Relatório de grandes devedores? BdP não divulga um único número. É tudo secreto

24-07-2019
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São 34 páginas aquelas em que o Banco de Portugal explica a lei da transparência que obriga a divulgar informação sobre os grandes devedores da banca e em que explica quais os seus argumentos para nada revelar. Não há um único número sobre as dívidas que podem ter estado na origem dos pedidos de auxílio dos bancos. O Parlamento vai avaliar agora se há informação que o supervisor está a ocultar e que não se justifica.

Não há um único número, nem individualizado por banco nem agregado por todos os bancos, sobre as grandes dívidas às instituições financeiras. Os números que surgem são sobre os auxílios estatais recebidos - informação já pública anteriormente.

Toda a informação que é considerada relevante pela lei que entrou em Janeiro não é divulgada: valores das dívidas e de o que está por pagar.

O Banco de Portugal foi obrigado, por essa lei, a realizar um relatório extraordinário sobre as dívidas dos bancos que foram ajudados. A informação refere-se aos bancos que receberam auxílio estatal. São oito: CGD, BCP, BPI, BES, Novo Banco, Banif, BPP e BPN. Só que os dados não são revelados publicamente

Porque está o anexo escondido

O supervisor liderado por Carlos Costa dividiu em dois documentos tudo o que diz respeito aos grandes devedores. Há uma nota metodológica, o documento publicado, e há depois um anexo, onde está a “informação relevante relativa às instituições de crédito abrangidas”. E é esse anexo que não foi divulgado.

Essa informação está “abrangida pelo segredo bancário”. “A informação em causa reconduz‐se à vida e à atividade principal das instituições de crédito [...] e às relações destas com os seus clientes, mais concretamente a operações bancárias (mormente de crédito) com dados individuais sobre os clientes”, indica o documento. A informação “encontra‐se igualmente abrangida pelo dever de segredo do Banco de Portugal”.

A autoridade gasta alguns parágrafos a explicar o motivo pelo qual não divulga a informação “relevante” sobre os grandes devedores dos bancos: “Além da necessária preservação do dever legal de segredo e da escrupulosa proteção de dados pessoais, importa atender às especiais cautelas que, no tratamento da informação constante do relatório extraordinário, não podem deixar de ser absolutamente justificadas à luz da estrita observância de princípios estruturantes de sã e leal concorrência entre as instituições de crédito e sociedades não financeiras a operar no mercado português, procurando‐se igualmente salvaguardar a estabilidade financeira e o regular financiamento da economia”.

Outra questão é o "dano reputacional": "poderá contribuir para uma perceção negativa por parte dos atuais e futuros clientes em favor de entidades não sujeitas ao escrutínio inerente à lei, enquanto para as empresas, designadamente para aquelas que regularizaram, ou estão a regularizar a sua situação, a eventual perda de confiança poderá ter impacto significativo na sua atividade e, deste modo, no emprego gerado, com as consequentes implicações em termos de estabilidade financeira".

Aliás, há um aviso claro: “a sua eventual divulgação, além de contrária às regras sobre o segredo e sobre a proteção de dados pessoais, constituiria um risco significativo para a estabilidade financeira e o regular financiamento da economia”.

Banca precisou de 23,8 mil milhões do Estado

No relatório, os números divulgados dizem respeito apenas aos fundos públicos disponibilizados às instituições de crédito abrangidos desde 2007, referido como o período sob abrangência da lei. São num total de 23,8 mil milhões de euros.

A CGD é a mais relevante, com 6,25 mil milhões, sendo que o BES e Novo Banco exigem 4,3 mil milhões, mas não têm ainda informação actualizada (os 850 milhões emprestados pelo Estado ao Fundo de Resolução, para colocar no banco, este ano). Aqui, nada foi ainda recuperado, sendo que o banco estatal já pagou dividendos este ano (200 milhões).

Os empréstimos ao BCP e BPI, no total de 4,5 mil milhões, foram totalmente recuperados, sendo que no Banif houve apenas um ressarcimento parcial.

Braço-de-ferro a caminho?

O Banco de Portugal divulga o documento consoante o seu entendimento, e o Parlamento vai agora analisar se o que foi revelado cumpre o “espírito do legislador”, como disse o deputado Duarte Pacheco.

O Parlamento, que está sensível ao facto de haver informação que não pode ser revelada (valores de imparidades de créditos em venda e nomes de devedores que são cumpridores), pode considerar que há dados que podem ser divulgados sem colocar em risco a estabilidade financeira. E ir contra o supervisor.

Essa avaliação vai agora ser feita pela comissão de Orçamento, Finanças e Modernização Administrativa – que poderá depois entrar em contactos com o Banco de Portugal para pedir mais dados – e o assunto será também discutido em conferência de líderes esta quarta-feira.

Nos últimos anos, os deputados e o supervisor da banca têm tido embates devido ao acesso a informação sobre os bancos – aliás, foram eles que estiveram na base desta lei de Janeiro.

(Notícia atualizada às 15.15 com mais informações)

São 34 páginas aquelas em que o Banco de Portugal explica a lei da transparência que obriga a divulgar informação sobre os grandes devedores da banca e em que explica quais os seus argumentos para nada revelar. Não há um único número sobre as dívidas que podem ter estado na origem dos pedidos de auxílio dos bancos. O Parlamento vai avaliar agora se há informação que o supervisor está a ocultar e que não se justifica.

Não há um único número, nem individualizado por banco nem agregado por todos os bancos, sobre as grandes dívidas às instituições financeiras. Os números que surgem são sobre os auxílios estatais recebidos - informação já pública anteriormente.

Toda a informação que é considerada relevante pela lei que entrou em Janeiro não é divulgada: valores das dívidas e de o que está por pagar.

O Banco de Portugal foi obrigado, por essa lei, a realizar um relatório extraordinário sobre as dívidas dos bancos que foram ajudados. A informação refere-se aos bancos que receberam auxílio estatal. São oito: CGD, BCP, BPI, BES, Novo Banco, Banif, BPP e BPN. Só que os dados não são revelados publicamente

Porque está o anexo escondido

O supervisor liderado por Carlos Costa dividiu em dois documentos tudo o que diz respeito aos grandes devedores. Há uma nota metodológica, o documento publicado, e há depois um anexo, onde está a “informação relevante relativa às instituições de crédito abrangidas”. E é esse anexo que não foi divulgado.

Essa informação está “abrangida pelo segredo bancário”. “A informação em causa reconduz‐se à vida e à atividade principal das instituições de crédito [...] e às relações destas com os seus clientes, mais concretamente a operações bancárias (mormente de crédito) com dados individuais sobre os clientes”, indica o documento. A informação “encontra‐se igualmente abrangida pelo dever de segredo do Banco de Portugal”.

A autoridade gasta alguns parágrafos a explicar o motivo pelo qual não divulga a informação “relevante” sobre os grandes devedores dos bancos: “Além da necessária preservação do dever legal de segredo e da escrupulosa proteção de dados pessoais, importa atender às especiais cautelas que, no tratamento da informação constante do relatório extraordinário, não podem deixar de ser absolutamente justificadas à luz da estrita observância de princípios estruturantes de sã e leal concorrência entre as instituições de crédito e sociedades não financeiras a operar no mercado português, procurando‐se igualmente salvaguardar a estabilidade financeira e o regular financiamento da economia”.

Outra questão é o "dano reputacional": "poderá contribuir para uma perceção negativa por parte dos atuais e futuros clientes em favor de entidades não sujeitas ao escrutínio inerente à lei, enquanto para as empresas, designadamente para aquelas que regularizaram, ou estão a regularizar a sua situação, a eventual perda de confiança poderá ter impacto significativo na sua atividade e, deste modo, no emprego gerado, com as consequentes implicações em termos de estabilidade financeira".

Aliás, há um aviso claro: “a sua eventual divulgação, além de contrária às regras sobre o segredo e sobre a proteção de dados pessoais, constituiria um risco significativo para a estabilidade financeira e o regular financiamento da economia”.

Banca precisou de 23,8 mil milhões do Estado

No relatório, os números divulgados dizem respeito apenas aos fundos públicos disponibilizados às instituições de crédito abrangidos desde 2007, referido como o período sob abrangência da lei. São num total de 23,8 mil milhões de euros.

A CGD é a mais relevante, com 6,25 mil milhões, sendo que o BES e Novo Banco exigem 4,3 mil milhões, mas não têm ainda informação actualizada (os 850 milhões emprestados pelo Estado ao Fundo de Resolução, para colocar no banco, este ano). Aqui, nada foi ainda recuperado, sendo que o banco estatal já pagou dividendos este ano (200 milhões).

Os empréstimos ao BCP e BPI, no total de 4,5 mil milhões, foram totalmente recuperados, sendo que no Banif houve apenas um ressarcimento parcial.

Braço-de-ferro a caminho?

O Banco de Portugal divulga o documento consoante o seu entendimento, e o Parlamento vai agora analisar se o que foi revelado cumpre o “espírito do legislador”, como disse o deputado Duarte Pacheco.

O Parlamento, que está sensível ao facto de haver informação que não pode ser revelada (valores de imparidades de créditos em venda e nomes de devedores que são cumpridores), pode considerar que há dados que podem ser divulgados sem colocar em risco a estabilidade financeira. E ir contra o supervisor.

Essa avaliação vai agora ser feita pela comissão de Orçamento, Finanças e Modernização Administrativa – que poderá depois entrar em contactos com o Banco de Portugal para pedir mais dados – e o assunto será também discutido em conferência de líderes esta quarta-feira.

Nos últimos anos, os deputados e o supervisor da banca têm tido embates devido ao acesso a informação sobre os bancos – aliás, foram eles que estiveram na base desta lei de Janeiro.

(Notícia atualizada às 15.15 com mais informações)

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