Lista negra europeia complica relações com Macau e Tunísia

15-12-2017
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A “lista negra” de offshores à escala europeia é curtinha mas pode fazer estragos. Com o Governo a garantir que acrescentará à lista portuguesa as jurisdições que faltam, as relações económicas com territórios como Macau ou a Tunísia podem sair afectadas. A menos que mudem de atitude e comprometam-se rapidamente com avanços.

A "lista negra" de offshores europeia, ontem anunciada em Bruxelas é curtinha, bem mais curta do que a portuguesa, mas poderá vir a fazer mossa nas relações económicas nacionais. Ao todo, há cinco territórios que a União Europeia considera "não cooperantes" em termos fiscais e que Portugal vai ter de perfilhar, complicando as relações económicas internacionais. Entre os mais problemáticos estão Macau e a Tunísia.

Prometida há quase dois anos, a lista europeia de territórios não cooperantes do ponto de vista fiscal é, como se esperava, o resultado de um exercício feito com benevolência e muitas cautelas.

Os países em desenvolvimento foram excluídos logo à cabeça desta avaliação (é por isso que não se encontram por exemplo referências a Angola); os territórios que sofreram recentes tempestades naturais vão ter uma moratória (casos de Anguilla, Antigua e Barbuda, Bahamas, Ilhas Virgens Britânicas, Dominica, Saint Kitts e Nevis, Turcos e Caicos e Ilhas Virgens dos EUA); e há ainda 47 jurisdições que, tendo-se comprometido em melhorar as suas práticas fiscais, ficaram a salvo da "lista negra" e ficaram na "lista cinzenta", debaixo do olho das autoridades europeias.

Com tantas brechas abertas no exercício, a "lista negra" de territórios pouco transparentes resume-se a 17 estados. Nenhum deles europeu, sem qualquer referência aos Estados Unidos, e apenas com um aviso a territórios sob a dependência britânica (casos de Jersey, Man, Guernsey, Ilhas Virgens que estão na lista cinzenta), agora que o Reino Unido se prepara para saltar fora do barco.

"A lista de Portugal será conformada de acordo com aquilo que é a lista europeia. Mas Portugal tem a opção de ser mais exigente." Ricardo Mourinho Félix, Secretário de Estado Adjunto e das Finanças

Tendo Portugal uma "lista negra" de 79 países (uma das maiores da Europa), não se esperaria que a lista europeia fizesse grande mossa. Mas, como os critérios seguidos para classificar o que é ou não um território cooperante em termos fiscais são distintos, dos 17 territórios escolhidos pela União Europeia, há cinco que não estão na lista nacional: são eles a Coreia do Sul, Macau, Mongólia, Namíbia e a Tunísia.

E agora?

Os Estados-membros que não têm listas negras (a grande maioria) vão ter de criá-las e os países que, como Portugal, já as têm, vão adaptá-las de modo a garantir a inclusão dos 17 territórios que a Europa quer penalizar.

Esta terça-feira, a partir de Bruxelas, Ricardo Mourinho Félix, secretário de Estado Adjunto e das Finanças, sinalizava isso mesmo, ao garantir que "a lista de Portugal será conformada de acordo com aquilo que é a lista europeia". Mais ainda, "Portugal tem a opção de ser mais exigente", acrescentou o braço direito de Mário Centeno no final da reunião dos ministros das finanças.

As sanções que Bruxelas quer impor aos territórios cadastrados ainda estão em aberto (e por isso, este exercício, além de benevolente, é também incompleto), mas uma transposição imediata destes territórios para a lista nacional sujeitaria desde já a taxas agravadas de IRS, IRC e IMI, a taxas de retenção na fonte e restrições várias ao nível de deduções fiscais.

Pelas relações diplomáticas e económicas com Portugal, os casos mais delicados são Macau e a Tunísia, e a expectativa do Governo é a de que estes territórios mudem de atitude e abordem as autoridades europeias para encetarem um processo negocial e que o façam de forma convincente. Se tal acontecer, abandonam a "lista negra" e migram para a "lista cinzenta".

A lista negra europeia poderá também servir para o inverso, isto é, servir de pretexto ao Governo português justificar o emagrecimento da lista nacional, tirando de lá algumas jurisdições com quem o País mantém relações económicas e diplomáticas mais intensas.

Entre o primeiro passo e a oportunidade perdida

Anunciada no início de 2016, no rescaldo de mais uma fuga de informação que ficou baptizada de Panamá Papers, a lista negra europeia prometia ser mais um instrumento de combate aos territórios que se alimentam da opacidade. As práticas fiscais de 92 jurisdições foram passadas a pente fino, com base numa bateria de critérios, mas o exercício acabou por resultar numa grande frustração para quem esperava que a técnica desta vez, levasse a melhor sobre a política.

Esta terça-feira, Alex Cobham, presidente executivo da Tax Justice Network, uma das mais influentes organizações de defesa dos contribuintes, dizia que "em vez de uma lista de paraísos fiscais assente em critérios objectivos, como originalmente pretendido", o que existe "é uma lista politicamente orientada, que só inclui os países economicamente fracos e os politicamente desligados". "Enquanto países europeus como a Holanda, Irlanda ou o Luxemburgo são os maiores facilitadores da transferência de lucros forem excluídos; e enquanto o Reino Unido conseguir evitar a inclusão dos territórios sob a coroa britânica, a lista dificilmente pode ser levada a sério", considera o activista.

Do lado da Comissão Europeia, que estava à espera da autorização política para poder avançar, as declarações foram mais contemporizadoras. Para Pierre Moscovici esta é "uma primeira vitória a favor da transparência" e os críticos devem passar a ser aliados: "Partilho os desejos daqueles que esperavam mais. Vamos considerar a lista como um primeiro passo e manter, juntos, a pressão".

"Partilho as expectativas daqueles que esperavam mais. Vamos considerar a lista [europeia] como um primeiro passo e manter, juntos, a pressão." Pierre Moscovici, Comissário europeu para os assuntos económicos e fiscais

A “lista negra” de offshores à escala europeia é curtinha mas pode fazer estragos. Com o Governo a garantir que acrescentará à lista portuguesa as jurisdições que faltam, as relações económicas com territórios como Macau ou a Tunísia podem sair afectadas. A menos que mudem de atitude e comprometam-se rapidamente com avanços.

A "lista negra" de offshores europeia, ontem anunciada em Bruxelas é curtinha, bem mais curta do que a portuguesa, mas poderá vir a fazer mossa nas relações económicas nacionais. Ao todo, há cinco territórios que a União Europeia considera "não cooperantes" em termos fiscais e que Portugal vai ter de perfilhar, complicando as relações económicas internacionais. Entre os mais problemáticos estão Macau e a Tunísia.

Prometida há quase dois anos, a lista europeia de territórios não cooperantes do ponto de vista fiscal é, como se esperava, o resultado de um exercício feito com benevolência e muitas cautelas.

Os países em desenvolvimento foram excluídos logo à cabeça desta avaliação (é por isso que não se encontram por exemplo referências a Angola); os territórios que sofreram recentes tempestades naturais vão ter uma moratória (casos de Anguilla, Antigua e Barbuda, Bahamas, Ilhas Virgens Britânicas, Dominica, Saint Kitts e Nevis, Turcos e Caicos e Ilhas Virgens dos EUA); e há ainda 47 jurisdições que, tendo-se comprometido em melhorar as suas práticas fiscais, ficaram a salvo da "lista negra" e ficaram na "lista cinzenta", debaixo do olho das autoridades europeias.

Com tantas brechas abertas no exercício, a "lista negra" de territórios pouco transparentes resume-se a 17 estados. Nenhum deles europeu, sem qualquer referência aos Estados Unidos, e apenas com um aviso a territórios sob a dependência britânica (casos de Jersey, Man, Guernsey, Ilhas Virgens que estão na lista cinzenta), agora que o Reino Unido se prepara para saltar fora do barco.

"A lista de Portugal será conformada de acordo com aquilo que é a lista europeia. Mas Portugal tem a opção de ser mais exigente." Ricardo Mourinho Félix, Secretário de Estado Adjunto e das Finanças

Tendo Portugal uma "lista negra" de 79 países (uma das maiores da Europa), não se esperaria que a lista europeia fizesse grande mossa. Mas, como os critérios seguidos para classificar o que é ou não um território cooperante em termos fiscais são distintos, dos 17 territórios escolhidos pela União Europeia, há cinco que não estão na lista nacional: são eles a Coreia do Sul, Macau, Mongólia, Namíbia e a Tunísia.

E agora?

Os Estados-membros que não têm listas negras (a grande maioria) vão ter de criá-las e os países que, como Portugal, já as têm, vão adaptá-las de modo a garantir a inclusão dos 17 territórios que a Europa quer penalizar.

Esta terça-feira, a partir de Bruxelas, Ricardo Mourinho Félix, secretário de Estado Adjunto e das Finanças, sinalizava isso mesmo, ao garantir que "a lista de Portugal será conformada de acordo com aquilo que é a lista europeia". Mais ainda, "Portugal tem a opção de ser mais exigente", acrescentou o braço direito de Mário Centeno no final da reunião dos ministros das finanças.

As sanções que Bruxelas quer impor aos territórios cadastrados ainda estão em aberto (e por isso, este exercício, além de benevolente, é também incompleto), mas uma transposição imediata destes territórios para a lista nacional sujeitaria desde já a taxas agravadas de IRS, IRC e IMI, a taxas de retenção na fonte e restrições várias ao nível de deduções fiscais.

Pelas relações diplomáticas e económicas com Portugal, os casos mais delicados são Macau e a Tunísia, e a expectativa do Governo é a de que estes territórios mudem de atitude e abordem as autoridades europeias para encetarem um processo negocial e que o façam de forma convincente. Se tal acontecer, abandonam a "lista negra" e migram para a "lista cinzenta".

A lista negra europeia poderá também servir para o inverso, isto é, servir de pretexto ao Governo português justificar o emagrecimento da lista nacional, tirando de lá algumas jurisdições com quem o País mantém relações económicas e diplomáticas mais intensas.

Entre o primeiro passo e a oportunidade perdida

Anunciada no início de 2016, no rescaldo de mais uma fuga de informação que ficou baptizada de Panamá Papers, a lista negra europeia prometia ser mais um instrumento de combate aos territórios que se alimentam da opacidade. As práticas fiscais de 92 jurisdições foram passadas a pente fino, com base numa bateria de critérios, mas o exercício acabou por resultar numa grande frustração para quem esperava que a técnica desta vez, levasse a melhor sobre a política.

Esta terça-feira, Alex Cobham, presidente executivo da Tax Justice Network, uma das mais influentes organizações de defesa dos contribuintes, dizia que "em vez de uma lista de paraísos fiscais assente em critérios objectivos, como originalmente pretendido", o que existe "é uma lista politicamente orientada, que só inclui os países economicamente fracos e os politicamente desligados". "Enquanto países europeus como a Holanda, Irlanda ou o Luxemburgo são os maiores facilitadores da transferência de lucros forem excluídos; e enquanto o Reino Unido conseguir evitar a inclusão dos territórios sob a coroa britânica, a lista dificilmente pode ser levada a sério", considera o activista.

Do lado da Comissão Europeia, que estava à espera da autorização política para poder avançar, as declarações foram mais contemporizadoras. Para Pierre Moscovici esta é "uma primeira vitória a favor da transparência" e os críticos devem passar a ser aliados: "Partilho os desejos daqueles que esperavam mais. Vamos considerar a lista como um primeiro passo e manter, juntos, a pressão".

"Partilho as expectativas daqueles que esperavam mais. Vamos considerar a lista [europeia] como um primeiro passo e manter, juntos, a pressão." Pierre Moscovici, Comissário europeu para os assuntos económicos e fiscais

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