"Como qualquer cidadão, espero uma resposta de Manuel Pinho"

05-05-2018
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Secretário de Estado da Energia, Jorge Seguro Sanches diz que o governo tem como objetivo fazer uma redução dos preços da eletricidade até final da legislatura. Sobre os polémicos CMEC (Custos de Manutenção do Equilíbrio Contratual), o governante sublinha o corte de 102 milhões no valor a pagar à EDP, mas acrescenta que a lei tem de ser cumprida. Quanto à desfiliação de Sócrates do PS, Seguro Sanches defende que é uma "decisão individual", mas admite que o caso em torno do ex-secretário-geral socialista "não foi bom para ninguém".

Como é que vê a desfiliação de José Sócrates do PS?

Respeito. É uma decisão individual de cada militante.

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Sócrates sai queixando-se de ter sido injustiçado pela direção do PS. António Costa, Carlos César ou Augusto Santos Silva foram injustos?

Não acho que deva fazer comentários sobre uma situação que tem a ver com um processo judicial - à justiça aquilo que é da justiça, à política o que é da política. O que posso dizer é o seguinte: o exercício de funções públicas e políticas é cada vez mais exigente, e ainda bem que assim é, porque é preciso darmos garantias do bom funcionamento da democracia, do governo e da administração pública. Desse ponto de vista sinto que, por vezes, aquilo que do ponto de vista político é muito importante de alguma forma possa corresponder, em termos pessoais, a algum tipo de injustiça relativa. Mas é muito importante que as instituições funcionem e que deem toda a garantia de bom funcionamento e de transparência aos cidadãos.

Nas últimas semanas, houve uma mudança no discurso do PS...

Não me parece.

Nunca tínhamos ouvido altos responsáveis do PS falar em embaraço ou vergonha.

Como é evidente todos nós sentimos que aquilo que aconteceu não foi bom para ninguém. Não foi bom para o país, para o PS, para os portugueses. Mas como digo, estas questões têm a sua sede própria para serem resolvidas, do ponto de vista judicial.

Estas questões devem ser motivo de reflexão no congresso do PS?

O PS tem feito, sempre, uma reflexão sobre as questões éticas. Qualquer fórum do PS está sempre aberto para discutir qualquer tema, sempre foi assim.

Como membro de um governo, como é que vê a suspeita de que Manuel Pinho recebeu dinheiro do BES enquanto era ministro?

A confirmar-se é inaceitável. E eu sei que o Dr. Manuel Pinho não foi ouvido, não foi acusado, mas a ética no exercício de funções públicas exige que estejamos, a qualquer momento, disponíveis para prestar contas sobre o que fazemos. O que espero, como qualquer cidadão, é que no mínimo haja uma resposta.

Manuel Pinho tem explicações a dar?

Todos temos essa obrigação quando desempenhamos funções públicas, até por uma questão de confiança no próprio sistema. Penso que não há nenhum português que não queira saber exatamente o que aconteceu nesta situação.

Se isto se confirmar, que consequências pode vir a ter? Estamos a falar de um ex-ministro que tomou decisões, por exemplo, sobre os CMEC.

Não quero entrar em futurologias. Todos estaremos cá para tirar as consequências políticas de qualquer situação. O que posso assegurar é que, independentemente de qualquer decisão que venha a ser tomada nesse âmbito, nós estamos a trabalhar no sentido de que esses objetivos sejam alcançados, no sentido de reduzir custos, no sentido de que a legalidade seja absolutamente garantida. Para todos, para os consumidores e para as empresas. Isto só lá vai de uma forma: com muito rigor e com muita transparência.

A forma como as relações entre o Estado e a EDP foram sendo estabelecidas, ao longo dos anos, propicia um ambiente de promiscuidade entre as duas partes?

Hoje vivemos uma situação completamente diferente daquilo que foi ao longo dos anos. A EDP começou por ser uma empresa totalmente pública, que a pouco e pouco foi vendendo as suas participações sociais a acionistas que foram entrando. Hoje as principais empresas de energia do país não são participadas, não há golden shares nem nada disso. É verdade que, em determinados momentos e ao longo da história, o governo aparecia de dois pontos de vista: por um lado, como acionista da empresa, por outro como garante do funcionamento do sistema. Isto não é desejável. Hoje vivemos uma situação muito clara. Qualquer empresa do setor é soberana. E há aqui uma questão muito clara: o interesse dessas empresas é um, o interesse público é outra coisa.

Houve um secretário de Estado da Energia [Henrique Gomes] que saiu por pressões da lobby da energia. Alguma vez sentiu esse tipo de pressões?

Se isso aconteceu, acho muito grave. É muito grave que qualquer interesse particular possa ter levado à mudança de membros de um governo. O que posso dizer sobre esta questão é que, como é evidente, não, nem nunca permitirei, nem este governo permitiria que isso acontecesse.

Alguma vez foi alvo de abordagens menos lícitas?

Nas reuniões onde estou só discuto aquilo que quero. Uma grande vantagem que o Estado, que o governo tem, é que nós estamos acima dos interesses particulares, sejam eles de quem forem. Se isso, porventura, alguma vez pudesse suceder, já não havia sequer diálogo. O Estado também tem que saber dar-se ao respeito. E por em cima da mesa quais são os objetivos. Os nossos objetivos são públicos : defesa dos consumidores, defesa da economia nacional, defesa do país. Todas as outras questões que pudessem surgir estariam fora de qualquer tipo de diálogo.

Isso não é uma verdade absoluta, aliás como se vai vendo.

É assim que funcionamos neste governo.

O que é que o levou a pôr em causa as decisões sobre os CMEC, e nomeadamente a pedir um parecer ao Conselho Consultivo da PGR? Teve dúvidas de que o interesse público pode não ter estado acima de tudo o resto, neste processo?

Não, foi uma questão mais simples. Quando iniciei funções, o governo anterior deixou-me para despacho a homologação dos CMEC de 2014, estando em aberto se a CESE - a Contribuição Extraordinária do Setor Energético - devia ou não repercutir sobre os CMEC. Ou seja, se seriam ou não os consumidores a pagar a CESE. Como a questão era controversa, pedi ao Conselho Consultivo da PGR que se pronunciasse sobre essa questão e sobre outras, que na altura me suscitaram dúvidas sobre a construção jurídica dos CMEC. Foi em função dessas questões que, pela primeira vez, foi possível clarificar quais é que são as obrigações, até onde é que vão os CMEC.

A dedução lógica disso é que havia falta de transparência.

Do meu ponto de vista era preciso esclarecer claramente algumas questões que não estavam claras, de um ponto de vista jurídico. Esta é uma área muito técnica, muito difícil, é preciso dar-lhe transparência.

Como é que avalia o papel da entidade reguladora, a ERSE, ao longo destes anos? Há acusações, por exemplo por parte do PCP, de que a ERSE não fez o suficiente para travar os CMEC.

Desde que aqui estou o regulador tem tido um papel extraordinário a dar garantias do bom funcionamento do mercado em relação aos consumidores. E muito do trabalho que tem sido feito ao nível da política energética, para reduzir a dívida tarifária - que era de mais de cinco mil milhões em 2015 e apontamos agora, para 3,6 mil milhões - e isto conseguindo baixar os preços da eletricidade, contrariamente ao que dizia o governo anterior. Conseguimos baixar os custos da eletricidade, não ainda de uma forma muito relevante, mas conseguimos baixar. Isso é feito com o trabalho rigoroso do regulador.

E quando é que isso se vai repercutir, de forma relevante, na fatura dos consumidores?

Se me pergunta quanto é que eu gostava? O mais cedo possível. Mas quem fixa os preços da eletricidade em Portugal é o regulador. O que eu tenho de criar é as melhores condições políticas para o funcionamento do mercado, para que este resultado chegue aos consumidores. O meu grande objetivo é que Portugal, que em 2015 tinha, em termos de paridade de poder de compra, o preço da eletricidade mais caro da Europa, possa chegar ao fim da legislatura na média da União Europeia.

Em 2019 o preço da eletricidade vai baixar de novo?

Não consigo dizer isso. Há questões que não podemos controlar, mas o objetivo é fazer uma redução. O governo está a trabalhar para que os preços da energia sejam mais competitivos. Como é que temos feito isso? Na redução da dívida tarifária, na redução da taxa de juro, ao termos autorizado mais de 1000 MW de renováveis sem qualquer tipo de subsídios. Estamos ainda a pagar cerca de 1,2 mil milhões de encargos com as renováveis subsidiadas. Não quero deixar ao meu sucessor uma dívida tarifária que seja a sua maior preocupação.

À esquerda defende-se que não devia ser pago nem mais um euro à EDP pelos CMEC.

Como membro do governo estou adstrito ao cumprimento da lei. O que faremos é cumprir rigorosamente o que está estabelecido, mas com objetivos claros: reduzir custos, conseguir um melhor funcionamento do mercado. A prova de que faz todo o sentido os CMEC passarem a ser feitos pela ERSE e não pela EDP e pela REN já se justificou nesta diferença de 102 milhões no valor do ajustamento final dos CMEC, sem prejuízo de ser revisto no futuro.

Quando é que a Direção-Geral de Energia e Geologia (DGEG) e a ERSE apresentarão as contas finais?

Estamos a trabalhar para que todas as decisões que tomemos sejam o mais sólidas possível do ponto de vista jurídico. São questões complexas, que não são dos últimos dois anos e meio, mas que têm a ver com o funcionamento do sistema antes deste governo. Da nossa parte será o mais rápido possível. Há um pedido à DGEG para que, em articulação com o regulador, faça esse trabalho de forma segura e sustentada. Dei a maior prioridade, pedi a maior urgência, mas não devo avançar com uma data para a decisão. Percebo que a avaliação possa demorar algum tempo. Vamos esperar que o resultado venha de forma inabalável juridicamente.

Que aspetos inovatórios estão a ser estudados?

Os aspetos inovatórios são as situações que não estavam consideradas nos contratos iniciais. É um trabalho técnico, sobre o qual não me devo pronunciar. Queremos saber se aconteceu algo de novo e extraordinário em relação ao que estava previsto no início nos contratos. Há urgência, mas há também serenidade. O parecer do Conselho Consultivo da PGR, que foi solicitado e homologado pelo Governo, dá como sanção a esses eventuais aspetos inovatórios a nulidade. Estamos a falar de todas as decisões que foram tomadas ao longo desses anos.

Podemos falar de um braço de ferro entre o Governo, a EDP e outras empresas do setor?

Não entendo que seja um braço de ferro. O relacionamento com todas as empresas do setor tem-se pautado pela maior cordialidade. A REN é uma empresa que a quase totalidade da sua atuação a faz em nome do Estado, através de um contrato de concessão. Mesmo a EDP Serviço Universal e EDP Distribuição são empresas concessionárias que atuam em nome do Estado. As empresas defendem os seus interesses, o Estado defende o interesse público. Umas vezes estaremos de acordo, noutras não.

Espera que a EDP avance agora para tribunal?

Temos de estar bem preparados do ponto de vista técnico, para que as decisões sejam o mínimo possível atacadas e que, se forem atacadas, não vençam.

O que espera da comissão parlamentar de inquérito aos CMEC?

Esta comissão de inquérito pode ser um bom exercício para o desenho de medidas no setor. Não deve ser vista como uma forma de por em causa as empresas. Não podemos pensar que este é um sistema que viveu, que vive e que vai continuar a viver com base em rendas.

As rendas excessivas de 510 milhões identificadas pela ERSE vão ser pedidas à EDP?

As rendas excessivas são uma avaliação sobre mudança do regime dos CAE para os CMEC. Foi um processo que não correu da melhor maneira. O próprio diploma 240/2004 foi publicado três vezes. Tudo isto não correu da melhor maneira, mas é uma lei do país e temos de executar o que está na lei. São questões datadas, de há 13 anos, que podem ter influenciado tudo o que aconteceu a seguir.

António Mexia é arguido no processo EDP, por suspeita de corrupção. Acha que isso acarreta custos reputacionais para a empresa?

Não consigo avaliar, essa é uma questão que terá de ser feita aos acionistas da empresa. De qualquer forma em Portugal ninguém pode ser condenado sem que haja uma sentença.

Secretário de Estado da Energia, Jorge Seguro Sanches diz que o governo tem como objetivo fazer uma redução dos preços da eletricidade até final da legislatura. Sobre os polémicos CMEC (Custos de Manutenção do Equilíbrio Contratual), o governante sublinha o corte de 102 milhões no valor a pagar à EDP, mas acrescenta que a lei tem de ser cumprida. Quanto à desfiliação de Sócrates do PS, Seguro Sanches defende que é uma "decisão individual", mas admite que o caso em torno do ex-secretário-geral socialista "não foi bom para ninguém".

Como é que vê a desfiliação de José Sócrates do PS?

Respeito. É uma decisão individual de cada militante.

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Sócrates sai queixando-se de ter sido injustiçado pela direção do PS. António Costa, Carlos César ou Augusto Santos Silva foram injustos?

Não acho que deva fazer comentários sobre uma situação que tem a ver com um processo judicial - à justiça aquilo que é da justiça, à política o que é da política. O que posso dizer é o seguinte: o exercício de funções públicas e políticas é cada vez mais exigente, e ainda bem que assim é, porque é preciso darmos garantias do bom funcionamento da democracia, do governo e da administração pública. Desse ponto de vista sinto que, por vezes, aquilo que do ponto de vista político é muito importante de alguma forma possa corresponder, em termos pessoais, a algum tipo de injustiça relativa. Mas é muito importante que as instituições funcionem e que deem toda a garantia de bom funcionamento e de transparência aos cidadãos.

Nas últimas semanas, houve uma mudança no discurso do PS...

Não me parece.

Nunca tínhamos ouvido altos responsáveis do PS falar em embaraço ou vergonha.

Como é evidente todos nós sentimos que aquilo que aconteceu não foi bom para ninguém. Não foi bom para o país, para o PS, para os portugueses. Mas como digo, estas questões têm a sua sede própria para serem resolvidas, do ponto de vista judicial.

Estas questões devem ser motivo de reflexão no congresso do PS?

O PS tem feito, sempre, uma reflexão sobre as questões éticas. Qualquer fórum do PS está sempre aberto para discutir qualquer tema, sempre foi assim.

Como membro de um governo, como é que vê a suspeita de que Manuel Pinho recebeu dinheiro do BES enquanto era ministro?

A confirmar-se é inaceitável. E eu sei que o Dr. Manuel Pinho não foi ouvido, não foi acusado, mas a ética no exercício de funções públicas exige que estejamos, a qualquer momento, disponíveis para prestar contas sobre o que fazemos. O que espero, como qualquer cidadão, é que no mínimo haja uma resposta.

Manuel Pinho tem explicações a dar?

Todos temos essa obrigação quando desempenhamos funções públicas, até por uma questão de confiança no próprio sistema. Penso que não há nenhum português que não queira saber exatamente o que aconteceu nesta situação.

Se isto se confirmar, que consequências pode vir a ter? Estamos a falar de um ex-ministro que tomou decisões, por exemplo, sobre os CMEC.

Não quero entrar em futurologias. Todos estaremos cá para tirar as consequências políticas de qualquer situação. O que posso assegurar é que, independentemente de qualquer decisão que venha a ser tomada nesse âmbito, nós estamos a trabalhar no sentido de que esses objetivos sejam alcançados, no sentido de reduzir custos, no sentido de que a legalidade seja absolutamente garantida. Para todos, para os consumidores e para as empresas. Isto só lá vai de uma forma: com muito rigor e com muita transparência.

A forma como as relações entre o Estado e a EDP foram sendo estabelecidas, ao longo dos anos, propicia um ambiente de promiscuidade entre as duas partes?

Hoje vivemos uma situação completamente diferente daquilo que foi ao longo dos anos. A EDP começou por ser uma empresa totalmente pública, que a pouco e pouco foi vendendo as suas participações sociais a acionistas que foram entrando. Hoje as principais empresas de energia do país não são participadas, não há golden shares nem nada disso. É verdade que, em determinados momentos e ao longo da história, o governo aparecia de dois pontos de vista: por um lado, como acionista da empresa, por outro como garante do funcionamento do sistema. Isto não é desejável. Hoje vivemos uma situação muito clara. Qualquer empresa do setor é soberana. E há aqui uma questão muito clara: o interesse dessas empresas é um, o interesse público é outra coisa.

Houve um secretário de Estado da Energia [Henrique Gomes] que saiu por pressões da lobby da energia. Alguma vez sentiu esse tipo de pressões?

Se isso aconteceu, acho muito grave. É muito grave que qualquer interesse particular possa ter levado à mudança de membros de um governo. O que posso dizer sobre esta questão é que, como é evidente, não, nem nunca permitirei, nem este governo permitiria que isso acontecesse.

Alguma vez foi alvo de abordagens menos lícitas?

Nas reuniões onde estou só discuto aquilo que quero. Uma grande vantagem que o Estado, que o governo tem, é que nós estamos acima dos interesses particulares, sejam eles de quem forem. Se isso, porventura, alguma vez pudesse suceder, já não havia sequer diálogo. O Estado também tem que saber dar-se ao respeito. E por em cima da mesa quais são os objetivos. Os nossos objetivos são públicos : defesa dos consumidores, defesa da economia nacional, defesa do país. Todas as outras questões que pudessem surgir estariam fora de qualquer tipo de diálogo.

Isso não é uma verdade absoluta, aliás como se vai vendo.

É assim que funcionamos neste governo.

O que é que o levou a pôr em causa as decisões sobre os CMEC, e nomeadamente a pedir um parecer ao Conselho Consultivo da PGR? Teve dúvidas de que o interesse público pode não ter estado acima de tudo o resto, neste processo?

Não, foi uma questão mais simples. Quando iniciei funções, o governo anterior deixou-me para despacho a homologação dos CMEC de 2014, estando em aberto se a CESE - a Contribuição Extraordinária do Setor Energético - devia ou não repercutir sobre os CMEC. Ou seja, se seriam ou não os consumidores a pagar a CESE. Como a questão era controversa, pedi ao Conselho Consultivo da PGR que se pronunciasse sobre essa questão e sobre outras, que na altura me suscitaram dúvidas sobre a construção jurídica dos CMEC. Foi em função dessas questões que, pela primeira vez, foi possível clarificar quais é que são as obrigações, até onde é que vão os CMEC.

A dedução lógica disso é que havia falta de transparência.

Do meu ponto de vista era preciso esclarecer claramente algumas questões que não estavam claras, de um ponto de vista jurídico. Esta é uma área muito técnica, muito difícil, é preciso dar-lhe transparência.

Como é que avalia o papel da entidade reguladora, a ERSE, ao longo destes anos? Há acusações, por exemplo por parte do PCP, de que a ERSE não fez o suficiente para travar os CMEC.

Desde que aqui estou o regulador tem tido um papel extraordinário a dar garantias do bom funcionamento do mercado em relação aos consumidores. E muito do trabalho que tem sido feito ao nível da política energética, para reduzir a dívida tarifária - que era de mais de cinco mil milhões em 2015 e apontamos agora, para 3,6 mil milhões - e isto conseguindo baixar os preços da eletricidade, contrariamente ao que dizia o governo anterior. Conseguimos baixar os custos da eletricidade, não ainda de uma forma muito relevante, mas conseguimos baixar. Isso é feito com o trabalho rigoroso do regulador.

E quando é que isso se vai repercutir, de forma relevante, na fatura dos consumidores?

Se me pergunta quanto é que eu gostava? O mais cedo possível. Mas quem fixa os preços da eletricidade em Portugal é o regulador. O que eu tenho de criar é as melhores condições políticas para o funcionamento do mercado, para que este resultado chegue aos consumidores. O meu grande objetivo é que Portugal, que em 2015 tinha, em termos de paridade de poder de compra, o preço da eletricidade mais caro da Europa, possa chegar ao fim da legislatura na média da União Europeia.

Em 2019 o preço da eletricidade vai baixar de novo?

Não consigo dizer isso. Há questões que não podemos controlar, mas o objetivo é fazer uma redução. O governo está a trabalhar para que os preços da energia sejam mais competitivos. Como é que temos feito isso? Na redução da dívida tarifária, na redução da taxa de juro, ao termos autorizado mais de 1000 MW de renováveis sem qualquer tipo de subsídios. Estamos ainda a pagar cerca de 1,2 mil milhões de encargos com as renováveis subsidiadas. Não quero deixar ao meu sucessor uma dívida tarifária que seja a sua maior preocupação.

À esquerda defende-se que não devia ser pago nem mais um euro à EDP pelos CMEC.

Como membro do governo estou adstrito ao cumprimento da lei. O que faremos é cumprir rigorosamente o que está estabelecido, mas com objetivos claros: reduzir custos, conseguir um melhor funcionamento do mercado. A prova de que faz todo o sentido os CMEC passarem a ser feitos pela ERSE e não pela EDP e pela REN já se justificou nesta diferença de 102 milhões no valor do ajustamento final dos CMEC, sem prejuízo de ser revisto no futuro.

Quando é que a Direção-Geral de Energia e Geologia (DGEG) e a ERSE apresentarão as contas finais?

Estamos a trabalhar para que todas as decisões que tomemos sejam o mais sólidas possível do ponto de vista jurídico. São questões complexas, que não são dos últimos dois anos e meio, mas que têm a ver com o funcionamento do sistema antes deste governo. Da nossa parte será o mais rápido possível. Há um pedido à DGEG para que, em articulação com o regulador, faça esse trabalho de forma segura e sustentada. Dei a maior prioridade, pedi a maior urgência, mas não devo avançar com uma data para a decisão. Percebo que a avaliação possa demorar algum tempo. Vamos esperar que o resultado venha de forma inabalável juridicamente.

Que aspetos inovatórios estão a ser estudados?

Os aspetos inovatórios são as situações que não estavam consideradas nos contratos iniciais. É um trabalho técnico, sobre o qual não me devo pronunciar. Queremos saber se aconteceu algo de novo e extraordinário em relação ao que estava previsto no início nos contratos. Há urgência, mas há também serenidade. O parecer do Conselho Consultivo da PGR, que foi solicitado e homologado pelo Governo, dá como sanção a esses eventuais aspetos inovatórios a nulidade. Estamos a falar de todas as decisões que foram tomadas ao longo desses anos.

Podemos falar de um braço de ferro entre o Governo, a EDP e outras empresas do setor?

Não entendo que seja um braço de ferro. O relacionamento com todas as empresas do setor tem-se pautado pela maior cordialidade. A REN é uma empresa que a quase totalidade da sua atuação a faz em nome do Estado, através de um contrato de concessão. Mesmo a EDP Serviço Universal e EDP Distribuição são empresas concessionárias que atuam em nome do Estado. As empresas defendem os seus interesses, o Estado defende o interesse público. Umas vezes estaremos de acordo, noutras não.

Espera que a EDP avance agora para tribunal?

Temos de estar bem preparados do ponto de vista técnico, para que as decisões sejam o mínimo possível atacadas e que, se forem atacadas, não vençam.

O que espera da comissão parlamentar de inquérito aos CMEC?

Esta comissão de inquérito pode ser um bom exercício para o desenho de medidas no setor. Não deve ser vista como uma forma de por em causa as empresas. Não podemos pensar que este é um sistema que viveu, que vive e que vai continuar a viver com base em rendas.

As rendas excessivas de 510 milhões identificadas pela ERSE vão ser pedidas à EDP?

As rendas excessivas são uma avaliação sobre mudança do regime dos CAE para os CMEC. Foi um processo que não correu da melhor maneira. O próprio diploma 240/2004 foi publicado três vezes. Tudo isto não correu da melhor maneira, mas é uma lei do país e temos de executar o que está na lei. São questões datadas, de há 13 anos, que podem ter influenciado tudo o que aconteceu a seguir.

António Mexia é arguido no processo EDP, por suspeita de corrupção. Acha que isso acarreta custos reputacionais para a empresa?

Não consigo avaliar, essa é uma questão que terá de ser feita aos acionistas da empresa. De qualquer forma em Portugal ninguém pode ser condenado sem que haja uma sentença.

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