Ladrões de Bicicletas: O misterioso custo do plafonamento de "cerca de 538 milhões de euros"

22-05-2019
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A 6 de Setembro passado, o ministro da Solidariedade Pedro Mota Soares afirmou algures que o "plafonamento" para os novos trabalhadores não era muito caro. Poderia "custar cerca de 538 milhões de euros". Diversos jornais publicaram-na. Mas a notícia já não pode ser encontrada porque foi retirada...

Faça-se uma busca com "Pedro Mota Soares" e "cerca de 538 milhões de euros" e obter-se-á vários resultados, todos remetendo para uma notícia com um título assustador para a Coligação: "CDS admite fazer derrapar o défice". E escrevia-se: "Luís Pedro Mota Soares disse que a proposta da coligação sobre o 'plafonamento' nas pensões poderá custar cerca de 538 milhões de euros/ano - ou seja, 0,3% do PIB". Mas quando se tenta ler cada uma das notícias, remete-se para o site do DN e o que se vê é isto: aqui ou aqui.

Não se sabe o motivo dessa desaparição. Mas calcula-se... No mesmo dia, surgiria outra notícia a substituir a primeira, desta vez com um título bem mais simpático: "CDS garante que o plafonamento nunca fará derrapar o défice".  A ideia passa a ser de que, saindo-se dos procedimentos de défices excessivos, então poderão "utilizar-se até 0,5% do PIB (cerca de 890 milhões de euros) para o plafonamento através das normas de flexibilidade do Tratado Orçamental - normas implicam que essas verbas nunca poderão ser contabilizadas no défice. Nunca haverá derrapagem do défice, explicou a mesma fonte". Mas os "cerca de 538 milhões de euro" nunca mais apareceriam nos noticiários.

Vários factos interessantes a sublinhar:

1) No dia anterior, a 5/9/2015, o mesmo Pedro Mota Soares afirmou que a proposta do PS de reduzir a TSU faria o défice derrapar. Veja-se  aqui. Mota Soares disse: "Só a medida da redução da TSU que tem um impacto de 0,33% coloca o défice efectivamente nos 3%". Portanto, o "plafonamento" é possível, mas a medida do PS não é, apesar de ter o mesmo impacto...;

2) Coincidentemente, os "cerca de 538 milhões de euros" aproximam-se muito dos "cerca de 600 milhões de euros" que o Governo cortou na rubrica de pensões e que não esclarece como quer lá chegar. Mas como foi anunciado que se tratava de uma reforma a discutir e concertar com o PS, cola muito bem com aquela argumentação apresentada por Mota Soares (a de não contar para o défice);

3) A que corresponde na realidade os "cerca de 538 milhões de euros"? Essa é uma boa questão. Veja-se as contas a seguir.

A fazer jus na proposta da coligação o "plafonamento" apenas se aplicaria aos novos contratos. Ora, para poder custar "cerca de 538 milhões de euros" ter-se-ia de aplicar a MUITOS, mas mesmo MUITOS, novos contratos. A partir dos Quadros de Pessoal, estatísticas fornecidas por um número considerável de empresas, é possível traçar uma estrutura de vencimentos do pessoal assalariado em 2013 (últimos dados). Dos 1,8 milhões de pessoas contabilizados, eis a distribuição entre pessoal com horário completo por ganho mensal:

Fonte: Quadros de Pessoal, 2013

Ora, embora esta "malha" não corresponda ao universo total nem à grelha actual que só o Instituto de Segurança Social possui, permite uma boa aproximação. E a questão que se coloca é: qual o tecto contributivo, com esta "malha" dos Quadros de pessoal, que daria um encargo de "cerca de 538 milhões de euros/ano", aplicando-o apenas aos novos contratados?

Como o Governo espera criar cerca de 200 mil postos de trabalho, pressuponha-se vários cenários:
a) que se manteria a mesma estrutura de rendimentos para todos os novos contratados. Ora, isso obrigaria a ter de reduzir muito o tecto contributivo para valores abaixo dos 1000 euros, o que é impraticável. Seria apostar a prazo no fim da Segurança Social pública.
b) que os todos os novos contratados teriam vencimentos superior a mil euros. Improvável, mas aceite-se. Nesse caso, poder-se-ia elevar mais o tecto contributivo. Para dar os "cerca de 835 milhões de euros", o limite poderia ficar nos 1750 euros, quase 3,5 salários mínimos nacionais. Mas mesmo assim, pressupostos improváveis.  
c) que o "plafonamento" se aplicará a todos os trabalhadores e não apenas aos novos contratados e que a promessa de ser apenas para os novos contratados é "um pé na porta" para rapidamente alargar a todos os assalariados. Nesse caso, o limite contributivo poderia ir até aos 2750 euros (quase 5,5 SMN). Nesse caso, a medida aplicar-se-ia a menos de 6% dos assalariados! Ou seja, algo como 175 mil pessoas. Mas representaria uma perda/ano de 4% das receitas da Segurança Social, algo como "cerca de 528 milhões de euros" - os tais 0,3% do PIB. Mas repito: para TODOS os assalariados.

Portanto, resta a questão por resolver: a que corresponderiam os "cerca de 538 milhões de euros"? Só o ministro a pode responder. Mas se não o fizer, a a única conclusão é a de que o Governo está a pensar aplicar em 2016 um plafonamento de algo parecido como 2750 euros, a TODOS OS ASSALARIADOS. Ou seja, ao arrepio da promessa feita de que era apenas para os novos contratos.

4) Passos Coelho afirmou ser inadmissível que António Costa não soubesse em que prestações sociais iria cortar para conseguir mil milhões de euros em quatro anos. Mas caso o Governo enveredasse por um plafonamento a 2750 euros, a Segurança Social perderia em 4 anos algo como "cerca de 2112 milhões de euros"... 

5) E a situação torna-se mais grave, caso o plafonamento seja inferior a 2750 euros. Se fosse a 2000 euros mensais, aí abrangeria cerca de 10% dos assalariados e, por isso, a perda de receitas da Segurança Social rondaria os "cerca de 1,1 mil milhões de euros/ano". E assim sucessivamente...

Portanto, a coligação de direita tem ainda muito para explicar antes de exigir explicações ao PS...

A 6 de Setembro passado, o ministro da Solidariedade Pedro Mota Soares afirmou algures que o "plafonamento" para os novos trabalhadores não era muito caro. Poderia "custar cerca de 538 milhões de euros". Diversos jornais publicaram-na. Mas a notícia já não pode ser encontrada porque foi retirada...

Faça-se uma busca com "Pedro Mota Soares" e "cerca de 538 milhões de euros" e obter-se-á vários resultados, todos remetendo para uma notícia com um título assustador para a Coligação: "CDS admite fazer derrapar o défice". E escrevia-se: "Luís Pedro Mota Soares disse que a proposta da coligação sobre o 'plafonamento' nas pensões poderá custar cerca de 538 milhões de euros/ano - ou seja, 0,3% do PIB". Mas quando se tenta ler cada uma das notícias, remete-se para o site do DN e o que se vê é isto: aqui ou aqui.

Não se sabe o motivo dessa desaparição. Mas calcula-se... No mesmo dia, surgiria outra notícia a substituir a primeira, desta vez com um título bem mais simpático: "CDS garante que o plafonamento nunca fará derrapar o défice".  A ideia passa a ser de que, saindo-se dos procedimentos de défices excessivos, então poderão "utilizar-se até 0,5% do PIB (cerca de 890 milhões de euros) para o plafonamento através das normas de flexibilidade do Tratado Orçamental - normas implicam que essas verbas nunca poderão ser contabilizadas no défice. Nunca haverá derrapagem do défice, explicou a mesma fonte". Mas os "cerca de 538 milhões de euro" nunca mais apareceriam nos noticiários.

Vários factos interessantes a sublinhar:

1) No dia anterior, a 5/9/2015, o mesmo Pedro Mota Soares afirmou que a proposta do PS de reduzir a TSU faria o défice derrapar. Veja-se  aqui. Mota Soares disse: "Só a medida da redução da TSU que tem um impacto de 0,33% coloca o défice efectivamente nos 3%". Portanto, o "plafonamento" é possível, mas a medida do PS não é, apesar de ter o mesmo impacto...;

2) Coincidentemente, os "cerca de 538 milhões de euros" aproximam-se muito dos "cerca de 600 milhões de euros" que o Governo cortou na rubrica de pensões e que não esclarece como quer lá chegar. Mas como foi anunciado que se tratava de uma reforma a discutir e concertar com o PS, cola muito bem com aquela argumentação apresentada por Mota Soares (a de não contar para o défice);

3) A que corresponde na realidade os "cerca de 538 milhões de euros"? Essa é uma boa questão. Veja-se as contas a seguir.

A fazer jus na proposta da coligação o "plafonamento" apenas se aplicaria aos novos contratos. Ora, para poder custar "cerca de 538 milhões de euros" ter-se-ia de aplicar a MUITOS, mas mesmo MUITOS, novos contratos. A partir dos Quadros de Pessoal, estatísticas fornecidas por um número considerável de empresas, é possível traçar uma estrutura de vencimentos do pessoal assalariado em 2013 (últimos dados). Dos 1,8 milhões de pessoas contabilizados, eis a distribuição entre pessoal com horário completo por ganho mensal:

Fonte: Quadros de Pessoal, 2013

Ora, embora esta "malha" não corresponda ao universo total nem à grelha actual que só o Instituto de Segurança Social possui, permite uma boa aproximação. E a questão que se coloca é: qual o tecto contributivo, com esta "malha" dos Quadros de pessoal, que daria um encargo de "cerca de 538 milhões de euros/ano", aplicando-o apenas aos novos contratados?

Como o Governo espera criar cerca de 200 mil postos de trabalho, pressuponha-se vários cenários:
a) que se manteria a mesma estrutura de rendimentos para todos os novos contratados. Ora, isso obrigaria a ter de reduzir muito o tecto contributivo para valores abaixo dos 1000 euros, o que é impraticável. Seria apostar a prazo no fim da Segurança Social pública.
b) que os todos os novos contratados teriam vencimentos superior a mil euros. Improvável, mas aceite-se. Nesse caso, poder-se-ia elevar mais o tecto contributivo. Para dar os "cerca de 835 milhões de euros", o limite poderia ficar nos 1750 euros, quase 3,5 salários mínimos nacionais. Mas mesmo assim, pressupostos improváveis.  
c) que o "plafonamento" se aplicará a todos os trabalhadores e não apenas aos novos contratados e que a promessa de ser apenas para os novos contratados é "um pé na porta" para rapidamente alargar a todos os assalariados. Nesse caso, o limite contributivo poderia ir até aos 2750 euros (quase 5,5 SMN). Nesse caso, a medida aplicar-se-ia a menos de 6% dos assalariados! Ou seja, algo como 175 mil pessoas. Mas representaria uma perda/ano de 4% das receitas da Segurança Social, algo como "cerca de 528 milhões de euros" - os tais 0,3% do PIB. Mas repito: para TODOS os assalariados.

Portanto, resta a questão por resolver: a que corresponderiam os "cerca de 538 milhões de euros"? Só o ministro a pode responder. Mas se não o fizer, a a única conclusão é a de que o Governo está a pensar aplicar em 2016 um plafonamento de algo parecido como 2750 euros, a TODOS OS ASSALARIADOS. Ou seja, ao arrepio da promessa feita de que era apenas para os novos contratos.

4) Passos Coelho afirmou ser inadmissível que António Costa não soubesse em que prestações sociais iria cortar para conseguir mil milhões de euros em quatro anos. Mas caso o Governo enveredasse por um plafonamento a 2750 euros, a Segurança Social perderia em 4 anos algo como "cerca de 2112 milhões de euros"... 

5) E a situação torna-se mais grave, caso o plafonamento seja inferior a 2750 euros. Se fosse a 2000 euros mensais, aí abrangeria cerca de 10% dos assalariados e, por isso, a perda de receitas da Segurança Social rondaria os "cerca de 1,1 mil milhões de euros/ano". E assim sucessivamente...

Portanto, a coligação de direita tem ainda muito para explicar antes de exigir explicações ao PS...

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