Cum grano salis: Investigação à Amadora levou PJ a ligações com ministros do PSD

17-07-2018
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Processo. Ligações de empreiteiros ao Governo de Durão Barroso constam do
processo. E um primo de José Sócrates, já referenciado no Freeport, terá
levantado um saco com dinheiro num banco

CARLOS RODRIGUES LIMA

Ponto prévio: nenhum dos nomes que constam destas duas páginas foi acusado pelo
Ministério Público no chamado processo da Câmara da Amadora. Só que os autos
indiciam uma série de ligações estreitas entre dois empresários da construção
civil - José Guilherme e António Cavaco - ao bloco central partidário, PS e
PSD. A partir do momento que os telefones de José Guilherme foram colocado sob
escuta, a Polícia Judiciária, de 2003 a 2005, para além da investigação à
autarquia da Amadora (dominada pelo PS), recolheu suspeitas ao nível do Governo
de Durão Barroso.

E até um primo de José Sócrates - já referenciado no caso Freeport-surgiu no
caso.

À medida que a investigação foi avançando, ficou claro para os investigadores
da Judiciária que o naipe de contactos de José Guilherme não se circunscrevia
ao executivo da Amadora, liderado por Joaquim Raposo. José Luís Arnaut, antigo
ministro adjunto de Durão Barroso, foi um dos primeiros a ser detetado. Um
relatório da Judiciária refere que os encontros entre Arnaut e José Guilherme
decorriam no edifício da Presidência do Conselho de Ministros. "O
motorista do ministro vai buscar José Guilherme e leva-o ao gabinete",
acrescentou o documento. As escutas telefónicas feitas a José Guilherme
indiciavam que o empresário teria pedido a Amaut ajuda para a obtenção de uma
licença de um couto de caça.

Os contactos entre ambos levaram o Ministério Público a colocar José Luís
Arnaut sobre escuta, passando a ser o "Alvo 1A896". Por isso, em
junho de 2004, o então ministro adjunto foi escutado a pedir a José Guilherme
um espaço "para guardar o espólio de Durão Barroso". Na semana passada,
José Luís Amaut afirmou ao DN ter ficado "surpreendido" com a
informação de que esteve sob escuta: "Não sabia. Porém, nunca foi
notificado de nada, nem constituído arguido por qualquer crime relacionado com
essa matéria. Sou amigo de José Guilherme e do filho mas, enquanto ministro,
nunca decidi nada que lhes dissesse diretamente respeito", declarou
Arnaut.

A teia de contactos de José Guilherme passava ainda por Álvaro Amaro, antigo
secretário de Estado da Agricultura e presidente da Câmara de Gouveia. As
conversas que constam do processo indiciam que Amaro tentou, através de Marques
Mendes, convencer a então presidente da Câmara de Oeiras, Teresa Zambujo, a
aprovar um projeto de José Guilherme para os terrenos da Fundição de Oeiras. As
movimentações de Álvaro Amaro levaram o MP a colocá-lo sob escuta. Passou,
então, a ser o "Alvo 1A895".

No rol de suspeitos foi incluído José Salter Cid - antigo secretário de Estado
e ex-presidente da Companhia das Lezírias-, suspeito de mover influências para
a aprovação de um couto de caça a José Guilherme. Luís Marques Mendes, então
ministro dos Assuntos Parlamentares, foi escutado em diversas" conversas
com Álvaro Amaro. O primeiro não quis fazer qualquer comentário sobre as
mesmas.

Amaro, por sua vez, afirmou não ter presente os temas, mas garantiu não ter
cometido qualquer ilegalidade. Certo é que das conversas em causa - sobre uma
Marina da Barra em ílhavo e terrenos da Fundição de Oeiras - nenhum projeto
avançou. Talvez, por isso, a investigação não tenha dado mais passos neste sentido.
"É normal que as pessoas peçam isto e aquilo aos ministros. Não se deve é
atravessar a fronteira entre o ajudar e traficar", comentou ao DN um
ex-ministro, que acompanhou de perto estas movimentações.

O "gordo" do Freeport

Para juntar à lista de contactos do empresário José e do filho, Paulo
Guilherme, este último recebeu, a 16 de março de 2003, uma chamada de um
indivíduo "que já se encontrava no interior da agência do BES na
Amadora".

Paulo Guilherme terá ido ao encontro dele e, posteriormente, em conversa
escutada com o gestor do BES, a PJ concluiu que o filho de José Guilherme terá
entregue ao tal indivíduo "um saco que ali se encontrava guardado há seis
meses de uma conta antiga de José ou de Paulo". Semanas mais tarde, chegou
a identidade do utilizador do telemóvel: José Paulo Bernardo Pinto de Sousa,
primo de José Sócrates, e referenciado como o "gordo" no processo
Freeport, no qual chegou a ser suspeito de ter recebido dinheiro.

As ligações de José Guilherme ao poder político passaram ainda por Capoulas
Santos - em causa estava um negócio para a venda do Parque Industrial de Évora,
onde o socialista era presidente da Assembleia Municipal - e por Duarte Lima.
Já António Cavaco foi escutado a falar com José Leite Martins, chefe de
gabinete de Durão Barroso, e atual inspetor-geral das Finanças. O empresário
queria saber se a concessão da Marina de Albufeira já tinha sido enviada para
promulgação de Jorge Sampaio. Um projeto que contribuiu para o buraco do BPN.

Arquiteto guardava em casa mil contos em notas de cinco mil escudos

arquivamento Apesar de as obras em causa violarem o PDM da Amadora, Ministério
Público arquivou todas as suspeitas

Ao meio-dia do dia 14 de outubro de 2004, o empresário José Guilherme caçava
tranquilamente na sua Herdade dos Arrochais, na Amareleja. O telemóvel tocou.
Do outro lado da linha, a sua mulher disse-lhe: "Zé... aquilo que tu
estiveste a falar ontem à noite... Estão aqui... mandaram-me telefonar para
ti... São cinco pessoas. Simpáticos." Eram cinco inspetores da Polícia
Judiciária que estavam a proceder a uma busca, tal como na véspera de a mesma
acontecer, o empresário tinha comentado com a mulher.

"O teor desta conversa indicia fortemente que José Guilherme já sabia
antecipadamente que iria ser alvo de uma ação policial, nomeadamente naquele
dia, uma vez que preparou/instruiu a sua esposa sobre esse evento, na véspera,
à noite", concluiu a Judiciária no relatório final da investigação à
Câmara da Amadora.

Um documento que, para além daquele episódio, revela ainda outros, como a
apreensão na casa do arquiteto António Clemente, antigo responsável da Direção
de Arquitetura e Urbanismo da Câmara da Amadora, de "dois maços de cem
notas" de cinco mil escudos (ainda cintados) e ainda mais 72 mil euros em
dinheiro. O arquiteto foi apanhado em várias escutas e constava numa folha de
pagamentos da empresa Urbidoismil, intitulada de "gratificações" e
cujos destinatários das mesmas eram identificados com o nome verdadeiro e a
correspondente alcunha. O "Ladainhas", como era conhecido António
Clemente, terá recebido vários pagamentos de dez mil euros. Por sua vez, o
presidente da Câmara, Joaquim Raposo ("Joaquim Gato", "Tira
Olhos", "Xerife"), os vereadores socialistas Joaquim Evangelista
("Padre Evans") e Gabriel Oliveira e o vereador comunista João
Bernardino" ("JB") também constavam dos registos informáticos da
empresa Urbidoismil-propriedade de Eduardo Santos e Vítor Leitão comotendo
recebido gratificações.

Porém, o Departamento Central de Investigação e Ação Penal entendeu que não foi
possível fazer a ligação entre projetos aprovados na autarquia e eventuais
entregas de dinheiro. Nos ficheiros da empresa, apreendidos pela PJ, constam
também várias indicações relativas a "pagamentos de jantares do PS".

Aliás, no despacho de arquivamento do DCIAP, apesar de todas as obras em causa
violarem o PDM da Amadora, tal como referem as perícias pedidas pela Polícia
Judiciária à antiga Inspeção-Geral da Administração Local, ninguém foi acusado
do que quer que seja. E o processo está arquivado.

TRÊS CASOS

Cabazes de Natal de José Guilherme eram um sucesso

Intrigado pela segunda oferta, José Neno, antigo vice-presidente da Câmara de
Oeiras, telefonou, no dia 22 de dezembro de 2003, a Paulo Guilherme, dando-lhe
conta de ter recebido um segundo cabaz de Natal. Teria havido, explicou o
autarca, um engano. Não, respondeu o filho do empresário José Guilherme. Era
mesmo assim. Dias antes, a Judiciária montou uma operação de vigilância junto à
Charcutaria Brasil, no Largo do Rato, em Lisboa. Parada à porta, uma carrinha
foi carregada com dezenas de cabazes de Natal. Os elementos da Judiciária
entraram no estabelecimento comercial e, como normais clientes, mostraram-se
interessados em comprar cabazes como os que acabaram de sair. "Cabazes do senhor
Guilherme...", começou por explicar o funcionário da charcutaria,
"600 contos cada [3000 euros]", mas poderiam chegar aos "800
contos [4000 euros). Rui Afonso, funcionário dos serviços de fiscalização da
autarquia da Amadora, recebeu outro, Álvaro Amaro também.

Pedidos de Álvaro Amaro escutados pela Judiciária

Ao mesmo tempo que era presidente da Câmara de Gouveia - atualmente é candidato
pelo PSD à autarquia da Guarda -, Álvaro Amaro era ainda sócio da NCP,
Consultadoria e Negócios, juntamente com José Pedro Parreira. Este, por sua
vez, tinha saído do BPN Brasil e procurava emprego. Por isso, Álvaro Amaro foi
escutado a pedir uma colocação na empresa Águas de Portugal a Marques Mendes e
a Arlindo Cunha. Mas, Álvaro Amaro, na qualidade de presidente da Assembleia
Geral da sociedade Guialmi, procurava negócios para esta. Uma escuta revela que
Álvaro Amaro falou com uma assessora de Marques Mendes para saber se o
Alto-Comissariado para a Imigração e Minorias Étnicas (ACIME) poderia adjudicar
à Guialmi um contrato de fornecimento de material de escritório. E, noutra
ocasião, falou com o então presidente da Federação Portuguesa de Futebol,
Gilberto Madaíl, no mesmo sentido. Só que o concurso da Federação foi
adjudicado a outra empresa, que não a Guialmi.

Eusébio e os bilhetes para o Euro 2004, Lima e o piano

O que é que Eusébio da Silva Ferreira, antigo jogador do Benfica, tem que ver
com negócios imobiliários, Câmara da Amadora e construtores civis?
Aparentemente, nada.

Mas o antigo jogador de futebol foi ouvido como testemunha, uma vez que o
empresário José Guilherme lhe pediu, em julho de 2006, que comprasse bilhetes
para a final do Euro 2004 entre Portugal e a Grécia Duzentos e setenta euros
cada, informou Eusébio. José Guilherme respondeu: "Eu não me importo que
seja duzentos... seja aquilo que for... arranja-me... se puderes arranjar
dez... e se puderes arranjar mais arranja... arranja vinte." E assim foi,
depois de o empresário ter combinado um local para entregar o dinheiro a
Eusébio. Alguns dos bilhetes acabaram, posteriormente, nas mãos de Joaquim
Raposo. Uma prenda com "adequação social", segundo o Ministério
Público.

As escutas revelam ainda que o ex-deputado do PSD Duarte Lima pediu a José
Guilherme para comprar um piano para um jovem talento.

Diário de
Notícias, 30 Julho 2013

Processo. Ligações de empreiteiros ao Governo de Durão Barroso constam do
processo. E um primo de José Sócrates, já referenciado no Freeport, terá
levantado um saco com dinheiro num banco

CARLOS RODRIGUES LIMA

Ponto prévio: nenhum dos nomes que constam destas duas páginas foi acusado pelo
Ministério Público no chamado processo da Câmara da Amadora. Só que os autos
indiciam uma série de ligações estreitas entre dois empresários da construção
civil - José Guilherme e António Cavaco - ao bloco central partidário, PS e
PSD. A partir do momento que os telefones de José Guilherme foram colocado sob
escuta, a Polícia Judiciária, de 2003 a 2005, para além da investigação à
autarquia da Amadora (dominada pelo PS), recolheu suspeitas ao nível do Governo
de Durão Barroso.

E até um primo de José Sócrates - já referenciado no caso Freeport-surgiu no
caso.

À medida que a investigação foi avançando, ficou claro para os investigadores
da Judiciária que o naipe de contactos de José Guilherme não se circunscrevia
ao executivo da Amadora, liderado por Joaquim Raposo. José Luís Arnaut, antigo
ministro adjunto de Durão Barroso, foi um dos primeiros a ser detetado. Um
relatório da Judiciária refere que os encontros entre Arnaut e José Guilherme
decorriam no edifício da Presidência do Conselho de Ministros. "O
motorista do ministro vai buscar José Guilherme e leva-o ao gabinete",
acrescentou o documento. As escutas telefónicas feitas a José Guilherme
indiciavam que o empresário teria pedido a Amaut ajuda para a obtenção de uma
licença de um couto de caça.

Os contactos entre ambos levaram o Ministério Público a colocar José Luís
Arnaut sobre escuta, passando a ser o "Alvo 1A896". Por isso, em
junho de 2004, o então ministro adjunto foi escutado a pedir a José Guilherme
um espaço "para guardar o espólio de Durão Barroso". Na semana passada,
José Luís Amaut afirmou ao DN ter ficado "surpreendido" com a
informação de que esteve sob escuta: "Não sabia. Porém, nunca foi
notificado de nada, nem constituído arguido por qualquer crime relacionado com
essa matéria. Sou amigo de José Guilherme e do filho mas, enquanto ministro,
nunca decidi nada que lhes dissesse diretamente respeito", declarou
Arnaut.

A teia de contactos de José Guilherme passava ainda por Álvaro Amaro, antigo
secretário de Estado da Agricultura e presidente da Câmara de Gouveia. As
conversas que constam do processo indiciam que Amaro tentou, através de Marques
Mendes, convencer a então presidente da Câmara de Oeiras, Teresa Zambujo, a
aprovar um projeto de José Guilherme para os terrenos da Fundição de Oeiras. As
movimentações de Álvaro Amaro levaram o MP a colocá-lo sob escuta. Passou,
então, a ser o "Alvo 1A895".

No rol de suspeitos foi incluído José Salter Cid - antigo secretário de Estado
e ex-presidente da Companhia das Lezírias-, suspeito de mover influências para
a aprovação de um couto de caça a José Guilherme. Luís Marques Mendes, então
ministro dos Assuntos Parlamentares, foi escutado em diversas" conversas
com Álvaro Amaro. O primeiro não quis fazer qualquer comentário sobre as
mesmas.

Amaro, por sua vez, afirmou não ter presente os temas, mas garantiu não ter
cometido qualquer ilegalidade. Certo é que das conversas em causa - sobre uma
Marina da Barra em ílhavo e terrenos da Fundição de Oeiras - nenhum projeto
avançou. Talvez, por isso, a investigação não tenha dado mais passos neste sentido.
"É normal que as pessoas peçam isto e aquilo aos ministros. Não se deve é
atravessar a fronteira entre o ajudar e traficar", comentou ao DN um
ex-ministro, que acompanhou de perto estas movimentações.

O "gordo" do Freeport

Para juntar à lista de contactos do empresário José e do filho, Paulo
Guilherme, este último recebeu, a 16 de março de 2003, uma chamada de um
indivíduo "que já se encontrava no interior da agência do BES na
Amadora".

Paulo Guilherme terá ido ao encontro dele e, posteriormente, em conversa
escutada com o gestor do BES, a PJ concluiu que o filho de José Guilherme terá
entregue ao tal indivíduo "um saco que ali se encontrava guardado há seis
meses de uma conta antiga de José ou de Paulo". Semanas mais tarde, chegou
a identidade do utilizador do telemóvel: José Paulo Bernardo Pinto de Sousa,
primo de José Sócrates, e referenciado como o "gordo" no processo
Freeport, no qual chegou a ser suspeito de ter recebido dinheiro.

As ligações de José Guilherme ao poder político passaram ainda por Capoulas
Santos - em causa estava um negócio para a venda do Parque Industrial de Évora,
onde o socialista era presidente da Assembleia Municipal - e por Duarte Lima.
Já António Cavaco foi escutado a falar com José Leite Martins, chefe de
gabinete de Durão Barroso, e atual inspetor-geral das Finanças. O empresário
queria saber se a concessão da Marina de Albufeira já tinha sido enviada para
promulgação de Jorge Sampaio. Um projeto que contribuiu para o buraco do BPN.

Arquiteto guardava em casa mil contos em notas de cinco mil escudos

arquivamento Apesar de as obras em causa violarem o PDM da Amadora, Ministério
Público arquivou todas as suspeitas

Ao meio-dia do dia 14 de outubro de 2004, o empresário José Guilherme caçava
tranquilamente na sua Herdade dos Arrochais, na Amareleja. O telemóvel tocou.
Do outro lado da linha, a sua mulher disse-lhe: "Zé... aquilo que tu
estiveste a falar ontem à noite... Estão aqui... mandaram-me telefonar para
ti... São cinco pessoas. Simpáticos." Eram cinco inspetores da Polícia
Judiciária que estavam a proceder a uma busca, tal como na véspera de a mesma
acontecer, o empresário tinha comentado com a mulher.

"O teor desta conversa indicia fortemente que José Guilherme já sabia
antecipadamente que iria ser alvo de uma ação policial, nomeadamente naquele
dia, uma vez que preparou/instruiu a sua esposa sobre esse evento, na véspera,
à noite", concluiu a Judiciária no relatório final da investigação à
Câmara da Amadora.

Um documento que, para além daquele episódio, revela ainda outros, como a
apreensão na casa do arquiteto António Clemente, antigo responsável da Direção
de Arquitetura e Urbanismo da Câmara da Amadora, de "dois maços de cem
notas" de cinco mil escudos (ainda cintados) e ainda mais 72 mil euros em
dinheiro. O arquiteto foi apanhado em várias escutas e constava numa folha de
pagamentos da empresa Urbidoismil, intitulada de "gratificações" e
cujos destinatários das mesmas eram identificados com o nome verdadeiro e a
correspondente alcunha. O "Ladainhas", como era conhecido António
Clemente, terá recebido vários pagamentos de dez mil euros. Por sua vez, o
presidente da Câmara, Joaquim Raposo ("Joaquim Gato", "Tira
Olhos", "Xerife"), os vereadores socialistas Joaquim Evangelista
("Padre Evans") e Gabriel Oliveira e o vereador comunista João
Bernardino" ("JB") também constavam dos registos informáticos da
empresa Urbidoismil-propriedade de Eduardo Santos e Vítor Leitão comotendo
recebido gratificações.

Porém, o Departamento Central de Investigação e Ação Penal entendeu que não foi
possível fazer a ligação entre projetos aprovados na autarquia e eventuais
entregas de dinheiro. Nos ficheiros da empresa, apreendidos pela PJ, constam
também várias indicações relativas a "pagamentos de jantares do PS".

Aliás, no despacho de arquivamento do DCIAP, apesar de todas as obras em causa
violarem o PDM da Amadora, tal como referem as perícias pedidas pela Polícia
Judiciária à antiga Inspeção-Geral da Administração Local, ninguém foi acusado
do que quer que seja. E o processo está arquivado.

TRÊS CASOS

Cabazes de Natal de José Guilherme eram um sucesso

Intrigado pela segunda oferta, José Neno, antigo vice-presidente da Câmara de
Oeiras, telefonou, no dia 22 de dezembro de 2003, a Paulo Guilherme, dando-lhe
conta de ter recebido um segundo cabaz de Natal. Teria havido, explicou o
autarca, um engano. Não, respondeu o filho do empresário José Guilherme. Era
mesmo assim. Dias antes, a Judiciária montou uma operação de vigilância junto à
Charcutaria Brasil, no Largo do Rato, em Lisboa. Parada à porta, uma carrinha
foi carregada com dezenas de cabazes de Natal. Os elementos da Judiciária
entraram no estabelecimento comercial e, como normais clientes, mostraram-se
interessados em comprar cabazes como os que acabaram de sair. "Cabazes do senhor
Guilherme...", começou por explicar o funcionário da charcutaria,
"600 contos cada [3000 euros]", mas poderiam chegar aos "800
contos [4000 euros). Rui Afonso, funcionário dos serviços de fiscalização da
autarquia da Amadora, recebeu outro, Álvaro Amaro também.

Pedidos de Álvaro Amaro escutados pela Judiciária

Ao mesmo tempo que era presidente da Câmara de Gouveia - atualmente é candidato
pelo PSD à autarquia da Guarda -, Álvaro Amaro era ainda sócio da NCP,
Consultadoria e Negócios, juntamente com José Pedro Parreira. Este, por sua
vez, tinha saído do BPN Brasil e procurava emprego. Por isso, Álvaro Amaro foi
escutado a pedir uma colocação na empresa Águas de Portugal a Marques Mendes e
a Arlindo Cunha. Mas, Álvaro Amaro, na qualidade de presidente da Assembleia
Geral da sociedade Guialmi, procurava negócios para esta. Uma escuta revela que
Álvaro Amaro falou com uma assessora de Marques Mendes para saber se o
Alto-Comissariado para a Imigração e Minorias Étnicas (ACIME) poderia adjudicar
à Guialmi um contrato de fornecimento de material de escritório. E, noutra
ocasião, falou com o então presidente da Federação Portuguesa de Futebol,
Gilberto Madaíl, no mesmo sentido. Só que o concurso da Federação foi
adjudicado a outra empresa, que não a Guialmi.

Eusébio e os bilhetes para o Euro 2004, Lima e o piano

O que é que Eusébio da Silva Ferreira, antigo jogador do Benfica, tem que ver
com negócios imobiliários, Câmara da Amadora e construtores civis?
Aparentemente, nada.

Mas o antigo jogador de futebol foi ouvido como testemunha, uma vez que o
empresário José Guilherme lhe pediu, em julho de 2006, que comprasse bilhetes
para a final do Euro 2004 entre Portugal e a Grécia Duzentos e setenta euros
cada, informou Eusébio. José Guilherme respondeu: "Eu não me importo que
seja duzentos... seja aquilo que for... arranja-me... se puderes arranjar
dez... e se puderes arranjar mais arranja... arranja vinte." E assim foi,
depois de o empresário ter combinado um local para entregar o dinheiro a
Eusébio. Alguns dos bilhetes acabaram, posteriormente, nas mãos de Joaquim
Raposo. Uma prenda com "adequação social", segundo o Ministério
Público.

As escutas revelam ainda que o ex-deputado do PSD Duarte Lima pediu a José
Guilherme para comprar um piano para um jovem talento.

Diário de
Notícias, 30 Julho 2013

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