A democracia chega ao Espaço

26-09-2018
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Há mais de 90 projetos ativos em todo o mundo, em especial na China e nos EUA, para a construção de bases espaciais de lançamento de pequenos satélites como a que será construída nos Açores

Texto Virgílio Azevedo

Há mais de 90 projetos ativos em todo o mundo, em especial na China e nos EUA, para a construção de bases espaciais destinadas ao lançamento de micro, mini e pequenos satélites, um negócio que pode valer milhares de milhões de euros na próxima década. O crescimento do número de projetos representa a emergência de um novo paradigma: a democratização do acesso ao Espaço.

O mercado espacial está a mudar muito rapidamente com a evolução tecnológica, a miniaturização e as necessidades concretas das populações, abrindo pela primeira vez oportunidades de acesso direto ao Espaço a pequenos países como Portugal, e não apenas às grandes potências espaciais como os EUA, a Rússia, a China ou a Índia. E também a muito mais empresas e organizações.

É precisamente nesse sentido que aponta o concurso público internacional lançado esta segunda-feira em Ponta Delgada pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT) e a Estrutura de Missão dos Açores para o Espaço (EMA-Space), com o apoio técnico da Agência Espacial Europeia (ESA), onde se convidam empresas e organizações de todo o mundo a manifestarem o seu interesse pela conceção, instalação e operação de uma base espacial na ilha de Santa Maria, nos Açores.

A produção de satélites mudou

“A forma de fabricar satélites hoje é muito diferente do que era há 15 a 20 anos, ou mesmo há cerca de cinco anos”, explica ao Expresso o ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior. Manuel Heitor acrescenta que “há atualmente uma nova geração de lançadores (foguetões) de pequena dimensão, sem impacto ambiental e que garantem a segurança das populações”.

Por isso, o ministro sublinha que “existem três variáveis críticas para o sucesso de uma futura base espacial em Santa Maria”. A primeira é o custo por quilo do lançamento de um satélite. “Hoje, o custo ronda os 40 mil dólares (34 mil euros), mas é possível reduzi-lo para metade nos próximos cinco a dez anos”, admite Manuel Heitor.

A segunda variável é a quantidade de carga que é enviada em cada lançamento. Na grande base espacial da ESA em Kourou, na Guiana Francesa (América do Sul), uma base convencional, são feitos apenas lançamentos com grandes foguetões Ariane que levam cargas de seis toneladas, “o que envolve uma logística muito complexa”. Para ser viável, o futuro porto espacial de Santa Maria “terá de fazer lançamentos com cargas menos pesadas e mais pequenas”, obviamente transportadas por foguetões de dimensões e capacidades mais reduzidas.

Seis a 20 lançamentos por ano

Finalmente, a terceira variável é o número de lançamentos por ano. “Em Kourou, há em média três por ano mas em Santa Maria deverão ser mais frequentes, cerca de seis a 20 lançamentos por ano, um ritmo semelhante ao previsto para o porto espacial da Nova Zelândia, que tem semelhanças com este projeto”.

A verdade é que no último concurso, em abril, do programa da ESA para os novos sistemas de lançamento (foguetões) – o Future Launchers Preparatory Programme (FLPP) – a agência selecionou cinco estudos para financiar, dos quais quatro incluem a análise dos Açores. São estudos promovidos pela OHB, a maior empresa espacial da Alemanha; a Avio, empresa italiana líder na área da propulsão espacial que comercializa o foguetão Vega, o mais pequeno usado pela ESA, que transporta satélites de 300 a 2500 quilos de órbita baixa e polar para observação da Terra; a Deimos Engenharia, empresa portuguesa, em parceria com a britânica Orbex; e a empresa espanhola PDL Space.

Apesar do interesse pelos Açores, o projeto de Santa Maria enfrenta na Europa três projetos potencialmente concorrentes. O mais avançado pretende instalar uma base para pequenos lançadores na Escócia – o Spaceport Scotland – e o Governo britânico já assinou uma contrato de 37 milhões de euros com o fabricante americano Lockeed Martin, em parceria com a Orbex. Os outros, vocacionados para o lançamento de pequenos satélites de órbita polar, estão em estudo na Noruega e na Suécia.

“A estratégia de Portugal para o Espaço não depende da construção de um porto espacial para atrair investimento estrangeiro de grandes empresas”, esclarece Manuel Heitor. Mas a base de Santa Maria “aumenta obviamente a nossa presença no sector e coloca Portugal no contexto internacional das novas indústrias do Espaço”. O mais importante “é o país posicionar-se no mercado, atrair empresas competitivas nesta área e criar emprego altamente qualificado”.

Condições únicas dos Açores

As condições de Santa Maria “não são replicáveis noutro local da Europa”, constata Gui Menezes, secretário regional do Mar, Ciência e Tecnologia do Governo dos Açores. “A centralidade atlântica dos Açores, a sua posição geoestratégica entre a Europa, a América e África, é única para o desenvolvimento científico e tecnológico”. Por outro lado, “os Açores têm um dos melhores sistemas de incentivos às empresas da UE e parques tecnológicos e industriais com excelentes infraestruturas, beneficiando de uma rede de comunicações de alta velocidade assegurada por cabo submarino de fibra ótica”.

Entretanto, o Governo está a preparar criação da Portugal Space, a Agência Espacial Portuguesa, em articulação com a ESA. “Não vai ser uma agência clássica com uma estrutura pesada e forte investimento público”, refere Manuel Heitor, “mas uma pequena agência que promova novos negócios no Espaço, emprego altamente qualificado e a atração de investimento estrangeiro”.

Há mais de 90 projetos ativos em todo o mundo, em especial na China e nos EUA, para a construção de bases espaciais de lançamento de pequenos satélites como a que será construída nos Açores

Texto Virgílio Azevedo

Há mais de 90 projetos ativos em todo o mundo, em especial na China e nos EUA, para a construção de bases espaciais destinadas ao lançamento de micro, mini e pequenos satélites, um negócio que pode valer milhares de milhões de euros na próxima década. O crescimento do número de projetos representa a emergência de um novo paradigma: a democratização do acesso ao Espaço.

O mercado espacial está a mudar muito rapidamente com a evolução tecnológica, a miniaturização e as necessidades concretas das populações, abrindo pela primeira vez oportunidades de acesso direto ao Espaço a pequenos países como Portugal, e não apenas às grandes potências espaciais como os EUA, a Rússia, a China ou a Índia. E também a muito mais empresas e organizações.

É precisamente nesse sentido que aponta o concurso público internacional lançado esta segunda-feira em Ponta Delgada pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT) e a Estrutura de Missão dos Açores para o Espaço (EMA-Space), com o apoio técnico da Agência Espacial Europeia (ESA), onde se convidam empresas e organizações de todo o mundo a manifestarem o seu interesse pela conceção, instalação e operação de uma base espacial na ilha de Santa Maria, nos Açores.

A produção de satélites mudou

“A forma de fabricar satélites hoje é muito diferente do que era há 15 a 20 anos, ou mesmo há cerca de cinco anos”, explica ao Expresso o ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior. Manuel Heitor acrescenta que “há atualmente uma nova geração de lançadores (foguetões) de pequena dimensão, sem impacto ambiental e que garantem a segurança das populações”.

Por isso, o ministro sublinha que “existem três variáveis críticas para o sucesso de uma futura base espacial em Santa Maria”. A primeira é o custo por quilo do lançamento de um satélite. “Hoje, o custo ronda os 40 mil dólares (34 mil euros), mas é possível reduzi-lo para metade nos próximos cinco a dez anos”, admite Manuel Heitor.

A segunda variável é a quantidade de carga que é enviada em cada lançamento. Na grande base espacial da ESA em Kourou, na Guiana Francesa (América do Sul), uma base convencional, são feitos apenas lançamentos com grandes foguetões Ariane que levam cargas de seis toneladas, “o que envolve uma logística muito complexa”. Para ser viável, o futuro porto espacial de Santa Maria “terá de fazer lançamentos com cargas menos pesadas e mais pequenas”, obviamente transportadas por foguetões de dimensões e capacidades mais reduzidas.

Seis a 20 lançamentos por ano

Finalmente, a terceira variável é o número de lançamentos por ano. “Em Kourou, há em média três por ano mas em Santa Maria deverão ser mais frequentes, cerca de seis a 20 lançamentos por ano, um ritmo semelhante ao previsto para o porto espacial da Nova Zelândia, que tem semelhanças com este projeto”.

A verdade é que no último concurso, em abril, do programa da ESA para os novos sistemas de lançamento (foguetões) – o Future Launchers Preparatory Programme (FLPP) – a agência selecionou cinco estudos para financiar, dos quais quatro incluem a análise dos Açores. São estudos promovidos pela OHB, a maior empresa espacial da Alemanha; a Avio, empresa italiana líder na área da propulsão espacial que comercializa o foguetão Vega, o mais pequeno usado pela ESA, que transporta satélites de 300 a 2500 quilos de órbita baixa e polar para observação da Terra; a Deimos Engenharia, empresa portuguesa, em parceria com a britânica Orbex; e a empresa espanhola PDL Space.

Apesar do interesse pelos Açores, o projeto de Santa Maria enfrenta na Europa três projetos potencialmente concorrentes. O mais avançado pretende instalar uma base para pequenos lançadores na Escócia – o Spaceport Scotland – e o Governo britânico já assinou uma contrato de 37 milhões de euros com o fabricante americano Lockeed Martin, em parceria com a Orbex. Os outros, vocacionados para o lançamento de pequenos satélites de órbita polar, estão em estudo na Noruega e na Suécia.

“A estratégia de Portugal para o Espaço não depende da construção de um porto espacial para atrair investimento estrangeiro de grandes empresas”, esclarece Manuel Heitor. Mas a base de Santa Maria “aumenta obviamente a nossa presença no sector e coloca Portugal no contexto internacional das novas indústrias do Espaço”. O mais importante “é o país posicionar-se no mercado, atrair empresas competitivas nesta área e criar emprego altamente qualificado”.

Condições únicas dos Açores

As condições de Santa Maria “não são replicáveis noutro local da Europa”, constata Gui Menezes, secretário regional do Mar, Ciência e Tecnologia do Governo dos Açores. “A centralidade atlântica dos Açores, a sua posição geoestratégica entre a Europa, a América e África, é única para o desenvolvimento científico e tecnológico”. Por outro lado, “os Açores têm um dos melhores sistemas de incentivos às empresas da UE e parques tecnológicos e industriais com excelentes infraestruturas, beneficiando de uma rede de comunicações de alta velocidade assegurada por cabo submarino de fibra ótica”.

Entretanto, o Governo está a preparar criação da Portugal Space, a Agência Espacial Portuguesa, em articulação com a ESA. “Não vai ser uma agência clássica com uma estrutura pesada e forte investimento público”, refere Manuel Heitor, “mas uma pequena agência que promova novos negócios no Espaço, emprego altamente qualificado e a atração de investimento estrangeiro”.

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