ADSE e privados já se sentaram à mesa para negociar. Há €38 milhões a dividi-los

27-02-2019
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As negociações entre o conselho diretivo da ADSE e os grandes grupos privados começaram ontem, quinta-feira, apurou o Expresso junto de fontes próximas do processo. Depois da intervenção do Governo, pelo menos dois prestadores já reuniram com a ADSE e estarão agendadas mais reuniões durante a próxima semana.

Na terça-feira, após ter reunido com o Conselho Geral e de Supervisão (CGS) da ADSE, a ministra da Saúde, Marta Temido, garantiu que havia da parte do Governo o “apoio inequívoco” às negociações, num discurso distante das palavras radicais proferidas ao Expresso, poucos dias antes, pelo seu secretário de Estado Adjunto e da Saúde, Francisco Ramos (também presente nesta reunião), que falou em privatizar a ADSE, caso esta cedesse aos privados.

“Há o apoio inequívoco à negociação, ao trabalho de aproximação entre o conselho direto da ADSE e do CSG e aquilo que são as posições dos prestadores privados, numa lógica de boas contas, de respeito pela regras, pela legalidade”, referiu a ministra, recusando pronunciar-se “sobre a suspensão de convenções”, dada a “boa expectativa de que em resultado desta negociação, que irá ser feita, esse processo não seja necessário”.

As reuniões estão a decorrer individualmente com cada prestador. Em cima da mesa estão os 38 milhões de euros exigidos pela ADSE aos privados, no final de 2018, por alegada faturação excessiva em 2015 e 2016, que os grupos contestam e que garantem que não vão pagar (o caso está em tribunal, depois de um parecer da Procuradoria Geral da República a dar conta que estas regularizações extraordinárias por parte da ADSE são legítimas).

Nova tabela de preços na calha

Também estará a ser falada com os prestadores a nova tabela de preços da ADSE, que este organismo quer ter concluída em março, e que vai acabar com a regra das regularizações extraordinárias, já que passa a haver preços fechados para todos os atos, serviços ou produtos faturados.

Em 2009, as tabelas gerais dos custos com cirurgias (em ambulatório e com internamento) acabaram e os preços para estes procedimentos passaram a ser abertos, ou seja, os privados é que definiam os valores. Ficou também estabelecido que, anualmente, haveria um acerto de contas, em que os privados devolviam dinheiro à ADSE sempre que cobrassem acima do preço médio acrescido de 10%.

A história das regularizações extraordinárias foi mencionada pela residente da ADSE, Sofia Portela, na semana passada, em entrevista à SIC Notícias. “Em 2009, a ADSE celebrou adendas aos contratos com os prestadores que tinham, à época, convenção com ADSE, cujas cláusulas determinaram o preço aberto para os procedimentos cirúrgicos. Isso permitiu que um ato que, à data tinha um valor fixo, passasse a ter um valor aberto, ou seja, os prestadores passaram a faturar o que entendessem para este tipo de atos”. E para salvaguardar a ADSE “ficou definido também que se pudesse fazer uma regularização no final do ano”.

E reforçou que os privados aceitaram estas regras. “Estas regularizações foram apuradas, os prestadores pronunciaram-se sobre elas e foram emitidas pelos próprios notas de crédito relativamente a regularizações entre 2011 e 2014. Os prestadores aceitaram-nas durante esse período”.

Em 2014, há uma nova mudança e as regularizações passam a incluir os medicamentos antineoplásicos (para combater o cancro) “que, como se sabe são muito caros”, e as próteses intraoperatórias, os chamados dispositivos médicos (como pacemakers, lentes oculares ou implantes auditivos, “que são faturados como os prestadores entendem e a ADSE paga”, explicou a responsável.

Nada de novo

O problema das diferenças de preços entre os vários prestadores não é novo, como lembrou no Parlamento, na passada quarta-feira, o ministro das Finanças, Mário Centeno. “Preços diferenciados para os mesmos atos, preços muito acima do que hospitais públicos suportam em termos de custos, isso não pode continuar. Mas, o Governo não descobriu isso agora”, disse. E lembrou que a necessidade de se rever o relacionamento entre a ADSE e prestadores privados de saúde ditou que, no decreto-lei de execução orçamental de 2018, fosse determinada a revisão das tabelas da ADSE. É esse trabalho que está a ser feito, primeiro para o regime convencionado e, depois, para o regime livre.

Segundo Óscar Gaspar, presidente da Associação Portuguesa de Hospitalização Privada, “neste momento estão em aberto [os preços de] medicamentos, exceto oncológicos, dispositivos médicos, exceto lentes intraoculares e os consumos em sala cirúrgica, no caso em que o respetivo procedimento cirúrgico não esteja em pacote”.

“Em 2015 e 2016 estavam também em aberto os medicamentos oncológicos e as lentes. Nas regularizações pretendidas pela ADSE relativamente a 2015 e 2016 cerca de dois terços têm a ver com a regra dos preços mínimos aplicados a próteses e medicamentos oncológicos. Em que a ADSE aplica o preço mínimo praticado por outro prestador e exige a devolução do que foi pago além desse valor”, explica.

E os privados não pagam porquê se, antes, aceitaram estas regularizações?

“Tem havido um diálogo longo e amplo com a ADSE, com progressos, nomeadamente na área oncológica, nos preços da gastroenterologia, surgiram uma série de pacotes para preços de cirurgias, até o preço das lentes intraoculares, por exemplo. Tudo isso foi conseguido. Mas, depois, fomos confrontados de forma surpreendente, no dia 14 de dezembro, com uma nova interpretação da ADSE em que nos é dito que há 38 milhões de euros a pagar pelos operadores privados”, respondeu Óscar Gaspar, em entrevista à SIC Notícias, na passada terça-feira.

A este respeito sustentou que “a ADSE não consegue explicar esses 38 milhões de euros. A presidente da ADSE até reconheceu, na SIC, que em muitos casos os operadores tinham provado que há preços em que o valor de compra pelos hospitais privados fica abaixo do preço de referência da ADSE”.

E ainda sobre os prestadores que praticam preços abaixo do valor de mercado responde, ao Exporesso, que desconhece porque é que isso acontece. “Não sabemos se por erro, má contabilização, dispositivos oferecidos. O que sabemos é que não podem obrigar-nos a faturar abaixo do preço de custo”.

Na referida entrevista, Sofia Portela revelou que “neste momento estamos numa fase em que os prestadores estão ainda a pronunciar-se e a verificar suas faturas. E já houve prestadores que se pronunciaram e que vieram entregar faturas que comprovam as situações”.

Para já não se sabe quem dará o braço a torcer, mas foi garantido, pelo presidente do CGS da ADSE, que haverá flexibilidade nestas negociações.

“Os termos estão regulados no âmbito das convenções e o processo vai prosseguir. Os prestadores têm um prazo para responder e justificar os desvios e haverá um processo de negociação com a devia flexibilidade”, disse João Proença à saída da reunião com a tutela.

Porque é que há diferenças de preços?

Na mesma entrevista à SIC Notícias, Sofia Portela deu dois exemplos de diferenças nas faturas relativas a produtos iguais, para explicar “o que está aqui em causa”: “Há um medicamento oncológico muito utilizado em que temos de valor mínimo 1495 euros e de valor máximo 2169 euros. Ou noutro caso em que há 274 euros de valor mínimo e o valor máximo são 8040 euros. Também temos pacemakers que variam muito de valor”.

Por sua vez, Óscar Gaspar sustenta que a raiz do problema é a atual tabela de preços da ADSE para o regime convencionado. “O que acontece é que a tabela não está correta, não está equilibrada, ou seja, a determinada altura a ADSE disse que alguns itens não eram pagos, sem qualquer tipo de racional, nem clínico, nem económico. E disse aos operadores que teriam de diluir este valor por outros itens. Alguns fizeram-no mais em consumíveis do bloco cirúrgico, outros nos dispositivos médicos e é isso que explica as discrepâncias. O problema é a tabela não estar correta”, afirmou na SIC Notícias.

Questionado sobre os atos, procedimentos, serviços ou produtos que a ADSE não cobre e que levam os prestadores a alocarem esses encargos noutro tipo de despesas, Óscar Gaspar menciona que, por exemplo, o aluguer da sala de bloco operatório não é pago. “O valor típico das seguradoras é de cerca de 500 euros por cirurgia e fazemos 40 mil cirurgias por ano a beneficiários da ADSE”.

E dá outros exemplos: “A ADSE não admite chamadas de especialista ao serviço de urgência e não admite que, no mesmo, uma pessoa tenha uma consulta programada e um episódio de urgência!” e também “não paga a sala de observações: Se o beneficiário, depois de um episódio de urgência, estiver oito horas a monitorar a reação a um tratamento, etc, a ADSE não assume (o valor de referência da sala de observações são 55 euros/hora)”.

E conclui que, “repetidamente, tem-se falado em ‘subsidiação cruzada’, que deve acabar, a bem da transparência”.

As negociações entre o conselho diretivo da ADSE e os grandes grupos privados começaram ontem, quinta-feira, apurou o Expresso junto de fontes próximas do processo. Depois da intervenção do Governo, pelo menos dois prestadores já reuniram com a ADSE e estarão agendadas mais reuniões durante a próxima semana.

Na terça-feira, após ter reunido com o Conselho Geral e de Supervisão (CGS) da ADSE, a ministra da Saúde, Marta Temido, garantiu que havia da parte do Governo o “apoio inequívoco” às negociações, num discurso distante das palavras radicais proferidas ao Expresso, poucos dias antes, pelo seu secretário de Estado Adjunto e da Saúde, Francisco Ramos (também presente nesta reunião), que falou em privatizar a ADSE, caso esta cedesse aos privados.

“Há o apoio inequívoco à negociação, ao trabalho de aproximação entre o conselho direto da ADSE e do CSG e aquilo que são as posições dos prestadores privados, numa lógica de boas contas, de respeito pela regras, pela legalidade”, referiu a ministra, recusando pronunciar-se “sobre a suspensão de convenções”, dada a “boa expectativa de que em resultado desta negociação, que irá ser feita, esse processo não seja necessário”.

As reuniões estão a decorrer individualmente com cada prestador. Em cima da mesa estão os 38 milhões de euros exigidos pela ADSE aos privados, no final de 2018, por alegada faturação excessiva em 2015 e 2016, que os grupos contestam e que garantem que não vão pagar (o caso está em tribunal, depois de um parecer da Procuradoria Geral da República a dar conta que estas regularizações extraordinárias por parte da ADSE são legítimas).

Nova tabela de preços na calha

Também estará a ser falada com os prestadores a nova tabela de preços da ADSE, que este organismo quer ter concluída em março, e que vai acabar com a regra das regularizações extraordinárias, já que passa a haver preços fechados para todos os atos, serviços ou produtos faturados.

Em 2009, as tabelas gerais dos custos com cirurgias (em ambulatório e com internamento) acabaram e os preços para estes procedimentos passaram a ser abertos, ou seja, os privados é que definiam os valores. Ficou também estabelecido que, anualmente, haveria um acerto de contas, em que os privados devolviam dinheiro à ADSE sempre que cobrassem acima do preço médio acrescido de 10%.

A história das regularizações extraordinárias foi mencionada pela residente da ADSE, Sofia Portela, na semana passada, em entrevista à SIC Notícias. “Em 2009, a ADSE celebrou adendas aos contratos com os prestadores que tinham, à época, convenção com ADSE, cujas cláusulas determinaram o preço aberto para os procedimentos cirúrgicos. Isso permitiu que um ato que, à data tinha um valor fixo, passasse a ter um valor aberto, ou seja, os prestadores passaram a faturar o que entendessem para este tipo de atos”. E para salvaguardar a ADSE “ficou definido também que se pudesse fazer uma regularização no final do ano”.

E reforçou que os privados aceitaram estas regras. “Estas regularizações foram apuradas, os prestadores pronunciaram-se sobre elas e foram emitidas pelos próprios notas de crédito relativamente a regularizações entre 2011 e 2014. Os prestadores aceitaram-nas durante esse período”.

Em 2014, há uma nova mudança e as regularizações passam a incluir os medicamentos antineoplásicos (para combater o cancro) “que, como se sabe são muito caros”, e as próteses intraoperatórias, os chamados dispositivos médicos (como pacemakers, lentes oculares ou implantes auditivos, “que são faturados como os prestadores entendem e a ADSE paga”, explicou a responsável.

Nada de novo

O problema das diferenças de preços entre os vários prestadores não é novo, como lembrou no Parlamento, na passada quarta-feira, o ministro das Finanças, Mário Centeno. “Preços diferenciados para os mesmos atos, preços muito acima do que hospitais públicos suportam em termos de custos, isso não pode continuar. Mas, o Governo não descobriu isso agora”, disse. E lembrou que a necessidade de se rever o relacionamento entre a ADSE e prestadores privados de saúde ditou que, no decreto-lei de execução orçamental de 2018, fosse determinada a revisão das tabelas da ADSE. É esse trabalho que está a ser feito, primeiro para o regime convencionado e, depois, para o regime livre.

Segundo Óscar Gaspar, presidente da Associação Portuguesa de Hospitalização Privada, “neste momento estão em aberto [os preços de] medicamentos, exceto oncológicos, dispositivos médicos, exceto lentes intraoculares e os consumos em sala cirúrgica, no caso em que o respetivo procedimento cirúrgico não esteja em pacote”.

“Em 2015 e 2016 estavam também em aberto os medicamentos oncológicos e as lentes. Nas regularizações pretendidas pela ADSE relativamente a 2015 e 2016 cerca de dois terços têm a ver com a regra dos preços mínimos aplicados a próteses e medicamentos oncológicos. Em que a ADSE aplica o preço mínimo praticado por outro prestador e exige a devolução do que foi pago além desse valor”, explica.

E os privados não pagam porquê se, antes, aceitaram estas regularizações?

“Tem havido um diálogo longo e amplo com a ADSE, com progressos, nomeadamente na área oncológica, nos preços da gastroenterologia, surgiram uma série de pacotes para preços de cirurgias, até o preço das lentes intraoculares, por exemplo. Tudo isso foi conseguido. Mas, depois, fomos confrontados de forma surpreendente, no dia 14 de dezembro, com uma nova interpretação da ADSE em que nos é dito que há 38 milhões de euros a pagar pelos operadores privados”, respondeu Óscar Gaspar, em entrevista à SIC Notícias, na passada terça-feira.

A este respeito sustentou que “a ADSE não consegue explicar esses 38 milhões de euros. A presidente da ADSE até reconheceu, na SIC, que em muitos casos os operadores tinham provado que há preços em que o valor de compra pelos hospitais privados fica abaixo do preço de referência da ADSE”.

E ainda sobre os prestadores que praticam preços abaixo do valor de mercado responde, ao Exporesso, que desconhece porque é que isso acontece. “Não sabemos se por erro, má contabilização, dispositivos oferecidos. O que sabemos é que não podem obrigar-nos a faturar abaixo do preço de custo”.

Na referida entrevista, Sofia Portela revelou que “neste momento estamos numa fase em que os prestadores estão ainda a pronunciar-se e a verificar suas faturas. E já houve prestadores que se pronunciaram e que vieram entregar faturas que comprovam as situações”.

Para já não se sabe quem dará o braço a torcer, mas foi garantido, pelo presidente do CGS da ADSE, que haverá flexibilidade nestas negociações.

“Os termos estão regulados no âmbito das convenções e o processo vai prosseguir. Os prestadores têm um prazo para responder e justificar os desvios e haverá um processo de negociação com a devia flexibilidade”, disse João Proença à saída da reunião com a tutela.

Porque é que há diferenças de preços?

Na mesma entrevista à SIC Notícias, Sofia Portela deu dois exemplos de diferenças nas faturas relativas a produtos iguais, para explicar “o que está aqui em causa”: “Há um medicamento oncológico muito utilizado em que temos de valor mínimo 1495 euros e de valor máximo 2169 euros. Ou noutro caso em que há 274 euros de valor mínimo e o valor máximo são 8040 euros. Também temos pacemakers que variam muito de valor”.

Por sua vez, Óscar Gaspar sustenta que a raiz do problema é a atual tabela de preços da ADSE para o regime convencionado. “O que acontece é que a tabela não está correta, não está equilibrada, ou seja, a determinada altura a ADSE disse que alguns itens não eram pagos, sem qualquer tipo de racional, nem clínico, nem económico. E disse aos operadores que teriam de diluir este valor por outros itens. Alguns fizeram-no mais em consumíveis do bloco cirúrgico, outros nos dispositivos médicos e é isso que explica as discrepâncias. O problema é a tabela não estar correta”, afirmou na SIC Notícias.

Questionado sobre os atos, procedimentos, serviços ou produtos que a ADSE não cobre e que levam os prestadores a alocarem esses encargos noutro tipo de despesas, Óscar Gaspar menciona que, por exemplo, o aluguer da sala de bloco operatório não é pago. “O valor típico das seguradoras é de cerca de 500 euros por cirurgia e fazemos 40 mil cirurgias por ano a beneficiários da ADSE”.

E dá outros exemplos: “A ADSE não admite chamadas de especialista ao serviço de urgência e não admite que, no mesmo, uma pessoa tenha uma consulta programada e um episódio de urgência!” e também “não paga a sala de observações: Se o beneficiário, depois de um episódio de urgência, estiver oito horas a monitorar a reação a um tratamento, etc, a ADSE não assume (o valor de referência da sala de observações são 55 euros/hora)”.

E conclui que, “repetidamente, tem-se falado em ‘subsidiação cruzada’, que deve acabar, a bem da transparência”.

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