Lendo e relendo

01-09-2019
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Ao decretar serviços mínimos entre 50% e 75%, além de 100% nos
serviços essenciais (Pensava que os serviços mínimos
eram os essenciais), o Governo recusa estar a pôr em causa o direito à greve e lembra a desproporcionalidade
do protesto de motoristas, com início previsto para 12 de agosto. Serão de 50% para os trabalhadores em postos de
combustível para os clientes finais, inclusive postos privados de empresas ou
cooperativas, e chega a ser de 75% a 100% em áreas como o fornecimento de alimentação,
bens essenciais e medicamentos a hospitais e centros de saúde.

Estas percentagens referem-se ao dia normal de trabalho de trabalho.

A informação foi avançada durante a conferência de imprensa conjunta no
Ministério do Trabalho da Solidariedade e da Segurança Social, com a presença
do Ministro Vieira da Silva, mas também do Ministro do Ambiente e da Transição
Energética, João Pedro Matos Fernandes e do Secretário de Estado das
Infraestruturas, Jorge Delgado.

Aos jornalistas, Vieira da Silva foi claro: este é um “conjunto exigente de serviços mínimos” e o Governo “tudo fará” para
que os serviços mínimos sejam respeitados. E especificou:

“Serão preparados todos os mecanismos que o
Governo tem ao dispor para garantir a tranquilidade e bem-estar dos
portugueses. (…) Não está a ser posto em causa o direito à greve. O Governo
respeita-a de forma inequívoca, mas tem também a responsabilidade de proteger o
direito de todos os portugueses.”.

Os serviços mínimos serão de 75% no atinente ao abastecimento de postos de
combustível destinados a empresas de transportes de passageiros, de alimentos e
animais, bem como de instituições de assistência social. Trata-se de empresas que têm por objeto a prestação do serviço público de
transportes de passageiros, telecomunicações, água e energia. Leia-se
empresas como Carris, Transtejo, EDP Distribuição, por exemplo. Também será exigido 75% dos serviços em “transporte e
abastecimento de combustíveis, matérias perigosas, medicamentos e todos os bens
essenciais destinados ao funcionamento dos estabelecimentos prisionais,
centros de acolhimento residencial para crianças e jovens, estruturas
residenciais para pessoas idosas, IPSS e Misericórdias”. E obviamente será exigido 75% de cumprimento dos serviços de transporte de bens
alimentares e de primeira necessidade, bem como de alimentação para animais em
explorações e animais vivos por razões de saúde e bem-estar animal.

No caso da REPA (Rede de Emergência de Postos de Abastecimento), ou seja, onde a greve nem sequer pode ter um
impacto mínimo, os motoristas estão mesmo obrigados a assegurar o abastecimento
destes postos prioritários a 100%. E o “abastecimento de combustíveis
destinados aos portos, aeroportos e aeródromos” (que sirvam de base a serviços
prioritários) obedece a
estas condições, tal como o “transporte e abastecimento de combustíveis,
matérias perigosas, medicamentos e todos os bens essenciais destinados ao
funcionamento dos hospitais, serviços de emergência médica, centros de saúde”.

No capítulo dos 100% de serviços, o Governo incluiu obviamente o
abastecimento dos postos incluídos na REPA, ou de portos, aeroportos e
aeródromos, instalações militares, bombeiros ou outras forças de
segurança, além do abastecimento de hospitais, centros de saúde e “o
transporte de produtos perecíveis e/ou deterioráveis, medicamentos para
farmácias e fornecimento de gases medicinais ao domicílio”. E o comunicado
do Executivo adrede distribuído salienta:

“Importa ainda referir que resulta do
Despacho de Serviços Mínimos que no abastecimento estão compreendidas as
operações de carga, transporte e descarga assegurados usualmente pelos
motoristas”.

A seguir, Matos Fernandes anunciou a declaração do estado de emergência
energética.

Neste sentido, o Ministro do Ambiente e da Transição Energética revelou que
existirão num total 374 postos da REPA a funcionar em todo o país (sendo 54
deles para veículos prioritários e 320 destinados ao público em geral) – um número superior ao que estava desenhado. Mais:
haverá um reforço no Algarve destes postos prioritários, bem como na região das
colheitas nas Lezírias do Tejo e em concelhos do interior do país. Em relação
ao Algarve, que habitualmente tem 8 postos da REPA, terá “praticamente o
triplo”.

Os mais de três mil postos de combustível existentes terão afixados quais
os postos da REPA (“um pouco como acontece atualmente com as farmácias de
serviço”). E o Governo vai anunciar a sua
listagem nos jornais e no site da ENSE
(Entidade
Nacional para o Setor Energético).

O volume máximo para os consumidores se abastecerem será de 15 litros por
viatura na REPA. Nos restantes postos de combustível, não existe limite e “tudo
dependerá do bom senso” de cada um, como adiantou Matos Fernandes.

Entre o abastecimento para os veículos prioritários, o Governo vai ter uma
atenção especial às carrinhas de transporte de valores, “para que não falte o
dinheiro no multibanco”.

Quanto à preparação das forças armadas e de segurança (GNR e PSP) para conduzir os veículos de pesados e de matérias
perigosas, o Ministro garantiu serem necessários “180 homens”. E revelou que
estão neste momento em formação 500 pessoas, ou seja, mais do dobro do que é
necessário para essa missão. E, no final da conferência de imprensa, Matos
Fernandes anunciou que a venda de combustível aumentou, na última semana, 30% em
relação à semana normal. “Alguns postos de combustível estão a comprar o
quádruplo do combustível”, o que demonstra que as bombas de gasolina estão “com
mais combustível do que o comum nesta época do ano”.

***

O grau elevado de “mínimos” decidido pelo Executivo justifica-se pelo facto
de a paralisação ter sido decretada “por tempo indeterminado” e pelos vários
impactos que a greve em questão pode representar para a economia nacional, como
justificou o Ministro do Trabalho. 

Esta decisão governamental teve impacto imediato nos sindicatos que
apelidaram a mesma de um “atentado”. Os sindicatos tinham proposto não
mais de 25% de serviços mínimos, enquanto a ANTRAM (Associação
Nacional de Transportadores Públicos Rodoviários de Mercadorias) contrapôs um mínimo de 70% e, depois, 75%. E, além
da percentagem de serviços “normais” a que os grevistas serão obrigados, é de
salientar também a abrangência destes, como vem referido supra.

Com efeito, foram incluídas nos serviços mínimos operações de carga e
descarga, isto quando nem a convenção coletiva atualmente em vigor no setor
inclui estas operações nas funções habituais de um camionista. E Vieira
da Silva, apesar de reconhecer este ponto, salientou que esta é uma função
“integrada nas funções usuais dos motoristas, pelo que não o considerar seria
admitir que se faria menos do que na realidade”.

Quanto ao risco de estes mínimos não serem cumpridos, o governante reiterou,
na conferência de imprensa, um recado antes deixado por Pedro Nuno Santos, vincando
que “o Governo não hesitará em usar todos os mecanismos ao seu alcance
para fazer cumprir os serviços mínimos”. 

Ainda a propósito do cumprimento, ou não, dos serviços mínimos, o Ministro
do Ambiente e da Transição Energética explicou que, não obstante serem
necessários 180 motoristas para assegurar a condução de veículos de mercadorias
em caso de desrespeito pelos serviços mínimos, o Governo tem “500 pessoas” para
ficarem habilitadas para esses serviços. E revelou que os postos da REPA
manterão o volume máximo de abastecimento em 15 litros, frisando que
esta rede vai ter 374 postos, mas só será ativada no próprio dia 12, dia de
início da greve. No entanto, sabe-se que já faltou combustível em áreas de serviço
da A1.

***

Apesar da imediata reação do sindicato de matérias perigosas – “sinto-me
envergonhado em ser português”, afirmou Pardal Henriques sobre os serviços
mínimos decretados pelo Governo –, para Vieira da Silva os mínimos elevados
“não colocam em causa o direito à greve”. O Ministro do Trabalho porfia
que o Governo “respeita de forma inequívoca” tal direito, mas “tem também
direito a defender os direitos de todos os portugueses” (aliás, tem
o dever de o fazer),
apontando a desproporcionalidade da paralisação. E vincou:

“O critério fundamental para o enquadramento
de qualquer greve é a proporcionalidade dos seus efeitos. A greve é
desencadeada para produzir efeitos, não há greve indolor. Mas os efeitos
negativos podem atingir uma escala que coloca em causa de forma muito sensível
toda a sociedade.”. 

***

A decisão do Governo surge depois de um último esforço negocial ter sido
encetado na última segunda-feira, dia em que o MIH (Ministério das
Infraestruturas e Habitação) propôs uma
via alternativa de diálogo, que passaria por ser o próprio Executivo a
assumir o desenho da convenção coletiva para o setor que seria, depois,
aprovada ou não por patrões e sindicatos.

Porém, a irredutibilidade dos sindicatos independentes de motoristas (segundo patrões
e Governo), os avanços significativos que a FECTRANS
tem conseguido nas suas negociações com a ANTRAM e a crescente perceção de que esta
greve destes motoristas é cada vez menos compreensível para os residentes em
Portugal levaram o Governo a abrir a porta ao lançamento prévio de um
alerta energético.

A declaração de crise energética, ao invés da requisição civil, não obriga
a que se espere pela crise propriamente dita para ser decretada, pois a
declaração pode avançar a partir do momento em que haja uma “previsão de
circunstâncias que possam provocar” a crise, ou seja, basta o Governo entender
que uma greve anunciada irá criar “dificuldades no aprovisionamento ou na
distribuição de energia”, para poder avançar de imediato com a declaração de
situação de crise energética. E uma paralisação alargada de motoristas de
matérias perigosas e de mercadorias enquadra-se nesta situação.

Assim que seja assinado o Despacho a decretar uma crise energética, e tal
como informou o Governo na última paralisação, é possível convocar de imediato
os trabalhadores do setor público e privado para a condução de veículos
pesados para compensar a greve dos motoristas, isto além dos militares da Força
Aérea, Exército ou Marinha.

***

Sobre a
legitimidade dos serviço mínimos assim desenhados, o ECO on line ouviu dois
especialistas em direito laboral para perceber se há um limite de serviços
mínimos, como deu a entender o Primeiro-Ministro, e o que sucederá se os
sindicatos não concordarem com os serviços mínimos decretados pelo Governo.

No pré-aviso de greve, os motoristas envolvidos no protesto avançaram
com uma proposta de serviços mínimos para vigorar aquando da
paralisação. A sugestão dos sindicatos é de 25%, uma
percentagem, contudo, muito inferior à proposta pela ANTRAM, de 70% a 75%.

Para os patrões, o valor avançado pelos
sindicatos é “completamente desajustado”, tendo em conta o impacto que esta
nova greve terá no país. Assim, questionado sobre a percentagem de serviços
mínimos que a ANTRAM considera aceitável, André Matias de Almeida, porta-voz da
ANTRAM, disse não ser ainda possível adiantar esse valor. Mais tarde, o Expresso adiantou
que a proposta dos patrões será a de exigir 70% a 75% dos serviços mínimos.

Entre as propostas do sindicato e da ANTRAM situa-se o
limite definido pelo Governo a meio da greve de abril. Na altura, o
Governo decretou serviços mínimos de 40% em Lisboa e no Porto. Desta vez não se
sabia se o Executivo ia repetir esta percentagem para ali. Aliás, de
acordo com as declarações do Primeiro-Ministro, a haver alterações será sempre
para cima. No dia 2, António Costa afirmou que o Governo admite adotar “todas
as medidas até ao limite do que a lei e a Constituição permitem para
mitigar o impacto da greve na vida dos portugueses.

Luís Gonçalves da Silva, advogado e consultor na Abreu Advogados, esclarece
que, embora não quantificável, o limite de serviços mínimos
“consta do quadro legal e decorre do princípio da proporcionalidade”,
acrescentando que este princípio diz que é preciso harmonizar um direito com o
outro. De acordo com o n.º 7 do artigo 398.º da LGTFP (Lei Geral do
Trabalho em Funções Públicas), “a
definição dos serviços mínimos deve respeitar os princípios da necessidade, da
adequação e da proporcionalidade”. Neste sentido, “a
intervenção do Governo tem de ser necessária, adequada e proporcional”, sendo
que a fixação da percentagem de serviços mínimos assume “uma certa
flexibilidade”. Isto porque, para definir serviços mínimos, o
Governo terá de avaliar os setores que afetados pela greve dos
motoristas e, a partir daí, estabelecer a percentagem proporcional. Trata-se
dum exercício mental, um enorme desafio para o Governo. E o advogado sublinha
que tem dificuldade “em pensar num setor que não seja afetado” por
esta greve agendada para 12 de agosto e por tempo indeterminado e acrescentando
que o Executivo terá, certamente, “alguma dificuldade em estabelecer os serviços
afetados”.

Por seu turno Carla Naia, da Nuno Cerejeira Namora, refere também que “não
há quantificações [na lei] de serviços mínimos”, o que é “completamente
abstrato”. “São tudo conceitos genéricos para serem adaptados às
situações em particular (…) tal como a lei deve ser”.

Depois de o Executivo decretar serviços mínimos – e, sobretudo, sendo a
percentagem mais elevada do que os 25% propostos –, os sindicatos têm direito a impugnar a decisão. E Gonçalves
da Silva diz que, para isso, “podem recorrer ao Tribunal Administrativo”. Nesse
caso, a decisão é do tribunal, que já, por outras vezes, deu razão aos
sindicatos. “Há mecanismos de controlo (…), mas isto não é uma folha de Excel
ou matemática” – relembra.

E o n.º 6 do artigo 398.º da LGTFP estabelece:

“Os representantes dos
trabalhadores devem designar os trabalhadores que ficam adstritos à prestação
dos serviços referidos no artigo anterior, até 24 horas antes do início do
período de greve, e, se não o fizerem, deve o empregador público proceder a
essa designação”. 

Uma vez convocados os trabalhadores para serviços mínimos, os que, mesmo
assim, não comparecerem ao trabalho no dia em questão, poderão ser sujeitos a
punições. De acordo com Carla Naia, “há uma resposta direta na lei” para esta questão
e chama-se responsabilidade disciplinar. E a advogada remete para o art.º 541.º
do Código do Trabalho que estipula:

“A ausência de
trabalhador por motivo de adesão a greve declarada ou executada de forma
contrária à lei considera-se falta injustificada”.

E explica:

“Quer isto dizer que, se um trabalhador for
convocado para serviços mínimos e faltar ao trabalho, pode valer-lhe uma falta
disciplinar”.

O n.º 3 do mesmo artigo estipula que, “em caso de incumprimento da
obrigação de prestação de serviços mínimos, o Governo pode determinar a
requisição ou mobilização, nos termos previstos em legislação
específica”. É a lei da requisição civil, um recurso que pode ser usado
durante a greve, caso seja verificado o incumprimento dos serviços mínimos
decretados.

***

Esta é, de facto, uma greve sui generis. Com efeito, é uma das greves que potencialmente pode
paralisar o país e o Governo, que em abril, como que ficou surpreendido, desta
feita está a preparar-se para encarar o momento de greve sem fim à vista com a
autoridade e a força do Estado. Aconselhou os cidadãos e as empresas a
abastecerem as suas viaturas antes da greve; decretou a emergência energética; definiu
de forma abundante os serviços mínimos, depois de ouvir patrões e sindicatos;
fez depender de simples despacho da tutela a mobilização dos trabalhadores e de
outros intervenientes (serão convocado de imediato); e, embora já tenha 150 profissionais
em condições de guiar os camiões que transportam matérias perigosas, precisando
de 180 no total, está a fazer formação a mais 500 pessoas (mais do dobro), com o objetivo de
assegurar o fornecimento de combustíveis aos postos de abastecimento durante a
greve.

Por outro lado, determinou que a REPA irá funcionar com 54 postos prioritários e 320
postos para utilizadores comuns, embora com local específico para veículos
prioritários. A rede entrará em funcionamento à meia-noite
de dia 12, mas a preparação e divulgação da rede começará antes. Matos
Fernandes explicou que será afixado em todos os postos de combustível do país
as localizações das bombas REPA, “à imagem do que se faz nas farmácias, com as
farmácias de serviço”. O responsável pela pasta do Ambiente e Transição
Energética revelou ainda que os 374 postos da rede de emergência manterão o
volume máximo de abastecimento em 15 litros. Nas restantes bombas de
abastecimento, os condutores não são vedados na quantidade que podem comprar,
mas não é garantido que continuem a ter combustível disponível.

A rede foi ajustada à maior procura pelo período de férias, pelo que terá
mais postos do que seria normal no Algarve: serão 22 postos na região, contra
os 8 previstos na rede normalmente.

Outro elemento de anormalidade da greve é a direção do SNMMP (Sindicato
Nacional de motoristas de Matérias Perigosas) ter como presidente um empresário e um advogado como vice-presidente. O
empresário não defende interesses do trabalhador, mas os seus, e o advogado tem
uma profissão liberal. Entretanto, o porta-voz do sindicato veio carpir para a
comunicação social o fado do dia de hoje como sendo do regresso à ditadura e à
repressão.

Ainda gostava de saber quais são os verdadeiros objetivos desta greve. E não
sei se o Presidente da República (cuja pronúncia era dispensável) tem razão ao admitir que os fins sejam legítimos mas
não os meios, como não sei se a população se porá mesmo contra os motoristas
como esteve contra os professores, que não têm empresários e advogados à testa
dos seus sindicatos, bem como se o Governo virá a afrontar os motoristas, como
fez a professores, enfermeiros e estivadores. 

Que os motoristas ganham mal e trabalham em más condições é verdade, mas
que a greve podia ter sido evitada também é certo. As negociações deviam
continuar até ao fim e levar a cedências mútuas. Só que as férias são bom
motivo para registar prejuízos como efeito da greve e as eleições estão à vista
e parece que é preciso arredar o PS da maioria absoluta. E Costa ou vence ou
perde. Se Ganha ri, mas, se perde não terá motivos para chorar, mas, sim o
consumidor e contribuinte. “A vida é um jogo”, mas aqui não se concretiza o
cantar de Nadia Malanima: “ri quem vence, quem perde chora”.

2019.08.07 –
Louro de Carvalho 

Ao decretar serviços mínimos entre 50% e 75%, além de 100% nos
serviços essenciais (Pensava que os serviços mínimos
eram os essenciais), o Governo recusa estar a pôr em causa o direito à greve e lembra a desproporcionalidade
do protesto de motoristas, com início previsto para 12 de agosto. Serão de 50% para os trabalhadores em postos de
combustível para os clientes finais, inclusive postos privados de empresas ou
cooperativas, e chega a ser de 75% a 100% em áreas como o fornecimento de alimentação,
bens essenciais e medicamentos a hospitais e centros de saúde.

Estas percentagens referem-se ao dia normal de trabalho de trabalho.

A informação foi avançada durante a conferência de imprensa conjunta no
Ministério do Trabalho da Solidariedade e da Segurança Social, com a presença
do Ministro Vieira da Silva, mas também do Ministro do Ambiente e da Transição
Energética, João Pedro Matos Fernandes e do Secretário de Estado das
Infraestruturas, Jorge Delgado.

Aos jornalistas, Vieira da Silva foi claro: este é um “conjunto exigente de serviços mínimos” e o Governo “tudo fará” para
que os serviços mínimos sejam respeitados. E especificou:

“Serão preparados todos os mecanismos que o
Governo tem ao dispor para garantir a tranquilidade e bem-estar dos
portugueses. (…) Não está a ser posto em causa o direito à greve. O Governo
respeita-a de forma inequívoca, mas tem também a responsabilidade de proteger o
direito de todos os portugueses.”.

Os serviços mínimos serão de 75% no atinente ao abastecimento de postos de
combustível destinados a empresas de transportes de passageiros, de alimentos e
animais, bem como de instituições de assistência social. Trata-se de empresas que têm por objeto a prestação do serviço público de
transportes de passageiros, telecomunicações, água e energia. Leia-se
empresas como Carris, Transtejo, EDP Distribuição, por exemplo. Também será exigido 75% dos serviços em “transporte e
abastecimento de combustíveis, matérias perigosas, medicamentos e todos os bens
essenciais destinados ao funcionamento dos estabelecimentos prisionais,
centros de acolhimento residencial para crianças e jovens, estruturas
residenciais para pessoas idosas, IPSS e Misericórdias”. E obviamente será exigido 75% de cumprimento dos serviços de transporte de bens
alimentares e de primeira necessidade, bem como de alimentação para animais em
explorações e animais vivos por razões de saúde e bem-estar animal.

No caso da REPA (Rede de Emergência de Postos de Abastecimento), ou seja, onde a greve nem sequer pode ter um
impacto mínimo, os motoristas estão mesmo obrigados a assegurar o abastecimento
destes postos prioritários a 100%. E o “abastecimento de combustíveis
destinados aos portos, aeroportos e aeródromos” (que sirvam de base a serviços
prioritários) obedece a
estas condições, tal como o “transporte e abastecimento de combustíveis,
matérias perigosas, medicamentos e todos os bens essenciais destinados ao
funcionamento dos hospitais, serviços de emergência médica, centros de saúde”.

No capítulo dos 100% de serviços, o Governo incluiu obviamente o
abastecimento dos postos incluídos na REPA, ou de portos, aeroportos e
aeródromos, instalações militares, bombeiros ou outras forças de
segurança, além do abastecimento de hospitais, centros de saúde e “o
transporte de produtos perecíveis e/ou deterioráveis, medicamentos para
farmácias e fornecimento de gases medicinais ao domicílio”. E o comunicado
do Executivo adrede distribuído salienta:

“Importa ainda referir que resulta do
Despacho de Serviços Mínimos que no abastecimento estão compreendidas as
operações de carga, transporte e descarga assegurados usualmente pelos
motoristas”.

A seguir, Matos Fernandes anunciou a declaração do estado de emergência
energética.

Neste sentido, o Ministro do Ambiente e da Transição Energética revelou que
existirão num total 374 postos da REPA a funcionar em todo o país (sendo 54
deles para veículos prioritários e 320 destinados ao público em geral) – um número superior ao que estava desenhado. Mais:
haverá um reforço no Algarve destes postos prioritários, bem como na região das
colheitas nas Lezírias do Tejo e em concelhos do interior do país. Em relação
ao Algarve, que habitualmente tem 8 postos da REPA, terá “praticamente o
triplo”.

Os mais de três mil postos de combustível existentes terão afixados quais
os postos da REPA (“um pouco como acontece atualmente com as farmácias de
serviço”). E o Governo vai anunciar a sua
listagem nos jornais e no site da ENSE
(Entidade
Nacional para o Setor Energético).

O volume máximo para os consumidores se abastecerem será de 15 litros por
viatura na REPA. Nos restantes postos de combustível, não existe limite e “tudo
dependerá do bom senso” de cada um, como adiantou Matos Fernandes.

Entre o abastecimento para os veículos prioritários, o Governo vai ter uma
atenção especial às carrinhas de transporte de valores, “para que não falte o
dinheiro no multibanco”.

Quanto à preparação das forças armadas e de segurança (GNR e PSP) para conduzir os veículos de pesados e de matérias
perigosas, o Ministro garantiu serem necessários “180 homens”. E revelou que
estão neste momento em formação 500 pessoas, ou seja, mais do dobro do que é
necessário para essa missão. E, no final da conferência de imprensa, Matos
Fernandes anunciou que a venda de combustível aumentou, na última semana, 30% em
relação à semana normal. “Alguns postos de combustível estão a comprar o
quádruplo do combustível”, o que demonstra que as bombas de gasolina estão “com
mais combustível do que o comum nesta época do ano”.

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O grau elevado de “mínimos” decidido pelo Executivo justifica-se pelo facto
de a paralisação ter sido decretada “por tempo indeterminado” e pelos vários
impactos que a greve em questão pode representar para a economia nacional, como
justificou o Ministro do Trabalho. 

Esta decisão governamental teve impacto imediato nos sindicatos que
apelidaram a mesma de um “atentado”. Os sindicatos tinham proposto não
mais de 25% de serviços mínimos, enquanto a ANTRAM (Associação
Nacional de Transportadores Públicos Rodoviários de Mercadorias) contrapôs um mínimo de 70% e, depois, 75%. E, além
da percentagem de serviços “normais” a que os grevistas serão obrigados, é de
salientar também a abrangência destes, como vem referido supra.

Com efeito, foram incluídas nos serviços mínimos operações de carga e
descarga, isto quando nem a convenção coletiva atualmente em vigor no setor
inclui estas operações nas funções habituais de um camionista. E Vieira
da Silva, apesar de reconhecer este ponto, salientou que esta é uma função
“integrada nas funções usuais dos motoristas, pelo que não o considerar seria
admitir que se faria menos do que na realidade”.

Quanto ao risco de estes mínimos não serem cumpridos, o governante reiterou,
na conferência de imprensa, um recado antes deixado por Pedro Nuno Santos, vincando
que “o Governo não hesitará em usar todos os mecanismos ao seu alcance
para fazer cumprir os serviços mínimos”. 

Ainda a propósito do cumprimento, ou não, dos serviços mínimos, o Ministro
do Ambiente e da Transição Energética explicou que, não obstante serem
necessários 180 motoristas para assegurar a condução de veículos de mercadorias
em caso de desrespeito pelos serviços mínimos, o Governo tem “500 pessoas” para
ficarem habilitadas para esses serviços. E revelou que os postos da REPA
manterão o volume máximo de abastecimento em 15 litros, frisando que
esta rede vai ter 374 postos, mas só será ativada no próprio dia 12, dia de
início da greve. No entanto, sabe-se que já faltou combustível em áreas de serviço
da A1.

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Apesar da imediata reação do sindicato de matérias perigosas – “sinto-me
envergonhado em ser português”, afirmou Pardal Henriques sobre os serviços
mínimos decretados pelo Governo –, para Vieira da Silva os mínimos elevados
“não colocam em causa o direito à greve”. O Ministro do Trabalho porfia
que o Governo “respeita de forma inequívoca” tal direito, mas “tem também
direito a defender os direitos de todos os portugueses” (aliás, tem
o dever de o fazer),
apontando a desproporcionalidade da paralisação. E vincou:

“O critério fundamental para o enquadramento
de qualquer greve é a proporcionalidade dos seus efeitos. A greve é
desencadeada para produzir efeitos, não há greve indolor. Mas os efeitos
negativos podem atingir uma escala que coloca em causa de forma muito sensível
toda a sociedade.”. 

***

A decisão do Governo surge depois de um último esforço negocial ter sido
encetado na última segunda-feira, dia em que o MIH (Ministério das
Infraestruturas e Habitação) propôs uma
via alternativa de diálogo, que passaria por ser o próprio Executivo a
assumir o desenho da convenção coletiva para o setor que seria, depois,
aprovada ou não por patrões e sindicatos.

Porém, a irredutibilidade dos sindicatos independentes de motoristas (segundo patrões
e Governo), os avanços significativos que a FECTRANS
tem conseguido nas suas negociações com a ANTRAM e a crescente perceção de que esta
greve destes motoristas é cada vez menos compreensível para os residentes em
Portugal levaram o Governo a abrir a porta ao lançamento prévio de um
alerta energético.

A declaração de crise energética, ao invés da requisição civil, não obriga
a que se espere pela crise propriamente dita para ser decretada, pois a
declaração pode avançar a partir do momento em que haja uma “previsão de
circunstâncias que possam provocar” a crise, ou seja, basta o Governo entender
que uma greve anunciada irá criar “dificuldades no aprovisionamento ou na
distribuição de energia”, para poder avançar de imediato com a declaração de
situação de crise energética. E uma paralisação alargada de motoristas de
matérias perigosas e de mercadorias enquadra-se nesta situação.

Assim que seja assinado o Despacho a decretar uma crise energética, e tal
como informou o Governo na última paralisação, é possível convocar de imediato
os trabalhadores do setor público e privado para a condução de veículos
pesados para compensar a greve dos motoristas, isto além dos militares da Força
Aérea, Exército ou Marinha.

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Sobre a
legitimidade dos serviço mínimos assim desenhados, o ECO on line ouviu dois
especialistas em direito laboral para perceber se há um limite de serviços
mínimos, como deu a entender o Primeiro-Ministro, e o que sucederá se os
sindicatos não concordarem com os serviços mínimos decretados pelo Governo.

No pré-aviso de greve, os motoristas envolvidos no protesto avançaram
com uma proposta de serviços mínimos para vigorar aquando da
paralisação. A sugestão dos sindicatos é de 25%, uma
percentagem, contudo, muito inferior à proposta pela ANTRAM, de 70% a 75%.

Para os patrões, o valor avançado pelos
sindicatos é “completamente desajustado”, tendo em conta o impacto que esta
nova greve terá no país. Assim, questionado sobre a percentagem de serviços
mínimos que a ANTRAM considera aceitável, André Matias de Almeida, porta-voz da
ANTRAM, disse não ser ainda possível adiantar esse valor. Mais tarde, o Expresso adiantou
que a proposta dos patrões será a de exigir 70% a 75% dos serviços mínimos.

Entre as propostas do sindicato e da ANTRAM situa-se o
limite definido pelo Governo a meio da greve de abril. Na altura, o
Governo decretou serviços mínimos de 40% em Lisboa e no Porto. Desta vez não se
sabia se o Executivo ia repetir esta percentagem para ali. Aliás, de
acordo com as declarações do Primeiro-Ministro, a haver alterações será sempre
para cima. No dia 2, António Costa afirmou que o Governo admite adotar “todas
as medidas até ao limite do que a lei e a Constituição permitem para
mitigar o impacto da greve na vida dos portugueses.

Luís Gonçalves da Silva, advogado e consultor na Abreu Advogados, esclarece
que, embora não quantificável, o limite de serviços mínimos
“consta do quadro legal e decorre do princípio da proporcionalidade”,
acrescentando que este princípio diz que é preciso harmonizar um direito com o
outro. De acordo com o n.º 7 do artigo 398.º da LGTFP (Lei Geral do
Trabalho em Funções Públicas), “a
definição dos serviços mínimos deve respeitar os princípios da necessidade, da
adequação e da proporcionalidade”. Neste sentido, “a
intervenção do Governo tem de ser necessária, adequada e proporcional”, sendo
que a fixação da percentagem de serviços mínimos assume “uma certa
flexibilidade”. Isto porque, para definir serviços mínimos, o
Governo terá de avaliar os setores que afetados pela greve dos
motoristas e, a partir daí, estabelecer a percentagem proporcional. Trata-se
dum exercício mental, um enorme desafio para o Governo. E o advogado sublinha
que tem dificuldade “em pensar num setor que não seja afetado” por
esta greve agendada para 12 de agosto e por tempo indeterminado e acrescentando
que o Executivo terá, certamente, “alguma dificuldade em estabelecer os serviços
afetados”.

Por seu turno Carla Naia, da Nuno Cerejeira Namora, refere também que “não
há quantificações [na lei] de serviços mínimos”, o que é “completamente
abstrato”. “São tudo conceitos genéricos para serem adaptados às
situações em particular (…) tal como a lei deve ser”.

Depois de o Executivo decretar serviços mínimos – e, sobretudo, sendo a
percentagem mais elevada do que os 25% propostos –, os sindicatos têm direito a impugnar a decisão. E Gonçalves
da Silva diz que, para isso, “podem recorrer ao Tribunal Administrativo”. Nesse
caso, a decisão é do tribunal, que já, por outras vezes, deu razão aos
sindicatos. “Há mecanismos de controlo (…), mas isto não é uma folha de Excel
ou matemática” – relembra.

E o n.º 6 do artigo 398.º da LGTFP estabelece:

“Os representantes dos
trabalhadores devem designar os trabalhadores que ficam adstritos à prestação
dos serviços referidos no artigo anterior, até 24 horas antes do início do
período de greve, e, se não o fizerem, deve o empregador público proceder a
essa designação”. 

Uma vez convocados os trabalhadores para serviços mínimos, os que, mesmo
assim, não comparecerem ao trabalho no dia em questão, poderão ser sujeitos a
punições. De acordo com Carla Naia, “há uma resposta direta na lei” para esta questão
e chama-se responsabilidade disciplinar. E a advogada remete para o art.º 541.º
do Código do Trabalho que estipula:

“A ausência de
trabalhador por motivo de adesão a greve declarada ou executada de forma
contrária à lei considera-se falta injustificada”.

E explica:

“Quer isto dizer que, se um trabalhador for
convocado para serviços mínimos e faltar ao trabalho, pode valer-lhe uma falta
disciplinar”.

O n.º 3 do mesmo artigo estipula que, “em caso de incumprimento da
obrigação de prestação de serviços mínimos, o Governo pode determinar a
requisição ou mobilização, nos termos previstos em legislação
específica”. É a lei da requisição civil, um recurso que pode ser usado
durante a greve, caso seja verificado o incumprimento dos serviços mínimos
decretados.

***

Esta é, de facto, uma greve sui generis. Com efeito, é uma das greves que potencialmente pode
paralisar o país e o Governo, que em abril, como que ficou surpreendido, desta
feita está a preparar-se para encarar o momento de greve sem fim à vista com a
autoridade e a força do Estado. Aconselhou os cidadãos e as empresas a
abastecerem as suas viaturas antes da greve; decretou a emergência energética; definiu
de forma abundante os serviços mínimos, depois de ouvir patrões e sindicatos;
fez depender de simples despacho da tutela a mobilização dos trabalhadores e de
outros intervenientes (serão convocado de imediato); e, embora já tenha 150 profissionais
em condições de guiar os camiões que transportam matérias perigosas, precisando
de 180 no total, está a fazer formação a mais 500 pessoas (mais do dobro), com o objetivo de
assegurar o fornecimento de combustíveis aos postos de abastecimento durante a
greve.

Por outro lado, determinou que a REPA irá funcionar com 54 postos prioritários e 320
postos para utilizadores comuns, embora com local específico para veículos
prioritários. A rede entrará em funcionamento à meia-noite
de dia 12, mas a preparação e divulgação da rede começará antes. Matos
Fernandes explicou que será afixado em todos os postos de combustível do país
as localizações das bombas REPA, “à imagem do que se faz nas farmácias, com as
farmácias de serviço”. O responsável pela pasta do Ambiente e Transição
Energética revelou ainda que os 374 postos da rede de emergência manterão o
volume máximo de abastecimento em 15 litros. Nas restantes bombas de
abastecimento, os condutores não são vedados na quantidade que podem comprar,
mas não é garantido que continuem a ter combustível disponível.

A rede foi ajustada à maior procura pelo período de férias, pelo que terá
mais postos do que seria normal no Algarve: serão 22 postos na região, contra
os 8 previstos na rede normalmente.

Outro elemento de anormalidade da greve é a direção do SNMMP (Sindicato
Nacional de motoristas de Matérias Perigosas) ter como presidente um empresário e um advogado como vice-presidente. O
empresário não defende interesses do trabalhador, mas os seus, e o advogado tem
uma profissão liberal. Entretanto, o porta-voz do sindicato veio carpir para a
comunicação social o fado do dia de hoje como sendo do regresso à ditadura e à
repressão.

Ainda gostava de saber quais são os verdadeiros objetivos desta greve. E não
sei se o Presidente da República (cuja pronúncia era dispensável) tem razão ao admitir que os fins sejam legítimos mas
não os meios, como não sei se a população se porá mesmo contra os motoristas
como esteve contra os professores, que não têm empresários e advogados à testa
dos seus sindicatos, bem como se o Governo virá a afrontar os motoristas, como
fez a professores, enfermeiros e estivadores. 

Que os motoristas ganham mal e trabalham em más condições é verdade, mas
que a greve podia ter sido evitada também é certo. As negociações deviam
continuar até ao fim e levar a cedências mútuas. Só que as férias são bom
motivo para registar prejuízos como efeito da greve e as eleições estão à vista
e parece que é preciso arredar o PS da maioria absoluta. E Costa ou vence ou
perde. Se Ganha ri, mas, se perde não terá motivos para chorar, mas, sim o
consumidor e contribuinte. “A vida é um jogo”, mas aqui não se concretiza o
cantar de Nadia Malanima: “ri quem vence, quem perde chora”.

2019.08.07 –
Louro de Carvalho 

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