Nova viagem. Com Costa e Marcelo

30-12-2015
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2016 seria sempre um tempo novo e o adeus do homem que durante 15 anos liderou a direita em Portugal confirma o virar de página. António Costa e Marcelo Rebelo de Sousa serão os protagonistas da próxima década. E nada na política portuguesa será igual.

Depois de quatro anos de aprumo sem alternativa, quem esteve despede-se. Cavaco acabou, Portas percebeu que há ciclos irrepetíveis, Passos fica até ver. O país, cansado do mesmo mas conservador, tardou a perceber o que aí vinha e a interiorizar que o homem que a maioria escolheu para primeiro-ministro iria, afinal, liderar a oposição. Mas está preparado para acreditar que o diferente é possível.

A derrota política de quem ganhou as eleições foi apenas o começo. As legislativas de Outubro assinalam uma ruptura que será consolidada com as presidenciais de Janeiro.

António Costa foi o agente desta aventura. Conseguiu o impensável, num país em que só as receitas tradicionais pareciam possíveis. Sinalizou a tempo que não se rendia à derrota, ninguém quis crer, trabalhou a esquerda, a esquerda deixou-se conquistar pelo cheiro do poder, a direita não teve capacidade de antecipar, prevenir e torpedear a jogada. E Cavaco, despojado de poderes, deixou-se levar.

Eis o PS no poder após perder as eleições. Eis António Costa no exercício do que melhor sabe fazer – desafiar o adversário com pragmatismo e ousadia. Parece ‘bluff’ mas não é. Depois de ter acertado com a esquerda o naipe de trunfo, não é certo que sejam comunistas e bloquistas a cartearem o contrato. Todo o contrato. Para salvar o Banif, contou com Passos Coelho.

Para reverter a TAP, conta com a esquerda. Para o que vier, conta consigo próprio.

Marcelo Rebelo de Sousa vai ajudá-lo. Para segurar a vitória à primeira volta (ou para garantir que a consolida à segunda), Marcelo fez tudo bem, incluindo libertar-se da sua família política. Foi maior que o PSD, muito maior que o CDS. Tão ou mais pragmático do que António Costa. Um em S. Bento e o outro em Belém não apagarão sem dor as mazelas de um país pobre, endividado e eternamente a meio caminho. Mas trazem consigo a vantagem de abrir novos horizontes e fazer crer que a política é isso – tentar o impossível.

Passos Coelho percebeu. Depois do azedume inicial, compreensível em quem conseguiu, contra todas as previsões, ganhar o direito a uma segunda legislatura, voltou a ser frio. Se Costa diz o que o país quer ouvir, é preciso temperar a resposta, acalmar o partido, não desistir mas não ter pressa, e estar preparado para tudo. Mesmo para sair de cena.

Ele, melhor do que ninguém, sabe que o país que deixou será, em 2016, muito diferente daquele que encontrou. E moderou o confronto por perceber que tudo o que (ainda) possa ter a ganhar passa por ter razão. Coisa que só o tempo dirá.

Para já, enquanto Costa repõe salários, alivia pensões, modera impostos, devolve feriados, e o Estado gasta em luzes de Natal o dobro de 2012, para quê ter pressa? Há que aproveitar este tempo para consolidar a imagem de homem de Estado – “o interesse nacional acima de tudo”, é o seu novo slogan. Passos zela pela sua imagem, a pensar no futuro.

Paulo Portas faz o mesmo, cortando caminho. Sai de cena porque já não consegue repetir o seu número de sempre. A aliança com Passos Coelho deu-lhe o negócio de um grupo parlamentar acima da sua medida, mas retirou-lhe espaço para liderar a direita. E Portas percebeu que o seu tempo exige outro modo. Despede-se já, à procura de um futuro político. Que ironicamente poderá passar por um confronto com o seu último aliado, numas presidenciais que hão-de vir.

Nas que aí estão, Marcelo é imbatível. Tal como António Costa, soube construir as pontes necessárias para chegar lá. E prepara-se para recuperar rapidamente os que teve que deixar pelo caminho. Costa já começou a namorar a direita. Marcelo não tardará a emancipar-se da esquerda. Nesta viagem, o centro é deles.

Conteúdo publicado no Económico à Uma. Subscreva aqui.

2016 seria sempre um tempo novo e o adeus do homem que durante 15 anos liderou a direita em Portugal confirma o virar de página. António Costa e Marcelo Rebelo de Sousa serão os protagonistas da próxima década. E nada na política portuguesa será igual.

Depois de quatro anos de aprumo sem alternativa, quem esteve despede-se. Cavaco acabou, Portas percebeu que há ciclos irrepetíveis, Passos fica até ver. O país, cansado do mesmo mas conservador, tardou a perceber o que aí vinha e a interiorizar que o homem que a maioria escolheu para primeiro-ministro iria, afinal, liderar a oposição. Mas está preparado para acreditar que o diferente é possível.

A derrota política de quem ganhou as eleições foi apenas o começo. As legislativas de Outubro assinalam uma ruptura que será consolidada com as presidenciais de Janeiro.

António Costa foi o agente desta aventura. Conseguiu o impensável, num país em que só as receitas tradicionais pareciam possíveis. Sinalizou a tempo que não se rendia à derrota, ninguém quis crer, trabalhou a esquerda, a esquerda deixou-se conquistar pelo cheiro do poder, a direita não teve capacidade de antecipar, prevenir e torpedear a jogada. E Cavaco, despojado de poderes, deixou-se levar.

Eis o PS no poder após perder as eleições. Eis António Costa no exercício do que melhor sabe fazer – desafiar o adversário com pragmatismo e ousadia. Parece ‘bluff’ mas não é. Depois de ter acertado com a esquerda o naipe de trunfo, não é certo que sejam comunistas e bloquistas a cartearem o contrato. Todo o contrato. Para salvar o Banif, contou com Passos Coelho.

Para reverter a TAP, conta com a esquerda. Para o que vier, conta consigo próprio.

Marcelo Rebelo de Sousa vai ajudá-lo. Para segurar a vitória à primeira volta (ou para garantir que a consolida à segunda), Marcelo fez tudo bem, incluindo libertar-se da sua família política. Foi maior que o PSD, muito maior que o CDS. Tão ou mais pragmático do que António Costa. Um em S. Bento e o outro em Belém não apagarão sem dor as mazelas de um país pobre, endividado e eternamente a meio caminho. Mas trazem consigo a vantagem de abrir novos horizontes e fazer crer que a política é isso – tentar o impossível.

Passos Coelho percebeu. Depois do azedume inicial, compreensível em quem conseguiu, contra todas as previsões, ganhar o direito a uma segunda legislatura, voltou a ser frio. Se Costa diz o que o país quer ouvir, é preciso temperar a resposta, acalmar o partido, não desistir mas não ter pressa, e estar preparado para tudo. Mesmo para sair de cena.

Ele, melhor do que ninguém, sabe que o país que deixou será, em 2016, muito diferente daquele que encontrou. E moderou o confronto por perceber que tudo o que (ainda) possa ter a ganhar passa por ter razão. Coisa que só o tempo dirá.

Para já, enquanto Costa repõe salários, alivia pensões, modera impostos, devolve feriados, e o Estado gasta em luzes de Natal o dobro de 2012, para quê ter pressa? Há que aproveitar este tempo para consolidar a imagem de homem de Estado – “o interesse nacional acima de tudo”, é o seu novo slogan. Passos zela pela sua imagem, a pensar no futuro.

Paulo Portas faz o mesmo, cortando caminho. Sai de cena porque já não consegue repetir o seu número de sempre. A aliança com Passos Coelho deu-lhe o negócio de um grupo parlamentar acima da sua medida, mas retirou-lhe espaço para liderar a direita. E Portas percebeu que o seu tempo exige outro modo. Despede-se já, à procura de um futuro político. Que ironicamente poderá passar por um confronto com o seu último aliado, numas presidenciais que hão-de vir.

Nas que aí estão, Marcelo é imbatível. Tal como António Costa, soube construir as pontes necessárias para chegar lá. E prepara-se para recuperar rapidamente os que teve que deixar pelo caminho. Costa já começou a namorar a direita. Marcelo não tardará a emancipar-se da esquerda. Nesta viagem, o centro é deles.

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