BE e PSD avançam com projectos para garantir anonimato dos dadores

04-10-2018
marcar artigo

A 24 de Abril, o Tribunal Constitucional declarou inconstitucionais várias normas da procriação medicamente assistida, entre as quais o anonimato dos dadores. Desde então especialistas alertam para a suspensão de tratamentos.

Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.

O Bloco de Esquerda (BE) entregou nesta quarta-feira um projecto de lei que cria uma norma transitória para salvaguardar o anonimato das pessoas que doaram esperma, óvulos e embriões antes de 24 de Abril deste ano, data em que foi conhecido o acórdão do Tribunal Constitucional (TC) que dá como inconstitucionais algumas normas da lei da Procriação Medicamente Assistida (PMA). Um projecto de lei do PSD vai no mesmo sentido.

O Bloco de Esquerda (BE) entregou nesta quarta-feira um projecto de lei que cria uma norma transitória para salvaguardar o anonimato das pessoas que doaram esperma, óvulos e embriões antes de 24 de Abril deste ano, data em que foi conhecido o acórdão do Tribunal Constitucional (TC) que dá como inconstitucionais algumas normas da lei da Procriação Medicamente Assistida (PMA). Um projecto de lei do PSD vai no mesmo sentido.

A carregar...

O PS adiantou nesta quarta-feira, na reunião da Comissão Parlamentar de Saúde na qual foi ouvida a Associação Portuguesa de Fertilidade, que está igualmente a trabalhar sobre esta matéria.

As questões relacionadas especificamente com a gestação de substituição, cujas normas também foram declaradas inconstitucionais, serão alvo de um outro projecto do BE, que não o relativo ao anonimato, explicou o deputado Moisés Ferreira. “Queremos que no final da legislatura os dois estejam a funcionar na prática”, disse.

A deputada Isabel Moreira afirmou que o PS está disponível para trabalhar com o BE na questão da gestação de substituição.

O acórdão do TC veio determinar o fim do anonimato dos dadores, o que levou a que o material já criopreservado, resultante de doações feitas antes desta alteração, não pudesse ser usado sem que os dadores dissessem que autorizavam o levantamento do anonimato. Alguns não o aceitaram, noutros casos não é possível contactá-los, o que levou o Conselho Nacional de Procriação Medicamente Assistida (CNPMA), a Associação Portuguesa de Fertilidade e médicos de vários centros a alertarem para a suspensão de muitos tratamentos com recurso a material doado.

Ver mais

Norma transitória

É com o objectivo de resolver este problema e permitir que os tratamentos possam ser retomados que BE e PSD avançam agora com os seus projectos de lei.

“Propõe-se uma norma transitória, na qual é garantida a confidencialidade acerca da identidade do dador aquando da utilização de gâmetas e embriões doados ou resultantes de doações realizadas em data anterior a 24 de Abril de 2018 e desde que utilizados num prazo máximo de cinco anos após a publicação da presente lei”, explica o BE no seu projecto de lei.

O BE ressalva que “os dadores cujas dádivas forem anteriores a 24 de Abril de 2018 e já tiverem sido utilizadas mantêm-se sob o regime de anonimato, salvo vontade expressa em contrário”.

Na exposição da iniciativa explica ainda que este regime especial não pode colocar em causa “o acesso a informação genética por parte da pessoa nascida em consequência de procedimentos de PMA, tão-pouco pode colocar em causa o acesso a informação sobre eventual existência de impedimento legal a projectado casamento”. Ou seja, qualquer pessoa continuará a ter a possibilidade de saber, por exemplo, se tem relação genética com alguém com quem pretende casar-se.

A carregar...

Já os nascidos com material doado após 24 de Abril, seja na sequência de tratamentos de PMA ou de gestação de substituição, podem, caso queiram conhecer a identidade civil do ou da dadora, pedir essa informação ao CNPMA, desde que tenham idade igual ou superior a 16 anos. Sobre a definição de identidade civil, Moisés Ferreira explicou que a mesma “deve ser escalpelizada na regulamentação” da nova lei.

"Vida em suspenso"

Também o PSD tem preparado um projecto de lei que cria igualmente uma norma transitória para salvaguardar o anonimato das pessoas que fizeram doações antes de 24 de Abril.

“Respeitamos em absoluto o acórdão do TC, o que não podemos é deixar sem resposta situações em que há processo em curso, em que há material doado e outro criopreservado e em que não se sabe que destino lhes dar. Mas, acima de tudo, o que nos preocupa são as pessoas que têm a vida em suspenso”, disse Ângela Guerra, deputada do PSD, após a audição na Comissão de Saúde.

“O que vamos tentar fazer nesta iniciativa é estabelecer uma norma transitória que resolva, sem por em causa a decisão do TC, este regime de confidencialidade e identidade civil dos dadores", explicou Ângela Guerra.

A carregar...

"O TC, entendemos nós, pronuncia-se para o futuro. Quanto a isso, vamos respeitar tudo o que está no acórdão. No que respeita às decisões pendentes, vamos tentar resolvê-las”, reforçou.

E explica o teor na iniciativa que vão apresentar: “O que dizemos na norma transitória é que o material genético, sejam eles gâmetas ou embriões, e que são resultantes de doações que tiveram lugar antes de 24 Abril e utilizados até cinco anos após a regulamentação da lei (está previsto na lei que o material pode ser usado e criopreservado durante cinco anos) são abrangidos por um regime de confidencialidade sobre a identidade civil do doador, excepto nos casos em que os próprios autorizem de forma expressa a levantar esse anonimato.”

O pedido de identidade civil – “Entendemos que é apenas o nome”, diz Ângela Guerra – só pode ser feito pelos nascidos com material doado após 24 de Abril ou pelos que resultam de tratamentos feitos antes 24 de Abril por dadores que tenham autorizado o levantamento do anonimato. Ter 16 anos é, tal como no projecto do BE, condição para que isso aconteça. O pedido é feito ao CNPMA.

Solução equilibrada

Os dois deputados mostram-se disponíveis para trabalhar com os restantes partidos, quando as propostas derem entrada na especialidade, e admitiram mesmo a possibilidade de poder vir a ser apresentado um texto comum.

A carregar...

Questionados sobre se a questão do conhecimento das origens, levantado pelo TC quando chumbou algumas das normas do anonimato dos dadores, obrigam a uma revisão constitucional, os dois consideram que a solução que encontraram evita a questão.

“Não me parece que seja necessária uma revisão constitucional. A proposta que apresentamos é a solução mais equilibrada. Por um lado respeita e vai ao encontro do que é a pronúncia do TC e respeita a decisão para o futuro, e por outro não viola as expectativas e direitos de dadores e beneficiários que fizeram os tratamentos sob o pressuposto do anonimato”, disse Moisés Ferreira.

Ângela Guerra tem a mesma opinião. “O que estamos a tentar criar é uma norma transitória que depois tenha uma regulamentação posterior por parte do Governo. Ou seja, que durante este período que estamos a tentar introduzir na norma, seja criada a possibilidade de que as pessoas que já fizeram as suas doações sejam contactadas e venham dizer que expressamente autorizam o levantamento [do anonimato] e assim contornamos a impossibilidade que foi criada por parte deste acórdão. Sendo certo que findo este prazo, o material tem de ser destruído”, explicou.

O que mudou no dia 24 de Abril de 2018? O pedido de fiscalização constitucional foi feito pelo CDS e por alguns deputados do PSD, em 2017, após as últimas alterações da lei da Procriação Medicamente Assistida (PMA), que introduziu a gestação de substituição (vulgarmente chamada de “barrigas de aluguer”) e permitiu o alargamento dos tratamentos de fertilidade a todas as mulheres, independentemente do estado civil. Os deputados questionavam se os direitos à identidade pessoal e genética das pessoas nascidas através destas técnicas estavam garantidos. Foi preciso esperar mais de um ano pela resposta do Tribunal Constitucional (TC), que a 24 de Abril publicou o acórdão sobre o tema — data a partir da qual o anonimato dos dadores de gâmetas (esperma ou óvulos) e embriões deixou de estar garantido, independentemente da técnica de tratamento que esteja a ser usada. No acórdão, o TC considerou que a regra do anonimato dos dadores e das gestantes de substituição merecia “censura constitucional” já que impunha “uma restrição desnecessária aos direitos à identidade pessoal e ao desenvolvimento da personalidade das pessoas nascidas” através deste método. Ou seja, são as crianças que ficam sem direito a saber quem são os seus progenitores biológicos. O artigo da lei que se refere ao anonimato tinha quatro pontos, mas apenas dois foram considerados inconstitucionais. Esta mesma norma já tinha sido avaliada pelo TC em 2009. Nessa altura foi considerada constitucional pelos juízes. A alteração criou um problema: o que aconteceria ao material doado, para diferentes técnicas de procriação, quando as regras ainda garantiam o anonimato dos dadores. A solução agora apresentada pelo BE e PSD é a criação de uma norma transitória que permite os dois regimes.

A 24 de Abril, o Tribunal Constitucional declarou inconstitucionais várias normas da procriação medicamente assistida, entre as quais o anonimato dos dadores. Desde então especialistas alertam para a suspensão de tratamentos.

Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.

O Bloco de Esquerda (BE) entregou nesta quarta-feira um projecto de lei que cria uma norma transitória para salvaguardar o anonimato das pessoas que doaram esperma, óvulos e embriões antes de 24 de Abril deste ano, data em que foi conhecido o acórdão do Tribunal Constitucional (TC) que dá como inconstitucionais algumas normas da lei da Procriação Medicamente Assistida (PMA). Um projecto de lei do PSD vai no mesmo sentido.

O Bloco de Esquerda (BE) entregou nesta quarta-feira um projecto de lei que cria uma norma transitória para salvaguardar o anonimato das pessoas que doaram esperma, óvulos e embriões antes de 24 de Abril deste ano, data em que foi conhecido o acórdão do Tribunal Constitucional (TC) que dá como inconstitucionais algumas normas da lei da Procriação Medicamente Assistida (PMA). Um projecto de lei do PSD vai no mesmo sentido.

A carregar...

O PS adiantou nesta quarta-feira, na reunião da Comissão Parlamentar de Saúde na qual foi ouvida a Associação Portuguesa de Fertilidade, que está igualmente a trabalhar sobre esta matéria.

As questões relacionadas especificamente com a gestação de substituição, cujas normas também foram declaradas inconstitucionais, serão alvo de um outro projecto do BE, que não o relativo ao anonimato, explicou o deputado Moisés Ferreira. “Queremos que no final da legislatura os dois estejam a funcionar na prática”, disse.

A deputada Isabel Moreira afirmou que o PS está disponível para trabalhar com o BE na questão da gestação de substituição.

O acórdão do TC veio determinar o fim do anonimato dos dadores, o que levou a que o material já criopreservado, resultante de doações feitas antes desta alteração, não pudesse ser usado sem que os dadores dissessem que autorizavam o levantamento do anonimato. Alguns não o aceitaram, noutros casos não é possível contactá-los, o que levou o Conselho Nacional de Procriação Medicamente Assistida (CNPMA), a Associação Portuguesa de Fertilidade e médicos de vários centros a alertarem para a suspensão de muitos tratamentos com recurso a material doado.

Ver mais

Norma transitória

É com o objectivo de resolver este problema e permitir que os tratamentos possam ser retomados que BE e PSD avançam agora com os seus projectos de lei.

“Propõe-se uma norma transitória, na qual é garantida a confidencialidade acerca da identidade do dador aquando da utilização de gâmetas e embriões doados ou resultantes de doações realizadas em data anterior a 24 de Abril de 2018 e desde que utilizados num prazo máximo de cinco anos após a publicação da presente lei”, explica o BE no seu projecto de lei.

O BE ressalva que “os dadores cujas dádivas forem anteriores a 24 de Abril de 2018 e já tiverem sido utilizadas mantêm-se sob o regime de anonimato, salvo vontade expressa em contrário”.

Na exposição da iniciativa explica ainda que este regime especial não pode colocar em causa “o acesso a informação genética por parte da pessoa nascida em consequência de procedimentos de PMA, tão-pouco pode colocar em causa o acesso a informação sobre eventual existência de impedimento legal a projectado casamento”. Ou seja, qualquer pessoa continuará a ter a possibilidade de saber, por exemplo, se tem relação genética com alguém com quem pretende casar-se.

A carregar...

Já os nascidos com material doado após 24 de Abril, seja na sequência de tratamentos de PMA ou de gestação de substituição, podem, caso queiram conhecer a identidade civil do ou da dadora, pedir essa informação ao CNPMA, desde que tenham idade igual ou superior a 16 anos. Sobre a definição de identidade civil, Moisés Ferreira explicou que a mesma “deve ser escalpelizada na regulamentação” da nova lei.

"Vida em suspenso"

Também o PSD tem preparado um projecto de lei que cria igualmente uma norma transitória para salvaguardar o anonimato das pessoas que fizeram doações antes de 24 de Abril.

“Respeitamos em absoluto o acórdão do TC, o que não podemos é deixar sem resposta situações em que há processo em curso, em que há material doado e outro criopreservado e em que não se sabe que destino lhes dar. Mas, acima de tudo, o que nos preocupa são as pessoas que têm a vida em suspenso”, disse Ângela Guerra, deputada do PSD, após a audição na Comissão de Saúde.

“O que vamos tentar fazer nesta iniciativa é estabelecer uma norma transitória que resolva, sem por em causa a decisão do TC, este regime de confidencialidade e identidade civil dos dadores", explicou Ângela Guerra.

A carregar...

"O TC, entendemos nós, pronuncia-se para o futuro. Quanto a isso, vamos respeitar tudo o que está no acórdão. No que respeita às decisões pendentes, vamos tentar resolvê-las”, reforçou.

E explica o teor na iniciativa que vão apresentar: “O que dizemos na norma transitória é que o material genético, sejam eles gâmetas ou embriões, e que são resultantes de doações que tiveram lugar antes de 24 Abril e utilizados até cinco anos após a regulamentação da lei (está previsto na lei que o material pode ser usado e criopreservado durante cinco anos) são abrangidos por um regime de confidencialidade sobre a identidade civil do doador, excepto nos casos em que os próprios autorizem de forma expressa a levantar esse anonimato.”

O pedido de identidade civil – “Entendemos que é apenas o nome”, diz Ângela Guerra – só pode ser feito pelos nascidos com material doado após 24 de Abril ou pelos que resultam de tratamentos feitos antes 24 de Abril por dadores que tenham autorizado o levantamento do anonimato. Ter 16 anos é, tal como no projecto do BE, condição para que isso aconteça. O pedido é feito ao CNPMA.

Solução equilibrada

Os dois deputados mostram-se disponíveis para trabalhar com os restantes partidos, quando as propostas derem entrada na especialidade, e admitiram mesmo a possibilidade de poder vir a ser apresentado um texto comum.

A carregar...

Questionados sobre se a questão do conhecimento das origens, levantado pelo TC quando chumbou algumas das normas do anonimato dos dadores, obrigam a uma revisão constitucional, os dois consideram que a solução que encontraram evita a questão.

“Não me parece que seja necessária uma revisão constitucional. A proposta que apresentamos é a solução mais equilibrada. Por um lado respeita e vai ao encontro do que é a pronúncia do TC e respeita a decisão para o futuro, e por outro não viola as expectativas e direitos de dadores e beneficiários que fizeram os tratamentos sob o pressuposto do anonimato”, disse Moisés Ferreira.

Ângela Guerra tem a mesma opinião. “O que estamos a tentar criar é uma norma transitória que depois tenha uma regulamentação posterior por parte do Governo. Ou seja, que durante este período que estamos a tentar introduzir na norma, seja criada a possibilidade de que as pessoas que já fizeram as suas doações sejam contactadas e venham dizer que expressamente autorizam o levantamento [do anonimato] e assim contornamos a impossibilidade que foi criada por parte deste acórdão. Sendo certo que findo este prazo, o material tem de ser destruído”, explicou.

O que mudou no dia 24 de Abril de 2018? O pedido de fiscalização constitucional foi feito pelo CDS e por alguns deputados do PSD, em 2017, após as últimas alterações da lei da Procriação Medicamente Assistida (PMA), que introduziu a gestação de substituição (vulgarmente chamada de “barrigas de aluguer”) e permitiu o alargamento dos tratamentos de fertilidade a todas as mulheres, independentemente do estado civil. Os deputados questionavam se os direitos à identidade pessoal e genética das pessoas nascidas através destas técnicas estavam garantidos. Foi preciso esperar mais de um ano pela resposta do Tribunal Constitucional (TC), que a 24 de Abril publicou o acórdão sobre o tema — data a partir da qual o anonimato dos dadores de gâmetas (esperma ou óvulos) e embriões deixou de estar garantido, independentemente da técnica de tratamento que esteja a ser usada. No acórdão, o TC considerou que a regra do anonimato dos dadores e das gestantes de substituição merecia “censura constitucional” já que impunha “uma restrição desnecessária aos direitos à identidade pessoal e ao desenvolvimento da personalidade das pessoas nascidas” através deste método. Ou seja, são as crianças que ficam sem direito a saber quem são os seus progenitores biológicos. O artigo da lei que se refere ao anonimato tinha quatro pontos, mas apenas dois foram considerados inconstitucionais. Esta mesma norma já tinha sido avaliada pelo TC em 2009. Nessa altura foi considerada constitucional pelos juízes. A alteração criou um problema: o que aconteceria ao material doado, para diferentes técnicas de procriação, quando as regras ainda garantiam o anonimato dos dadores. A solução agora apresentada pelo BE e PSD é a criação de uma norma transitória que permite os dois regimes.

marcar artigo