Silva Peneda e os nove trabalhos "do Hércules europeu"

10-02-2016
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A sucessão de crises não tem deixado Bruxelas respirar. A crise do euro, das dívidas soberanas e das profundas desigualdades na Zona Euro estava longe de ser resolvida quando foi ultrapassada pela vaga de milhares de refugiados e migrantes.

Por solucionar ainda a emergência humanitária, eis que a União Europeia tem de enfrentar, de novo, a luta contra o terrorismo. Pelo meio, uma outra ameaça real: a do adeus do Reino Unido.

Estão as instituições europeias a não acompanhar a vertigem dos acontecimentos e a serem constantemente ultrapassadas? Como podem voltar a ser reactivas?

José da Silva Peneda é, desde Junho, “principal adviser” para políticas sociais do presidente da Comissão Europeia, Jean Claude Juncker. Não concorda com uma análise que menorize a capacidade de diagnóstico e reacção desta Europa. Outra coisa é reconhecer as dificuldades.

A partir do seu posto de observação em Bruxelas, o ex-presidente do Conselho Económico e Social (CES), elenca no programa da Renascença “Conversas Cruzadas” os grandes desafios a enfrentar pela Europa e lamenta que em Portugal não seja suficientemente conhecido o diagnóstico/receita para debelar a crise – documento comum às cinco instituições europeias mais decisivas.

Mas para lá chegar, José Silva Peneda começa pelo início. Aqui o princípio é mesmo listar os problemas do momento: “Seleccionei nove grandes desafios, alguns com origem externa e outros quatro que decorrem de problemas internos”.

“O primeiro: os milhões de refugiados que estão a chegar à Europa e que aqui procuram viver. Segundo as relações com a Rússia. Terceiro: as consequências da tribulação financeira da China. Quarto: o papel da Europa no tema das alterações climáticas. E finalmente, em quinto, o acordo transatlântico. São cinco enormes desafios que a Europa tem de enfrentar”, aponta o economista.

“No plano interno, a União Europeia tem também problemas complicados, desde logo, o referendo britânico que está já à porta. A política de segurança que está relacionada com a consolidação do espaço Schengen”, nota ainda.

“Depois, o relacionamento do investimento com a criação de emprego. Por último, e para mim, o mais decisivo de todos, um desafio da mais absoluta necessidade: o da Zona Euro voltar a ser um espaço de convergência”, sublinha o adjunto de Juncker.

“Há um aspecto que é comum a todos estes desafios: qualquer deles exige duas condições para uma abordagem séria e eficaz. E aqui surgem logo as primeiras dificuldades”, sublinha.

“Primeiro que cada um destes desafios disponha de uma clara visão estratégica de médio prazo. Pensar a política com base no médio prazo, sendo muito necessário, não é um método vulgar nos tempos que correm”, reconhece.

“Para a resolução destes problemas têm, em segundo lugar, de estar assegurados valores de solidariedade entre os vários interesses em presença. Sabemos que hoje mobilizar esses valores é uma tarefa hercúlea”, é a imagem escolhida.

“A questão dos refugiados é um exemplo, mas focando na questão da convergência – que é aquela que nos toca mais de perto – eu diria que a Comissão fez um trabalho notável”, sublinha Silva Peneda.

“Zona Euro deixou de ser máquina de convergência”

“Há um documento assinado pelos cinco presidentes das instituições europeias – a saber Comissão Europeia, Parlamento Europeu, Eurogrupo, Banco Central Europeu e Conselho Europeu – em que se reconhece que a Zona Euro deixou de ser ‘aquela máquina’ de convergência”, diz Silva Peneda.

“Um documento onde se define uma estratégia de curto, longo e médio prazo para que a Zona Euro possa ser objecto dessa convergência. Até agora nunca ninguém tinha feito um trabalho desta natureza”, salienta.

Manuel Carvalho da Silva contrapõe: “Ninguém institucionalmente tinha assumido, porque essa é a questão que tem vindo a ser debatida desde sempre. Mas dou relevo a isso, ao que foi feito”, faz notar o sociólogo.

“Cinco presidentes virem reconhecer que a Zona Euro está inacabada, que isto tem corrido mal – é um dado reconhecido no relatório – e define uma estratégia a médio longo prazo, seleccionando medidas políticas objectivas, é um dado que deve ser destacado como algo de muito importante, sublinhando o mérito desta Comissão”, observa o antigo presidente do CES, o órgão constitucional de consulta e concertação na área económica e social.

Manuel Carvalho da Silva reconhece “mérito ao diagnóstico”, mas não deixa “de lembrar aquelas imagens do final do apartheid com o sr. de Klerk ao lado de Nelson Mandela. A constatação merece relevo, mas deve ser aproveitada para lembrar que há um combate de boa parte da sociedade europeia para o abandono da via que tem sido seguida”.

“Mas não deixo de saudar o facto do Dr. Silva Peneda aqui ter trazido esta constatação. Estou também de acordo com a lista de desafios internos e externos que o Dr. Peneda elencou, mas sublinho que a luta pela convergência coloca em causa uma visão dicotómica da União Europeia que tem sido seguida até aqui”, sublinha o professor da Universidade de Coimbra. “É pena que a Sra. Merkel tenha sido a porta-voz de um caminho dicotómico”, nota Manuel Carvalho da Silva

“Sem euro, cai o projecto europeu”

Silva Peneda retoma o documento “dos presidentes”. “O próprio relatório diz taxativamente que, se a Zona Euro não entrar num caminho de convergência o euro cai. A sra. Merkel – insuspeita – disse que se o euro cair, cai também o projecto europeu. Portanto, estamos a falar de um assunto extremamente grave e de enorme importância”, diz o antigo ministro.

“Eu estou a falar para o futuro. Tantas vezes, aqui na Renascença, critiquei a forma como foi tratada a crise financeira. Isso é conhecido, mas em termos de futuro, a solidariedade das cinco instituições europeias é total e no sentido de resolver um problema vital para a continuidade do projecto europeu”, acentua Silva Peneda.

“Há todo um conjunto de afirmações no sentido de que há hoje um risco político grave. Se este problema da convergência não for resolvido é toda a concepção do projecto europeu que está em causa”, alerta.

“As cinco instituições chave acertaram um documento que em Portugal não tem sido falado, não é muito conhecido, mas que define uma estratégia muito coerente e objectiva. Uma estratégia no sentido de se caminhar em direcção a uma união financeira, monetária, fiscal, bancária e política”, nota.

“Elementos que devem ser sempre interdependentes e, só aí, é que haverá uma verdadeira monetária. Também tem a ver com a dívida. Mas o caminho é no sentido de acabar uma obra que está inacabada”, afirma.

“É um projecto coerente. Estou relativamente confiante que perante as dificuldades, de visões diferentes, entre os vários estados, as instituições europeias estão empenhadas em ter sucesso”, diz Silva Peneda.

Silva Peneda: “A Portugal falta o SBCI da Irlanda”

E na semana em que o BCE anunciou mais um pacote de medidas de estímulo ao crescimento económico, mas a desapontar os mercados, como reconduzir países como Portugal no trajecto do crescimento económico? Como voltar a fazer chegar o dinheiro às empresas e não apenas aos ‘mercados’?

Silva Peneda vê na Irlanda a concretização prática de um conceito que lhe (é) era caro. “Julgo que em Portugal – e noutros países da Europa – falta um mecanismo que eu, há tempos, já tinha previsto”, afirma o economista.

“Há anos tive em Portugal a ideia criação de um Banco de Fomento, ideia que foi desvirtuada, a última versão conhecida não é nada daquilo que eu tinha pensado”, nota Silva Peneda.

“Vim a encontrar essa minha ideia concretizada em pleno na República da Irlanda. A Irlanda tem o SBCI – Strategic Banking Corporation of Ireland – em que os fundadores são o BEI – Banco Europeu de Investimento – e o KfW, o maior banco público alemão”.

“Exactamente nos termos do que havia proposto ao ministro Vítor Gaspar e que ele aceitou muito bem. O SBCI trabalha com a banca comercial e tem feito um trabalho fantástico. Em que sentido? Concedendo às empresas empréstimos a muito longo prazo. A banca comercial não concede empréstimos a 10 e 20 anos”, sublinha Silva Peneda.

“Nós precisamos de instituições que emprestem às empresas a 20 anos e com taxas de juro muito razoáveis e com períodos de carência nos primeiros três, quatro e cinco anos. Temos um problema de escassez de capital próprio nas empresas e quando se empresta a 20 anos pode-se colocar como condição que as empresas reforcem os seus capitais próprios”, nota.

“Vejo que a banca quando concede empréstimos tem o problema dos seus balanços internos. A banca nacional tem problemas de activos que estão registados por valores complicados”, prossegue.

“Não condeno quem gere esses bancos: é natural que a prioridade seja resolver esses problemas internos. Problemas a sobrar para as empresas que estão entaladas nos balanços desses bancos”, diz.

“Donde não se prioriza na banca o mérito de um projecto, mas a resolução de problemas. Este ciclo não está quebrado. Não acontece só em Portugal, mas também na Europa. Era preciso fazer um grande esforço para se criar verdadeiros bancos de investimento”, alerta Silva Peneda.

“Não conheço o pensamento do novo ministro da Economia Manuel Caldeira Cabral, mas conheço o do ministro Vítor Gaspar quando lhe fiz esta proposta a título pessoal. Uma proposta feita depois de ter tido uma conversa com o governador do Banco de Portugal que a aceitou comigo e até combinou que eu a faria ao ministro das Finanças”, prossegue.

“Ministro que aceitou a ideia e mais: quando deixou o lugar tinha todo um cronograma feito acerca da forma como o banco iria ser criado. Os sócios seriam o BEI e o KfW. A própria Sra. Merkel, quando esteve em Portugal, manifestou o seu apoio à criação de uma instituição deste tipo. Depois as coisas não avançaram dessa maneira”, conclui Silva Peneda.

Carvalho da Silva “Dinheiro tem de chegar às empresas e ao sector público”

Manuel Carvalho da Silva concorda com a tese do antigo ministro e amplia a análise. “Quero reforçar a ideia exposta por José da Silva Peneda a partir de três pressupostos”.

“Primeiro: há dinheiro. Não há falta de liquidez na União Europeia. Há muito dinheiro. Segundo: há um sistema financeiro que não cumpre aquilo que são as missões e em particular esta perspectiva do investimento para um processo de crescimento”, defende.

“O terceiro: devem ser accionados estes mecanismos de estado na intervenção económica e as instituições europeias devem intervir no sentido de ajudar a que o investimento seja canalizado de outra forma e para outros resultados”, refere Carvalho da Silva.

“Aqui entra outra complementaridade que não pode ser ignorada. A concepção do que é o investimento e os seus efeitos no tempo se aplica universalmente. Tem de se aplicar ao sector privado, de forma a fazer chegar dinheiro às empresas e haver investimento privado, mas tem de chegar também ao sector público nas mais diversas áreas.

“Quando me perguntam como se pode recuperar na saúde e na educação respondo que só há uma forma. É a sociedade olhar para os resultados do investimento nessas áreas e reforçar a disponibilidade de investimento que se possa diluir no tempo”, conclui.

A sucessão de crises não tem deixado Bruxelas respirar. A crise do euro, das dívidas soberanas e das profundas desigualdades na Zona Euro estava longe de ser resolvida quando foi ultrapassada pela vaga de milhares de refugiados e migrantes.

Por solucionar ainda a emergência humanitária, eis que a União Europeia tem de enfrentar, de novo, a luta contra o terrorismo. Pelo meio, uma outra ameaça real: a do adeus do Reino Unido.

Estão as instituições europeias a não acompanhar a vertigem dos acontecimentos e a serem constantemente ultrapassadas? Como podem voltar a ser reactivas?

José da Silva Peneda é, desde Junho, “principal adviser” para políticas sociais do presidente da Comissão Europeia, Jean Claude Juncker. Não concorda com uma análise que menorize a capacidade de diagnóstico e reacção desta Europa. Outra coisa é reconhecer as dificuldades.

A partir do seu posto de observação em Bruxelas, o ex-presidente do Conselho Económico e Social (CES), elenca no programa da Renascença “Conversas Cruzadas” os grandes desafios a enfrentar pela Europa e lamenta que em Portugal não seja suficientemente conhecido o diagnóstico/receita para debelar a crise – documento comum às cinco instituições europeias mais decisivas.

Mas para lá chegar, José Silva Peneda começa pelo início. Aqui o princípio é mesmo listar os problemas do momento: “Seleccionei nove grandes desafios, alguns com origem externa e outros quatro que decorrem de problemas internos”.

“O primeiro: os milhões de refugiados que estão a chegar à Europa e que aqui procuram viver. Segundo as relações com a Rússia. Terceiro: as consequências da tribulação financeira da China. Quarto: o papel da Europa no tema das alterações climáticas. E finalmente, em quinto, o acordo transatlântico. São cinco enormes desafios que a Europa tem de enfrentar”, aponta o economista.

“No plano interno, a União Europeia tem também problemas complicados, desde logo, o referendo britânico que está já à porta. A política de segurança que está relacionada com a consolidação do espaço Schengen”, nota ainda.

“Depois, o relacionamento do investimento com a criação de emprego. Por último, e para mim, o mais decisivo de todos, um desafio da mais absoluta necessidade: o da Zona Euro voltar a ser um espaço de convergência”, sublinha o adjunto de Juncker.

“Há um aspecto que é comum a todos estes desafios: qualquer deles exige duas condições para uma abordagem séria e eficaz. E aqui surgem logo as primeiras dificuldades”, sublinha.

“Primeiro que cada um destes desafios disponha de uma clara visão estratégica de médio prazo. Pensar a política com base no médio prazo, sendo muito necessário, não é um método vulgar nos tempos que correm”, reconhece.

“Para a resolução destes problemas têm, em segundo lugar, de estar assegurados valores de solidariedade entre os vários interesses em presença. Sabemos que hoje mobilizar esses valores é uma tarefa hercúlea”, é a imagem escolhida.

“A questão dos refugiados é um exemplo, mas focando na questão da convergência – que é aquela que nos toca mais de perto – eu diria que a Comissão fez um trabalho notável”, sublinha Silva Peneda.

“Zona Euro deixou de ser máquina de convergência”

“Há um documento assinado pelos cinco presidentes das instituições europeias – a saber Comissão Europeia, Parlamento Europeu, Eurogrupo, Banco Central Europeu e Conselho Europeu – em que se reconhece que a Zona Euro deixou de ser ‘aquela máquina’ de convergência”, diz Silva Peneda.

“Um documento onde se define uma estratégia de curto, longo e médio prazo para que a Zona Euro possa ser objecto dessa convergência. Até agora nunca ninguém tinha feito um trabalho desta natureza”, salienta.

Manuel Carvalho da Silva contrapõe: “Ninguém institucionalmente tinha assumido, porque essa é a questão que tem vindo a ser debatida desde sempre. Mas dou relevo a isso, ao que foi feito”, faz notar o sociólogo.

“Cinco presidentes virem reconhecer que a Zona Euro está inacabada, que isto tem corrido mal – é um dado reconhecido no relatório – e define uma estratégia a médio longo prazo, seleccionando medidas políticas objectivas, é um dado que deve ser destacado como algo de muito importante, sublinhando o mérito desta Comissão”, observa o antigo presidente do CES, o órgão constitucional de consulta e concertação na área económica e social.

Manuel Carvalho da Silva reconhece “mérito ao diagnóstico”, mas não deixa “de lembrar aquelas imagens do final do apartheid com o sr. de Klerk ao lado de Nelson Mandela. A constatação merece relevo, mas deve ser aproveitada para lembrar que há um combate de boa parte da sociedade europeia para o abandono da via que tem sido seguida”.

“Mas não deixo de saudar o facto do Dr. Silva Peneda aqui ter trazido esta constatação. Estou também de acordo com a lista de desafios internos e externos que o Dr. Peneda elencou, mas sublinho que a luta pela convergência coloca em causa uma visão dicotómica da União Europeia que tem sido seguida até aqui”, sublinha o professor da Universidade de Coimbra. “É pena que a Sra. Merkel tenha sido a porta-voz de um caminho dicotómico”, nota Manuel Carvalho da Silva

“Sem euro, cai o projecto europeu”

Silva Peneda retoma o documento “dos presidentes”. “O próprio relatório diz taxativamente que, se a Zona Euro não entrar num caminho de convergência o euro cai. A sra. Merkel – insuspeita – disse que se o euro cair, cai também o projecto europeu. Portanto, estamos a falar de um assunto extremamente grave e de enorme importância”, diz o antigo ministro.

“Eu estou a falar para o futuro. Tantas vezes, aqui na Renascença, critiquei a forma como foi tratada a crise financeira. Isso é conhecido, mas em termos de futuro, a solidariedade das cinco instituições europeias é total e no sentido de resolver um problema vital para a continuidade do projecto europeu”, acentua Silva Peneda.

“Há todo um conjunto de afirmações no sentido de que há hoje um risco político grave. Se este problema da convergência não for resolvido é toda a concepção do projecto europeu que está em causa”, alerta.

“As cinco instituições chave acertaram um documento que em Portugal não tem sido falado, não é muito conhecido, mas que define uma estratégia muito coerente e objectiva. Uma estratégia no sentido de se caminhar em direcção a uma união financeira, monetária, fiscal, bancária e política”, nota.

“Elementos que devem ser sempre interdependentes e, só aí, é que haverá uma verdadeira monetária. Também tem a ver com a dívida. Mas o caminho é no sentido de acabar uma obra que está inacabada”, afirma.

“É um projecto coerente. Estou relativamente confiante que perante as dificuldades, de visões diferentes, entre os vários estados, as instituições europeias estão empenhadas em ter sucesso”, diz Silva Peneda.

Silva Peneda: “A Portugal falta o SBCI da Irlanda”

E na semana em que o BCE anunciou mais um pacote de medidas de estímulo ao crescimento económico, mas a desapontar os mercados, como reconduzir países como Portugal no trajecto do crescimento económico? Como voltar a fazer chegar o dinheiro às empresas e não apenas aos ‘mercados’?

Silva Peneda vê na Irlanda a concretização prática de um conceito que lhe (é) era caro. “Julgo que em Portugal – e noutros países da Europa – falta um mecanismo que eu, há tempos, já tinha previsto”, afirma o economista.

“Há anos tive em Portugal a ideia criação de um Banco de Fomento, ideia que foi desvirtuada, a última versão conhecida não é nada daquilo que eu tinha pensado”, nota Silva Peneda.

“Vim a encontrar essa minha ideia concretizada em pleno na República da Irlanda. A Irlanda tem o SBCI – Strategic Banking Corporation of Ireland – em que os fundadores são o BEI – Banco Europeu de Investimento – e o KfW, o maior banco público alemão”.

“Exactamente nos termos do que havia proposto ao ministro Vítor Gaspar e que ele aceitou muito bem. O SBCI trabalha com a banca comercial e tem feito um trabalho fantástico. Em que sentido? Concedendo às empresas empréstimos a muito longo prazo. A banca comercial não concede empréstimos a 10 e 20 anos”, sublinha Silva Peneda.

“Nós precisamos de instituições que emprestem às empresas a 20 anos e com taxas de juro muito razoáveis e com períodos de carência nos primeiros três, quatro e cinco anos. Temos um problema de escassez de capital próprio nas empresas e quando se empresta a 20 anos pode-se colocar como condição que as empresas reforcem os seus capitais próprios”, nota.

“Vejo que a banca quando concede empréstimos tem o problema dos seus balanços internos. A banca nacional tem problemas de activos que estão registados por valores complicados”, prossegue.

“Não condeno quem gere esses bancos: é natural que a prioridade seja resolver esses problemas internos. Problemas a sobrar para as empresas que estão entaladas nos balanços desses bancos”, diz.

“Donde não se prioriza na banca o mérito de um projecto, mas a resolução de problemas. Este ciclo não está quebrado. Não acontece só em Portugal, mas também na Europa. Era preciso fazer um grande esforço para se criar verdadeiros bancos de investimento”, alerta Silva Peneda.

“Não conheço o pensamento do novo ministro da Economia Manuel Caldeira Cabral, mas conheço o do ministro Vítor Gaspar quando lhe fiz esta proposta a título pessoal. Uma proposta feita depois de ter tido uma conversa com o governador do Banco de Portugal que a aceitou comigo e até combinou que eu a faria ao ministro das Finanças”, prossegue.

“Ministro que aceitou a ideia e mais: quando deixou o lugar tinha todo um cronograma feito acerca da forma como o banco iria ser criado. Os sócios seriam o BEI e o KfW. A própria Sra. Merkel, quando esteve em Portugal, manifestou o seu apoio à criação de uma instituição deste tipo. Depois as coisas não avançaram dessa maneira”, conclui Silva Peneda.

Carvalho da Silva “Dinheiro tem de chegar às empresas e ao sector público”

Manuel Carvalho da Silva concorda com a tese do antigo ministro e amplia a análise. “Quero reforçar a ideia exposta por José da Silva Peneda a partir de três pressupostos”.

“Primeiro: há dinheiro. Não há falta de liquidez na União Europeia. Há muito dinheiro. Segundo: há um sistema financeiro que não cumpre aquilo que são as missões e em particular esta perspectiva do investimento para um processo de crescimento”, defende.

“O terceiro: devem ser accionados estes mecanismos de estado na intervenção económica e as instituições europeias devem intervir no sentido de ajudar a que o investimento seja canalizado de outra forma e para outros resultados”, refere Carvalho da Silva.

“Aqui entra outra complementaridade que não pode ser ignorada. A concepção do que é o investimento e os seus efeitos no tempo se aplica universalmente. Tem de se aplicar ao sector privado, de forma a fazer chegar dinheiro às empresas e haver investimento privado, mas tem de chegar também ao sector público nas mais diversas áreas.

“Quando me perguntam como se pode recuperar na saúde e na educação respondo que só há uma forma. É a sociedade olhar para os resultados do investimento nessas áreas e reforçar a disponibilidade de investimento que se possa diluir no tempo”, conclui.

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