“Gerir o declínio” - a proposta da nova ministra para “porções importantes” do território

17-10-2019
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A nova ministra da Coesão Territorial escreveu há poucas semanas um texto em que apresenta as suas ideias sobre a pasta que vai assumir no próximo Governo. Nesse texto, diz que será preciso “assumir que não é possível ter a tónica no crescimento em todos os territórios, e assumir também que em porções importantes do nosso país coesão territorial significa gerir o declínio, e, portanto, significa assumir que há partes do nosso território onde não vai ser possível recuperar população e atividade económica.”

No texto de opinião publicado a 9 de setembro pelo "Público", e assinado enquanto presidente da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Centro, Ana Abrunhosa começa por avisar que o discurso sobre a coesão territorial se faça “com verdade e sem demagogias”. E é nessa defesa da “verdade” que a gestora de fundos europeus defende que “é urgente abandonar a visão redistributiva da política de coesão, assumindo-se que não basta colocar recursos nas regiões menos desenvolvidas, mas antes assumir que a diminuição das assimetrias regionais envolve investimento seletivo, qualificador e capaz de valorizar os recursos endógenos dos territórios”.

É nessa lógica, que admite a necessidade de “gerir o declínio” em “porções importantes do nosso país”. “Contudo”, atalha de imediato, “isto não significa o abandono destes territórios, nem deixar de garantir às populações o acesso aos bens e serviços nas mesmas condições da população dos territórios mais desenvolvidos. Significa, hoje em dia, por exemplo, que em vez de a pessoa ir ao centro de saúde, à loja do cidadão, ao mercado, são os prestadores destes serviços que vão a casa das pessoas. Com as tecnologias de que dispomos, é seguramente possível fazer melhor e com menos recursos, tendo as pessoas no centro das políticas e das decisões.”

É esta visão da coesão do território que Ana Abrunhosa poderá agora pôr em prática, à frente do novo ministério criado com esse título. A sua visão da coesão territorial “implica abandonar a forma tradicional de fazer política, em que temos políticas transversais, que se aplicam a todo o território, sem se ter em conta as especificidades dos territórios, sobretudo dos mais frágeis”, escreveu.

“Nos territórios de baixa densidade não podem, por exemplo, ser aplicados os tradicionais critérios que norteiam o investimento público”, nota a economista, defendendo que o investimento público nesses territórios terá de ser feito “na maior parte das vezes sem retorno imediato”. Da mesma forma, chama a atenção para a necessidade de “uma articulação mais eficiente entre os diferentes níveis de administração (da escala europeia à escala local, a que está associado o princípio da subsidiariedade) e entre as diferentes políticas setoriais”.

“Gerir o declínio”? Como disse?

Mas esta era a parte pacífica do artigo de opinião. As opiniões polémicas de Ana Abrunhosa, sobre a necessidade de nalguns territórios “gerir o declínio” e assumir que “não vai ser possível recuperar população e atividade económica” mereceu resposta, poucos dias depois, de Norberto Pires. Trata-se de um professor de robótica no departamento de Engenharia Mecânica da Universidade de Coimbra, que liderou a mesma CCDR-Centro durante cinco meses, em 2012.

“Gerir o declínio? É essa a nova política de desenvolvimento regional?”, questionava-se Pires logo no título do texto de opinião, publicado uma semana depois, também no "Público".

A resposta de Norberto Pires a Ana Abrunhosa começava um cenário hipotético: “Imaginem que a UE aplicava ao território Europeu, composto por regiões com diferentes realidades, o princípio de que há regiões onde não é possível ‘recuperar população e atividade económica’. Podem concluir que Portugal, tendo em conta os seus recursos endógenos, nunca será competitivo e, em consequência, se devem aplicar políticas públicas para ‘gerir o seu declínio’. Certo?”

“Aparentemente, temos território a mais, de que não precisamos e somos incapazes de aproveitar. O melhor, se calhar, será então oferecer esse território a quem o possa desenvolver e tenha capacidade para desenhar estratégias de desenvolvimento sustentado que recuperem densidade económica e populacional. É essa a ideia?”, interrogava o antigo presidente da CCDR-C.

Numa altura em que já se estava em pré-campanha para as legislativas, e quando Ana Abrunhosa já tinha sido uma das oradoras convidadas na convenção programática do PS, para falar precisamente de coesão territorial, Norberto Pires salientava ainda que “a proposta de ‘gerir o declínio’, ou seja, gerir o despovoamento, contraria discurso oficial sobre o Interior” - e citava declarações de António Costa apontando o caminho contrário.

“A nova gestão do despovoamento não é só um reconhecimento de incapacidade, mas também uma inaceitável desistência de ‘porções importantes’ do território nacional, quando se andou a prometer, ao mais alto nível (incluindo o primeiro-ministro e o Presidente da República), que o Interior era uma prioridade”, contrapôs Norberto Pires.

A futura ministra não retorquiu a essa resposta, mas pode agora pôr as suas ideias em prática. Ou não.

A nova ministra da Coesão Territorial escreveu há poucas semanas um texto em que apresenta as suas ideias sobre a pasta que vai assumir no próximo Governo. Nesse texto, diz que será preciso “assumir que não é possível ter a tónica no crescimento em todos os territórios, e assumir também que em porções importantes do nosso país coesão territorial significa gerir o declínio, e, portanto, significa assumir que há partes do nosso território onde não vai ser possível recuperar população e atividade económica.”

No texto de opinião publicado a 9 de setembro pelo "Público", e assinado enquanto presidente da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Centro, Ana Abrunhosa começa por avisar que o discurso sobre a coesão territorial se faça “com verdade e sem demagogias”. E é nessa defesa da “verdade” que a gestora de fundos europeus defende que “é urgente abandonar a visão redistributiva da política de coesão, assumindo-se que não basta colocar recursos nas regiões menos desenvolvidas, mas antes assumir que a diminuição das assimetrias regionais envolve investimento seletivo, qualificador e capaz de valorizar os recursos endógenos dos territórios”.

É nessa lógica, que admite a necessidade de “gerir o declínio” em “porções importantes do nosso país”. “Contudo”, atalha de imediato, “isto não significa o abandono destes territórios, nem deixar de garantir às populações o acesso aos bens e serviços nas mesmas condições da população dos territórios mais desenvolvidos. Significa, hoje em dia, por exemplo, que em vez de a pessoa ir ao centro de saúde, à loja do cidadão, ao mercado, são os prestadores destes serviços que vão a casa das pessoas. Com as tecnologias de que dispomos, é seguramente possível fazer melhor e com menos recursos, tendo as pessoas no centro das políticas e das decisões.”

É esta visão da coesão do território que Ana Abrunhosa poderá agora pôr em prática, à frente do novo ministério criado com esse título. A sua visão da coesão territorial “implica abandonar a forma tradicional de fazer política, em que temos políticas transversais, que se aplicam a todo o território, sem se ter em conta as especificidades dos territórios, sobretudo dos mais frágeis”, escreveu.

“Nos territórios de baixa densidade não podem, por exemplo, ser aplicados os tradicionais critérios que norteiam o investimento público”, nota a economista, defendendo que o investimento público nesses territórios terá de ser feito “na maior parte das vezes sem retorno imediato”. Da mesma forma, chama a atenção para a necessidade de “uma articulação mais eficiente entre os diferentes níveis de administração (da escala europeia à escala local, a que está associado o princípio da subsidiariedade) e entre as diferentes políticas setoriais”.

“Gerir o declínio”? Como disse?

Mas esta era a parte pacífica do artigo de opinião. As opiniões polémicas de Ana Abrunhosa, sobre a necessidade de nalguns territórios “gerir o declínio” e assumir que “não vai ser possível recuperar população e atividade económica” mereceu resposta, poucos dias depois, de Norberto Pires. Trata-se de um professor de robótica no departamento de Engenharia Mecânica da Universidade de Coimbra, que liderou a mesma CCDR-Centro durante cinco meses, em 2012.

“Gerir o declínio? É essa a nova política de desenvolvimento regional?”, questionava-se Pires logo no título do texto de opinião, publicado uma semana depois, também no "Público".

A resposta de Norberto Pires a Ana Abrunhosa começava um cenário hipotético: “Imaginem que a UE aplicava ao território Europeu, composto por regiões com diferentes realidades, o princípio de que há regiões onde não é possível ‘recuperar população e atividade económica’. Podem concluir que Portugal, tendo em conta os seus recursos endógenos, nunca será competitivo e, em consequência, se devem aplicar políticas públicas para ‘gerir o seu declínio’. Certo?”

“Aparentemente, temos território a mais, de que não precisamos e somos incapazes de aproveitar. O melhor, se calhar, será então oferecer esse território a quem o possa desenvolver e tenha capacidade para desenhar estratégias de desenvolvimento sustentado que recuperem densidade económica e populacional. É essa a ideia?”, interrogava o antigo presidente da CCDR-C.

Numa altura em que já se estava em pré-campanha para as legislativas, e quando Ana Abrunhosa já tinha sido uma das oradoras convidadas na convenção programática do PS, para falar precisamente de coesão territorial, Norberto Pires salientava ainda que “a proposta de ‘gerir o declínio’, ou seja, gerir o despovoamento, contraria discurso oficial sobre o Interior” - e citava declarações de António Costa apontando o caminho contrário.

“A nova gestão do despovoamento não é só um reconhecimento de incapacidade, mas também uma inaceitável desistência de ‘porções importantes’ do território nacional, quando se andou a prometer, ao mais alto nível (incluindo o primeiro-ministro e o Presidente da República), que o Interior era uma prioridade”, contrapôs Norberto Pires.

A futura ministra não retorquiu a essa resposta, mas pode agora pôr as suas ideias em prática. Ou não.

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