euro sofreu o maior ataque desde a sua criação. Para o que nos aflige, interessa pouco se o ataque veio da China, principal credor da dívida americana (e, nessa medida, tutor do dólar). Um euro forte será sempre uma dor de cabeça em Pequim. Adiante.Na tarde e noite de 9 de Maio, Portugal festejava o Benfica (ver imagem), indiferente ao destino da moeda única, que esteve por um triz até às 7 ou 8 da manhã de segunda-feira, dia 10. Os media omitiram a realidade, a classe política idem, o governo assobiou para o lado, e o Presidente da República portou-se como a rainha de Inglaterra. No dia seguinte chegou o Papa: um terço do país empanturrou-se de hóstias; outro terço foi para banhos; o último terço ficou a ranger os dentes com a beatice estatal.Só no dia 13, após o conselho de ministros dessa quinta-feira, o ministro das Finanças anunciou, sob indiferença geral, um plano de austeridade. Soube-se então que Sócrates e Passos Coelho tinham estado juntos na véspera a acertar detalhes. E que economistas do PS e do PSD tinham estado reunidos até de manhã a negociar o paper. Ninguém se comoveu. A coisa só começou a apimentar quando a oposição julgou ter descoberto o carácter retroactivo das taxas adicionais de IRS, sem levar em linha de conta a média ponderada das referidas taxas, indexadas a 7/12 avos.Much Ado About Nothing... diria o homem de Stratford-upon-Avon se fosse vivo. Afinal, as referidas medidas só depois de amanhã, 2 de Junho, começam a ser discutidas na Assembleia da República.Conviria, porém, reter o seguinte. A sucessão de declarações, entrevistas, dicas, despachos, contra-despachos, desmentidos e correcções de membros do governo e de dirigentes do PS e do PSD (uns e outros obrigados à parcimónia de Estado), em nada ajudou. Pelo contrário. Os líderes do CDS-PP, do PCP e do BE podem dar pinotes porque não se comprometeram com nada. O PSD tem outras obrigações. Até pode rasgar o acordo obtido na manhã do dia 13. Não pode é jogar em todos os tabuleiros. Se depender do Presidente da República, não haverá eleições antes de Novembro/Dezembro do próximo ano (e, se calhar, não antes da Primavera de 2012).Razão acrescida para estranhar o silêncio de Cavaco. Por razões que se prendem com a sua reeleição, não quer mexidas no status quo. Mas até por isso devia falar ao país, explicando a necessidade das medidas de austeridade. A maioria das pessoas não acompanha a imprensa estrangeira e não percebe os trambolhões da moeda única. Teixeira dos Santos pode dar uma dúzia de entrevistas a dizer que é a sobrevivência do modelo europeu que impõe que façamos o que já fizeram a Irlanda, a Grécia, a Espanha, o Reino Unido, a Itália, a Alemanha e a França, que ninguém se comove. Tem de ser o Presidente da República a fazê-lo, em comunicação formal. Isto na hipótese de continuar a acreditar nas virtudes da cooperação estratégica. Caso contrário, mais valia tirar o tapete ao governo. Tinha a vantagem de ser claro.[Foto: Jumento.]Etiquetas: Dívida pública

No domingo 9 de Maio, o euro sofreu o maior ataque desde a sua criação. Para o que nos aflige, interessa pouco se o ataque veio da China, principal credor da dívida americana (e, nessa medida, tutor do dólar). Um euro forte será sempre uma dor de cabeça em Pequim. Adiante.Na tarde e noite de 9 de Maio, Portugal festejava o Benfica (ver imagem), indiferente ao destino da moeda única, que esteve por um triz até às 7 ou 8 da manhã de segunda-feira, dia 10. Os media omitiram a realidade, a classe política idem, o governo assobiou para o lado, e o Presidente da República portou-se como a rainha de Inglaterra. No dia seguinte chegou o Papa: um terço do país empanturrou-se de hóstias; outro terço foi para banhos; o último terço ficou a ranger os dentes com a beatice estatal.Só no dia 13, após o conselho de ministros dessa quinta-feira, o ministro das Finanças anunciou, sob indiferença geral, um plano de austeridade. Soube-se então que Sócrates e Passos Coelho tinham estado juntos na véspera a acertar detalhes. E que economistas do PS e do PSD tinham estado reunidos até de manhã a negociar o paper. Ninguém se comoveu. A coisa só começou a apimentar quando a oposição julgou ter descoberto o carácter retroactivo das taxas adicionais de IRS, sem levar em linha de conta a média ponderada das referidas taxas, indexadas a 7/12 avos.Much Ado About Nothing... diria o homem de Stratford-upon-Avon se fosse vivo. Afinal, as referidas medidas só depois de amanhã, 2 de Junho, começam a ser discutidas na Assembleia da República.Conviria, porém, reter o seguinte. A sucessão de declarações, entrevistas, dicas, despachos, contra-despachos, desmentidos e correcções de membros do governo e de dirigentes do PS e do PSD (uns e outros obrigados à parcimónia de Estado), em nada ajudou. Pelo contrário. Os líderes do CDS-PP, do PCP e do BE podem dar pinotes porque não se comprometeram com nada. O PSD tem outras obrigações. Até pode rasgar o acordo obtido na manhã do dia 13. Não pode é jogar em todos os tabuleiros. Se depender do Presidente da República, não haverá eleições antes de Novembro/Dezembro do próximo ano (e, se calhar, não antes da Primavera de 2012).Razão acrescida para estranhar o silêncio de Cavaco. Por razões que se prendem com a sua reeleição, não quer mexidas no status quo. Mas até por isso devia falar ao país, explicando a necessidade das medidas de austeridade. A maioria das pessoas não acompanha a imprensa estrangeira e não percebe os trambolhões da moeda única. Teixeira dos Santos pode dar uma dúzia de entrevistas a dizer que é a sobrevivência do modelo europeu que impõe que façamos o que já fizeram a Irlanda, a Grécia, a Espanha, o Reino Unido, a Itália, a Alemanha e a França, que ninguém se comove. Tem de ser o Presidente da República a fazê-lo, em comunicação formal. Isto na hipótese de continuar a acreditar nas virtudes da cooperação estratégica. Caso contrário, mais valia tirar o tapete ao governo. Tinha a vantagem de ser claro.[Foto: Jumento.]Etiquetas: Dívida pública

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