A História de 2080 semanas

23-05-2019
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Francisco Pinto Balsemão não era propriamente um novato na imprensa. O tio e o pai eram os proprietários do "Diário Popular", o maior vespertino de Lisboa, onde se estreara como jornalista profissional. Por morte do pai, herdou a quota de 16,6% do capital da empresa proprietária do jornal - ao lado do tio, acionista maioritário, e de Guilherme Brás Medeiros - e passou a fazer parte da administração. "O meu tio, que também se chamava Francisco, não tinha filhos, era meu padrinho e adorava-me", recorda Pinto Balsemão, que acrescenta: "E eu adorava-o".

Em 1969 realizam-se eleições para a Assembleia Nacional. Marcello Caetano, sucessor de Salazar, ensaia uma tímida liberalização e abre as listas do partido único, a Ação Nacional Popular (ANP). Convidado, Balsemão aceita, como candidato independente, é eleito e passa a enfileirar num aguerrido grupo de deputados, liderado por Francisco Sá Carneiro e mais tarde conhecido por "ala liberal".

No verão de 1971, um grupo económico liderado por Miguel Quina, ligado ao Banco Borges, avança para a compra do "Diário Popular". A oferta é irrecusável e o tio de Balsemão aceita. Sem o vespertino, definitivamente rendido ao jornalismo e cada vez mais desencantado com a "primavera marcelista", Balsemão decide investir num jornal próprio. Ideias e projetos não lhe faltam. O modelo é o dos "jornais ingleses de domingo de qualidade", como o "The Sunday Times" e "The Observer". O título escolhido, Expresso, não deixa de evidenciar a fortíssima influência da revista francesa "L'Express". "Fizemos uma sondagem sobre o título e deu resultados péssimos. As pessoas pensavam que se tratava de um comboio... Mesmo assim avançámos".

À empresa proprietária é dado o nome de Sojornal-Sociedade Jornalística e Editorial, SARL. Cauteloso, Balsemão fica com 51% do capital inicial, de 6 mil contos (1,6 milhões de euros, a preço atual, ajustado à inflação) - e limita a participação dos demais acionistas a um máximo de 15%. Entre os principais parceiros contam-se a Sociedade Nacional de Sabões (a que está ligado o amigo Luiz Vasconcellos), proprietária das agências de publicidade Ciesa e Publicis; o banqueiro Manuel Boullosa; as famílias Ruella Ramos ("Diário de Lisboa") e Botelho Moniz (Rádio Clube Português). Outros acionistas, com posições pequenas, são o tio Francisco, seis grandes amigos de Balsemão (Luiz Vasconcellos, Francisco da Costa Reis, António Patrício Gouveia, Ruben A. Leitão, Luís Corrêa de Sá, António Flores de Andrade) e a mulher, Mercedes. E ainda dois jovens promissores: António Guterres e Marcelo Rebelo de Sousa, filho do ministro das Corporações e muito ligado a Caetano.

A sede fica num segundo andar direito do nº 37 da Rua Duque de Palmela. É um belo imóvel, desenhado em 1902 pelo arquiteto Ventura Terra e onde vivera Afonso Costa. Semanário em formato broadsheet, é concebido como integrando dois cadernos. O primeiro, explicará o dono e diretor, de caráter mais noticioso, "com uma primeira página forte e secções bem definidas nas páginas interiores". O segundo, chamado "Revista", é "menos ligado ao dia a dia, convidando à reflexão e proporcionando entretenimento", contendo "prosas maiores", com as secções de economia e cultura (incluindo um conto original) e a rubrica 'Gente', marcada por "uma permanente irreverência".

As inovações alargam-se ao próprio grafismo. "Importámos as fontes tipo Times, que não existiam em Portugal, adotámos os títulos em caixa baixa, e impusemos as fotografias a rasgar a primeira página". O desenho original é da autoria do designer Vítor da Silva, que se apoia em Luís Ribeiro, mais conhecido por "Mestre", e que, durante anos, será o grafista-chefe do jornal.

Uma redação de 10 jornalistas

A redação, formada por uma dezena de profissionais, é chefiada por Augusto de Carvalho, que conta com o apoio na secção nacional de José Manuel Teixeira. Outros redatores são Fernando Ulrich (que, sob o pseudónimo de Vicente Marques, faz a crónica bolsista), António Patrício Gouveia (economia), Álvaro Martins Lopes (internacional), Inácio Teigão (desporto), Fernando Brederode Santos (que já estivera preso pela PIDE, tal como o diretor de publicidade, Jorge Galamba). Teodomiro Leite de Vasconcelos tem um 'gancho' na Rádio Renascença, onde na noite de 24 para 25 de abril de 1974 irá pôr a rodar o disco "Grândola, Vila Morena"... O deputado João Bosco Mota Amaral é o correspondente nos Açores (assinando como J. Soares Botelho) e Mercedes Balsemão, mulher do diretor, faz as palavras cruzadas, com o pseudónimo de Marcos Cruz. Juan Luis Cebrián, fundador, em 1976, e primeiro diretor do "El País" e grande amigo de Balsemão, é o correspondente em Madrid.

Para se inteirar do modelo jornalístico, Augusto de Carvalho faz um estágio no Reino Unido, acompanhado do diretor de publicidade e de Fernando Ulrich. O grupo trabalha nos londrinos "The Sunday Times" e "The Observer", Atenta, a Direção-Geral de Segurança (DGS, sucessora da PIDE) interceta e fotocopia a correspondência trocada entre Balsemão e os seus homólogos ingleses, fazendo-a chegar às mãos de Marcello Caetano.

A sessão de lançamento do novo semanário realiza-se a 21 de dezembro de 1972, no hotel Ritz. Dias depois, a 27, o vespertino "República", ligado à oposição socialista, traz uma longa entrevista a Balsemão. Uma cópia é anexada ao processo aberto pela polícia política em nome de Balsemão. A primeira entrevista, porém, fora dada a 27 de outubro de 1972 ao jornalista Alexandre Manuel, da revista "Flama": "É viável uma imprensa portuguesa independente".

A campanha de publicidade é entregue à agência Ciesa, onde pontifica o criativo Artur Portela Filho. "Expresso, o jornal dos que sabem ler", é o principal slogan, a apelar a uma leitura nas entrelinhas... A campanha para a televisão é proibida. Marcelo Rebelo de Sousa detalha: "Dizia qualquer coisa como 'o Expresso não é de esquerda nem de direita, nem de cima nem de baixo, mas do centro'. O Portela é que fez os textos".

Duas inovações são o estatuto editorial, que define a orientação do periódico, e um Conselho de Redação, eleito pelos jornalistas, órgão de participação na elaboração do jornal. Uma terceira novidade é o Conselho Editorial, a que se pede que discuta e critique o conteúdo e para o qual são convidados Mário Murteira, Ruben A., Vasco Vieira de Almeida, João Morais Leitão, Sedas Nunes e Magalhães Mota, que, recorda Balsemão, "todas as semanas enviava uma carta repleta de sugestões e notícias".

O nº 1 sai para a rua no sábado 6 de janeiro de 1973. A tiragem ultrapassa os 60 mil exemplares, impressos na rotativa do "Diário de Lisboa". Com 24 páginas e dois cadernos, o preço é de 5$00 (€1,33 a preço atual). A manchete é uma sondagem encomendada, que revela que "63 por cento dos portugueses nunca votaram" - para bom entendedor... A 3 de fevereiro surgem pela primeira vez as iniciais MRS - de Marcelo Rebelo de Sousa, que se estreia na análise política e que só mais tarde assinará por extenso. Marcelo, que inicialmente fora convidado para gestor, vai sendo desligado dessas funções, para as quais não revela grande talento; desviado para a área dos conteúdos, é igualmente destacado para gerir as complexas relações com a censura, que desde 1971 se chama Exame Prévio. Mário Bento Soares é o respetivo diretor. Provocador, Marcelo faz gala em lhe chamar Mário Soares, em vez de Mário Bento... O ex-chefe da censura recorda que "o Expresso era uma dor de cabeça".

Nas 68 edições submetidas ao lápis azul, o semanário leva mais de quatro mil cortes, em quase dois mil textos. A tudo estão atentos os coronéis censores: notícias, entrevistas, reportagens, títulos, até palavras cruzadas. Golpes em artigos de opinião são aos molhos, incidindo sobre nomes como Pinto Balsemão, Sá Carneiro e Miller Guerra, Mário Soares e Salgado Zenha, Maria de Lourdes Pintasilgo e Jorge Sampaio.

No final de maio de 1973, durante uma deslocação de Balsemão a Espanha, Rebelo de Sousa decide desrespeitar três dezenas de cortes impostos à edição de 2 de junho. O pior é a ressaca. Furioso, o diretor-geral de Informação, Geraldes Cardoso, retalia, impondo uma dupla censura: não apenas aos textos, mas às próprias provas de página. O castigo repete-se em janeiro de 1974, quando o mesmo Geraldes Cardoso escreve a Balsemão, comentando, irado, duas notícias de capa da edição de dia 12: "Sottomayor Cardia ouvido na DGS" e "Conferência sobre arte interrompida pela PSP". A sanção repete-se: "sujeição de todo ou parte do jornal a prova de página", e que se prolongará por vários meses. Os efeitos são desastrosos. Os atrasos na feitura são em catadupa. O jornal passa a sair da rotativa tarde e a más horas, perdendo o correio e os comboios. As vendas caem, a publicidade retrai-se. Luís Ribeiro, o designer, recordará o alerta pessimista de Balsemão: "Mestre, tem de ir pensando nos seus desenhos, porque se calhar qualquer dia fecham-nos a porta". Balsemão não duvida: "Se o 25 de abril não tivesse acontecido, o Expresso teria acabado!".

O 25 de abril é uma festa. O primeiro número em liberdade vai para a rua a 27. No andar da Duque de Palmela não se faz só o Expresso - faz-se também o Partido Popular Democrático, PPD, antecessor do PSD. O nome é escolhido durante uma conversa que reúne, entre outros, Balsemão, Marcelo e Ruben A., que é quem sugere o nome. A preferência pendia para a designação de social-democrata, mas da qual outros dois partidos, que nunca haveriam de constituir-se, se haviam apropriado com pinturas nas paredes. Ao telefone, no Porto, está Sá Carneiro, que também concorda com a sigla, que é arrematada. O Expresso é palco de outro momento histórico da criação do PPD/PSD, contado por Balsemão: "Quando o Miller Guerra, depois de uma discussão com o Presidente António de Spínola sobre a descolonização, decidiu não ser fundador do partido, foi no meu gabinete na Duque de Palmela, que, no regresso de Belém, o Sá Carneiro, o Magalhães Mota e eu próprio tentámos, sem êxito, convencê-lo a ficar".

"Ambiente de cortar à faca"

Vindo do "Comércio do Funchal", Vicente Jorge Silva começa a colaborar em setembro. "Havia um cordão umbilical entre o Expresso e o PPD. E tirando a política, o jornal ainda andava à procura do seu próprio percurso". Com o acelerar da revolução, o jornal envereda por um jornalismo de combate, em defesa de um regime democrático. Sobretudo a partir do momento em que o primeiro-ministro Vasco Gonçalves classifica o jornal de "pasquim". "O ambiente era de cortar à faca", refere Vicente Jorge Silva.

Com contactos estreitos com o Copcon, a mais poderosa estrutura militar da altura, chefiada por Otelo Saraiva de Carvalho, "o jornalista Benjamim Formigo tinha um mapa na parede cheio de pioneses a indicar as posições militares. À noite, íamos lá e mudávamos os pioneses todos...". Num texto evocativo, Balsemão destaca que, após o silenciamento do "República", o Expresso era "o único meio de comunicação social de expansão nacional não controlado pela Aliança PCP/MFA (Movimento das Forças Armadas), ou parte do MFA". No próprio Expresso "houve tentativas palacianas de me derrubar por parte de algumas pessoas mais afetas ao PCP e aos seus aliados no MFA, mas não tiveram apoio, até porque havia uma forte fação do MRPP (Movimento Reorganizativo do Partido do Proletariado, de extrema-esquerda) na redação". No "verão quente" as tiragens chegam aos 150 mil exemplares. O ritmo de acontecimentos é tal que a partir de 5 de novembro de 1975 passa a sair uma edição à quarta-feira. Chama-se "Expresso Extra" e mantém-se até 7 de janeiro de 1976. O 25 de novembro de 1975 põe termo aos dias loucos do PREC (Processo Revolucionário Em Curso). No sábado 29, e por uma vez na vida, o Expresso não é publicado, devido ao estado de sítio na Região Militar de Lisboa.

A partir de 1976, normalizada a situação política, o jornal começa finalmente a poder assumir o papel de contrapoder - no sentido de assumir e respeitar a legitimidade de um poder finalmente democrático e sufragado em eleições livres. A concorrência é basta e quer o "Tempo" quer "O Jornal" chegam a ultrapassar o Expresso. A competição, porém, nunca assustou Balsemão. "A concorrência foi-nos sempre útil: de cada vez que um novo concorrente aparecia, o produto melhorava, o Expresso aumentava as vendas, o mercado publicitário alargava". Uma verdade que se há de confirmar mais tarde com o "Semanário", "O Independente" e o "Sol".

É neste período que se começam a evidenciar algumas fricções entre os dois principais nomes do semanário. Na secção 'Gente' de 5 de agosto de 1978 surge uma estranhíssima frase, desinserida de qualquer contexto: "O Balsemão é lelé da cuca". O autor é o próprio Marcelo, aparentemente para demonstrar - em resposta a um desafio lançado por pessoa amiga - até que ponto ia a sua ousadia e liberdade. "A frase perseguirá Marcelo toda a vida como exemplo de loucura irresponsável", frisa o seu biógrafo, Vítor Matos. O episódio, que faz parte dos anais do Expresso, irá toldar para todo o sempre as relações entre o diretor e aquele subdiretor. Apesar disso, em janeiro de 1980, quando Balsemão passa a ministro-adjunto do primeiro-ministro, no Governo de Sá Carneiro, nomeia Marcelo para diretor interino. Mesmo em São Bento, o dono não deixa de velar pelo jornal. Não confiando em Marcelo, chega a convidar Fernando Ulrich para o seu lugar. "Em 1980/81 passei por um susto horrível: o dr. Balsemão quis que eu fosse diretor do jornal (...) Fiquei completamente dividido, mas acabei por não aceitar".

Dinamizada por Vicente Jorge Silva, a Revista ganha um fôlego assinalável. "Gostei muito de trabalhar com o Marcelo e a Revista não teria sido possível sem ele. O jornal estava muito contaminado pela política. Concebida por mim e pelo António Mega Ferreira, a Revista tornou-se uma espécie de contraponto, pelo lado da cultura, da reportagem, da investigação".

Fazendo gala da sua independência, o Expresso passa a ser um dos principais críticos do Governo da Aliança Democrática, presidido, a partir de janeiro de 81, por Pinto Balsemão. "Cometemos alguns exageros, mas enraizámos a independência do jornal", orgulhava-se Augusto de Carvalho, num texto a propósito dos 25 anos do Expresso; "O seu proprietário nunca interferiu nas regras do jogo, apesar de constantemente instado a fazê-lo. Honra lhe seja!" No outro lado da barreira, também Balsemão considera que "houve exageros, instigados em muitos casos por Marcelo Rebelo de Sousa". Este acaba por entrar no executivo em setembro de 1981, com Augusto de Carvalho a assumir a direção interina do jornal. Entre Balsemão e Marcelo, porém, nada será como dantes. Numa entrevista a "O Independente", o primeiro acusará o seu ex-braço-direito: "Traiu-me várias vezes desde que, em 1972, o chamei para colaborar comigo no Expresso".

Vocacionado para a grande reportagem, Augusto de Carvalho não está fadado para diretor, cargo que exerce interinamente. Em fevereiro de 1983 passa a estar acompanhado por José António Saraiva, um arquiteto que salta diretamente de colaborador para subdiretor.

Em junho, Balsemão regressa à empresa e há um movimento para que volte a ser diretor, mas ele recusa, alegando que "quando se faz bem um lugar não se deve tentar voltar a fazê-lo". Além disso, deseja estar disponível para um projeto mais ambicioso: a criação de um grupo multimédia.

A nova dupla da direção desfaz-se em pouco tempo. Em outubro, na sequência de uma acesa querela em torno do destaque a dar a uma entrevista dada pelo Presidente de Moçambique, Samora Machel, o diretor apresenta a demissão, depois de ter publicado o seu trabalho no semanário concorrente "O Jornal". Saraiva é, naturalmente, quem está na calha. "Mas disse logo que não seria diretor, porque era a forma de demonstrar que tinha sido leal com o Augusto. E sugeri vários nomes alternativos, como o de Mário Mesquita", diretor do "Diário de Notícias", conta Saraiva. Balsemão não desiste. O nome de Saraiva é objeto de uma votação entre os redatores. Votam 20: 5 a favor, 2 contra, 1 nulo e 12 em branco. "O resultado foi absolutamente desgraçado", reconhece o arquiteto; "acabei por assumir, com claro sacrifício".

Jornal cresce até sete cadernos

No verão seguinte, a secção 'Gente' volta a estar no epicentro de mais uma crise. Uma nota da autoria do ex-editor da secção nacional e na altura cronista João Carreira Bom leva à instauração de um processo disciplinar, que dita uma suspensão quase simbólica. Saraiva, que vinha sendo contestado na redação, abre a direção a alguns dos seus críticos. "Sentia-me muito solitário e passada a crise Carreira Bom, decidi reforçar o núcleo dirigente", convidando Vicente Jorge Silva e Jorge Wemans, que assumem funções em novembro de 1984. "Entrou-se então numa espécie de 'normalidade constitucional', ainda que não isenta de choques entre mim e o Vicente, que é uma pessoa explosiva".

Por proposta de Wemans, a área de economia é autonomizada num caderno próprio. O jornal passa a assentar no que Saraiva designa "um tripé: a política, a economia e a cultura". É "o início de um período de grande crescimento do jornal, que irá culminar em outubro de 1989 com a existência de sete cadernos fixos". A Revista, a funcionar no último andar do edifício, continua nas mãos de Vicente Jorge Silva. "O meu território era o sótão, feito pelo Saraiva e que era uma obra fantástica. Mas nessa altura eu já tinha na cabeça a ideia de um diário".

O projeto chega a ser apresentado a Balsemão, que se mostra desinteressado. O mesmo não sucede com Belmiro de Azevedo, o "patrão" da Sonae, que transforma o sonho de Vicente no matutino "Público", lançado em 1990. Vicente e Wemans levam consigo quase uma vintena de jornalistas, entre os quais José Manuel Fernandes, Nuno Pacheco, Teresa de Sousa e José Vítor Malheiros, além de outros trabalhadores.

A recomposição do Expresso é feita por Joaquim Vieira, que entrara no Expresso em 1981, revelando-se um grande repórter de investigação, e que é promovido a diretor-adjunto. "O Vieira desempenhou um papel muito importante, mesmo fulcral", admite José António Saraiva. "Segurou a Clara Ferreira Alves e foi buscar gente nova e de qualidade". Ao todo entram 19 jornalistas. No semanário "O Jornal" recruta Henrique Monteiro e João Garcia, do "Diário de Notícias" vem Fernando Madrinha, e entre os estagiários inclui-se o estudante Ricardo Costa - nomes que virão a desempenhar, a mais ou menos prazo, cargos em futuras direções do Expresso.

A concorrência com o "Público" e "O Independente", aliada ao sangue novo numa redação paga generosamente, levam o Expresso a superar a crise. As vendas e a publicidade aumentam - e, com eles, os lucros. Por sugestão de Saraiva, o jornal passa a ser vendido dentro de um saco de plástico.

Uma data histórica

Data histórica é 6 de outubro de 1992. Nesse dia iniciam-se as emissões da SIC, que confere ao grupo liderado por Balsemão uma invejável dimensão multimédia. Ricardo Costa transfere-se para o novo canal televisivo, juntamente com Luís Marques, Reinaldo Serrano, Paulo Camacho e Sofia Pinto Coelho.

Uma notícia sobre a SIC, na edição de 13 de novembro de 1993, provoca uma inesperada crise no Expresso. Joe Berardo comprara 10% das ações da SIC, que aumentara o capital para 10 milhões de contos (50 milhões de euros). A notícia é dada por Balsemão a Saraiva, que a redige e pede a Joaquim Vieira, que é quem está de fecho, para não a mudar. Sem nada dizer ao diretor, o adjunto acrescenta-lhe um novo dado, segundo o qual Berardo "tem um processo nos tribunais por alegada fuga ao fisco". Quebrada a indispensável relação de confiança no interior da direção, Vieira acaba por apresentar a demissão. "Fiquei um ano e meio sozinho na direção" - escreverá Saraiva no segundo volume das suas "Confissões"; "Foi talvez o modelo de governance mais perfeito que tive".

Não é bem essa a apreciação da administração, que em abril de 1995 força a reconstituição da direção. "Apesar das reticências de Balsemão", como escreverá Saraiva, José António Lima entra para diretor-adjunto, enquanto Fernando Madrinha e Henrique Monteiro são nomeados subdiretores. Lima, que ingressara no jornal como revisor de imprensa, é um elemento da inteira confiança de Saraiva, que define Madrinha como "relativamente neutro", enquanto Monteiro seria "a oposição, o contrapoder". Meses antes, Monteiro entrara em choque frontal com Saraiva. "Demiti-me de editor por causa das eleições em Moçambique, em outubro de 1994. Tinha ido fazer a campanha e discordei completamente de um editorial de Saraiva, no qual dizia que não era possível a democracia em África".

Um marco chamado Guias de Portugal

José António Saraiva descreve "o momento mais alto" dos seus 23 anos de diretor: "Terá sido quando fizemos 'O Guia de Portugal' e tirámos pela primeira vez 200 mil exemplares. Não foi só pela tiragem em si. Foi também porque representou um pedregulho em cima de 'O Independente', que atirou a toalha ao chão". O presidente do Conselho de Administração, Pinto Balsemão, recorda que "os famosos 'Guias' nasceram nas habituais reuniões de terça-feira, em que participavam administradores e a direção, e que eram fundamentais para a crítica e o planeamento do jornal".

A entrada no mundo da net, com a criação do Expresso Online, é em 1997. Em março do ano seguinte, a direção é ampliada com um novo elemento, Nicolau Santos, que antes dirigira o "Público", o "Diário Económico" e o "Semanário Económico". Na opinião de Henrique Monteiro, "este é um momento decisivo, porque é quando a relação no interior da direção se desequilibra".

A Revista, um dos produtos mais distintivos do Expresso, é substituída no início de 2003 pela Única. A decisão é contrariada por Monteiro: "Opus-me à mudança de nome e de conceito". Na mesma data, o caderno cultural, que se chamava Cartaz, evolui para Atual.

Apesar de se terem alargado a todo o edifício, as instalações da Duque de Palmela rebentam pelas costuras. Inevitável, a mudança ocorre em março de 2003, para um moderníssimo edifício em Laveiras (Paço de Arcos), partilhado com as demais publicações do grupo. Em 2005, na sequência da ida de Fernando Madrinha para diretor do "Courrier Internacional", Cândida Pinto entra para diretora-adjunta - a primeira e até agora única mulher a aceder à direção. Repórter da SIC, fora ela quem, em 2002, quando diretora da SIC Notícias, propusera a criação de um programa de televisão cujo formato se fixou no "Expresso da Meia-Noite".

O ano de 2005 é o da sucessão de José António Saraiva, que Balsemão prepara com pinças. Por sua iniciativa, o diretor do Expresso é consagrado em junho com o prémio internacional Luca de Tena, promovido pelo jornal "ABC". Semanas antes, e à laia de despedida, Saraiva dera uma grande entrevista ao seu próprio jornal, em que admitia poder ganhar o Nobel da literatura.

É por essa altura que Balsemão convida Henrique Monteiro para diretor. "Disse-lhe que não queria. Insistiu muito comigo e sugeri o nome da Cândida Pinto, mas ele não aceitou". Balsemão também aborda com Saraiva o perfil do sucessor. "Sugeri o Ricardo Costa, diretor da SIC Notícias, ou o Mário Ramires, o editor da política". Entre os dois, a sua preferência é clara: "Com o Mário Ramires a minha relação era quase paternal, ele assumia-se como meu 'discípulo' - pelo que a sucessão processar-se-ia de forma natural". A escolha de Balsemão, contudo, já está tomada há muito: "Só pensei no Henrique Monteiro".

Este assume a direção em janeiro de 2006. No cabeçalho sai ainda o nome de José António Lima (que se demitira), permanecendo os de Nicolau Santos e Cândida Pinto, e entra o de João Garcia, com larga experiência de editor. Monteiro lamenta que não tenha havido "nenhuma conversa na transição. Saraiva não me passou um único papel. Deixou-me apenas um cartão (que guardei), a dizer que nunca diria mal de mim - depois viu-se..."

O ex-diretor permanece umas semanas no grupo Impresa, de onde sai para lançar um semanário concorrente. Financiado pelo BCP, de Paulo Teixeira Pinto, o "Sol" arranca a 16 de setembro de 2006, feito pelos dois Josés Antónios (Saraiva e Lima), Mário Ramires e uma vintena de dissidentes do Expresso. Este responde por antecipação: a 9 de setembro surge com um novo formato (berliner) e um grafismo radicalmente novo, criado pela empresa de consultores Innovation e executado por Marco Grieco. Brasileiro, Grieco fora recrutado ao "Jornal de Notícias" e é o primeiro diretor de arte do jornal. A recompensa são vários prémios internacionais, incluindo o do jornal mais bem desenhado do mundo. Outra 'revolução' é em matéria de organização da redação. "Acabei com os gabinetes e pus toda a gente em open space, incluindo os diretores", orgulha-se Monteiro.

A 28 de outubro o Expresso atinge o seu recorde absoluto de vendas em banca: 202.108 exemplares, no termo de uma oferta de DVD aos leitores. O velho estatuto editorial é atualizado, mas mantém todos os princípios fundamentais, ao mesmo tempo que se cria um código de conduta dos jornalistas do Expresso.

Cândida Pinto regressa à SIC em março de 2008. Para o seu lugar entra João Vieira Pereira, editor de economia e que antes dirigira o "Semanário Económico". E no início de 2009 a equipa diretiva é ampliada com Ricardo Costa, vindo da SIC. O regresso de Costa ao periódico onde estagiara não é por acaso. Para Monteiro, havia que começar a rodar um futuro diretor. "Já estava na direção há 16 anos e não me queria eternizar. Quando aceitei ser diretor foi por um prazo de dois anos, que, por insistência do dr. Balsemão, se foi alargando - primeiro para três, depois para quatro. Até que lhe escrevi, a recordar o compromisso inicial. Pedi para ser substituído e sugeri o Ricardo Costa". Antes de sair, Monteiro, acompanhado do sucessor, promove uma negociação com quase duas dezenas de trabalhadores, visando a rescisão dos contratos.

A 8 de janeiro de 2011 o Expresso conhece o seu sexto diretor. "Esta é uma direção de continuidade, sem qualquer rutura, praticamente com a mesma equipa", acentua Ricardo Costa, que leva consigo Miguel Cadete, diretor do mensário de música "Blitz" e que já editara o Atual.

A edição nº 2000 (26 de fevereiro de 2011) é assinalada com várias iniciativas. "Além de um número especial, arrancámos com a edição no iPad e modificámos profundamente o nosso site" - explica o atual diretor. Durante largos meses o Expresso lidera as revelações sobre o chamado "caso dos espiões". "Fui um dos intervenientes, em conjunto com outros jornalistas, e creio que o resultado foi importante em termos políticos, jornalísticos e até para o próprio grupo".

Para Ricardo Costa, "o mais negativo são as condições de mercado, que têm vindo a degradar-se, a par e passo com o país". As consequências refletem-se nas vendas e na publicidade. "Sei bem que esta não é uma época áurea da história do Expresso, em termos de resultados. No entanto, e contraditoriamente, nunca o jornal chegou a tanta gente, através da edição em papel, da net, do iPad, dos telemóveis, até da própria televisão. O grande desafio é preservar o lugar que ocupa na sociedade, sem pôr em causa a sua história, autonomia e independência".

Jornalista, político, empresário, quase toda a vida de Francisco Pinto Balsemão está ligada ao Expresso, que costuma designar, com orgulho e carinho, "navio almirante" do grupo multimédia que encabeça. Nascido em Lisboa em 1937, licenciado em Direito, Balsemão nunca deixou de ser o principal proprietário do jornal, do qual foi o primeiro diretor, desde a fundação até ir para o governo, em janeiro de 1980. No ano seguinte, substitui no cargo de primeiro-ministro o amigo Sá Carneiro, acabado de morrer numa fatídica viagem de avião. Após se ter demitido da chefia do governo da Aliança Democrática, em junho de 1983, regressa ao Expresso. Não como diretor, mas reocupando o cargo de presidente do Conselho de Administração, de onde arranca para a construção do futuro grupo Impresa, que inclui a SIC, a revista "Visão" e muitas outras publicações. Deixou em outubro as funções de CEO do grupo, de que passou a ser presidente. Com um vastíssimo currículo empresarial e político, é um dos "senadores" do regime democrático. Pertence ao Conselho de Estado, nomeado por Cavaco Silva.

É na Assembleia Nacional, no princípio dos anos setenta, que o deputado Pinto Balsemão o conhece: "O Marcelo aparecia nas galerias da Assembleia a apoiar as intervenções dos deputados liberais. Depois vinha falar connosco, a 'dar manteiga'". O jurista é convidado para gestor do novo jornal, mas não vingará. Em contrapartida, cedo começa a fazer análise política. Diretor do Expresso em 1980-81, transporta o seu jeito muito peculiar de comentador para outros jornais (como o "Semanário", que funda em 1983), rádio (TSF) e até televisão (atualmente na TVI). Nascido em Lisboa em 1948, é catedrático da Faculdade de Direito de Lisboa. Fundador do PPD/PSD, de que foi presidente da Comissão Política Nacional (1996-99), pertenceu ao VIII Governo Constitucional. Candidato derrotado à câmara da capital, é membro do Conselho de Estado.

Primeiro chefe de redação do Expresso, vindo da revista "Vida Mundial", foi diretor entre 1981 e 1983 e distinguiu-se sobretudo como repórter. Natural de Sátão (Viseu), foi sacerdote católico, tendo cursado teologia em Roma. Faleceu em agosto último, com 79 anos, em Maputo, onde se fixara há duas décadas, sem ter cumprido a promessa de "escrever um livro" sobre o semanário que ajudou a fundar.

Arquiteto, foi diretor do Expresso de 1983 a 2005. Dos seus 26 anos no jornal escreveu dois livros de memórias, a que deu o nome genérico de "Confissões". "Acho que fiz praticamente tudo o que gostava de ter feito" no Expresso, disse. Estreou-se na imprensa antes do 25 de abril, no semanário "Comércio do Funchal", coordenado por Vicente Jorge Silva, que depois o convidou para escrever no Expresso, onde manteve, a partir de novembro de 1981, uma rubrica a que chamou "Política à Portuguesa". Em 2006 fundou o semanário "Sol", a que fixou o objetivo de "bater o Expresso e destroná-lo do lugar 'histórico' que ocupava". Leciona na Universidade Católica e é autor de vários estudos históricos e de romances. Nascido em Lisboa em 1948, é filho do filólogo José António Saraiva e sobrinho do historiador José Hermano Saraiva.

Em junho de 1989 estava a frequentar um seminário de jornalismo numa universidade dos EUA. "Recebi um telefonema do Joaquim Vieira, deviam ser umas quatro da manhã. Era a convidar-me para o Expresso. Despedi-me de 'O Jornal' por fax, que era a tecnologia mais moderna". Tal como todos os jornalistas que entravam na casa, é recebido por Balsemão. "Recebeu-me de braços abertos. Mais tarde, o José António Saraiva, que eu não conhecia, convidou-me para almoçar no Pabe. Disse-me: 'Se fosse apenas por mim, você não teria vindo trabalhar para o Expresso'". Diretor do jornal de 2006 a 2010, é o próprio quem sugere o nome do sucessor, Ricardo Costa. Nascido em Lisboa em 1956, licenciado em História, trabalhou ainda nos jornais "Voz do Povo", "Jornal de Notícias" e "Notícias da Tarde". É diretor coordenador editorial do grupo Impresa.

Entra no Expresso como estagiário, em 1989. "Tinha 21 anos, estava no 3º ano de Comunicação Social da Universidade Nova de Lisboa - o mesmo em que ainda estou. Sou dos últimos jornalistas não licenciados... Contava ir para a secção internacional, mas levaram-me para a política, o que marcou a minha vida profissional para sempre". Em 1992 é um dos fundadores da SIC. "Fui para a SIC pela mais absurda das razões. Não gostava de televisão, mas era uma maneira de entrar no quadro". Repórter e comentador político, é diretor de informação da SIC, que acumula com a direção da SIC Notícias entre 2003 e 2008. No ano seguinte regressa ao Expresso e logo para a direção. Desde 8 de janeiro de 2011 que é o diretor do jornal. Lisboeta, é filho do escritor goês Orlando da Costa e meio-irmão do presidente da Câmara de Lisboa, António Costa.

Texto publicado na Revista de 5 de janeiro de 2013

Francisco Pinto Balsemão não era propriamente um novato na imprensa. O tio e o pai eram os proprietários do "Diário Popular", o maior vespertino de Lisboa, onde se estreara como jornalista profissional. Por morte do pai, herdou a quota de 16,6% do capital da empresa proprietária do jornal - ao lado do tio, acionista maioritário, e de Guilherme Brás Medeiros - e passou a fazer parte da administração. "O meu tio, que também se chamava Francisco, não tinha filhos, era meu padrinho e adorava-me", recorda Pinto Balsemão, que acrescenta: "E eu adorava-o".

Em 1969 realizam-se eleições para a Assembleia Nacional. Marcello Caetano, sucessor de Salazar, ensaia uma tímida liberalização e abre as listas do partido único, a Ação Nacional Popular (ANP). Convidado, Balsemão aceita, como candidato independente, é eleito e passa a enfileirar num aguerrido grupo de deputados, liderado por Francisco Sá Carneiro e mais tarde conhecido por "ala liberal".

No verão de 1971, um grupo económico liderado por Miguel Quina, ligado ao Banco Borges, avança para a compra do "Diário Popular". A oferta é irrecusável e o tio de Balsemão aceita. Sem o vespertino, definitivamente rendido ao jornalismo e cada vez mais desencantado com a "primavera marcelista", Balsemão decide investir num jornal próprio. Ideias e projetos não lhe faltam. O modelo é o dos "jornais ingleses de domingo de qualidade", como o "The Sunday Times" e "The Observer". O título escolhido, Expresso, não deixa de evidenciar a fortíssima influência da revista francesa "L'Express". "Fizemos uma sondagem sobre o título e deu resultados péssimos. As pessoas pensavam que se tratava de um comboio... Mesmo assim avançámos".

À empresa proprietária é dado o nome de Sojornal-Sociedade Jornalística e Editorial, SARL. Cauteloso, Balsemão fica com 51% do capital inicial, de 6 mil contos (1,6 milhões de euros, a preço atual, ajustado à inflação) - e limita a participação dos demais acionistas a um máximo de 15%. Entre os principais parceiros contam-se a Sociedade Nacional de Sabões (a que está ligado o amigo Luiz Vasconcellos), proprietária das agências de publicidade Ciesa e Publicis; o banqueiro Manuel Boullosa; as famílias Ruella Ramos ("Diário de Lisboa") e Botelho Moniz (Rádio Clube Português). Outros acionistas, com posições pequenas, são o tio Francisco, seis grandes amigos de Balsemão (Luiz Vasconcellos, Francisco da Costa Reis, António Patrício Gouveia, Ruben A. Leitão, Luís Corrêa de Sá, António Flores de Andrade) e a mulher, Mercedes. E ainda dois jovens promissores: António Guterres e Marcelo Rebelo de Sousa, filho do ministro das Corporações e muito ligado a Caetano.

A sede fica num segundo andar direito do nº 37 da Rua Duque de Palmela. É um belo imóvel, desenhado em 1902 pelo arquiteto Ventura Terra e onde vivera Afonso Costa. Semanário em formato broadsheet, é concebido como integrando dois cadernos. O primeiro, explicará o dono e diretor, de caráter mais noticioso, "com uma primeira página forte e secções bem definidas nas páginas interiores". O segundo, chamado "Revista", é "menos ligado ao dia a dia, convidando à reflexão e proporcionando entretenimento", contendo "prosas maiores", com as secções de economia e cultura (incluindo um conto original) e a rubrica 'Gente', marcada por "uma permanente irreverência".

As inovações alargam-se ao próprio grafismo. "Importámos as fontes tipo Times, que não existiam em Portugal, adotámos os títulos em caixa baixa, e impusemos as fotografias a rasgar a primeira página". O desenho original é da autoria do designer Vítor da Silva, que se apoia em Luís Ribeiro, mais conhecido por "Mestre", e que, durante anos, será o grafista-chefe do jornal.

Uma redação de 10 jornalistas

A redação, formada por uma dezena de profissionais, é chefiada por Augusto de Carvalho, que conta com o apoio na secção nacional de José Manuel Teixeira. Outros redatores são Fernando Ulrich (que, sob o pseudónimo de Vicente Marques, faz a crónica bolsista), António Patrício Gouveia (economia), Álvaro Martins Lopes (internacional), Inácio Teigão (desporto), Fernando Brederode Santos (que já estivera preso pela PIDE, tal como o diretor de publicidade, Jorge Galamba). Teodomiro Leite de Vasconcelos tem um 'gancho' na Rádio Renascença, onde na noite de 24 para 25 de abril de 1974 irá pôr a rodar o disco "Grândola, Vila Morena"... O deputado João Bosco Mota Amaral é o correspondente nos Açores (assinando como J. Soares Botelho) e Mercedes Balsemão, mulher do diretor, faz as palavras cruzadas, com o pseudónimo de Marcos Cruz. Juan Luis Cebrián, fundador, em 1976, e primeiro diretor do "El País" e grande amigo de Balsemão, é o correspondente em Madrid.

Para se inteirar do modelo jornalístico, Augusto de Carvalho faz um estágio no Reino Unido, acompanhado do diretor de publicidade e de Fernando Ulrich. O grupo trabalha nos londrinos "The Sunday Times" e "The Observer", Atenta, a Direção-Geral de Segurança (DGS, sucessora da PIDE) interceta e fotocopia a correspondência trocada entre Balsemão e os seus homólogos ingleses, fazendo-a chegar às mãos de Marcello Caetano.

A sessão de lançamento do novo semanário realiza-se a 21 de dezembro de 1972, no hotel Ritz. Dias depois, a 27, o vespertino "República", ligado à oposição socialista, traz uma longa entrevista a Balsemão. Uma cópia é anexada ao processo aberto pela polícia política em nome de Balsemão. A primeira entrevista, porém, fora dada a 27 de outubro de 1972 ao jornalista Alexandre Manuel, da revista "Flama": "É viável uma imprensa portuguesa independente".

A campanha de publicidade é entregue à agência Ciesa, onde pontifica o criativo Artur Portela Filho. "Expresso, o jornal dos que sabem ler", é o principal slogan, a apelar a uma leitura nas entrelinhas... A campanha para a televisão é proibida. Marcelo Rebelo de Sousa detalha: "Dizia qualquer coisa como 'o Expresso não é de esquerda nem de direita, nem de cima nem de baixo, mas do centro'. O Portela é que fez os textos".

Duas inovações são o estatuto editorial, que define a orientação do periódico, e um Conselho de Redação, eleito pelos jornalistas, órgão de participação na elaboração do jornal. Uma terceira novidade é o Conselho Editorial, a que se pede que discuta e critique o conteúdo e para o qual são convidados Mário Murteira, Ruben A., Vasco Vieira de Almeida, João Morais Leitão, Sedas Nunes e Magalhães Mota, que, recorda Balsemão, "todas as semanas enviava uma carta repleta de sugestões e notícias".

O nº 1 sai para a rua no sábado 6 de janeiro de 1973. A tiragem ultrapassa os 60 mil exemplares, impressos na rotativa do "Diário de Lisboa". Com 24 páginas e dois cadernos, o preço é de 5$00 (€1,33 a preço atual). A manchete é uma sondagem encomendada, que revela que "63 por cento dos portugueses nunca votaram" - para bom entendedor... A 3 de fevereiro surgem pela primeira vez as iniciais MRS - de Marcelo Rebelo de Sousa, que se estreia na análise política e que só mais tarde assinará por extenso. Marcelo, que inicialmente fora convidado para gestor, vai sendo desligado dessas funções, para as quais não revela grande talento; desviado para a área dos conteúdos, é igualmente destacado para gerir as complexas relações com a censura, que desde 1971 se chama Exame Prévio. Mário Bento Soares é o respetivo diretor. Provocador, Marcelo faz gala em lhe chamar Mário Soares, em vez de Mário Bento... O ex-chefe da censura recorda que "o Expresso era uma dor de cabeça".

Nas 68 edições submetidas ao lápis azul, o semanário leva mais de quatro mil cortes, em quase dois mil textos. A tudo estão atentos os coronéis censores: notícias, entrevistas, reportagens, títulos, até palavras cruzadas. Golpes em artigos de opinião são aos molhos, incidindo sobre nomes como Pinto Balsemão, Sá Carneiro e Miller Guerra, Mário Soares e Salgado Zenha, Maria de Lourdes Pintasilgo e Jorge Sampaio.

No final de maio de 1973, durante uma deslocação de Balsemão a Espanha, Rebelo de Sousa decide desrespeitar três dezenas de cortes impostos à edição de 2 de junho. O pior é a ressaca. Furioso, o diretor-geral de Informação, Geraldes Cardoso, retalia, impondo uma dupla censura: não apenas aos textos, mas às próprias provas de página. O castigo repete-se em janeiro de 1974, quando o mesmo Geraldes Cardoso escreve a Balsemão, comentando, irado, duas notícias de capa da edição de dia 12: "Sottomayor Cardia ouvido na DGS" e "Conferência sobre arte interrompida pela PSP". A sanção repete-se: "sujeição de todo ou parte do jornal a prova de página", e que se prolongará por vários meses. Os efeitos são desastrosos. Os atrasos na feitura são em catadupa. O jornal passa a sair da rotativa tarde e a más horas, perdendo o correio e os comboios. As vendas caem, a publicidade retrai-se. Luís Ribeiro, o designer, recordará o alerta pessimista de Balsemão: "Mestre, tem de ir pensando nos seus desenhos, porque se calhar qualquer dia fecham-nos a porta". Balsemão não duvida: "Se o 25 de abril não tivesse acontecido, o Expresso teria acabado!".

O 25 de abril é uma festa. O primeiro número em liberdade vai para a rua a 27. No andar da Duque de Palmela não se faz só o Expresso - faz-se também o Partido Popular Democrático, PPD, antecessor do PSD. O nome é escolhido durante uma conversa que reúne, entre outros, Balsemão, Marcelo e Ruben A., que é quem sugere o nome. A preferência pendia para a designação de social-democrata, mas da qual outros dois partidos, que nunca haveriam de constituir-se, se haviam apropriado com pinturas nas paredes. Ao telefone, no Porto, está Sá Carneiro, que também concorda com a sigla, que é arrematada. O Expresso é palco de outro momento histórico da criação do PPD/PSD, contado por Balsemão: "Quando o Miller Guerra, depois de uma discussão com o Presidente António de Spínola sobre a descolonização, decidiu não ser fundador do partido, foi no meu gabinete na Duque de Palmela, que, no regresso de Belém, o Sá Carneiro, o Magalhães Mota e eu próprio tentámos, sem êxito, convencê-lo a ficar".

"Ambiente de cortar à faca"

Vindo do "Comércio do Funchal", Vicente Jorge Silva começa a colaborar em setembro. "Havia um cordão umbilical entre o Expresso e o PPD. E tirando a política, o jornal ainda andava à procura do seu próprio percurso". Com o acelerar da revolução, o jornal envereda por um jornalismo de combate, em defesa de um regime democrático. Sobretudo a partir do momento em que o primeiro-ministro Vasco Gonçalves classifica o jornal de "pasquim". "O ambiente era de cortar à faca", refere Vicente Jorge Silva.

Com contactos estreitos com o Copcon, a mais poderosa estrutura militar da altura, chefiada por Otelo Saraiva de Carvalho, "o jornalista Benjamim Formigo tinha um mapa na parede cheio de pioneses a indicar as posições militares. À noite, íamos lá e mudávamos os pioneses todos...". Num texto evocativo, Balsemão destaca que, após o silenciamento do "República", o Expresso era "o único meio de comunicação social de expansão nacional não controlado pela Aliança PCP/MFA (Movimento das Forças Armadas), ou parte do MFA". No próprio Expresso "houve tentativas palacianas de me derrubar por parte de algumas pessoas mais afetas ao PCP e aos seus aliados no MFA, mas não tiveram apoio, até porque havia uma forte fação do MRPP (Movimento Reorganizativo do Partido do Proletariado, de extrema-esquerda) na redação". No "verão quente" as tiragens chegam aos 150 mil exemplares. O ritmo de acontecimentos é tal que a partir de 5 de novembro de 1975 passa a sair uma edição à quarta-feira. Chama-se "Expresso Extra" e mantém-se até 7 de janeiro de 1976. O 25 de novembro de 1975 põe termo aos dias loucos do PREC (Processo Revolucionário Em Curso). No sábado 29, e por uma vez na vida, o Expresso não é publicado, devido ao estado de sítio na Região Militar de Lisboa.

A partir de 1976, normalizada a situação política, o jornal começa finalmente a poder assumir o papel de contrapoder - no sentido de assumir e respeitar a legitimidade de um poder finalmente democrático e sufragado em eleições livres. A concorrência é basta e quer o "Tempo" quer "O Jornal" chegam a ultrapassar o Expresso. A competição, porém, nunca assustou Balsemão. "A concorrência foi-nos sempre útil: de cada vez que um novo concorrente aparecia, o produto melhorava, o Expresso aumentava as vendas, o mercado publicitário alargava". Uma verdade que se há de confirmar mais tarde com o "Semanário", "O Independente" e o "Sol".

É neste período que se começam a evidenciar algumas fricções entre os dois principais nomes do semanário. Na secção 'Gente' de 5 de agosto de 1978 surge uma estranhíssima frase, desinserida de qualquer contexto: "O Balsemão é lelé da cuca". O autor é o próprio Marcelo, aparentemente para demonstrar - em resposta a um desafio lançado por pessoa amiga - até que ponto ia a sua ousadia e liberdade. "A frase perseguirá Marcelo toda a vida como exemplo de loucura irresponsável", frisa o seu biógrafo, Vítor Matos. O episódio, que faz parte dos anais do Expresso, irá toldar para todo o sempre as relações entre o diretor e aquele subdiretor. Apesar disso, em janeiro de 1980, quando Balsemão passa a ministro-adjunto do primeiro-ministro, no Governo de Sá Carneiro, nomeia Marcelo para diretor interino. Mesmo em São Bento, o dono não deixa de velar pelo jornal. Não confiando em Marcelo, chega a convidar Fernando Ulrich para o seu lugar. "Em 1980/81 passei por um susto horrível: o dr. Balsemão quis que eu fosse diretor do jornal (...) Fiquei completamente dividido, mas acabei por não aceitar".

Dinamizada por Vicente Jorge Silva, a Revista ganha um fôlego assinalável. "Gostei muito de trabalhar com o Marcelo e a Revista não teria sido possível sem ele. O jornal estava muito contaminado pela política. Concebida por mim e pelo António Mega Ferreira, a Revista tornou-se uma espécie de contraponto, pelo lado da cultura, da reportagem, da investigação".

Fazendo gala da sua independência, o Expresso passa a ser um dos principais críticos do Governo da Aliança Democrática, presidido, a partir de janeiro de 81, por Pinto Balsemão. "Cometemos alguns exageros, mas enraizámos a independência do jornal", orgulhava-se Augusto de Carvalho, num texto a propósito dos 25 anos do Expresso; "O seu proprietário nunca interferiu nas regras do jogo, apesar de constantemente instado a fazê-lo. Honra lhe seja!" No outro lado da barreira, também Balsemão considera que "houve exageros, instigados em muitos casos por Marcelo Rebelo de Sousa". Este acaba por entrar no executivo em setembro de 1981, com Augusto de Carvalho a assumir a direção interina do jornal. Entre Balsemão e Marcelo, porém, nada será como dantes. Numa entrevista a "O Independente", o primeiro acusará o seu ex-braço-direito: "Traiu-me várias vezes desde que, em 1972, o chamei para colaborar comigo no Expresso".

Vocacionado para a grande reportagem, Augusto de Carvalho não está fadado para diretor, cargo que exerce interinamente. Em fevereiro de 1983 passa a estar acompanhado por José António Saraiva, um arquiteto que salta diretamente de colaborador para subdiretor.

Em junho, Balsemão regressa à empresa e há um movimento para que volte a ser diretor, mas ele recusa, alegando que "quando se faz bem um lugar não se deve tentar voltar a fazê-lo". Além disso, deseja estar disponível para um projeto mais ambicioso: a criação de um grupo multimédia.

A nova dupla da direção desfaz-se em pouco tempo. Em outubro, na sequência de uma acesa querela em torno do destaque a dar a uma entrevista dada pelo Presidente de Moçambique, Samora Machel, o diretor apresenta a demissão, depois de ter publicado o seu trabalho no semanário concorrente "O Jornal". Saraiva é, naturalmente, quem está na calha. "Mas disse logo que não seria diretor, porque era a forma de demonstrar que tinha sido leal com o Augusto. E sugeri vários nomes alternativos, como o de Mário Mesquita", diretor do "Diário de Notícias", conta Saraiva. Balsemão não desiste. O nome de Saraiva é objeto de uma votação entre os redatores. Votam 20: 5 a favor, 2 contra, 1 nulo e 12 em branco. "O resultado foi absolutamente desgraçado", reconhece o arquiteto; "acabei por assumir, com claro sacrifício".

Jornal cresce até sete cadernos

No verão seguinte, a secção 'Gente' volta a estar no epicentro de mais uma crise. Uma nota da autoria do ex-editor da secção nacional e na altura cronista João Carreira Bom leva à instauração de um processo disciplinar, que dita uma suspensão quase simbólica. Saraiva, que vinha sendo contestado na redação, abre a direção a alguns dos seus críticos. "Sentia-me muito solitário e passada a crise Carreira Bom, decidi reforçar o núcleo dirigente", convidando Vicente Jorge Silva e Jorge Wemans, que assumem funções em novembro de 1984. "Entrou-se então numa espécie de 'normalidade constitucional', ainda que não isenta de choques entre mim e o Vicente, que é uma pessoa explosiva".

Por proposta de Wemans, a área de economia é autonomizada num caderno próprio. O jornal passa a assentar no que Saraiva designa "um tripé: a política, a economia e a cultura". É "o início de um período de grande crescimento do jornal, que irá culminar em outubro de 1989 com a existência de sete cadernos fixos". A Revista, a funcionar no último andar do edifício, continua nas mãos de Vicente Jorge Silva. "O meu território era o sótão, feito pelo Saraiva e que era uma obra fantástica. Mas nessa altura eu já tinha na cabeça a ideia de um diário".

O projeto chega a ser apresentado a Balsemão, que se mostra desinteressado. O mesmo não sucede com Belmiro de Azevedo, o "patrão" da Sonae, que transforma o sonho de Vicente no matutino "Público", lançado em 1990. Vicente e Wemans levam consigo quase uma vintena de jornalistas, entre os quais José Manuel Fernandes, Nuno Pacheco, Teresa de Sousa e José Vítor Malheiros, além de outros trabalhadores.

A recomposição do Expresso é feita por Joaquim Vieira, que entrara no Expresso em 1981, revelando-se um grande repórter de investigação, e que é promovido a diretor-adjunto. "O Vieira desempenhou um papel muito importante, mesmo fulcral", admite José António Saraiva. "Segurou a Clara Ferreira Alves e foi buscar gente nova e de qualidade". Ao todo entram 19 jornalistas. No semanário "O Jornal" recruta Henrique Monteiro e João Garcia, do "Diário de Notícias" vem Fernando Madrinha, e entre os estagiários inclui-se o estudante Ricardo Costa - nomes que virão a desempenhar, a mais ou menos prazo, cargos em futuras direções do Expresso.

A concorrência com o "Público" e "O Independente", aliada ao sangue novo numa redação paga generosamente, levam o Expresso a superar a crise. As vendas e a publicidade aumentam - e, com eles, os lucros. Por sugestão de Saraiva, o jornal passa a ser vendido dentro de um saco de plástico.

Uma data histórica

Data histórica é 6 de outubro de 1992. Nesse dia iniciam-se as emissões da SIC, que confere ao grupo liderado por Balsemão uma invejável dimensão multimédia. Ricardo Costa transfere-se para o novo canal televisivo, juntamente com Luís Marques, Reinaldo Serrano, Paulo Camacho e Sofia Pinto Coelho.

Uma notícia sobre a SIC, na edição de 13 de novembro de 1993, provoca uma inesperada crise no Expresso. Joe Berardo comprara 10% das ações da SIC, que aumentara o capital para 10 milhões de contos (50 milhões de euros). A notícia é dada por Balsemão a Saraiva, que a redige e pede a Joaquim Vieira, que é quem está de fecho, para não a mudar. Sem nada dizer ao diretor, o adjunto acrescenta-lhe um novo dado, segundo o qual Berardo "tem um processo nos tribunais por alegada fuga ao fisco". Quebrada a indispensável relação de confiança no interior da direção, Vieira acaba por apresentar a demissão. "Fiquei um ano e meio sozinho na direção" - escreverá Saraiva no segundo volume das suas "Confissões"; "Foi talvez o modelo de governance mais perfeito que tive".

Não é bem essa a apreciação da administração, que em abril de 1995 força a reconstituição da direção. "Apesar das reticências de Balsemão", como escreverá Saraiva, José António Lima entra para diretor-adjunto, enquanto Fernando Madrinha e Henrique Monteiro são nomeados subdiretores. Lima, que ingressara no jornal como revisor de imprensa, é um elemento da inteira confiança de Saraiva, que define Madrinha como "relativamente neutro", enquanto Monteiro seria "a oposição, o contrapoder". Meses antes, Monteiro entrara em choque frontal com Saraiva. "Demiti-me de editor por causa das eleições em Moçambique, em outubro de 1994. Tinha ido fazer a campanha e discordei completamente de um editorial de Saraiva, no qual dizia que não era possível a democracia em África".

Um marco chamado Guias de Portugal

José António Saraiva descreve "o momento mais alto" dos seus 23 anos de diretor: "Terá sido quando fizemos 'O Guia de Portugal' e tirámos pela primeira vez 200 mil exemplares. Não foi só pela tiragem em si. Foi também porque representou um pedregulho em cima de 'O Independente', que atirou a toalha ao chão". O presidente do Conselho de Administração, Pinto Balsemão, recorda que "os famosos 'Guias' nasceram nas habituais reuniões de terça-feira, em que participavam administradores e a direção, e que eram fundamentais para a crítica e o planeamento do jornal".

A entrada no mundo da net, com a criação do Expresso Online, é em 1997. Em março do ano seguinte, a direção é ampliada com um novo elemento, Nicolau Santos, que antes dirigira o "Público", o "Diário Económico" e o "Semanário Económico". Na opinião de Henrique Monteiro, "este é um momento decisivo, porque é quando a relação no interior da direção se desequilibra".

A Revista, um dos produtos mais distintivos do Expresso, é substituída no início de 2003 pela Única. A decisão é contrariada por Monteiro: "Opus-me à mudança de nome e de conceito". Na mesma data, o caderno cultural, que se chamava Cartaz, evolui para Atual.

Apesar de se terem alargado a todo o edifício, as instalações da Duque de Palmela rebentam pelas costuras. Inevitável, a mudança ocorre em março de 2003, para um moderníssimo edifício em Laveiras (Paço de Arcos), partilhado com as demais publicações do grupo. Em 2005, na sequência da ida de Fernando Madrinha para diretor do "Courrier Internacional", Cândida Pinto entra para diretora-adjunta - a primeira e até agora única mulher a aceder à direção. Repórter da SIC, fora ela quem, em 2002, quando diretora da SIC Notícias, propusera a criação de um programa de televisão cujo formato se fixou no "Expresso da Meia-Noite".

O ano de 2005 é o da sucessão de José António Saraiva, que Balsemão prepara com pinças. Por sua iniciativa, o diretor do Expresso é consagrado em junho com o prémio internacional Luca de Tena, promovido pelo jornal "ABC". Semanas antes, e à laia de despedida, Saraiva dera uma grande entrevista ao seu próprio jornal, em que admitia poder ganhar o Nobel da literatura.

É por essa altura que Balsemão convida Henrique Monteiro para diretor. "Disse-lhe que não queria. Insistiu muito comigo e sugeri o nome da Cândida Pinto, mas ele não aceitou". Balsemão também aborda com Saraiva o perfil do sucessor. "Sugeri o Ricardo Costa, diretor da SIC Notícias, ou o Mário Ramires, o editor da política". Entre os dois, a sua preferência é clara: "Com o Mário Ramires a minha relação era quase paternal, ele assumia-se como meu 'discípulo' - pelo que a sucessão processar-se-ia de forma natural". A escolha de Balsemão, contudo, já está tomada há muito: "Só pensei no Henrique Monteiro".

Este assume a direção em janeiro de 2006. No cabeçalho sai ainda o nome de José António Lima (que se demitira), permanecendo os de Nicolau Santos e Cândida Pinto, e entra o de João Garcia, com larga experiência de editor. Monteiro lamenta que não tenha havido "nenhuma conversa na transição. Saraiva não me passou um único papel. Deixou-me apenas um cartão (que guardei), a dizer que nunca diria mal de mim - depois viu-se..."

O ex-diretor permanece umas semanas no grupo Impresa, de onde sai para lançar um semanário concorrente. Financiado pelo BCP, de Paulo Teixeira Pinto, o "Sol" arranca a 16 de setembro de 2006, feito pelos dois Josés Antónios (Saraiva e Lima), Mário Ramires e uma vintena de dissidentes do Expresso. Este responde por antecipação: a 9 de setembro surge com um novo formato (berliner) e um grafismo radicalmente novo, criado pela empresa de consultores Innovation e executado por Marco Grieco. Brasileiro, Grieco fora recrutado ao "Jornal de Notícias" e é o primeiro diretor de arte do jornal. A recompensa são vários prémios internacionais, incluindo o do jornal mais bem desenhado do mundo. Outra 'revolução' é em matéria de organização da redação. "Acabei com os gabinetes e pus toda a gente em open space, incluindo os diretores", orgulha-se Monteiro.

A 28 de outubro o Expresso atinge o seu recorde absoluto de vendas em banca: 202.108 exemplares, no termo de uma oferta de DVD aos leitores. O velho estatuto editorial é atualizado, mas mantém todos os princípios fundamentais, ao mesmo tempo que se cria um código de conduta dos jornalistas do Expresso.

Cândida Pinto regressa à SIC em março de 2008. Para o seu lugar entra João Vieira Pereira, editor de economia e que antes dirigira o "Semanário Económico". E no início de 2009 a equipa diretiva é ampliada com Ricardo Costa, vindo da SIC. O regresso de Costa ao periódico onde estagiara não é por acaso. Para Monteiro, havia que começar a rodar um futuro diretor. "Já estava na direção há 16 anos e não me queria eternizar. Quando aceitei ser diretor foi por um prazo de dois anos, que, por insistência do dr. Balsemão, se foi alargando - primeiro para três, depois para quatro. Até que lhe escrevi, a recordar o compromisso inicial. Pedi para ser substituído e sugeri o Ricardo Costa". Antes de sair, Monteiro, acompanhado do sucessor, promove uma negociação com quase duas dezenas de trabalhadores, visando a rescisão dos contratos.

A 8 de janeiro de 2011 o Expresso conhece o seu sexto diretor. "Esta é uma direção de continuidade, sem qualquer rutura, praticamente com a mesma equipa", acentua Ricardo Costa, que leva consigo Miguel Cadete, diretor do mensário de música "Blitz" e que já editara o Atual.

A edição nº 2000 (26 de fevereiro de 2011) é assinalada com várias iniciativas. "Além de um número especial, arrancámos com a edição no iPad e modificámos profundamente o nosso site" - explica o atual diretor. Durante largos meses o Expresso lidera as revelações sobre o chamado "caso dos espiões". "Fui um dos intervenientes, em conjunto com outros jornalistas, e creio que o resultado foi importante em termos políticos, jornalísticos e até para o próprio grupo".

Para Ricardo Costa, "o mais negativo são as condições de mercado, que têm vindo a degradar-se, a par e passo com o país". As consequências refletem-se nas vendas e na publicidade. "Sei bem que esta não é uma época áurea da história do Expresso, em termos de resultados. No entanto, e contraditoriamente, nunca o jornal chegou a tanta gente, através da edição em papel, da net, do iPad, dos telemóveis, até da própria televisão. O grande desafio é preservar o lugar que ocupa na sociedade, sem pôr em causa a sua história, autonomia e independência".

Jornalista, político, empresário, quase toda a vida de Francisco Pinto Balsemão está ligada ao Expresso, que costuma designar, com orgulho e carinho, "navio almirante" do grupo multimédia que encabeça. Nascido em Lisboa em 1937, licenciado em Direito, Balsemão nunca deixou de ser o principal proprietário do jornal, do qual foi o primeiro diretor, desde a fundação até ir para o governo, em janeiro de 1980. No ano seguinte, substitui no cargo de primeiro-ministro o amigo Sá Carneiro, acabado de morrer numa fatídica viagem de avião. Após se ter demitido da chefia do governo da Aliança Democrática, em junho de 1983, regressa ao Expresso. Não como diretor, mas reocupando o cargo de presidente do Conselho de Administração, de onde arranca para a construção do futuro grupo Impresa, que inclui a SIC, a revista "Visão" e muitas outras publicações. Deixou em outubro as funções de CEO do grupo, de que passou a ser presidente. Com um vastíssimo currículo empresarial e político, é um dos "senadores" do regime democrático. Pertence ao Conselho de Estado, nomeado por Cavaco Silva.

É na Assembleia Nacional, no princípio dos anos setenta, que o deputado Pinto Balsemão o conhece: "O Marcelo aparecia nas galerias da Assembleia a apoiar as intervenções dos deputados liberais. Depois vinha falar connosco, a 'dar manteiga'". O jurista é convidado para gestor do novo jornal, mas não vingará. Em contrapartida, cedo começa a fazer análise política. Diretor do Expresso em 1980-81, transporta o seu jeito muito peculiar de comentador para outros jornais (como o "Semanário", que funda em 1983), rádio (TSF) e até televisão (atualmente na TVI). Nascido em Lisboa em 1948, é catedrático da Faculdade de Direito de Lisboa. Fundador do PPD/PSD, de que foi presidente da Comissão Política Nacional (1996-99), pertenceu ao VIII Governo Constitucional. Candidato derrotado à câmara da capital, é membro do Conselho de Estado.

Primeiro chefe de redação do Expresso, vindo da revista "Vida Mundial", foi diretor entre 1981 e 1983 e distinguiu-se sobretudo como repórter. Natural de Sátão (Viseu), foi sacerdote católico, tendo cursado teologia em Roma. Faleceu em agosto último, com 79 anos, em Maputo, onde se fixara há duas décadas, sem ter cumprido a promessa de "escrever um livro" sobre o semanário que ajudou a fundar.

Arquiteto, foi diretor do Expresso de 1983 a 2005. Dos seus 26 anos no jornal escreveu dois livros de memórias, a que deu o nome genérico de "Confissões". "Acho que fiz praticamente tudo o que gostava de ter feito" no Expresso, disse. Estreou-se na imprensa antes do 25 de abril, no semanário "Comércio do Funchal", coordenado por Vicente Jorge Silva, que depois o convidou para escrever no Expresso, onde manteve, a partir de novembro de 1981, uma rubrica a que chamou "Política à Portuguesa". Em 2006 fundou o semanário "Sol", a que fixou o objetivo de "bater o Expresso e destroná-lo do lugar 'histórico' que ocupava". Leciona na Universidade Católica e é autor de vários estudos históricos e de romances. Nascido em Lisboa em 1948, é filho do filólogo José António Saraiva e sobrinho do historiador José Hermano Saraiva.

Em junho de 1989 estava a frequentar um seminário de jornalismo numa universidade dos EUA. "Recebi um telefonema do Joaquim Vieira, deviam ser umas quatro da manhã. Era a convidar-me para o Expresso. Despedi-me de 'O Jornal' por fax, que era a tecnologia mais moderna". Tal como todos os jornalistas que entravam na casa, é recebido por Balsemão. "Recebeu-me de braços abertos. Mais tarde, o José António Saraiva, que eu não conhecia, convidou-me para almoçar no Pabe. Disse-me: 'Se fosse apenas por mim, você não teria vindo trabalhar para o Expresso'". Diretor do jornal de 2006 a 2010, é o próprio quem sugere o nome do sucessor, Ricardo Costa. Nascido em Lisboa em 1956, licenciado em História, trabalhou ainda nos jornais "Voz do Povo", "Jornal de Notícias" e "Notícias da Tarde". É diretor coordenador editorial do grupo Impresa.

Entra no Expresso como estagiário, em 1989. "Tinha 21 anos, estava no 3º ano de Comunicação Social da Universidade Nova de Lisboa - o mesmo em que ainda estou. Sou dos últimos jornalistas não licenciados... Contava ir para a secção internacional, mas levaram-me para a política, o que marcou a minha vida profissional para sempre". Em 1992 é um dos fundadores da SIC. "Fui para a SIC pela mais absurda das razões. Não gostava de televisão, mas era uma maneira de entrar no quadro". Repórter e comentador político, é diretor de informação da SIC, que acumula com a direção da SIC Notícias entre 2003 e 2008. No ano seguinte regressa ao Expresso e logo para a direção. Desde 8 de janeiro de 2011 que é o diretor do jornal. Lisboeta, é filho do escritor goês Orlando da Costa e meio-irmão do presidente da Câmara de Lisboa, António Costa.

Texto publicado na Revista de 5 de janeiro de 2013

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