Sophia, a missão que deixou de o ser

22-05-2019
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A Sophia nasceu com um objetivo: controlar o fluxo de migrantes no centro do Mediterrâneo. E isso implica, entre outras tarefas, patrulhar aquela zona de travessia onde mais gente morreu a tentar chegar à Europa. E patrulhar implica, quando necessário, também fazer o salvamento e resgate de pessoas. Mas a Sophia, por agora, vai deixar de ser a mesma Sophia que nasceu em 2015: a Comissão Europeia vai deixar de mandar navios e, de agora em diante, só vão estar na patrulha meios aéreos. A Sophia que nasceu como uma operação no mar vai ser uma operação de mar que não está no mar. Acabaram-se os navios. “A Operação Sophia é uma operação marítima. É claro que, sem os navios, esta operação não vai ser capaz de cumprir o seu mandato. No entanto, esta é uma decisão tomada pelos Estados-membros”, lamenta um porta-voz da Comissão Europeia em declarações ao Expresso. A operação Sophia está em vigor até este domingo e, até lá, os meios marítimos estão assegurados. A missão foi renovada por mais seis meses, até setembro, embora com a nuance de não ter navios - e os meses de verão, já se sabe, são os que registam mais tentativas de atravessar. Para a decisão dos Estados-membros ser definitiva, é necessária ainda a luz verde do Conselho da União Europeia, o que tem de acontecer até dia 31, ou seja, o próximo domingo. “A Operação Sophia é uma parte essencial do trabalho da União Europeia para desmantelar o modelo de negócio dos traficantes de seres humanos e para melhorar na generalidade a segurança marítima e a estabilidade do Centro do Mediterrâneo”, considera Federica Mogherini, alta Representante para a Política Externa da UE.

picture alliance/ Getty Images

Em setembro vai ser novamente analisada e, possivelmente, renovada. Nessa altura podem ou não ser alocados meios marítimos uma vez mais. A Comissão Europeia assegura que está à procura de soluções para resolver o problema. “O Serviço Europeu de Ação Externa e a Operação Sophia vão tomar medidas para reduzir os efeitos que a suspensão vai provocar mas é claro que o seu mandato não pode ser totalmente aplicado”, refere a Comissão. Ao Expresso, o ministro da Defesa lamentou a decisão. “Esperamos que seja possível encontrar uma solução para dar continuidade às importantes atividades que a Operação Sophia tem desenvolvido, nomeadamente as missões de busca e salvamento e combate de tráfico de seres humanos que permitiram já salvar milhares de vidas”, disse João Gomes Cravinho. “Certo é que os problemas no Mediterrâneo não vão desaparecer. Convém que todos os países assumam e exerçam as devidas responsabilidades tanto de natureza humanitária como securitária.” No que respeita ao resgate de migrantes no Mediterrâneo, Portugal tem oferecido ajuda para acolher pessoas resgatadas pelos navios. A Sophia, formalmente designada European Union Naval Force Mediterranean, tem contribuições de 26 Estados-membros. A Portugal juntam-se países como o Reino Unido, França, Alemanha, Grécia e Itália. No mar sem barcos Questionada pelo Expresso, sobre os motivos desta suspensão, a Comissão argumentou apenas que se tratou “de uma decisão dos Estados-membros” e, como tal, deve ser respeitada. No entanto, mantém-se o treino à Guarda Costeira da Líbia em matéria de salvamento e resgate. “Até agora, não conseguimos uma solução para a questão do desembarque”, disse ao Expresso um porta-voz da Comissão Europeia. Já na última renovação da operação deixou de ser obrigatório o desembarque em Itália que passou a ser feito no porto seguro mais próximo. É que naquele país da UE, como noutros, aportar e deixar os migrantes resgatados passou a ser um problema. Segundo o jornal britânico “The Guardian”, esta decisão foi tomada pois a outra “alternativa seria terminar de todo com a operação”.

picture alliance/ Getty Images

Atualmente, no centro do Mediterrâneo continua apenas a operação Themis, da responsabilidade da Frontex (Agência Europeia de Gestão da Cooperação Operacional nas Fronteiras Externas), que possui três meios aéreos e cinco marítimos. Já as organizações não governamentais que tinham barcos de resgate e salvamento (chegaram a ser pelo menos dez) pararam as operações. No último ano, começaram a dificultar-lhes o desembarque e muitas delas acabaram por se ver envolvidas com a Justiça: seja por problemas com a bandeira com que navegam ou até por suspeitas de cooperação com grupos de traficantes de migrantes - algo que tem sempre sido negado pelas organizações. “Não há barcos de ONG no mar porque têm tido muitos problemas com as autoridades. Isto é perturbador porque mesmo sem estarmos lá, as pessoas continuam a tentar atravessar. As informações que tenho é que nos últimos dias pelo menos mais de 200 pessoas foram resgatadas e que desde sábado que um barco com 41 pessoas está desaparecido”, defende Aloys Vimard, coordenador das operações de salvamento e resgate da ONG. Foi durante o verão do ano passado que as políticas dos governos de Malta e de Itália começaram a impor mais restrições ao desembarque de navios de ONG nos seus territórios – apesar de, nessa altura, ainda continuarem os desembarques dos navios oficiais das autoridades marítimas. Desde então, porque os navios não têm onde atracar, o número de missões começou a diminuir.

picture alliance/ Getty Images

Ficar dias à espera que lhes seja atribuído um porto seguro tornou-se quase regra para os navios das ONG, após o resgate de migrantes. O mais mediático dos casos, e por ter sido o primeiro, foi o do navio Aquarius (com mais de 600 pessoas a bordo). Seguiram-se outros casos, incluindo o navio Lifeline. “As operações da União Europeia no Mediterrâneo ajudaram no resgate de quase 730 mil pessoas desde 2015, com o número de mortos a reduzir significativamente quando comparado com os quatro anos anteriores”, sublinha a Comissão Europeia. De acordo com números do “Missing Migrants Project”, um portal de dados coordenado pela Organização Internacional de Migração, em 2019 já morreram na travessia 165 pessoas. Em todo o ano de 2014 morreram 3147 pessoas. Em 2015, foram 3149. O ano de 2016 foi ainda pior: 4791. Em 2017 foram 2853 enquanto em 2018 o número registado foi de 1314 mortos. “Não é por tirarem os navios que as pessoas vão deixar de tentar chegar à Europa”

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A Sophia nasceu com um objetivo: controlar o fluxo de migrantes no centro do Mediterrâneo. E isso implica, entre outras tarefas, patrulhar aquela zona de travessia onde mais gente morreu a tentar chegar à Europa. E patrulhar implica, quando necessário, também fazer o salvamento e resgate de pessoas. Mas a Sophia, por agora, vai deixar de ser a mesma Sophia que nasceu em 2015: a Comissão Europeia vai deixar de mandar navios e, de agora em diante, só vão estar na patrulha meios aéreos. A Sophia que nasceu como uma operação no mar vai ser uma operação de mar que não está no mar. Acabaram-se os navios. “A Operação Sophia é uma operação marítima. É claro que, sem os navios, esta operação não vai ser capaz de cumprir o seu mandato. No entanto, esta é uma decisão tomada pelos Estados-membros”, lamenta um porta-voz da Comissão Europeia em declarações ao Expresso. A operação Sophia está em vigor até este domingo e, até lá, os meios marítimos estão assegurados. A missão foi renovada por mais seis meses, até setembro, embora com a nuance de não ter navios - e os meses de verão, já se sabe, são os que registam mais tentativas de atravessar. Para a decisão dos Estados-membros ser definitiva, é necessária ainda a luz verde do Conselho da União Europeia, o que tem de acontecer até dia 31, ou seja, o próximo domingo. “A Operação Sophia é uma parte essencial do trabalho da União Europeia para desmantelar o modelo de negócio dos traficantes de seres humanos e para melhorar na generalidade a segurança marítima e a estabilidade do Centro do Mediterrâneo”, considera Federica Mogherini, alta Representante para a Política Externa da UE.

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Em setembro vai ser novamente analisada e, possivelmente, renovada. Nessa altura podem ou não ser alocados meios marítimos uma vez mais. A Comissão Europeia assegura que está à procura de soluções para resolver o problema. “O Serviço Europeu de Ação Externa e a Operação Sophia vão tomar medidas para reduzir os efeitos que a suspensão vai provocar mas é claro que o seu mandato não pode ser totalmente aplicado”, refere a Comissão. Ao Expresso, o ministro da Defesa lamentou a decisão. “Esperamos que seja possível encontrar uma solução para dar continuidade às importantes atividades que a Operação Sophia tem desenvolvido, nomeadamente as missões de busca e salvamento e combate de tráfico de seres humanos que permitiram já salvar milhares de vidas”, disse João Gomes Cravinho. “Certo é que os problemas no Mediterrâneo não vão desaparecer. Convém que todos os países assumam e exerçam as devidas responsabilidades tanto de natureza humanitária como securitária.” No que respeita ao resgate de migrantes no Mediterrâneo, Portugal tem oferecido ajuda para acolher pessoas resgatadas pelos navios. A Sophia, formalmente designada European Union Naval Force Mediterranean, tem contribuições de 26 Estados-membros. A Portugal juntam-se países como o Reino Unido, França, Alemanha, Grécia e Itália. No mar sem barcos Questionada pelo Expresso, sobre os motivos desta suspensão, a Comissão argumentou apenas que se tratou “de uma decisão dos Estados-membros” e, como tal, deve ser respeitada. No entanto, mantém-se o treino à Guarda Costeira da Líbia em matéria de salvamento e resgate. “Até agora, não conseguimos uma solução para a questão do desembarque”, disse ao Expresso um porta-voz da Comissão Europeia. Já na última renovação da operação deixou de ser obrigatório o desembarque em Itália que passou a ser feito no porto seguro mais próximo. É que naquele país da UE, como noutros, aportar e deixar os migrantes resgatados passou a ser um problema. Segundo o jornal britânico “The Guardian”, esta decisão foi tomada pois a outra “alternativa seria terminar de todo com a operação”.

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Atualmente, no centro do Mediterrâneo continua apenas a operação Themis, da responsabilidade da Frontex (Agência Europeia de Gestão da Cooperação Operacional nas Fronteiras Externas), que possui três meios aéreos e cinco marítimos. Já as organizações não governamentais que tinham barcos de resgate e salvamento (chegaram a ser pelo menos dez) pararam as operações. No último ano, começaram a dificultar-lhes o desembarque e muitas delas acabaram por se ver envolvidas com a Justiça: seja por problemas com a bandeira com que navegam ou até por suspeitas de cooperação com grupos de traficantes de migrantes - algo que tem sempre sido negado pelas organizações. “Não há barcos de ONG no mar porque têm tido muitos problemas com as autoridades. Isto é perturbador porque mesmo sem estarmos lá, as pessoas continuam a tentar atravessar. As informações que tenho é que nos últimos dias pelo menos mais de 200 pessoas foram resgatadas e que desde sábado que um barco com 41 pessoas está desaparecido”, defende Aloys Vimard, coordenador das operações de salvamento e resgate da ONG. Foi durante o verão do ano passado que as políticas dos governos de Malta e de Itália começaram a impor mais restrições ao desembarque de navios de ONG nos seus territórios – apesar de, nessa altura, ainda continuarem os desembarques dos navios oficiais das autoridades marítimas. Desde então, porque os navios não têm onde atracar, o número de missões começou a diminuir.

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Ficar dias à espera que lhes seja atribuído um porto seguro tornou-se quase regra para os navios das ONG, após o resgate de migrantes. O mais mediático dos casos, e por ter sido o primeiro, foi o do navio Aquarius (com mais de 600 pessoas a bordo). Seguiram-se outros casos, incluindo o navio Lifeline. “As operações da União Europeia no Mediterrâneo ajudaram no resgate de quase 730 mil pessoas desde 2015, com o número de mortos a reduzir significativamente quando comparado com os quatro anos anteriores”, sublinha a Comissão Europeia. De acordo com números do “Missing Migrants Project”, um portal de dados coordenado pela Organização Internacional de Migração, em 2019 já morreram na travessia 165 pessoas. Em todo o ano de 2014 morreram 3147 pessoas. Em 2015, foram 3149. O ano de 2016 foi ainda pior: 4791. Em 2017 foram 2853 enquanto em 2018 o número registado foi de 1314 mortos. “Não é por tirarem os navios que as pessoas vão deixar de tentar chegar à Europa”

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