Da destruição do tecido produtivo teatral à posição do BE

29-06-2011
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Os resultados dos modelos podem comparar-se entre companhias residentes e salas de acolhimento

Há muitos anos, em nome da integração e medidas da União Europeia, a destruição de grande parte do tecido produtivo português e mesmo o desmantelamento da agricultura e das pescas (até subsídios houve ao abate de barcos de frota pesqueira!) foram reduzindo Portugal a um "país de serviços". Facto que hoje está integrado no discurso político generalizado (mesmo entre quem promoveu essa mesma política) como uma prioridade e necessidade de inversão para que, ao menos ao nível de uma economia de auto-subsistência e factor de dinamização económica, se passe à recuperação da agricultura e das pescas e ao apoio (indirecto por via de incentivos fiscais, ou mesmo directos na criação ou manutenção de postos de trabalho) a unidades de produção industrial.

Ora, com o teatro passou-se o mesmo, mas com sinais muito preocupantes nos últimos anos. Enquanto simultaneamente cresceram como cogumelos projectos megalómanos e máquinas burocráticas enormes para Ministérios da Cultura com menos de metade de orçamento real para a actividade do que tinha uma secretaria de Estado dependente do primeiro-ministro, solução esta que aqui defendi há muito como modelo mais adequado, sobretudo em época de contracção da despesa pública.

O "ataque" iniciou-se em 2001 com a extinção da Companhia do Teatro Nacional Dona Maria II, ao mesmíssimo tempo em que um célebre despacho de atribuição de financiamentos a privados (com supostos cadernos de encargos de serviço público, mas tudo passado na mais profunda subjectividade e "proximidades") pelo Instituto Português das Artes do Espectáculo provocou uma tremenda zaragata no próprio seio do teatro português, acabando com a condenação do Estado - uns sete ou oito anos mais tarde - no Supremo Tribunal Administrativo, confirmando as irregularidades, arbitrariedades e mesmo ilegalidades cometidas pela então presidente (dr.ª Ana Marin) desse organismo, que, mais coisa, menos coisa, foi mudando de nomes até hoje ser uma Direcção-Geral das Artes (DGArtes).

Depois veio (desde a entrada de Diogo Infante no D. Maria e a saída de Ricardo Pais do São João), a recondução dos dois Teatros Nacionais a cada vez mais espaço de acolhimento e co-produções, com rara ou nula produção própria, aumentando o deficit financeiro de par com a destruição de postos de trabalho!

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A rematar o bouquet, nos concursos da DGArtes, para 2011 e 2012, surge o alargamento ao apoio das redes de teatros e cineteatros, deslocando o eixo de apoios à criação e produção artísticas para o acolhimento, ao mesmo tempo que se prosseguiu com a dispersão de verbas por mais "grupos de vão de escada" (sem público, esteticamente iguais entre si e, por vezes, numa promiscuidade de as mesmas pessoas fazerem parte de vários!), em detrimento da racionalização de recursos junto de unidades de produção sólidas, economicamente sustentáveis com outros apoios e de resultados mensuráveis (em direcção aos públicos) para lá da mera apreciação de gosto dos decisores. A "desculpa" é a promoção da "circulação" por essa rede; o objectivo, em verdade, é controlar a própria produção, com verbas cada vez mais minguadas, na lógica dos "programadores" numa política totalitária de gosto único, de onde, certamente por mera coincidência, vem o actual director da DGArtes.

Os resultados dos modelos podem comparar-se entre companhias residentes (como é o caso daquela em que trabalho, em Viana, mas também várias outras, como Almada, por exemplo) e salas de acolhimento, como a de Guimarães, tida por "emblemática", em que a influência sobre os hábitos culturais da população (conforme estudo universitário) é nula, apenas gerando a repetição "fechada" de circuitos de públicos estagnados em número e formação de massa crítica local e "artistas" sem capacidade de produzir pensamento próprio, repetindo-se também entre si na "criação".

Estranho é que o Bloco de Esquerda, nas medidas que apresentou como directrizes para o teatro no seu "programa" para a Cultura, tenha valorizado o reforço de apoio à rede de teatros e cineteatros sem uma única palavra sobre a produção. Será que também concorda com a demais extinção do tecido produtivo nacional, aplaudindo o encerramento de fábricas, o desaparecimento do comércio tradicional, a destruição da frota pesqueira e o abandono da agricultura? Ou então temos "caixinha" com gato escondido com o rabo de fora. Encenador (castroguedes9@gmail.com)

Os resultados dos modelos podem comparar-se entre companhias residentes e salas de acolhimento

Há muitos anos, em nome da integração e medidas da União Europeia, a destruição de grande parte do tecido produtivo português e mesmo o desmantelamento da agricultura e das pescas (até subsídios houve ao abate de barcos de frota pesqueira!) foram reduzindo Portugal a um "país de serviços". Facto que hoje está integrado no discurso político generalizado (mesmo entre quem promoveu essa mesma política) como uma prioridade e necessidade de inversão para que, ao menos ao nível de uma economia de auto-subsistência e factor de dinamização económica, se passe à recuperação da agricultura e das pescas e ao apoio (indirecto por via de incentivos fiscais, ou mesmo directos na criação ou manutenção de postos de trabalho) a unidades de produção industrial.

Ora, com o teatro passou-se o mesmo, mas com sinais muito preocupantes nos últimos anos. Enquanto simultaneamente cresceram como cogumelos projectos megalómanos e máquinas burocráticas enormes para Ministérios da Cultura com menos de metade de orçamento real para a actividade do que tinha uma secretaria de Estado dependente do primeiro-ministro, solução esta que aqui defendi há muito como modelo mais adequado, sobretudo em época de contracção da despesa pública.

O "ataque" iniciou-se em 2001 com a extinção da Companhia do Teatro Nacional Dona Maria II, ao mesmíssimo tempo em que um célebre despacho de atribuição de financiamentos a privados (com supostos cadernos de encargos de serviço público, mas tudo passado na mais profunda subjectividade e "proximidades") pelo Instituto Português das Artes do Espectáculo provocou uma tremenda zaragata no próprio seio do teatro português, acabando com a condenação do Estado - uns sete ou oito anos mais tarde - no Supremo Tribunal Administrativo, confirmando as irregularidades, arbitrariedades e mesmo ilegalidades cometidas pela então presidente (dr.ª Ana Marin) desse organismo, que, mais coisa, menos coisa, foi mudando de nomes até hoje ser uma Direcção-Geral das Artes (DGArtes).

Depois veio (desde a entrada de Diogo Infante no D. Maria e a saída de Ricardo Pais do São João), a recondução dos dois Teatros Nacionais a cada vez mais espaço de acolhimento e co-produções, com rara ou nula produção própria, aumentando o deficit financeiro de par com a destruição de postos de trabalho!

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A rematar o bouquet, nos concursos da DGArtes, para 2011 e 2012, surge o alargamento ao apoio das redes de teatros e cineteatros, deslocando o eixo de apoios à criação e produção artísticas para o acolhimento, ao mesmo tempo que se prosseguiu com a dispersão de verbas por mais "grupos de vão de escada" (sem público, esteticamente iguais entre si e, por vezes, numa promiscuidade de as mesmas pessoas fazerem parte de vários!), em detrimento da racionalização de recursos junto de unidades de produção sólidas, economicamente sustentáveis com outros apoios e de resultados mensuráveis (em direcção aos públicos) para lá da mera apreciação de gosto dos decisores. A "desculpa" é a promoção da "circulação" por essa rede; o objectivo, em verdade, é controlar a própria produção, com verbas cada vez mais minguadas, na lógica dos "programadores" numa política totalitária de gosto único, de onde, certamente por mera coincidência, vem o actual director da DGArtes.

Os resultados dos modelos podem comparar-se entre companhias residentes (como é o caso daquela em que trabalho, em Viana, mas também várias outras, como Almada, por exemplo) e salas de acolhimento, como a de Guimarães, tida por "emblemática", em que a influência sobre os hábitos culturais da população (conforme estudo universitário) é nula, apenas gerando a repetição "fechada" de circuitos de públicos estagnados em número e formação de massa crítica local e "artistas" sem capacidade de produzir pensamento próprio, repetindo-se também entre si na "criação".

Estranho é que o Bloco de Esquerda, nas medidas que apresentou como directrizes para o teatro no seu "programa" para a Cultura, tenha valorizado o reforço de apoio à rede de teatros e cineteatros sem uma única palavra sobre a produção. Será que também concorda com a demais extinção do tecido produtivo nacional, aplaudindo o encerramento de fábricas, o desaparecimento do comércio tradicional, a destruição da frota pesqueira e o abandono da agricultura? Ou então temos "caixinha" com gato escondido com o rabo de fora. Encenador (castroguedes9@gmail.com)

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