Ladrões de Bicicletas: Eu e o vácuo

22-05-2019
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Por três vezes, Pedro Santana Lopes disse o seu nome na apresentação da sua candidatura à presidência do PSD. Disse-o com aquele dramatismo cinematográfico norte-americano para o qual as televisões convidadas não estavam preparadas:

“Chamo-me Pedro Santana Lopes e sou candidato”. Ou “Disse o meu nome, pai de cinco filhos, avô de quatro netos, divorciado, mas bem na sua vida pessoal. Orgulho-me de tudo o que fiz e com 61 anos quero trazer as camadas mais jovens de 30, de 40 anos, e fazer delas a base do trabalho que vou realizar, sempre numa perspectiva de intergeracionalidade.

[Até parecia a deixa de Russell Crowe em Gladiador, de Ridley Scott, quando se descobre diante do imperador malvado Joaquin Phoenix e diz: "O meu nome é Maximus Decimus Meridius, comandante dos exércitos do Norte, general das legiões Fénix, súbdito leal do verdadeiro imperador Marcus Aurelius, pai de um filho assassinado, marido de uma mulher assassinado e terei a minha vingança nesta ou na outra vida"]

E Santana Lopes disse-o igualmente de cada vez que falava no “meu partido”, ou quando dizia “não venho negar o que disse antes, venho assumir quem sou e o que fui até hoje”, ou “quando o partido precisou de mim estive presente” ou “o partido de que me orgulho”.

Santana Lopes parece achar que o centro lhe é devido. As prolongadas alfinetadelas a críticos são uma forma igualmente de dizer que o expurgo dos impuros – Santana chamou-lhe “clarificação” - é possível e será feito consigo, para bem do “seu partido”.

“Nunca fui para a Aula Magna fazer sessões com o BE ou Mário Soares” [Pacheco Pereira], “Nunca fui para Associação 25 de Abril ouvir elogios de Vasco Lourenço na situação em que o partido salvava o país da bancarrota [Rui Rio]. Nunca fui para a Fundação Mário Soares com audiências de outros partidos (...) para dizer - quando em Novembro, Dezembro de 2013 se estava a conseguir a saída limpa - nunca fui para essas instituições dizer "a democracia está mais difícil, estamos a caminho de uma ditadura corporativa" e "fazer coro com os grandes adversários do meu partido” [António Capucho].

“Unir, mas sem equívocos”, será o lema. E isso quer dizer o quê? O partido que Santana Lopes quer “unir depois de clarificar” deverá ir para algum lado. Mas esse destino não é claro. Frases como “a vida é feita de vitória e derrota e de vitória outra vez” ou “Somos um partido que nasceu para ganhar”, não diz absolutamente nada. O programa que traçou foi pobre. Talvez porque ainda está a ser feito, com “Telmo Faria, Teresa Morais, o Silvério Regalado, e tantos outros, com base numa plataforma colaborativa”.

Santana Lopes tentou alguns pontos:

1. Ataque ao PS e ricochete para o CDS: “Sou contra o bloco central. Não hoje [remoque a Rui Rio] porque sou candidato, mas já naquela altura e ao longo da minha vida política”. Um PSD que não quer bloco central vai roubar votos ao CDS antes que o CDS roube votos ao PSD.

2. Ataque ao acordo à esquerda e novo ricochete ao CDS: “Para mim, são uma frente de esquerda, com o Partido Comunista e a extrema-esquerda, que do PS se aproveita para governar com um programa que não é o seu”. É mau para o nosso país. É o único pais da UE onde tal acontece. Acontece e ainda por cima disfarçando-se, não se assumindo, querendo outra designação. Disfarçando o seu próprio programa".

3. Um partido popular/populista e novo ricochete ao CDS: “Um partido popular que pratica descentralização e desconcentração”. “Um partido social-democrata, partindo não do marxismo, mas do humanismo, personalismo e do liberalismo nas matérias em que o assumimos”. Quais? Ficaram por ser ditas.

4. Um partido que critica – incoerentemente - a desumanização do trabalho e faz ricochete à esquerda: “Um partido que aposta na criação de riqueza, rejeitando o modelo de crescimento em que vivemos, dos 600 ou 700 euros para quadros licenciados em que muitos têm de deixar o nosso país para procurar remunerações condignas fora as nossas fronteiras”. “O que está mal nos PIBs de outros países e o nosso - não é o povo, não são os portugueses que muitas vezes trabalham mais horas do que outros - é o modelo de crescimento e são algumas elites políticas e económicas que, ao longo de anos como hoje em dia se vê - e eu denunciei em 2004 e 2005 - trataram deles próprios e não trataram de Portugal e dos portugueses”. Este discurso é para quem? Resta perguntar se esse modelo não foi intensificado no seu governo Durão Barroso e mesmo no seu, com a criação e aprovação do Código do Trabalho em 2003, elaborado em outsourcing por um escritório de advogados e que deu a machada para a desarticulação da contratação colectiva, que diabolizou os sindicatos, que aumentou o número de renovações de contratos a prazo, que aumentou o período experimental, etc.,etc. Santana Lopes diz que assume tudo o que fez, mas convinha ir um pouco mais longe nessa análise. Ou mesmo quando elogia a política seguida por Pedro Passos Coelho que agravou - e muito! - essa tendência.Ou trata-se apenas de estratégia para cativar o aparelho passista? Que vazio.

5. Um partido que critica a política orçamental das metas sem explicar ao que vem. “Consolidação orçamental sem dúvida nenhuma, mas Portugal não é nem a folha de Excel, nem a visões miserabilistas, nem a resignação injustificada”. Estranha formulação tão pouco concretizada...

6. Um partido que quer continuar a política de concorrência desleal com os seus parceiros: “Temos de ser capaz de ter uma politica fiscal atractiva”, incentivar a coesão territorial, favorecer a captação de talentos, quer dos nossos que estão fora, quer dos estrangeiros que se convençam de que Portugal é o El Dorado. E “não só das celebridades”. Mais ainda? O regime de residentes não habituais já vai em 10% de IRS... Mais desigualdade de tratamento? Será eficaz e se for não será uma forma de ladidar a receita fiscal de outros países parceiros? E se não for não será apenas uma borla para amigos?

7. Um partido amigo do sector social e novo ricochete ao CDS: “Sou favorável a uma forte presença do Estado na Saúde, na Educação, na Segurança Social, mas espero muito dos privados e do sector social nesses três domínios. “O nosso partido tem de assumir e falar deste tema: a solidariedade social , o combate ao esquecimento. Dos mais idosos, dos cuidados continuados, dos cuidados paliativos, da dependência física. Nós falaremos.” No fundo, quererá dar um sinal às instituições de que esteve perto como as Misericórdias, mas fará sombra a um mercado eleitoral do CDS, partido que se vangloria de ter aumentado a orçamentação da Acção Social de 2011 a 2015 quando as outras despesas desciam.

8. Um partido amigo da segurança e novo ricochete ao CDS: Mais apoios e financiamentos às “Forças Armadas, à segurança, diplomatas e serviços de informações”.

9. Um partido moderno que fala inglês universitário: "Quero o meu partido sempre ligado às universidades. Das startups e dos starups, com os spinoffs das universidades portuguesas que estão na vanguarda, espalhados por todo o país”. De facto, fica sempre bem em qualquer programa eleitoral.

Santana Lopes pode achar que tem ideias claras para o partido e para o país, mas apenas se mostrou a si, cerca de 13 mais velho do que quando foi primeiro-ministro (durante uns meses e por fuga do então primeiro-ministro Durão Barroso). E que não resistiu a eleições, por coisas como este programa.


Por três vezes, Pedro Santana Lopes disse o seu nome na apresentação da sua candidatura à presidência do PSD. Disse-o com aquele dramatismo cinematográfico norte-americano para o qual as televisões convidadas não estavam preparadas:

“Chamo-me Pedro Santana Lopes e sou candidato”. Ou “Disse o meu nome, pai de cinco filhos, avô de quatro netos, divorciado, mas bem na sua vida pessoal. Orgulho-me de tudo o que fiz e com 61 anos quero trazer as camadas mais jovens de 30, de 40 anos, e fazer delas a base do trabalho que vou realizar, sempre numa perspectiva de intergeracionalidade.

[Até parecia a deixa de Russell Crowe em Gladiador, de Ridley Scott, quando se descobre diante do imperador malvado Joaquin Phoenix e diz: "O meu nome é Maximus Decimus Meridius, comandante dos exércitos do Norte, general das legiões Fénix, súbdito leal do verdadeiro imperador Marcus Aurelius, pai de um filho assassinado, marido de uma mulher assassinado e terei a minha vingança nesta ou na outra vida"]

E Santana Lopes disse-o igualmente de cada vez que falava no “meu partido”, ou quando dizia “não venho negar o que disse antes, venho assumir quem sou e o que fui até hoje”, ou “quando o partido precisou de mim estive presente” ou “o partido de que me orgulho”.

Santana Lopes parece achar que o centro lhe é devido. As prolongadas alfinetadelas a críticos são uma forma igualmente de dizer que o expurgo dos impuros – Santana chamou-lhe “clarificação” - é possível e será feito consigo, para bem do “seu partido”.

“Nunca fui para a Aula Magna fazer sessões com o BE ou Mário Soares” [Pacheco Pereira], “Nunca fui para Associação 25 de Abril ouvir elogios de Vasco Lourenço na situação em que o partido salvava o país da bancarrota [Rui Rio]. Nunca fui para a Fundação Mário Soares com audiências de outros partidos (...) para dizer - quando em Novembro, Dezembro de 2013 se estava a conseguir a saída limpa - nunca fui para essas instituições dizer "a democracia está mais difícil, estamos a caminho de uma ditadura corporativa" e "fazer coro com os grandes adversários do meu partido” [António Capucho].

“Unir, mas sem equívocos”, será o lema. E isso quer dizer o quê? O partido que Santana Lopes quer “unir depois de clarificar” deverá ir para algum lado. Mas esse destino não é claro. Frases como “a vida é feita de vitória e derrota e de vitória outra vez” ou “Somos um partido que nasceu para ganhar”, não diz absolutamente nada. O programa que traçou foi pobre. Talvez porque ainda está a ser feito, com “Telmo Faria, Teresa Morais, o Silvério Regalado, e tantos outros, com base numa plataforma colaborativa”.

Santana Lopes tentou alguns pontos:

1. Ataque ao PS e ricochete para o CDS: “Sou contra o bloco central. Não hoje [remoque a Rui Rio] porque sou candidato, mas já naquela altura e ao longo da minha vida política”. Um PSD que não quer bloco central vai roubar votos ao CDS antes que o CDS roube votos ao PSD.

2. Ataque ao acordo à esquerda e novo ricochete ao CDS: “Para mim, são uma frente de esquerda, com o Partido Comunista e a extrema-esquerda, que do PS se aproveita para governar com um programa que não é o seu”. É mau para o nosso país. É o único pais da UE onde tal acontece. Acontece e ainda por cima disfarçando-se, não se assumindo, querendo outra designação. Disfarçando o seu próprio programa".

3. Um partido popular/populista e novo ricochete ao CDS: “Um partido popular que pratica descentralização e desconcentração”. “Um partido social-democrata, partindo não do marxismo, mas do humanismo, personalismo e do liberalismo nas matérias em que o assumimos”. Quais? Ficaram por ser ditas.

4. Um partido que critica – incoerentemente - a desumanização do trabalho e faz ricochete à esquerda: “Um partido que aposta na criação de riqueza, rejeitando o modelo de crescimento em que vivemos, dos 600 ou 700 euros para quadros licenciados em que muitos têm de deixar o nosso país para procurar remunerações condignas fora as nossas fronteiras”. “O que está mal nos PIBs de outros países e o nosso - não é o povo, não são os portugueses que muitas vezes trabalham mais horas do que outros - é o modelo de crescimento e são algumas elites políticas e económicas que, ao longo de anos como hoje em dia se vê - e eu denunciei em 2004 e 2005 - trataram deles próprios e não trataram de Portugal e dos portugueses”. Este discurso é para quem? Resta perguntar se esse modelo não foi intensificado no seu governo Durão Barroso e mesmo no seu, com a criação e aprovação do Código do Trabalho em 2003, elaborado em outsourcing por um escritório de advogados e que deu a machada para a desarticulação da contratação colectiva, que diabolizou os sindicatos, que aumentou o número de renovações de contratos a prazo, que aumentou o período experimental, etc.,etc. Santana Lopes diz que assume tudo o que fez, mas convinha ir um pouco mais longe nessa análise. Ou mesmo quando elogia a política seguida por Pedro Passos Coelho que agravou - e muito! - essa tendência.Ou trata-se apenas de estratégia para cativar o aparelho passista? Que vazio.

5. Um partido que critica a política orçamental das metas sem explicar ao que vem. “Consolidação orçamental sem dúvida nenhuma, mas Portugal não é nem a folha de Excel, nem a visões miserabilistas, nem a resignação injustificada”. Estranha formulação tão pouco concretizada...

6. Um partido que quer continuar a política de concorrência desleal com os seus parceiros: “Temos de ser capaz de ter uma politica fiscal atractiva”, incentivar a coesão territorial, favorecer a captação de talentos, quer dos nossos que estão fora, quer dos estrangeiros que se convençam de que Portugal é o El Dorado. E “não só das celebridades”. Mais ainda? O regime de residentes não habituais já vai em 10% de IRS... Mais desigualdade de tratamento? Será eficaz e se for não será uma forma de ladidar a receita fiscal de outros países parceiros? E se não for não será apenas uma borla para amigos?

7. Um partido amigo do sector social e novo ricochete ao CDS: “Sou favorável a uma forte presença do Estado na Saúde, na Educação, na Segurança Social, mas espero muito dos privados e do sector social nesses três domínios. “O nosso partido tem de assumir e falar deste tema: a solidariedade social , o combate ao esquecimento. Dos mais idosos, dos cuidados continuados, dos cuidados paliativos, da dependência física. Nós falaremos.” No fundo, quererá dar um sinal às instituições de que esteve perto como as Misericórdias, mas fará sombra a um mercado eleitoral do CDS, partido que se vangloria de ter aumentado a orçamentação da Acção Social de 2011 a 2015 quando as outras despesas desciam.

8. Um partido amigo da segurança e novo ricochete ao CDS: Mais apoios e financiamentos às “Forças Armadas, à segurança, diplomatas e serviços de informações”.

9. Um partido moderno que fala inglês universitário: "Quero o meu partido sempre ligado às universidades. Das startups e dos starups, com os spinoffs das universidades portuguesas que estão na vanguarda, espalhados por todo o país”. De facto, fica sempre bem em qualquer programa eleitoral.

Santana Lopes pode achar que tem ideias claras para o partido e para o país, mas apenas se mostrou a si, cerca de 13 mais velho do que quando foi primeiro-ministro (durante uns meses e por fuga do então primeiro-ministro Durão Barroso). E que não resistiu a eleições, por coisas como este programa.

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