1. Este Governo vale até meio de 2021. António Costa não quis pensar num Governo para quatro anos, mas para dois: é que, como explicava o Expresso no sábado, no primeiro semestre de 2021 Portugal vai ter a presidência da UE e isso vai obrigar o primeiro-ministro a estar mais tempo fora. O problema é que este novo Governo é de minoria e poucos meses depois (em outubro de 2021) haverá eleições autárquicas que não podem ser perdidas. Daí que o núcleo duro do Governo passe a ter cinco membros: Costa e mais quatro ministros de Estado. Não se viam tantos desde a última remodelação de António Guterres.
2. A Economia vale mais que as Finanças - sobretudo quando sopram maus ventos de fora e quando sabemos que Centeno pode não ficar muito tempo. António Costa bem tinha avisado durante a pré-campanha, dizendo num almoço com os empresários que não percebia porque se falava tanto do ministro das Finanças, porque a economia era pelo menos tão importante como aquela pasta. Vai daí, fez subir Pedro Siza Vieira a primeiro na lista dos ministros de Estado. Na prática, será o número dois e quem o vai substituir na condução do Conselho de Ministros quando estiver ausente. Um sinal de que, uma vez liberto das amarras do Bloco e PCP, o apoio ao tecido empresarial pode tornar-se o alfa e ómega da política de Costa (e de que as Finanças vão perder peso no discurso político). Será este um Costa mais ao centro?
3. E Centeno, perde a Administração Pública? Mesmo subindo a ministro da Estado, Mário Centeno não perde apenas na hierarquia para Siza Vieira - perde também a Administração Pública para um novo ministério. A solução não é nova, mas já não se via desde António Guterres (sem resultados brilhantes, diga-se) e deixa no ar uma dúvida: o novo ministério terá, como parece, a tutela direta das carreiras da Administração ou só a componente da sua modernização? E que grau de autonomia de gestão terá face às Finanças?
Esta novidade na orgânica do Governo carrega mais uma interrogação nos braços. É que a nova ministra será Alexandra Leitão. A até aqui secretária de Estado teve uma guerra enorme com um dos setores mais importantes da função pública, os professores (e em particular o sindicalista da CGTP Mário Nogueira). Se António Costa quiser levar por diante o que tem escrito no seu programa de Governo - que é uma revisão das carreiras especiais da Administração Pública -, se o novo Ministério tiver também a gestão das carreiras na mão, então Costa terá em Alexandra Leitão uma ministra determinada para entrar nesta reforma de frente. Mas sem maioria, quererá o primeiro-ministro comprar essa guerra?
4. Ministros de Estado pouco ‘geringonços'. Já aqui lhe contámos que António Costa vai ter meses duros pela frente até meio de 2021. E que, como tal, decidiu dar mais peso a quatro ministros: Economia, Negócios Estrangeiros, Presidência e Finanças. A ideia de Costa é permitir maior coordenação durante todo o tempo em que tiver que se dedicar a tarefas externas - mas também equilibrar os pratos da balança. A escolha não foi, por isso, nada inocente: Siza Vieira terá ao lado Centeno; e os dois ‘económicos’ terão ao lado dois políticos - Augusto Santos Silva e Mariana Vieira da Silva. Mas atenção: nenhum dos quatro é conhecido por ter relações próximas com os partidos que, à partida, irão viabilizar os orçamentos deste Governo. Centeno é odiado; Siza é visto como o homem das empresas e negócios; Santos Silva foi o ministro que bateu no Bloco; e Mariana Vieira da Silva tem fama (e proveito) de ser o braço-direito do PM. O melhor é saltar para o ponto seguinte, para perceber onde nos leva este caminho.
5. Um secretário de Estado para gerir a minoria. Isso mesmo: ao contrário do que alguns jornais chegaram a equacionar nos últimos dias, Duarte Cordeiro não subiu a ministro dos Assuntos Parlamentares. Ficou como secretário de Estado, com a missão mais difícil de gerir um Governo de minoria, sem papel passado. Será inocente, ou um sinal à esquerda que este novo Governo não vai dedicar mais importância às negociações (e, portanto, que a bola da estabilidade está do lado deles)?
6. As prioridades indiciam reformas? A mensagem estava no programa eleitoral e Costa repetiu-a a cada intervenção na campanha: os quatro eixos programáticos do novo Governo serão a transição digital, o combate às alterações climáticas, desigualdades e demografia. E, agora, o primeiro-ministro distribuiu-as por três ministros, entregando-lhes poderes transversais de coordenação. Ou seja, poderes para organizarem medidas com os outros ministros à mesa. São eles, por ordem, Siza Vieira, Matos Fernandes e Mariana Vieira da Silva (e só um, o do Ambiente, não é ministro de Estado). Se Costa quiser deixar uma marca reformista ao fim destes quatro anos o ferro estará na mão deles. Mas não era Costa que dizia não gostar da ideia de reformas estruturais?
7. Os fiéis, para o combate. Este é o Governo com mais ministros desde 1976, também o que tem mais mulheres. É seguramente um Governo mais novo, porque quem entra é dea geração mais jovem do que quem sai. Mas este é sobretudo um Governo mais socialista, mais próximo de António Costa - o que se mostra pelas promoções e pelas novas entradas (Ana Abrunhosa, por exemplo, esteve em estreita coordenação com o PM desde os incêndios de 2017, na frente da CCDR do Centro). A lição é esta: ao contrário do que aconteceu há quatro anos, Costa já não liga muito aos independentes, prefere reforçar a coesão do Executivo e a fidelidade à sua liderança. Serão tempos de combate político, definitivamente.
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1. Este Governo vale até meio de 2021. António Costa não quis pensar num Governo para quatro anos, mas para dois: é que, como explicava o Expresso no sábado, no primeiro semestre de 2021 Portugal vai ter a presidência da UE e isso vai obrigar o primeiro-ministro a estar mais tempo fora. O problema é que este novo Governo é de minoria e poucos meses depois (em outubro de 2021) haverá eleições autárquicas que não podem ser perdidas. Daí que o núcleo duro do Governo passe a ter cinco membros: Costa e mais quatro ministros de Estado. Não se viam tantos desde a última remodelação de António Guterres.
2. A Economia vale mais que as Finanças - sobretudo quando sopram maus ventos de fora e quando sabemos que Centeno pode não ficar muito tempo. António Costa bem tinha avisado durante a pré-campanha, dizendo num almoço com os empresários que não percebia porque se falava tanto do ministro das Finanças, porque a economia era pelo menos tão importante como aquela pasta. Vai daí, fez subir Pedro Siza Vieira a primeiro na lista dos ministros de Estado. Na prática, será o número dois e quem o vai substituir na condução do Conselho de Ministros quando estiver ausente. Um sinal de que, uma vez liberto das amarras do Bloco e PCP, o apoio ao tecido empresarial pode tornar-se o alfa e ómega da política de Costa (e de que as Finanças vão perder peso no discurso político). Será este um Costa mais ao centro?
3. E Centeno, perde a Administração Pública? Mesmo subindo a ministro da Estado, Mário Centeno não perde apenas na hierarquia para Siza Vieira - perde também a Administração Pública para um novo ministério. A solução não é nova, mas já não se via desde António Guterres (sem resultados brilhantes, diga-se) e deixa no ar uma dúvida: o novo ministério terá, como parece, a tutela direta das carreiras da Administração ou só a componente da sua modernização? E que grau de autonomia de gestão terá face às Finanças?
Esta novidade na orgânica do Governo carrega mais uma interrogação nos braços. É que a nova ministra será Alexandra Leitão. A até aqui secretária de Estado teve uma guerra enorme com um dos setores mais importantes da função pública, os professores (e em particular o sindicalista da CGTP Mário Nogueira). Se António Costa quiser levar por diante o que tem escrito no seu programa de Governo - que é uma revisão das carreiras especiais da Administração Pública -, se o novo Ministério tiver também a gestão das carreiras na mão, então Costa terá em Alexandra Leitão uma ministra determinada para entrar nesta reforma de frente. Mas sem maioria, quererá o primeiro-ministro comprar essa guerra?
4. Ministros de Estado pouco ‘geringonços'. Já aqui lhe contámos que António Costa vai ter meses duros pela frente até meio de 2021. E que, como tal, decidiu dar mais peso a quatro ministros: Economia, Negócios Estrangeiros, Presidência e Finanças. A ideia de Costa é permitir maior coordenação durante todo o tempo em que tiver que se dedicar a tarefas externas - mas também equilibrar os pratos da balança. A escolha não foi, por isso, nada inocente: Siza Vieira terá ao lado Centeno; e os dois ‘económicos’ terão ao lado dois políticos - Augusto Santos Silva e Mariana Vieira da Silva. Mas atenção: nenhum dos quatro é conhecido por ter relações próximas com os partidos que, à partida, irão viabilizar os orçamentos deste Governo. Centeno é odiado; Siza é visto como o homem das empresas e negócios; Santos Silva foi o ministro que bateu no Bloco; e Mariana Vieira da Silva tem fama (e proveito) de ser o braço-direito do PM. O melhor é saltar para o ponto seguinte, para perceber onde nos leva este caminho.
5. Um secretário de Estado para gerir a minoria. Isso mesmo: ao contrário do que alguns jornais chegaram a equacionar nos últimos dias, Duarte Cordeiro não subiu a ministro dos Assuntos Parlamentares. Ficou como secretário de Estado, com a missão mais difícil de gerir um Governo de minoria, sem papel passado. Será inocente, ou um sinal à esquerda que este novo Governo não vai dedicar mais importância às negociações (e, portanto, que a bola da estabilidade está do lado deles)?
6. As prioridades indiciam reformas? A mensagem estava no programa eleitoral e Costa repetiu-a a cada intervenção na campanha: os quatro eixos programáticos do novo Governo serão a transição digital, o combate às alterações climáticas, desigualdades e demografia. E, agora, o primeiro-ministro distribuiu-as por três ministros, entregando-lhes poderes transversais de coordenação. Ou seja, poderes para organizarem medidas com os outros ministros à mesa. São eles, por ordem, Siza Vieira, Matos Fernandes e Mariana Vieira da Silva (e só um, o do Ambiente, não é ministro de Estado). Se Costa quiser deixar uma marca reformista ao fim destes quatro anos o ferro estará na mão deles. Mas não era Costa que dizia não gostar da ideia de reformas estruturais?
7. Os fiéis, para o combate. Este é o Governo com mais ministros desde 1976, também o que tem mais mulheres. É seguramente um Governo mais novo, porque quem entra é dea geração mais jovem do que quem sai. Mas este é sobretudo um Governo mais socialista, mais próximo de António Costa - o que se mostra pelas promoções e pelas novas entradas (Ana Abrunhosa, por exemplo, esteve em estreita coordenação com o PM desde os incêndios de 2017, na frente da CCDR do Centro). A lição é esta: ao contrário do que aconteceu há quatro anos, Costa já não liga muito aos independentes, prefere reforçar a coesão do Executivo e a fidelidade à sua liderança. Serão tempos de combate político, definitivamente.