Ladrões de Bicicletas: Foi há 13 anos

22-05-2019
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Hoje, debateu-se no Parlamento a legislação laboral, nomeadamente a questão da contratação colectiva.

Era muito conveniente voltar ao passado para perceber ideias, convicções, promessas que ficaram pelo caminho.

Estávamos em 2003 e a maioria de direita no Parlamento, colocou à discussão uma promessa de Código de Trabalho, elaborada de forma não transparente num escritório de advogados. Nem foi na concertação social, veja-se lá!

Era o ministro do Trabalho, António Bagão Félix no governo Durão Barroso.

Não guardei o link da sessão, mas podem ler na íntegra no final, como se fosse em anexo. Mas dizia ele na sessão de a 16 de Janeiro de 2003:

Orador: Acabou definitivamente o tempo de emprego para toda a vida. Há, agora, que criar as condições de trabalho com qualidade e por toda a vida activa.
(...)
Todos consideram que um dos grandes problemas
nacionais é o baixo nível de produtividade. O Código do Trabalho procura, na
medida do seu âmbito, contribuir para a sua melhoria, pela alteração do
paradigma da relação entre empregadores e trabalhadores, sabendo-se que a
economia só se desenvolve com as pessoas e pelas pessoas.
(...)
A reforma laboral é necessária para fortalecer as empresas, dignificar o
trabalho, proteger os que trabalham. Ganhará com ela o País que trabalha e quer
trabalhar, os empresários responsáveis e com sentido de risco, os jovens à
procura da inserção no mercado de trabalho. Ajudar-se-á a quebrar o ciclo
vicioso de baixa produtividade indutora de baixos salários. Dar-se-ão novas
oportunidades a quem, querendo trabalhar, não tem emprego e ser-se-á mais
exigente para quem, tendo emprego, não quer trabalhar.

Orador: Foi este o desafio que aceitámos. Será este o desafio a que Portugal vai
responder patrioticamente.

Aplausos do PSD e do CDS-PP, de pé.

(...)
Orador: Primeiro, a ideia de cooperação solidária no seio da empresa. De facto, é elementar perceber-se hoje que entre o empregador e o trabalhador há a empresa, que entre a empresa e o emprego há o trabalho, que entre o empregador e a empresa há a responsabilidade social.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Segundo, o justo equilíbrio entre competitividade económica, personalismo laboral, coesão social e justiça distributiva.

Terceiro, a modernização das nossas empresas e da nossa economia, tendo em atenção as exigências da mundialização das trocas e do alargamento da União Europeia.

Quarto, o primado da co-responsabilidade e da exigência, o reforço da ética do esforço e do mérito como elementos estruturantes do progresso e da justiça, no pleno respeito pela igualdade de oportunidades, mas afastando o igualitarismo artificial de resultados. É preciso não esquecer que a pior injustiça é a que nivela o que é diferente.

Quinto, a necessidade de adaptar a legislação a novas formas de trabalho e a novas categorias de trabalhadores, como sejam os que trabalham a tempo parcial, os tele-trabalhadores, os jovens pais e mães trabalhadores, as situações de cedência ocasional ou de trabalho temporário, os trabalhadores deficientes ou com menor capacidade de trabalho, bem como a consideração específica das empresas de menor dimensão, em regra, aliás, boas geradoras de novos empregos.

Sexto, a expressa consagração de direitos de personalidade dos trabalhadores e de um conjunto de garantias dos seus direitos e créditos, designadamente face às novas formas de organização societária.

Sétimo, a justa, responsável e harmoniosa conciliação entre direitos e deveres de todas as partes no seio da empresa.

Oitavo, a contribuição para um dos mais decisivos desafios de uma economia humana e humanizada: a melhor partilha entre o trabalho, a família e os tempos livres das pessoas.

Nono, o reconhecimento da adaptabilidade, da flexibilidade e da organização do tempo de trabalho como factores imprescindíveis numa economia em permanente mutação, devendo sublinhar-se que, com a nova lei e nesta matéria, os trabalhadores deixam de ser objecto para serem parte nas decisões que a eles respeitam.

Décimo, o reforço e a revitalização da contratação colectiva, como sede, por excelência, da livre e responsável formação de vontade das partes, eliminando bloqueios ao seu ajustamento e desenvolvimento, como, aliás, é a regra nos países mais desenvolvidos da Europa. É que subsistem, ainda, muitas convenções colectivas feitas à medida de um mundo que já não existe e que, na aparência da defesa dos chamados "direitos adquiridos" e irreversíveis, acabam por prejudicar o futuro das empresas e os respectivos postos de trabalho.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Décimo primeiro, a salvaguarda da efectividade da lei e da defesa do Estado de Direito que erradique o sentimento de impunidade resultante do acentuado grau de incumprimento das normas laborais, que desincentive formas de emprego clandestinas, que previna abusos, sancione irregularidades e penalize a irresponsabilidade, o desleixo e o absentismo.

Uma lei, enfim, que reforce o Estado fiscalizador em detrimento do Estado controlador de procedimentos meramente administrativos.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Décimo segundo, o fortalecimento do investimento nacional e a criação de condições de atracção de investimento estrangeiro gerador de riqueza e de postos de trabalho, bem como da promoção da qualidade empresarial, gestionária e profissional.

Décimo terceiro, a criação de condições que estimulem o emprego produtivo e, sobretudo, dêem renovadas esperanças aos que não têm trabalho e aos jovens no início das suas vidas activas.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

Falou José António Vieira da Silva (PS):
"Havia pelo menos quatro questões que, para nós, era fundamental que tivessem sido trazidas ao debate através do relatório da Comissão e do Sr. Deputado relator. Em primeiro lugar, foram muitas e de diferentes
origens as opiniões de que a solução legislativa encontrada não é uma boa
solução.

Em segundo lugar, foram muitas e diversas as vozes
que nos trouxeram uma preocupação fundamental: a de que esta proposta desloque
a favor das entidades patronais o frágil equilíbrio das relações de trabalho,
nomeadamente por obrigar - e cito alguém que participou nos nossos debates - os
sindicatos a negociar em situação de necessidade. 

Falou Jerónimo de Sousa (PCP):
"Quanto aos direitos colectivos, é ou não verdade que este Governo pretende,
por exemplo, cortar em metade o crédito de horas às comissões de trabalhadores?

É ou não verdade que, pela chamada cláusula de paz social, a que eu chamaria
mais "paz de cemitério", através dos serviços mínimos que tentam
inculcar nos trabalhadores, o direito à greve fica de facto mutilado?

E é ou
não verdade que, em relação a um direito fundamental, que é a contratação colectiva,
através de um miraculoso conceito de critérios de aferição da
representatividade, uma organização sindical de vão de escada, representando 5%
dos trabalhadores do sector, ou tendo 1500 associados, ou sendo filiada num dos
parceiros da concertação social, ou tendo uma situação económica mais ou menos
estável, pode liquidar e substituir contratos colectivos que estão em vigor?

Respondeu Bagão Félix:
"No fundo, o que nos separa é o futuro e o passado, e os senhores continuam a
alimentar-se do passado."

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - São maus os direitos existentes?!

O Orador: - Continuam a alimentar-se do passado, porque não conseguem
perceber que tudo mudou à nossa volta e que a situação geopolítica, económica e
social da Europa em 2003 não é a de 1975, de 1980 ou de 1990.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Portanto, tem de se cortar nos direitos!

O Orador: - Não, Sr. Deputado, é preciso adaptarmo-nos aos novos desafios,
como estão a fazer os países do antigo bloco comunista, que vão integrar a
União Europeia.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Com belos resultados!

O Orador: - Sr. Deputado, eu gostaria que verificasse a legislação da
Eslovénia, da Hungria, da República Checa, da Eslováquia, da Polónia e que,
depois, nos dissesse como é que conseguiria sobreviver fora desse contexto."

Foi há 13 anos! Aonde estamos?

ANEXO:

3148 | I Série - Número 074 | 16 de Janeiro de 2003

Vamos, então, guardar 1 minuto de comovido silêncio em memória do nosso
antigo Colega João Amaral.

A Câmara guardou, de pé, 1 minuto de silêncio.

Srs. Deputados, transmitirei este voto de pesar, antes de mais, à família do
Dr. João Amaral, cuja presença parcial na galeria assinalo, e enderecerei
igualmente estas condolências à cidade e ao concelho de Lisboa, que, como
Presidente da Assembleia Municipal, tão bem serviu durante tantos anos.
Passamos ao ponto da ordem do dia de hoje, que tem por objecto a apreciação, na
generalidade, da proposta de lei n.º 29/IX - Aprova o Código do Trabalho.
De acordo com o disposto pelo Regimento, o debate na generalidade é introduzido
pelo autor da proposta de lei, o Sr. Ministro da Segurança Social e do
Trabalho, após o que darei a palavra ao relator da comissão para apresentar as
principais conclusões contidas no relatório.
Tem, pois, a palavra o Sr. Ministro da Segurança Social e do Trabalho, para
proceder à apresentação da proposta de lei.

O Sr. Ministro da Segurança Social e do Trabalho (Bagão Félix): - Sr.
Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro: No exacto
cumprimento do seu Programa, o Governo apresentou nesta Câmara a proposta de
lei que consagra uma importante reforma da legislação laboral.
O Código do Trabalho, aqui, hoje, em debate, é a expressão dessa vontade
reformista, visando consagrar um instrumento virado para o futuro, produtor de
confiança, dignificando o trabalho e proporcionando condições de maior
capacidade empresarial.
Trata-se do projecto legislativo mais debatido desde o 25 de Abril. Desde o
início, houve o propósito de um debate profundo e esclarecedor. Por isso, em 18
de Julho do ano passado, o País pôde começar a reflectir sobre um anteprojecto
que esteve mais de quatro meses em discussão a diferentes níveis. Um
anteprojecto que constituiu um ponto de partida concreto, não um mero alinhavar
de ideias soltas ou uma simples sistematização para limpeza de
"impurezas" técnicas.
Depois de transformado em proposta de lei, foi submetido, pela Assembleia da
República, a discussão pública, que se prolongou por quase dois meses.
No fim de um longo mas profícuo tempo, foi possível realizar mais de 130 horas
de reuniões da Comissão Permanente da Concertação Social, ouvir especialistas
nesta matéria, participar em cerca de 130 debates públicos, receber sugestões,
observações, críticas e comentários de muitos portugueses. O sítio do
Ministério na Internet foi objecto, neste período, de cerca de 340 000 visitas,
o que significa uma média diária de cerca de 2500 consultas. A Comissão de
Trabalho e dos Assuntos Sociais procedeu, por sua vez, a um vasto conjunto de
audiências que, por certo, enriqueceu o seu trabalho e terá esclarecido os Srs.
Deputados.
O Governo sempre afirmou que o Código do Trabalho é uma condição importante,
embora parcelar, para vencermos os desafios da competitividade, da
produtividade e da coesão social. É um passo para reforçar o modelo social
europeu nas relações de trabalho, sem se transformar, porém, num
pronto-a-vestir insensível à nossa própria realidade.
A actual legislação é um emaranhado de normas e regulamentos que, desde há
muito, esgotou o seu prazo de validade. Dispersa, anacrónica, reflectindo
momentos políticos e sociais bem diversos, virada para o passado, facilmente
manipulável, transformou-se crescentemente no paraíso dos não cumpridores,
evidenciou um reduzido grau de efectividade e transformou a sua rigidez num
perverso e objectivo aliado da ineficiência económica e da injustiça social.
O primeiro activo desta iniciativa governamental é, assim, largamente
conseguido: o de suscitar uma maior consciencialização da sociedade e dos
parceiros sociais para a necessidade de uma mudança que já não é compaginável
com o imobilismo e a indiferença. Quebrou-se um tabu que, se persistisse, nos
atrasaria irremediavelmente no contexto europeu e mundial.
O anteprojecto, pelo simples facto de o ter sido, incorporou uma explícita
ideia e uma assumida vontade de boa fé negocial, não de cego autismo ou de
suspeita imposição.
Acreditamos na concertação como um activo público que permite dar grandes
passos em frente. Provou-se que a cultura e a prática de negociação saudável,
mesmo que dura e incisiva, é mais proveitosa que a prática de pura
confrontação. Provou-se a inutilidade de greves provocadas em pleno período de
discussão pública.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - A greve - é dos manuais - é o último recurso, não pode ser nem
uma ameaça instantânea e instintiva, nem a primeira arma de arremesso ou um
ritual tornado quase obrigatório para alguns.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - E porque acreditamos na concertação, sempre dissemos que a
proposta de lei presente ao Parlamento seria melhor que o anteprojecto inicial,
tal e qual como estamos convictos que a lei, na sua versão definitiva, será
melhor que a proposta de lei que deu entrada no Parlamento.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - A iniciativa legislativa - e, como tal, o País - muito
beneficiou do debate público e da discussão aberta e leal, em particular com os
parceiros sociais. Por isso, o Governo congratula-se vivamente com o recente
compromisso tripartido a que chegou, responsável e livremente, com alguns dos
parceiros.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Encaminharemos agora o seu resultado para apreciação dos Srs.
Deputados, convictos de que vão melhorar a proposta ora em debate.
Sr.as e Srs. Deputados: Quando se fala de concertação, alguns logo buscam nos
consensos alcançados vencedores e derrotados. Outros, ou até os mesmos,
perscrutam recuos e cedências, como se se tratasse de um jogo de xadrez onde o
objectivo é o xeque-mate de uma qualquer parte. Não há contabilidade de
negociação social.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Mas há "resultado líquido" da mesma, onde ninguém cedeu a ninguém,
mas onde todos, e, sobretudo, o País, ganharam. Por isso, o resultado final é
superior à soma da posição das partes. Sabemos que há quem pense que unir
esforços é um sinal de fraqueza. O Governo pensa, pelo contrário, que é uma
expressão de amadurecimento político e social.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Em política social e laboral, não há óptimos sociais, mas pode e
deve haver boas soluções na moderação das divergências.
Por isso, a posição do Governo foi, desde o início, uma posição equilibrada na
busca do maior denominador comum. Equidistante no método, estimuladora de
consensos. Como árbitro de posições legitimamente diferentes, mas não como
parte de qualquer parte.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Até parece que é verdade!

O Orador: - Não procurámos a concertação em nome de uma lei inócua ou da
desvirtuação do propósito inicial. Não fizemos concertação com receio de uma
greve. Sempre dissemos, aliás, que era preferível uma boa lei com uma greve do
que uma paz social artificial com uma lei que tudo adiava.
A concertação - como a justiça social - não é detida em regime de monopólio por
qualquer força política ou social. Ficou provado que, com muita vontade,
autenticidade nos propósitos, firmeza reformista e persistência no método, é
possível bons resultados em nome do interesse geral e do bem comum.
Sr.as e Srs. Deputados: Permitam-me que, sumariamente, enuncie, neste momento,
as principais linhas orientadoras da proposta de Código do Trabalho:
Primeiro, a ideia de cooperação solidária no seio da empresa. De facto, é
elementar perceber-se hoje que entre o empregador e o trabalhador há a empresa,
que entre a empresa e o emprego há o trabalho, que entre o empregador e a
empresa há a responsabilidade social.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Segundo, o justo equilíbrio entre competitividade económica,
personalismo laboral, coesão social e justiça distributiva.
Terceiro, a modernização das nossas empresas e da nossa economia, tendo em
atenção as exigências da mundialização das trocas e do alargamento da União
Europeia.
Quarto, o primado da co-responsabilidade e da exigência, o reforço da ética do
esforço e do mérito como elementos estruturantes do progresso e da justiça, no
pleno respeito pela igualdade de oportunidades, mas afastando o igualitarismo
artificial de resultados. É preciso não esquecer que a pior injustiça é a que
nivela o que é diferente.
Quinto, a necessidade de adaptar a legislação a novas formas de trabalho e a
novas categorias de trabalhadores, como sejam os que trabalham a tempo parcial,
os tele-trabalhadores, os jovens pais e mães trabalhadores, as situações de
cedência ocasional ou de trabalho temporário, os trabalhadores deficientes ou
com menor capacidade de trabalho, bem como a consideração específica das
empresas de menor dimensão, em regra, aliás, boas geradoras de novos empregos.
Sexto, a expressa consagração de direitos de personalidade dos trabalhadores e de
um conjunto de garantias dos seus direitos e créditos, designadamente face às
novas formas de organização societária.
Sétimo, a justa, responsável e harmoniosa conciliação entre direitos e deveres
de todas as partes no seio da empresa.
Oitavo, a contribuição para um dos mais decisivos desafios de uma economia
humana e humanizada: a melhor partilha entre o trabalho, a família e os tempos
livres das pessoas.
Nono, o reconhecimento da adaptabilidade, da flexibilidade e da organização do
tempo de trabalho como factores imprescindíveis numa economia em permanente
mutação, devendo sublinhar-se que, com a nova lei e nesta matéria, os
trabalhadores deixam de ser objecto para serem parte nas decisões que a eles
respeitam.
Décimo, o reforço e a revitalização da contratação colectiva, como sede, por
excelência, da livre e responsável formação de vontade das partes, eliminando
bloqueios ao seu ajustamento e desenvolvimento, como, aliás, é a regra nos
países mais desenvolvidos da Europa. É que subsistem, ainda, muitas convenções
colectivas feitas à medida de um mundo que já não existe e que, na aparência da
defesa dos chamados "direitos adquiridos" e irreversíveis, acabam por
prejudicar o futuro das empresas e os respectivos postos de trabalho.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Décimo primeiro, a salvaguarda da efectividade da lei e da
defesa do Estado de Direito que erradique o sentimento de impunidade resultante
do acentuado grau de incumprimento das normas laborais, que desincentive formas
de emprego clandestinas, que previna abusos, sancione irregularidades e
penalize a irresponsabilidade, o desleixo e o absentismo. Uma lei, enfim, que
reforce o Estado fiscalizador em detrimento do Estado controlador de
procedimentos meramente administrativos.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Décimo segundo, o fortalecimento do investimento nacional e a
criação de condições de atracção de investimento estrangeiro gerador de riqueza
e de postos de trabalho, bem como da promoção da qualidade empresarial,
gestionária e profissional.
Décimo terceiro, a criação de condições que estimulem o emprego produtivo e,
sobretudo, dêem renovadas esperanças aos que não têm trabalho e aos jovens no
início das suas vidas activas.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Décimo quarto, a consideração da formação profissional, do
reforço de condições de higiene, saúde e segurança laborais como investimentos
estratégicos e verdadeiros activos das empresas e dos trabalhadores e não como
meros exercícios formais sem consistência.
Sr.as e Srs. Deputados: Com este Código podemos passar a ter uma lei de
progresso social que afasta duas visões radicais do mundo empresarial e
laboral: a tese ultra liberal, para a qual a parte mais débil ficaria, em maior
ou menor grau, submetida aos ditames da parte mais forte, mas também a tese
resignada, retrógrada e imobilista pela qual não se distingue o mérito, a
responsabilidade e os resultados, "cai o Carmo e a Trindade" logo que
se fala de flexibilidade ou de produtividade e o dono da empresa aparece sempre
como o "inimigo" a abater. Dizemos claramente "não" à
precariedade social e moralmente reprovável,…

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Vê-se…!

O Orador: - … como repudiamos o proteccionismo artificial que esconde as
diferenças e empobrece o mérito.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Por isso, não alimentamos autismos corporativos ou
fundamentalismos radicais.

Risos do Deputado do PCP Jerónimo de Sousa.

Não temos uma visão maniqueísta das relações de trabalho. Assim como não se
pode generalizar abusivamente a ideia do mau trabalhador, não se pode induzir a
ideia do patrão explorador e insensível.
Por outro lado, a segurança de emprego não pode ser dissociada da ideia da
saúde das empresas. Por isso, aquela não existe a nível absoluto e não pode ser
salvaguardada apenas com base em requisitos formais e adquiridos. Por exemplo,
o que é melhor para o trabalhador, um contrato permanente numa empresa falida
ou um contrato a termo numa empresa com futuro?

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Mas só há essas duas hipóteses?

O Orador: - Acabou definitivamente o tempo de emprego para toda a vida. Há,
agora, que criar as condições de trabalho com qualidade e por toda a vida
activa.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Uma empresa é, em primeiro lugar, uma comunidade de pessoas e de
progresso. Não há trabalhadores sem empresas, como não pode haver boas empresas
sem trabalhadores motivados. A vitalidade das empresas não pode ser apenas
do interesse dos patrões e indiferente para os trabalhadores, como a partilha
de resultados não pode ser um acto isolado e egoísta, mas uma expressão de
respeito e de estímulo pelo trabalho. Os postos de trabalho dependem cada vez
mais da capacidade das empresas para não soçobrarem perante mercados cada vez
mais concorrenciais. Uma empresa de sucesso não se faz separando o
empregador dos trabalhadores. A dignificação do trabalho e dos
trabalhadores não se opõem mas completam-se e entrecruzam-se.
Este Código repudia também a inércia e exprime uma posição socialmente
equilibrada e adaptada aos novos desafios. Não é um "faz de conta"
legislativo pelo qual, com alguma cosmética e certa estética, se muda o
acessório para que o essencial permaneça intocável, nem é uma expressão de
radicalismo liberal que não compreende a natureza eminentemente social do
direito do trabalho e ignora completamente os preceitos constitucionais que
sempre terão de ser respeitados.
Este Código, para uns, sempre incomodados com a ideia da mudança, é demais;
para outros, sempre obcecados com a idolatria do mercado sem preocupações
sociais e humanistas, será de menos. Por isso, os primeiros diabolizam o Código
como uma constante ameaça, defendendo administrativamente os empregos que
existem, não os que é necessário criar, convencidos que o progresso existe por
definição legal sem esforço, sem dedicação e desprezando a função social do
mérito, e os segundos, sempre cépticos e às vezes cínicos, desvalorizam-no como
um insuficiente passo, ansiosamente sempre à espera do passo seguinte que, para
eles, nunca vem.
Para o Governo, esta reforma é um instrumento para favorecer a produtividade e
a competitividade. Não o único, como sempre dissemos, nem certamente o mais
decisivo, mas seguramente necessário e inadiável. Uma reforma suficientemente
flexível para ser eficaz, suficientemente diferenciadora para ser progressista,
suficientemente equilibrada para ser justa. Uma lei para usar e não para dela
se abusar.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Uma lei onde a regra do jogo nunca possa passar pelo jogo sem regras, mas
também uma lei onde se repudia a excessiva rigidez dos actuais normativos que,
na prática, beneficiam quem não investe, quem não é responsável, quem não quer
trabalhar, quem não se preocupa com a qualificação profissional

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Um Código que, em qualquer caso, jamais será um conjunto de
normas para definhar a responsabilidade de quem, às vezes, exige da lei o que
deve resultar da maior autoridade legítima, que é o exemplo, e do mais sério
pacto não escrito, que é a confiança.
Todos consideram que um dos grandes problemas nacionais é o baixo nível de
produtividade. O Código do Trabalho procura, na medida do seu âmbito,
contribuir para a sua melhoria, pela alteração do paradigma da relação entre
empregadores e trabalhadores, sabendo-se que a economia só se desenvolve com as
pessoas e pelas pessoas.
É redutor e incorrecto atribuir-se aos trabalhadores a responsabilidade única
pelos níveis de produtividade. Mas é igualmente redutor e incorrecto colocá-los
fora deste processo. Estamos todos conscientes que, se é certo que o trabalho
se repercute directamente nos custos de produção, a batalha de produtividade
passa, também e decisivamente, por muitos outros factores endógenos às empresas,
como a formação dos próprios empresários, a organização, a inovação, a
formação, a participação motivadora, a capacidade comercial, a política de
reinvestimento dos lucros e também por factores exógenos, como a política
fiscal, a administração da justiça, a agilidade do aparelho administrativo,
entre muitos outros. Por isso, a batalha da produtividade exige a acção
interdependente de empresários, de trabalhadores, do Estado, das autarquias e
da sociedade em geral.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Sr.as e Srs. Deputados: Não podemos adiar por mais tempo aquilo
que há demasiados anos se vem adiando.
Estamos no século XXI. Não estamos em 1969, nem em 1975, nem mesmo nos anos 80
ou 90.
Somos membros de pleno direito do mais importante espaço político, económico e
social. A nossa legislação laboral deverá inscrever-se no modelo social europeu
e não noutros modelos historicamente ultrapassados e definitivamente rejeitados
numa sociedade democrática.
A reforma laboral é necessária para fortalecer as empresas, dignificar o
trabalho, proteger os que trabalham. Ganhará com ela o País que trabalha e quer
trabalhar, os empresários responsáveis e com sentido de risco, os jovens à
procura da inserção no mercado de trabalho. Ajudar-se-á a quebrar o ciclo
vicioso de baixa produtividade indutora de baixos salários. Dar-se-ão novas
oportunidades a quem, querendo trabalhar, não tem emprego e ser-se-á mais
exigente para quem, tendo emprego, não quer trabalhar.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Diferenciar-se-á o empregador responsável e criador de novas
oportunidades de emprego do empresário incumpridor, subsídio-dependente e
insensível aos seus empregados.
Foi em nome de todos estes valores que o Governo foi mandatado pelo povo
português para, com coragem, sentido de justiça e discernimento, proceder a
esta reforma de fundo.
Foi este o desafio que aceitámos. Será este o desafio a que Portugal vai
responder patrioticamente.

Aplausos do PSD e do CDS-PP, de pé.

O Sr. Presidente: - Nos termos estabelecidos no Regimento, tem a palavra o
relator da Comissão de Trabalho e dos Assuntos Sociais para apresentar a
síntese do relatório e as respectivas conclusões mais relevantes.
Tem, pois, a palavra o Sr. Deputado Francisco José Martins. A Mesa concede-lhe
7 minutos, atendendo a que o relatório é muito longo.

O Sr. Francisco José Martins (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro,
Srs. Ministros, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Procurarei
ser breve e respeitar o tempo de 7 minutos que o Sr. Presidente me concedeu.
No entanto, permitam-me que, como nota prévia, transmita que este relatório foi
elaborado em concordância com o novo Regimento, o mesmo é dizer que o relatório
foi apresentado em Comissão, não foi submetido a votação, mas, sim, as respectivas
conclusões obrigatórias e o parecer. Nessa medida, procurarei aludir ao
relatório de uma forma sintética, tão-somente referindo o que foram que aí os
pontos abordados e, depois, enunciando as conclusões e o respectivo parecer.
Quanto ao relatório, ele aborda naturalmente a apresentação da proposta de lei
por parte do Governo, a qual deu entrada nesta Assembleia e foi objecto de
despacho de admissão do Sr. Presidente da Assembleia em 14 de Novembro de 2002.
Refere obviamente as questões suscitadas, relativamente à sua admissibilidade,
nos recursos interpostos pelo Bloco de Esquerda e pelo Partido Comunista
Português, os quais mereceram, como é sabido, um parecer da 1.ª Comissão, que
concluiu pela inexistência de quaisquer inconstitucionalidades que pudessem pôr
em causa a admissibilidade dessa proposta de lei e, por conseguinte, que ela
estava em condições de ser admitida e discutida.
Depois, em sede de relatório, é apreciado aquilo que o proponente desta
iniciativa, o Governo, enuncia como motivos para a sua apresentação. Tudo isto,
neste particular, segundo o proponente, assente no princípio programático da
absoluta indispensabilidade de rever a legislação laboral e de a adaptar à nova
organização do trabalho, ao reforço da produtividade e também ao natural
objectivo de competitividade da própria economia nacional.
Voltando à análise da proposta de lei, o relatório também aborda aquilo que é a
orientação, a opção, a estrutura e o conteúdo da proposta de lei, para, depois,
fazer uma análise, ainda que sintética, dos 21 artigos que integram a proposta
de lei, a qual tem em anexo o próprio Código do Trabalho que lhe está
subjacente. No que respeita a esses 21 artigos da proposta de lei, permitam-me
que aqui dê relevo a um aspecto essencial, que tem a ver com a transposição de
directivas comunitárias, quer na totalidade quer parcialmente. De facto, todo
um conjunto de directivas, à luz de uma harmonização, que se deseja, do direito
nacional com o direito comunitário, é aí transposto.
Também é referido um conjunto de matérias fundamentais que merecem uma
relevância especial. Estou a falar no trabalho de menores, nos acidentes de
trabalho e também no estatuto do trabalhador-estudante.
É referida a forma de regulamentação da própria lei, quer em sede de decreto-lei,
relativamente a algumas matérias e alguns artigos, quer por decreto
regulamentar, para, depois, se acentuarem dois aspectos fundamentais. Em
relação a um deles, o prazo de vigência do próprio Código do Trabalho, está
expresso que a sua periodicidade é de quatro anos, findos os quais é
pressuposto a sua revisão. Depois, enumera-se no último artigo, no artigo 21.º,
todo um conjunto (e bastante) de diplomas que serão revogados.
É também matéria constante do relatório - e penso que muito importante - uma abordagem,
ainda que sintética, ao direito comunitário do trabalho. Portugal está
integrado na União Europeia e todos sabemos quão importante é a harmonização da
nossa legislação com o direito comunitário. O relatório expressa, ainda que
sinteticamente, como referi, a evolução das questões sociais e da legislação,
desde o Tratado de Roma até hoje, significando a importância crescente da
legislação laboral no âmbito da Comunidade, mas concluindo, apesar de tudo, por
aquilo que é evidente e ainda hoje corolário dessa legislação, ou seja, que os
direitos de cada um dos Estados-membros ainda prevalecem sobre o direito
comunitário.
Uma nota também sobre aquilo que é a Organização Internacional do Trabalho
(OIT) e aquilo que de importante releva relativamente ao nosso ordenamento
jurídico, em termos laborais, face, sobretudo e fundamentalmente, às convenções
que emanam dessa organização, as quais, como é sabido, fazem parte integrante
da nossa ordem jurídica, nos termos do artigo 8.º da Constituição da República Portuguesa.
Depois, em termos de nota final, faz-se referência - e o Sr. Ministro já hoje o
mencionou - ao processo de consulta pública. Processo de consulta pública,
desde logo, na óptica da própria Assembleia da República, já que, em sede de
Comissão do Trabalho e dos Assuntos Sociais muitas foram as entidades que aqui
vieram deixar o seu contributo e promover o debate em sede da própria comissão,
o que foi seguramente muito rico e será muito importante para o debate na
especialidade.
Refere-se também, nesse processo de consulta pública, o papel do Governo na
discussão com os parceiros sociais, e depois sublinham-se, nesse mesmo
processo, como direito próprio das organizações representativas dos
trabalhadores e dos empregadores de participarem na elaboração da legislação
laboral, os quase 300 pareceres que foram canalizados para a Comissão do
Trabalho e dos Assuntos Sociais, como contributos dados à luz da legislação.
Permitam-me, agora, que transmita também a esta Câmara as oito conclusões
constantes do relatório, que são as seguintes: "1. A proposta de lei em
apreciação não enferma de quaisquer inconstitucionalidades que possam pôr em
causa a admissibilidade e discussão da iniciativa legislativa.
2. A proposta de lei não é uma mera sistematização mas significa uma
codificação assente, nomeadamente, nos estudos e jurisprudência dos últimos
quarenta anos e pelo facto do Direito do Trabalho já ter alcançado uma
estabilidade suficiente para se proceder a essa codificação.
3. As alterações introduzidas respeitam os limites constitucionais como a
segurança no emprego, o papel das comissões de trabalhadores e das associações
sindicais ou o direito à greve e, por outro lado, procedem a adaptações do
Direito do Trabalho nacional a diversas directivas comunitárias em matéria
social."

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se. Peço-lhe que
abrevie.

O Orador: - Vou só acabar de referir as conclusões, Sr. Presidente.
"4. Esta proposta vem também acentuar a importância dos direitos de
personalidade, a limitação do trabalho de menores, a protecção da maternidade e
paternidade, o respeito pelo trabalho dos cidadãos portadores de deficiência,
acentuando ainda a preocupação com a observância das normas de higiene, saúde e
segurança no local de trabalho, tudo isto inserido numa preocupação reforçada
pela dignidade da pessoa humana e pela prestação de trabalho em condições
socialmente dignificantes.
5. Esta proposta, nomeadamente nas alterações que introduz ao nível da
flexibilidade em determinadas áreas, não esquecendo nem ignorando a posição
jurídica do trabalhador, constitui um instrumento importante para a elevação da
produtividade e competitividade externa da economia nacional numa base
sustentada.
6. Esta proposta tem ainda como objectivo estruturante inverter a actual
situação de estagnação da contratação colectiva, dinamizando-a e criando uma
responsabilização das partes no que respeita ao seu cumprimento efectivo.
7. Esta proposta inova ainda em matéria de responsabilização dos empregadores e
agrava o quadro sancionatório por inobservância das leis laborais, em sede de
matéria penal e contra-ordenacional.
8. A participação no processo de consulta pública registou um interesse e
abrangência na sociedade portuguesa extraordinários que muito enriqueceu o
processo de formação desta lei."
Estas conclusões foram aprovadas, ontem, por maioria, na Comissão do Trabalho e
dos Assuntos Sociais, tal como o parecer, que, de forma sintética, nos diz que
a proposta de lei n.º 29/IX reúne os requisitos constitucionais, legais e regimentais
indispensáveis para subir a Plenário da Assembleia da República e aí ser
discutida, como está hoje a acontecer.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Antes de dar a palavra aos Srs. Deputados inscritos para
pedir esclarecimentos ao Sr. Ministro da Segurança Social e do Trabalho,
constato que há dois pedidos de interpelação à Mesa, por parte dos Srs.
Deputados Lino de Carvalho e António Costa.
Começo por perguntar ao Sr. Deputado Lino de Carvalho qual é o motivo da sua
interpelação.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, era para informar a Mesa que
queremos usar da faculdade prevista no n.º 6 do artigo 158.º do Regimento,
utilizandoutilizando o tempo autónomo de 5 minutos dado a cada grupo
parlamentar, para comentar, intervir e pedir esclarecimentos sobre o relatório,
e que, para esse fim, queremos inscrever a Sr.ª Deputada Odete Santos.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado António Costa, qual é o motivo da sua
interpelação.

O Sr. António Costa (PS): - Sr. Presidente, é para chamar a atenção de que
já tínhamos inscrito, para o mesmo efeito referido pelo Sr. Deputado Lino de
Carvalho, o Sr. Deputado Vieira da Silva.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados Lino de Carvalho e António Costa, com
toda a franqueza, julgo que esse preceito deve ser integrado com o princípio
geral da atribuição dos tempos para a fixação de grelhas de debate. Esse deve
ser um preceito que sobreviveu dos tempos em que a regra era não haver grelhas.
Em todo o caso, sobre isso, pergunto se há mais algum Sr. Deputado que se
queira pronunciar, já que estamos a lidar com um Regimento revisto e é provável
que haja dúvidas na apreciação de alguns dos seus preceitos. Faço notar que
esse preceito já existia, sobreviveu intacto do Regimento anterior e nunca foi
relembrado.
Alguém quer usar da palavra?

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, só para ajudar a Mesa, tenho
a ideia de que esse preceito só se aplica, nos termos do artigo 141.º do
Regimento, a propósito da intervenção do autor da iniciativa legislativa. Isto é,
para esse efeito é que esse tempo não conta, quando a Conferência de Líderes
tiver fixado o tempo global de debate. Mas isso é só quando se refere ao autor
da iniciativa. Fora desse caso, há a possibilidade de o relator intervir (e ele
usou dessa faculdade), sendo o n.º 5 do artigo 158.º claro, ao atribuir um
tempo autónomo para esse processo, 5 minutos, e dando igualmente o n.º 6 um
tempo autónomo a cada grupo parlamentar para intervir sobre o relatório.
Portanto, não tinha sentido que, para a apresentação do relatório, houvesse um
tempo autónomo e que, para sobre ele intervir, cada grupo parlamentar não o
tivesse.

O Sr. Presidente: - Com toda a franqueza, acho que não vale a pena
prolongarmos este debate procedimental, com o qual certamente perderemos muito
mais tempo do que se a Mesa der a palavra ao Sr. Deputado Vieira da Silva e à
Sr.ª Deputada Odete Santos.
Por agora, fica assim decidido; é mais prático do que estar a discutir isto
interminavelmente.
Tem a palavra o Sr. Deputado Vieira da Silva.
O Sr. Vieira da Silva (PS): - Sr.
Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O Partido
Socialista não pode associar-se às conclusões do relatório aqui apresentado nem
se revê no seu conteúdo.
Não quer isto dizer que não louvemos o mérito e o trabalho do Sr. Deputado
Francisco José Martins, que se empenhou e desenvolveu um conjunto de reflexões
importantes acerca da proposta de lei aqui em debate, nem votámos contra as
conclusões por algumas divergências que tínhamos relativamente a esse relatório
ou às suas conclusões. Votámos contra, fundamentalmente, porque o relatório e
as conclusões contêm, para nós, omissões inaceitáveis.
Concluímos, há cerca de uma semana, um extenso processo de discussão pública,
conduzido pela Comissão do Trabalho e dos Assuntos Sociais, onde foram ouvidos
e connosco discutiram diversos sectores da sociedade portuguesa. Não faz
sentido que o relatório desse trabalho se resuma à mera enunciação de quem
participou nessa discussão pública.

O Sr. Paulo Pedroso (PS): - Muito bem!

O Orador: - É essencial para esta Câmara que o conteúdo desse debate esteja
também presente, de modo a que todas as Sr.as e Srs. Deputados possam
analisá-lo.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - E, nesse debate, havia pelo menos quatro questões que, para nós,
era fundamental que tivessem sido trazidas ao debate através do relatório da
Comissão e do Sr. Deputado relator.
Em primeiro lugar, foram muitas e de diferentes origens as opiniões de que a
solução legislativa encontrada não é uma boa solução. Trata-se de um código
que, antes de o ser, já não o é, porque, segundo diferentes opiniões, são
necessários entre 40 a 70 diplomas adicionais para formar a nova arquitectura
jurídica do direito laboral. Não se trata de um código e é uma má solução para
muitos daqueles com quem falámos.
Em segundo lugar, foram muitas e diversas as vozes que nos trouxeram uma
preocupação fundamental: a de que esta proposta desloque a favor das entidades
patronais o frágil equilíbrio das relações de trabalho, nomeadamente por obrigar
- e cito alguém que participou nos nossos debates - os sindicatos a negociar em
situação de necessidade.
Em terceiro lugar, foram também muitas e diversas as vozes que questionaram o
enquadramento constitucional de normas de relevante importância material e
simbólica desta proposta de lei, normas que se prendem com a admissibilidade
objectiva, ainda que limitada a alguns sectores, do despedimento sem justa
causa e normas referentes ao direito à greve.
Em quarto lugar (e a quarta razão por que não pudemos associar-nos a este
relatório e às suas conclusões), foram também muitas as vozes - aqui, talvez
unânimes - que questionaram a existência de recuos na igualdade de género, na
conciliação da vida profissional e da vida familiar e na protecção à família.
São quatro questões que, no exercício do debate democrático que levámos a cabo
na Comissão de Trabalho, teriam de ter reflexo neste relatório.
Na verdade, não esperávamos que o Sr. Deputado Relator viesse subscrever muitas
dessas questões, mas pensamos que deveria trazer para aqui esse debate, que foi
um debate importante. Sem ele, sem a presença das vozes que aí ouvimos, as
nossas conclusões, o nossos trabalho, serão mais pobres e a nossa esperança é
que ainda seja possível fazer, nos debates na generalidade e na especialidade,
com que as preocupações, o interesse, o empenhamento que esta proposta de lei
suscitou em muitos sectores da sociedade portuguesa se possa fazer ouvir,
conduzindo a uma melhoria da qualidade do nosso debate democrático.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos, que dispõe
de 5 minutos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs.
Membros do Governo, Srs. Deputados, Sr. Deputado Francisco José Martins: Sei
muito bem que V. Ex.ª teve muito pouco tempo para elaborar o relatório, o que
prova, afinal, que o debate desta proposta de lei, ao contrário do que é para
aí veiculado, não se fez nas melhores condições. Veremos agora na
especialidade.
Por isso, cumprimento o seu trabalho, mas não posso, até em obediência ao
Regimento que temos, que refere que os relatórios têm o nome do seu autor,
deixar de dizer que, nesta matéria, como em todas, o relatório tem muito mais
exigências que o mero enunciado de propostas sem a devida "densificação"
no próprio relatório, e os argumentos contrários foram muitos para muitas
matérias.
Passo a dar alguns exemplos e, desde logo, em relação à questão da precarização
para que aponta esta proposta de lei, segundo alguns dizem. Aliás, esperei até
que V. Ex.ª aproveitasse o relatório para contrariar algumas afirmações que o
Sr. Ministro do Trabalho tem vindo a fazer, como fez, por exemplo, em Setembro,
e que são uma crítica a uma legislação do PSD, do Prof. Cavaco Silva. Isto
porque diz que a actual legislação permite uma precarização absoluta, e até dá
o exemplo dos contratos a prazo incerto - a actual legislação é de 1989, é de
um governo de VV. Ex.as -, e que é esta que vem moralizar a precarização da
vida laboral. Isto foi dito numa entrevista dada em 1989, onde o Sr. Ministro
diz que "todos" fazem batota.
Mas deveria incluir-se também nesses "todos", porque é uma batota
dizer que esta proposta de lei não permite contratos sucessivos até quase à
exaustão e não permite contratos a prazo incerto com muito mais facilidade que
a actual lei, que é má. É que esta ainda permite mais, permite sucessivos
contratos a prazo quando alarga as excepções pelas quais, segundo a proposta de
lei, é possível substituir, logo de seguida, um trabalhador contratado a prazo
certo e mandado embora por outro contratado a prazo certo.
Na verdade, isto acontece, nomeadamente, para os jovens à procura do primeiro
emprego - está ressalvada essa excepção -, pois podem fazer caducar o seu
contrato de trabalho e depois admitir outro trabalhador a prazo para o mesmo
posto de trabalho, ou para um posto lateral da empresa. Por isso, esta proposta
de lei, alargando as excepções, de facto, é mais brutal que a actual lei.
Quanto aos contratos a prazo incerto, em relação aos quais o Sr. Ministro
também disse que a actual lei era má, que não servia, porque permitia um grande
alargamento da contratação a prazo incerto, basta só ler as várias alíneas
desta proposta de lei para concluir que aqui ainda se permite mais incerteza na
contratação, desde logo pela questão da contratação para substituir
trabalhadores directa ou indirectamente e também nas contratações para as obras
da construção civil.
Este é um exemplo de uma matéria que V. Ex.ª deveria ter discutido e tratado,
tal como a flexibilização. Gostaria de saber se, de facto, dar a possibilidade
de trabalhar 12 horas por dia, 60 horas por semana, é bom para conciliar a vida
profissional com a vida familiar, se é uma protecção às famílias o que se quer
estabelecer desta maneira.

Vozes do PCP: - Exactamente!

A Oradora: - Também gostaria de saber, por exemplo, se para a saúde dos
trabalhadores é bom acabar com as pequenas pausas e intervalos de descanso em
uso nas empresas. É ou não verdade que há um debate muito intenso, a nível da
União Europeia, sobre as profundas doenças que afectam os trabalhadores,
nomeadamente as doenças músculo-esqueléticas?

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - Para terminar, Sr. Deputado Francisco José Martins, este é um
simples exemplo e V. Ex.ª, no pouco tempo que tem, poderia, de qualquer forma,
abordar estas questões e outras, como a questão de Castelo de Paiva, pois, ao
contrário do que o Sr. Ministro gostaria, isto prova que esta não é uma
legislação laboral precarizante, de facto, fixa o investimento.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno
Teixeira de Melo.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Sr. Presidente, gostaria de colocar
a seguinte questão prévia: era suposto que, nos termos do artigo 158.º, n.º 6,
do Regimento da Assembleia da República, se discutisse, nesta fase, o
relatório, não o diploma.
Curiosamente, as bancadas do Partido Socialista e do Partido Comunista
aproveitaram para subverter esta regra regimental, antecipando um debate, que
vão ter tempo de travar já a seguir, porventura, para usarem tempo que, de todo
o modo, já têm.
Sr. Presidente, não queremos subverter as regras do jogo, mas para que não
julguem que tememos o debate - e não o tememos - não deixo de suscitar, também,
em jeito de antecipação, uma questão prévia.
O Sr. Deputado Vieira da Silva falou de recuos, dirigindo-se a nós e ao
Governo. Gostava de dizer que não houve recuos, houve sim, Srs. Deputados do
Partido Socialista e do Partido Comunista, aquilo que VV. Ex.as nunca conseguiram
e nunca promoveram, que é a verdadeira concertação social.

Aplausos do CDS-PP e doPSD.

E VV. Ex.as confundiram concertação social, debate amplo, profundo, genuíno,
com recuos, o que se compreende.
Porém, gostava de dizer-vos, Srs. Deputados, que, apesar de tudo, mesmo com o
que hoje apelidam de recuos ficou-se já muito além daquilo que VV. Ex.as alguma
vez sonharam e que há muito deviam ter proposto e promovido, mas nunca o
fizeram. E isso será, agora sim, em sede de discussão do diploma, trazido à discussão
pela minha bancada e por todas as que sobre ele se vão pronunciar.
Quanto ao relatório, importa assinalar o seguinte: desde logo, apreciar a
extensa, rica e feliz argumentação do relator que, desde logo, como pudemos
ver, contribuiu para este debate; em poucas palavras, diria que a proposta de
lei faz todo o sentido, porque sistematiza, simplifica, sintetiza legislação
laboral dispersa por numerosos diplomas legais; procede à transposição para a
ordem interna de várias directivas comunitárias; representa um fortíssimo contributo;
e foi, desde que há memória, o projecto de diploma mais debatido com parceiros
sociais e outras organizações representativas da sociedade civil.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Releva também que, mesmo em sede de discussão do relatório, o
Partido Socialista não teve uma palavra para com a UGT, o que não é de
estranhar - não sei se tem a ver com a presença de alguns Srs. Deputados desse
partido em recentes iniciativas da CGTP, mas isso são coisas do Partido
Socialista

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Trata-se de um diploma profundamente inovador e representa uma
coragem reformista que este Governo, também nesta matéria, demonstrou. E fê-lo
de uma forma que não tem comparação com exemplos do passado.
Por tudo isto, e por tudo o mais que há-de vir e que, em sede de discussão
substancial do diploma, vai ser suscitado por todas as bancadas, gostaria de
reiterar o nosso acordo com os fundamentos do relatório, saudar, uma vez mais,
o Sr. Relator e, finalmente, esperar que com este excelente trabalho do
Governo, que pelo menos conta com o contributo das bancadas da maioria, se
possa dar um grande avanço na legislação laboral em benefício dos
trabalhadores, em benefícios das entidades patronais, em benefício de Portugal.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Drago.

A Sr.ª Ana Drago (BE): - Sr. Presidente, ontem, o Bloco de Esquerda, na
Comissão de Trabalho e dos Assuntos Sociais, votou contra as conclusões e o
parecer do relatório que está agora em discussão e basta olhar para essas
conclusões, que foram apresentadas pelo Sr. Deputado Francisco José Martins,
para perceber que elas são, nada mais, nada menos, que um elogio rasgado à
orientação política da proposta que foi apresentada pelo Governo.
Nós não nos revemos nessas conclusões.
Tal como várias organizações e várias entidades que ouvimos na Comissão de
Trabalho e dos Assuntos Sociais demonstraram, este projecto do código do
trabalho não vai simplificar a legislação - pelo contrário, agora faltam 50,
60, 70, mais diplomas para completar o que está expresso no código -, não vai
proteger os trabalhadores portugueses - pelo contrário, vai-lhes retirar
direitos; não faz a transposição daquilo que são as directivas comunitárias, como
por exemplo em matérias de igualdade e não discriminação. Nessa medida, não
responde a nada do que eram os objectivos que, inicialmente, o Sr. Ministro
tinha proposto para este código do trabalho.
No que respeita ao relatório que o Sr. Deputado Francisco José Martins
elaborou, fizemos-lhe ontem um elogio, pois nota-se que o Sr. Deputado
trabalhou afincadamente. Contudo, ele omite matérias que são fundamentais e
omite, principalmente, aquilo que foram as divergências e o contraditório de
opiniões das várias entidades, dos especialistas, dos próprios Deputados da
Comissão de Trabalho e dos Assuntos Sociais. O Sr. Deputado resolveu não
incluir esse contraditório de opiniões no seu relatório, e relativamente a isso
nós criticámo-lo.
E fizemo-lo especialmente quando nesta matéria estava em discussão aquilo que
consideramos serem inconstitucionalidades grosseiras, que foram, aliás,
argumentadas pelo Bloco de Esquerda e pelo PCP, e que o Sr. Deputado também
entendeu não incluir no relatório, tendo feito apenas uma descrição dos
acontecimentos e nunca para ele transpondo aquilo que era a substância da nossa
argumentação.
Ao que parece, as declarações do Sr. Ministro feitas ontem à rádio TSF poderão
estar correctas: terá reconhecido que haverá, de facto, problemas de
inconstitucionalidade relativamente à não reintegração com despedimento sem
justa causa. Se calhar, isto não preocupa o Sr. Ministro, mas preocupa-nos a
nós, e foi nesse sentido que votámos contra as conclusões e o parecer do seu
relatório.

Vozes do BE e do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo,
Sr.as e Srs. Deputados: Tendo em conta o estabelecido no nosso novo Regimento,
penso que um relatório da Assembleia da República tem responsabilidades
acrescidas, uma vez que passa a ser publicado.
Entendemos que, independentemente do trabalho exigente que compete ao relator e
tendo em conta o imenso universo de entidades que foram ouvidas pela Comissão,
é evidente que uma leitura atenta de todos os documentos chegados e que os
imensos depoimentos feitos perante a Comissão não estão de modo algum
reflectidos num relatório que, em nosso entendimento, deveria ser factual.
Desde logo, há aspectos que não são menores e que foram, pura e simplesmente,
ignorados e não foram equacionados neste relatório.
Do ponto de vista da forma, não foram poucos aqueles que, para além do que já
tinha sido debatido em Plenário, alertaram para inconstitucionalidades grosseiras
do diploma que a Assembleia vai ter hoje presente para uma primeira discussão
em Plenário.
Trata-se de problemas graves, nomeadamente, entre outros, os que foram
levantados em relação ao desprezo e ao desrespeito pelo direito à reserva da
vida privada, que é sacrificada ao serviço dos interesses da empresa e do seu
funcionamento.
Este é, seguramente, um relatório que não reflecte algo que é, para nós, da
maior importância. Aliás, todo um conjunto de organizações, não apenas
sindicais (como a CDIM e a Associação Portuguesa de Mulheres Juristas) chamou a
atenção para o facto de não ser aceitável que um diploma com a pretensão de
estar virado para o futuro e de constituir um instrumento importante do ponto
de vista do direito ao trabalho desconsidere, despreze e, pura e simplesmente,
ignore questões fundamentais em relação às quais estamos obrigados, quer por
deveres constitucionais quer por directivas. Refiro-me às questões de género,
da protecção dos direitos das mulheres, direitos sexuais e reprodutivos que,
pura e simplesmente, não têm expressão no diploma que está em discussão,
direitos que foram enfatizados mas não estão reflectidos neste Em nossa
opinião, também não deixa de ser empobrecedor para o relatório (e para o
esforço que o mesmo deveria conter em termos de objectividade) que nele se
ignorem aspectos importantes que se prendem com uma imoral flexibilidade que
foi identificada como um elemento que será factor de instabilidade, de
insegurança e de perturbação social. Estas não são questões menores e, nesse
sentido, foi pena - e é negativo - que não estivessem reflectidas num documento
com esta responsabilidade.

Vozes de Os Verdes e do Deputado do PCP Bernardino Soares: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Francisco José Martins.

O Sr. Francisco José Martins (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro,
Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Uma primeira palavra para
agradecer algumas intervenções simpáticas em relação à minha pessoa, enquanto
relator da Comissão de Trabalho e dos Assuntos Sociais no que respeita à
proposta de lei n.º 29/IX.
Em primeiro lugar, para o PSD é sabido o quanto é importante a figura do
relatório em comissão, quer por privilegiar o debate na própria comissão, quer
pela dignificação desse mesmo trabalho. Por conseguinte, esta é uma inovação
introduzida no Regimento que apoiamos.
Em segundo lugar, estamos a intervir em sede de apreciação do relatório e,
portanto, não devemos - não é esse o nosso propósito - antecipar a discussão de
fundo sobre a matéria concreta que consubstancia esta proposta de lei. Em
momento e em sede própria, isto é, no debate que se segue, teremos muito gosto
e muito prazer em fazê-lo.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Em todo o caso, permitam-me duas ou três notas que me parecem
muito pertinentes.
Há que respeitar as posições do Partido Socialista, do Partido Comunista
Português, do Bloco de Esquerda e de Os Verdes (este último, com certeza por
razões muito especiais, não esteve presente no debate de ontem, em comissão),
mas nós, PSD e PP, temos posições diametralmente opostas, posições que são
interpretadas à luz do próprio relatório e que, na nossa óptica, contribuem
para um contributo valioso, uma mais-valia que, realmente, este código do
trabalho vai trazer para o ordenamento jurídico português, para aquele que é o
quadro legal das relações de trabalho.
É muito importante verificar que há inovação quando se consagra um capítulo dos
direitos de personalidade, no qual se podem incluir direitos já previstos constitucionalmente
e no Código Civil.

Protestos da Deputada do PCP Odete Santos.

Mas, Sr.ª Deputada Odete Santos, há uma mais-valia, que é a preocupação com
a saúde dos trabalhadores!
Também no que se refere às questões do direito à protecção à maternidade e à
paternidade, todos os direitos actualmente previstos na legislação estão
consagrados nesta proposta de lei, onde muitas dessas preocupações são
evidenciadas. Basta uma para o atestar: a preocupação relativamente aos filhos
e a consagração de, numa periodicidade trimestral, o pai ou a mãe faltarem ao
trabalho para irem à escola do filho.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Se estiverem com contrato a prazo vão usar
muito esse direito!…

O Orador: - Já para não falar da questão do trabalho a tempo parcial e do
trabalho suplementar não obrigatório. Tudo isto ajuda a perceber o quanto está
presente nesta proposta de lei a preocupação da conciliação entre as vidas
profissional e familiar.
Permitam-me mais uma pequena nota relativamente à segurança, higiene e saúde no
trabalho. Quando muito se fala e pugna por essa questão, porque não dizer aqui,
com a autoridade do que foram os governos do PSD, que a directiva…

O Sr. Paulo Pedroso (PS): -Na proposta está zero!

O Orador: - Sr. Deputado, lá chegarei!

O Sr. Paulo Pedroso (PS): - No seu relatório está zero!

O Orador: - Tenha calma, vou explicar em 30 segundos!
Como dizia, esta matéria advém de uma directiva de 1989, que foi transposta
para Portugal, e é bom que saibamos que entre 1991 e 1995, durante os governos
do PSD, construiu-se nesta área um verdadeiro e efectivo edifício legislativo,
com a Lei-quadro da Segurança, Higiene e Saúde no Trabalho, com o diploma
relativo ao regime de organização e funcionamento dos serviços de higiene,
segurança e saúde no trabalho…

Protestos do Deputado do PS Paulo Pedroso.

Sr. Deputado Paulo Pedroso, é triste mas foi o seu governo - e fica esta
nota - que entre 1995 e 1999 nada fez sobre esta matéria. E isso agora vai ser
consagrado, evidenciado como uma referência em termos de quadro legal!
Estes são apenas alguns exemplos que evidenciam o que de positivo está
estabelecido nesta proposta de lei, que vai ser, seguramente, um instrumento
indispensável para reforçar a produtividade e melhorar a competitividade das
empresas portuguesas.
Como nota final, permitam-me que refira algo que é significativo,
inquestionável e que ninguém pode pôr em causa: a concertação social como
referencial para as relações de trabalho. O Sr. Primeiro-Ministro, aqui
presente, disse-o muitas vezes: há que privilegiar a concertação em detrimento
da confrontação. Desse modo, conseguiremos um novo normativo que, seguramente,
enriquece o País, interessa aos portugueses e que será muito importante para
todos nós.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, encerrado este período de discussão do
relatório da Comissão de Trabalho e dos Assuntos Sociais sobre a proposta de
lei n.º 29/IX, vamos passar aos pedidos de esclarecimento ao Sr. Ministro da
Segurança Social e do Trabalho Antes, porém, quero assinalar que, havendo no
meu espírito dúvidas sobre a articulação de diversos preceitos do Regimento -
n.º 2 do artigo 154.º e n.º 6 do artigo 158.º -, pedirei à 1.ª Comissão um
parecer sobre a matéria. Tenho dúvidas, sobretudo, de que esta discussão sobre
o relatório exorbite os tempos fixados pela Conferência de Líderes. Digo isto
porque, conforme estabelece o n.º 2 do artigo 154.º, só o tempo atribuído ao
relator é expressamente excluído dos tempos globais de debate distribuídos aos
grupos parlamentares.
Quero apenas assinalar este assunto para que não constitua um precedente sem
mais. Tal como referi, oportunamente pedirei um parecer sobre a matéria à 1.ª
Comissão.
Vamos, então, dar início aos pedidos de esclarecimento ao Sr. Ministro da
Segurança Social e do Trabalho, cabendo o primeiro deles ao Sr. Deputado Telmo
Correia.
Tem a palavra, Sr. Deputado. Dispõe de 3 minutos.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Segurança
Social e do Trabalho, queria começar por sublinhar, entre outras matérias, os
importantes avanços que se fazem em matéria de contratação colectiva e
dizer-lhe, Sr. Ministro, que este código que hoje aqui chega representa uma
vitória indiscutível.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Uma vitória indiscutível, em primeiro lugar, de todos aqueles
que acreditam num Portugal moderno e competitivo!

Vozes do CDS-PP e do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Uma vitória daqueles que acreditam que é possível conciliar mais
flexibilidade laboral com o respeito integral pelos direitos dos trabalhadores!

Vozes do CDS-PP e do PSD: - Muito bem!

O Orador: - E uma vitória daqueles que acreditam que os princípios do
tripartismo e da concertação social são úteis e fazem sentido!

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Exactamente!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Mas, se há uma vitória, também há uma derrota. E a grande
derrota neste processo é a daqueles que sempre procuraram o conflito pelo
conflito!

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - A grande derrota neste processo é a dos profissionais do
protesto e a dos profissionais da greve, ainda que ela seja parcial!

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A grande derrota neste processo é a de todos os que recorreram,
sistematicamente, à demagogia e à falsidade para atacar este mesmo processo!

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Quero dizer-lhe, Sr. Ministro, e recordar aqui claramente, para
que não fiquem dúvidas, que o que aconteceu neste processo, com o PCP e com o
BE, ultrapassou, em variadíssimas circunstâncias, o que é admissível em
democracia no grau de ataque e no grau de insulto ao Ministro do Trabalho!

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Sr. Deputado Bernardino Soares, o meu gabinete fica por trás de uma das
portas desta Sala e, dia sim, dia não, ouço as cornetas de uma carrinha que
passa a gritar na rua: "Bagão lacaio do patrão".

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Uma vergonha!

O Orador: - Mais ainda, Sr. Deputado Francisco Louçã, o vosso grau de
insulto chegou a um nível que não era pensável, um insulto do tipo que lhe vou
mostrar e recordar. Refiro-me ao autocolante do Bloco de Esquerda de apoio à
greve geral.

Neste momento, o orador exibe uma cópia do referido autocolante.

Nele se reproduz aquilo que o Bloco de Esquerda, no seu imaginário
delirante, imagina ser um capitalista que nem no século XIX existia,
reproduzindo o Ministro como se fosse um cão do patrão.
A este grau de insulto não estamos habituados.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Quando o Ministro, que é um homem sério, chega a esta Assembleia com um
acordo firmado com patrões e com sindicatos responsáveis era tempo e hora de os
senhores se retratarem e pedirem desculpa.

Vozes do CDS-PP e do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Esse era o momento e essa era a hora.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o tempo de que dispunha esgotou-se.
Peço-lhe para concluir.

O Orador: - Concluo já, Sr. Presidente. Tenho sido sistematicamente
interrompido, portanto tenho dificuldade em concluir…

O Sr. Presidente: - Não muito, Sr. Deputado. Tenha a bondade de concluir.

O Orador: - Concluo, dizendo que esta é, de facto, uma vitória da
concertação. Era bom que soubéssemos onde ficam, perante esta concertação,
aqueles que, primeiro, diziam que não havia concertação e, depois, que a
proposta é um recuo.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Pergunto-lhe, Sr. Ministro, se considera, como diz o Partido
Socialista, que esta proposta é um recuo ou se, bem pelo contrário, o resultado
final e este acordo tripartido melhoram a proposta inicial. Esta é a questão
que quero deixar-lhe, felicitando-o mais uma vez pela concertação e por uma
reforma que é fundamental para Portugal.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da
Segurança Social e do Trabalho. Dispõe de 3 minutos.

O Sr. Ministro da Segurança Social e do Trabalho: - Sr. Presidente, Sr.
Deputado Telmo Correia, muito obrigado pelas suas palavras e pelo estímulo que
elas representam para o Governo em geral e, em particular, para o Ministro e
Secretários de Estado aqui presentes do Ministério da Segurança Social e do
Trabalho.
Faço apenas o seguinte comentário: neste momento, devemos sobretudo
congratularmo-nos pela vitória de Portugal.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - As calúnias já lá vão - só faz calúnias quem não tem argumentos…

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - … - e sinto-me muito orgulhoso em poder ter sido parte activa
nesta profunda reforma a favor de Portugal, dos trabalhadores portugueses, das
empresas portuguesas e daqueles que procuram emprego. Não caluniem os outros
parceiros sociais que assinaram, também, o compromisso tripartido.

Vozes do PS: - Assinaram?!

O Orador: - Por isso, Srs. Deputados, creio que é Portugal que tem agora um
factor renovado de esperança, de esperança em melhores condições de vida para
os trabalhadores portugueses. Temos um código laboral produtor dessa esperança
e dessa confiança e é em nome desses valores, do personalismo laboral, da
competitividade económica, da coesão e da justiça social que continuaremos a trabalhar.
Nesse sentido, todo o estímulo das bancadas da maioria é, para nós, um grande
elemento de conforto e de alento para prosseguirmos esta batalha decisiva para
Portugal.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Paulo Pedroso pediu a palavra para que
efeito?

O Sr. Paulo Pedroso (PS): - Para uma interpelação à Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Qual é o tema da sua interpelação, Sr. Deputado?

O Sr. Paulo Pedroso (PS): - Sr. Presidente, gostaria de solicitar cópia das
assinaturas do acordo a que o Sr. Ministro se referiu, uma vez que o Sr.
Deputado Telmo Correia também já tinha falado de um acordo tripartido e a única
informação que tenho é a de um comunicado da União Geral de Trabalhadores em
que está escrito o seguinte: "Mesmo com as alterações, a proposta de lei
continua a não merecer a concordância da UGT, tanto por razões de forma como de
conteúdo."
Há algum acordo? Há alguma assinatura? Se houver, peço-lhe o favor, Sr.
Presidente, de disponibilizar às bancadas parlamentares cópia do acordo e das
assinaturas.

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Paulo Pedroso, a Mesa não dispõe desse
documento, mas talvez seja possível esclarecer a sua posição em momento
oportuno do debate.

O Sr. Ministro da Segurança Social e do Trabalho: - Sr. Presidente, peço a
palavra também para uma interpelação à Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro da Segurança Social e do Trabalho: - Sr. Presidente, Sr.
Deputado Paulo Pedroso, o senhor foi Ministro do anterior governo…

O Sr. Patinha Antão (PSD): - Mas não parece!

O Orador: - … e sabe perfeitamente que nunca houve na história da
concertação social portuguesa qualquer acordo escrito sobre um projecto
legislativo.

Vozes do PS: - Não é verdade!

O Orador: - Certamente o Sr. Deputado só leu parte do comunicado que a UGT
tornou público, porque está lá escrito…

O Sr. Paulo Pedroso (PS): - Não é verdade!

O Orador: - Não jogue com palavras, Sr. Deputado. Não jogue com argumentos
formais,…

O Sr. Eduardo Ferro Rodrigues (PS): - Formais?!

O Orador: - … quando sabe perfeitamente que a UGT deu o seu acordo ao que
chamámos compromisso tripartido, que permite para todos uma lei melhor do que a
proposta que inicialmente entregámos no Parlamento.
Isso é que é decisivo e esse é que é o resultado da concertação social.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Antes de dar a palavra ao orador seguinte, quero
assinalar a presença na tribuna dos diplomatas estrangeiros de uma nossa colega
australiana, a Sr.ª Deputada Kelly Hoare, a quem, em nome da Câmara, dirijo uma
saudação muito amiga.
A Sr.ª Deputada, que veio tão longe, do outro lado do mundo, é aqui acolhida
fraternalmente. Muito obrigado pela sua visita.

Aplausos gerais, de pé.

Para pedir esclarecimentos ao Sr. Ministro, tem a palavra o Sr. Deputado
João Teixeira Lopes.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Sr. Presidente, este debate, pelo menos
até ao momento, deu para descobrirmos no Sr. Deputado Telmo Correia uma fulgor
censório que não lhe conhecíamos. O Sr. Deputado decerto não ignorará que as
caricaturas são a livre expressão da criatividade e da interpretação de quem as
faz.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Já me lembrei de o caricaturar.

O Orador: - Provavelmente, o Sr. Deputado Telmo Correia também não apreciará
a Mafaldinha, de Quino, o Calvin & Hobbes, Rafael Bordalo Pinheiro…, mas
isso é uma questão de gosto. Não queira é impor o seu gosto, porque, como sabe,
gostos não se discutem!

Protestos do CDS-PP.

Estão um pouco nervosos! Estão incomodados? Querem censurar a minha
intervenção?

Vozes do CDS-PP: - Não, não!

O Orador: - Muito obrigado.
O Sr. Ministro referiu há pouco que este código do trabalho não quer ser
conotado com a época de 1969, com a época do pós-25 de Abril. Pois dir-lhe-ei
que o senhor falha os encontros com a História e com o tempo.
De facto, Sr. Ministro, este código do trabalho encontra as suas raízes no
século XIX, encontra as suas raízes no período anterior ao modelo social
europeu, que o senhor teve - perdoar-me-á - a coragem de evocar. Este código do
trabalho (ele, sim, uma calúnia para os trabalhadores portugueses) é anterior
ao contrato social que funda as democracias ocidentais tal como hoje as
conhecemos.
Como é que o Sr. Ministro explica tamanha contradição entre o facto de termos
uma empresa, a Auto Europa, em Palmela, que na actual legislação consegue dos
melhores resultados no conjunto das suas empresas a nível internacional,
produzindo mais de 130 000 carros, e que, simultaneamente, a Clarks, em Castelo
de Paiva, feche as suas portas? E fecha as suas portas porque o código do
trabalho não é para ela uma questão decisiva e não é com ele que vai atrair o
"investimento beduíno", o "investimento nómada", que tantos
governos, infelizmente, têm permitido no nosso país.
Sr. Ministro, sabe o que significa para muitos trabalhadores o trabalho para
toda a vida? Significa a impossibilidade de trabalhar durante o resto da sua
vida, porque são demasiado velhos para terem emprego e demasiado novos para
terem reforma.
Perdoar-me-á, mas não é por colocar na sua boca palavras como
"moderno", "competitividade" ou "produtividade"
que o senhor encontra a modernidade. Com este código o senhor arrisca-se a ser
não o árbitro que reclama ser - e isso é uma ofensa a todos os árbitros isentos
e imparciais -, mas, sim, alguém que dribla, que passa a bola para meter o
golo. E ainda por cima faz batota!
Sr. Ministro, este código, ele sim, é uma calúnia aos trabalhadores
portugueses!

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Telmo Correia sentiu-se agravado por o
Sr. Deputado Teixeira Lopes o ter chamado censor. De facto, é uma palavra muita
feia.
Para defesa da honra, tem, pois, a palavra o Sr. Telmo Correia, que me prometeu
ser extremamente breve.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Serei muito breve, Sr. Presidente.
Sr. Deputado Teixeira Lopes, não só não tenho qualquer intuito censório em
nenhuma circunstância como até sou um apreciador de banda desenhada. Só lamento
a sua pretensão de se comparar a alguns dos autores que citou, que são autores
notáveis na banda desenhada.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Deputado Teixeira Lopes, em relação à questão concreta que
está em causa, aquilo que considerei um insulto não tem a ver com o facto de se
tratar de banda desenhada, de um cartoon ou seja do que for. O insulto - repito
- foi a insinuação sistemática de que o Ministro, reproduzido como um cão -
trata-se de banda desenhada de mau gosto, mas esse é problema vosso, pois cada
um tem o seu gosto, como diz -, era o instrumento do patrão. Isso é que é
insultuoso para uma pessoa que consideramos séria.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Pelo contrário, o Sr. Ministro demonstrou, com o compromisso
tripartido, que não esteve ao serviço de ninguém, tendo, ao representar o papel
do árbitro, feito aquilo que deve ser.
Os senhores deviam reconhecê-lo e deviam ter lamentado este tipo de ataques,
este tipo de acusações e este tipo de insultos.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Deputado
Teixeira Lopes.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Sr. Presidente, anoto que o Sr. Deputado
Telmo Correia faz a defesa da honra do Ministro e não a sua própria!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Foi a mim que me chamou censor!

O Orador: - No seu caso, só posso aconselhá-lo a ter sentido de humor em
relação às caricaturas, porque é para isso que elas servem.
No que diz respeito ao teor da caricatura, a sua ingenuidade, Sr. Deputado, é
angelical! O Sr. Deputado acreditará no que diz?! Acreditará que, de facto, o
Sr. Ministro é um árbitro imparcial?! Acreditará que o Sr. Ministro não tem
tomado uma posição por uma das partes?! Acreditará que o Sr. Ministro não está
ao serviço dos interesses mais poderosos e, inclusivamente, mais
"cegos" da economia portuguesa?! O senhor ignorará que todo este
código representa a consagração da vingança sobre o 25 de Abril, que há muito
tempo vêm pretendendo?!

Protestos do PSD e do CDS-PP.

Sr. Deputado Telmo Correia, a sua ingenuidade merecia uma bem humorada
caricatura!

O Sr. Presidente: - Para responder ao pedido de esclarecimento do Sr.
Deputado João Teixeira Lopes, tem a palavra o Sr. Ministro da Segurança Social
e doTrabalho.

O Sr. Ministro da Segurança Social e do Trabalho: - Sr. Presidente, Sr.
Deputado Teixeira Lopes, tenho de reconhecer que o Sr. Deputado não me
insultou, mas ao dizer que nunca fui um árbitro imparcial acabou por fazer um
grave insulto aos parceiros sociais que assinaram o compromisso tripartido.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Quanto às lições de história, muito obrigado. Aliás, o Bloco de
Esquerda sabe de tudo, tem soluções para tudo, nada lhe escapa, tudo o que faz
é bendito, tudo o que os outros fazem é maldito!

Vozes do CDS-PP: - Exactamente!

O Orador: - Só há um problema, é que não têm os votos dos portugueses!

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - A propósito da acusação de que estamos a voltar ao século XIX em
matéria de legislação laboral, eu trouxe a legislação laboral do século XIX,…

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - … que apenas no Código Civil de 1867 consagrava os únicos três
tipos de trabalho existentes na altura do ponto de vista normativo: serviço
doméstico, criados de lavoura e aprendizagem.

O Sr. Patinha Antão (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Curiosamente, já só no século XX, em 1907, mais precisamente no
Decreto Real de 3 de Agosto, é que foi consagrado expressamente o princípio da
obrigatoriedade de um dia de descanso semanal.
Como vêem, obtivemos aqui uma grande lição de história ao comparar-se o código
de trabalho ao século XIX! Palavras mais não são necessárias!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Quanto à questão da Auto Europa, estou de acordo com o Sr. Deputado, que
certamente ouviu com muita atenção a minha intervenção. Eu não disse que este
código de trabalho era uma panaceia para o problema da produtividade, disse que
era uma condição necessária, mas insuficiente. Elenquei uma série de medidas
que também são necessárias, onde estão alguns dos factores de sucesso, de
produtividade da Auto Europa.
Relativamente à Clarks, que aqui focou, e que, como portugueses, solidariamente
todos lamentamos, o que está a acontecer ou pode vir a acontecer aos
trabalhadores nessas circunstâncias, o código do trabalho ainda não tem culpa
disso. Eventualmente, a culpa disso pode ser da legislação laboral que existe,
que os senhores querem que não mude.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado
Rui Cunha.

O Sr. Rui Cunha (PS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, em primeiro lugar,
queria agradecer-lhe por me ter dispensado de lhe formular a primeira pergunta,
visto que já nos esclareceu que não existe nenhum acordo, que, como dizem os
nossos irmãos brasileiros, não há nenhum "papel passado".
O único papel passado que existe é este comunicado da UGT que tenho comigo, do
qual, além do período lido pelo meu camarada Paulo Pedroso, ainda me permito
ler mais dois: "(…) que por isso continuaremos um diálogo com os grupos
parlamentares e com a Comissão de Trabalho e dos Assuntos Sociais da Assembleia
da República, visando a introdução de alterações na especialidade (…)",
"(…) que continua a haver inconstitucionalidades que têm de ser sanadas
(…)".

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - E o resto? Leia tudo! Isso é que é
censura!

O Orador: - Este é o "papel passado". Para tudo o mais não há
"papel passado"!
O Sr. Ministro anunciou, no início da noite do passado dia 8, um conjunto de
propostas de alteração que supomos venham a ser apresentadas pelos partidos da
maioria em sede de especialidade.
Esse anúncio conduziu, por um lado, à situação sui generis de hoje e de amanhã
estarmos a discutir e a votar um "nado morto" e, por outro,
corresponde ao segundo recuo do Governo, o que demonstra claramente o
reconhecimento de que estamos perante uma má proposta de revisão da legislação
laboral.
Mas, Sr. Ministro, queria colocar-lhe algumas questões muito concretas.
Algumas das propostas anunciadas pelo Sr. Ministro, na noite do passado dia 8,
vieram ao encontro de propostas do PS divulgadas na manhã desse mesmo dia.
Queria começar por registar o abandono das alterações que o articulado hoje em
discussão preconizava no que respeita ao regime de faltas que constituem justa
causa para despedimento.
Ao longo das várias intervenções, o Sr. Ministro sempre afirmou a necessidade
de introdução dessas alterações como decisivas no combate ao absentismo e no
aumento da produtividade. Sr. Ministro, ao abandonar estas alterações, ou se
estava perante uma falácia com objectivos que nos escapam - tal como o PS
sempre afirmou - ou o Sr. Ministro decidiu abandonar o combate ao absentismo e
a luta pelo aumento da produtividade. Em que ficamos, Sr. Ministro?
No anteprojecto apresentado em Julho, a duração dos contratos a termo era
praticamente ilimitada. No articulado ora em apreço, e mesmo após a
"operação cosmética" da proposta divulgada no passado dia 8,
constatamos que a duração desses contratos passa de três para seis anos. Sr.
Ministro, gostaríamos de saber o porquê desta obsessão do Governo no aumento da
duração dos contratos a termo. Que movimentações existem na sociedade
portuguesa que conduzam à exigência destas alterações, agravadas ainda pelo
desaparecimento do objectivo da celebração do contrato a termo que actualmente
é exigido?
Sr. Ministro, não me responda com as obras de construção civil que duram mais
do que três anos, porque, para isso, a lei prevê a celebração de contratos por
tempo indeterminado.
Sr. Ministro, não vou cometer a indelicadeza de lhe perguntar se é ou não
sindicalizado, mas, caso seja, o Sr. Ministro aceita que o seu sindicato
prescinda do direito à greve?

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro.

O Sr. Ministro da Segurança Social e do Trabalho: - Sr. Presidente, Sr.
Deputado Rui Cunha, sei que lhe custa muito este acordo, este compromisso
tripartido com a UGT e com a CIP, mas, de uma vez por todas, tem de se perceber
qual é a posição do Partido Socialista: se quer estar do lado da moderação e da
vontade de concertação da UGT ou se quer estar do lado do autismo e do
radicalismo fundamentalista da CGTP.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Parece-nos que está a ser inclinado para o lado da CGTP! É esta a questão
que está, neste momento, aqui, verdadeiramente em causa.
O Partido Socialista tem também de se entender internamente sobre de que lado
quer estar: quer estar do lado da legislação actual ou quer estar do lado do
progresso e da adaptação? É que basta ler algumas declarações de anteriores
responsáveis socialistas, quer como Ministros ou Secretários de Estado, quer,
agora, como Deputados, para se perceber que, de facto, nós viemos ao encontro -
creio eu - daquilo que o PS sempre pensou. Por exemplo, Paulo Pedroso dizia há
algum tempo: "É fundamental que os parceiros sociais exprimam, através de atitudes
negociais, o desejo de participar de forma responsável neste processo,
evidenciando disponibilidade para se adaptarem às condições impostas pela
modernidade, quer explorando novas possibilidades que se lhe oferecem, quer
partilhando solidariamente os riscos e os problemas que se lhe colocam."
Portanto, vamos ver de que lado querem estar.
Por outro lado, se algumas propostas constantes do compromisso tripartido vão
ao encontro do PS, então porque é que não vão votar a favor desta proposta de
lei?
Quanto ao recuo, é interessantíssimo que o PS, que se julgava o pai monopolista
da concertação… Aliás, na minha perspectiva, o PS entende o diálogo como um fim
e não como um meio para atingir objectivos! O que o PS nunca pensava é que nós
fossemos capazes de concertar! O Sr. Deputado Ferro Rodrigues, em 26 de Junho,
dizia a um jornal que o que o Governo procurava era a busca do confronto pelo
confronto, mas agora, que negociámos, que acordámos, considera que são recuos,
cedências! Afinal, onde é que o PS fica? Queixou-se do défice da concertação,
agora queixa-se de que são um excesso os seus resultados!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Quanto às questões que me colocou relativas às baixas, ao absentismo, penso
que este é um aspecto que nos deve unir a todos, em nome da justiça, em nome da
responsabilidade, em nome do progresso. Certamente que não é por passar de
quatro para cinco, ou de oito para dez, novamente, que estão em causa os
fundamentos desta reforma laboral. Sabe isso perfeitamente!

O Sr. Rui Cunha (PS): - Foi o que sempre dissemos!

O Orador: - Então, estamos de acordo!
Mas ouviu-me dizer que o combate ao absentismo era fundamental, não me ouviu
dizer que esta norma era fundamental para combater o absentismo! Isso é uma
coisa completamente diferente.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Quanto aos contratos a termo, nós não temos nenhuma obsessão; nós firmámos
um compromisso, um compromisso com parceiros responsáveis, em nome de valores
que podem unir-nos. Estas medidas não se trataram de operações de cosmética. Aliás,
a expressão "operações de cosmética" tem sido a bandeira das críticas
da CGTP a este compromisso tripartido. Mais uma vez, parece-nos que PS está
claramente a tender para o campo em que também a CGTP se move nesta matéria,
que não é o da cultura da negociação, que sempre disseram defender, mas o da
cultura da pura confrontação.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª
Deputada Ana Manso.

A Sr.ª Ana Manso (PSD): - Antes de mais, Sr. Ministro, quero felicitar V.
Ex.ª pela coragem política e espírito reformador, muito especialmente pelo
excelente trabalho que fez em sede de concertação social. V. Ex.ª, Sr.
Ministro, provou que a concertação e a justiça social não são monopólio da
esquerda.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - A proposta de lei que hoje debatemos nesta Câmara é o resultado
de um longo processo negocial em que a cultura de concertação e de diálogo foi
praticada, e praticada mesmo para decidir e não, como era hábito, para só
adiar. Hoje debatemos uma proposta de lei que resulta de um processo
verdadeiramente participado, direi mesmo, como disse o Sr. Ministro, o mais
participado desde o 25 de Abril, nos espaços e tempos da comunicação social,
nos artigos de opinião, na informação televisiva, nos colóquios e debates
públicos, nas consultas e nas horas de concertação formal, quer do Governo,
quer da comissão parlamentar. Foi uma verdadeira maratona para uma verdadeira
reforma de fundo das leis laborais.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Por isso, hoje, mais ainda do que ontem, são justos e fazem
todo o sentido os reconhecimentos e os elogios dos mais variados quadrantes,
desde o Governador do Banco de Portugal, Dr. Victor Constâncio, que é
insuspeito, penso eu, para a bancada socialista, desde o Presidente do Conselho
Económico e Social, Prof. Silva Lopes, ao tão falado acordo tripartido
celebrado entre o Governo, a UGT e a CIP. São sinais claros, Sr. Ministro, de
que quando tudo muda à nossa volta nós também temos de mudar e não devemos
ficar agarrados a um passado de preconceitos ideológicos que em nada beneficia
os trabalhadores, porque em nada beneficia a economia e o desenvolvimento
social e a criação de novos empregos.
O pior é vermos dirigentes do maior partido da oposição, que tiveram grandes
responsabilidades nesta área, utilizarem o tempo de antena de uma central
sindical para apoiarem uma greve, dita geral, em vez de proporem uma mudança
que eles próprios deviam ter tido a coragem de realizar, evitando assim a
pesada herança e o marasmo em que nos deixaram.
Mas, Sr. Ministro, o esforço valeu a pena: com esta proposta de lei, Portugal
fica ao nível dos seus parceiros europeus, ganha competitividade e atrai
investimento. E fica também com um instrumento que lhe permite a revitalização
da contratação de trabalho, a flexibilização e a maior adaptabilidade das
relações de trabalho, o combate ao absentismo, no caminho claro do reforço dos
interesses dos trabalhadores, da segurança do emprego, do primado da qualidade
e do bem-estar das famílias. Este é, de facto, o verdadeiro alcance da proposta
de lei: reforçar os interesses dos trabalhadores e dos mais desfavorecidos e
dinamizar a economia portuguesa, proporcionando mais postos de trabalho.
Por isso, é com estranheza que continuamos a ver o maior partido da oposição,
inibido, tímido e hesitante, ficar de fora deste processo de mudança e
colocar-se ao lado do Partido Comunista e do Bloco de Esquerda no apoio à CGTP.
É precisamente sobre o equívoco dessa posição que gostaria de colocar a V.
Ex.ª, Sr. Ministro, algumas questões.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, o seu tempo esgotou-se. Tem de concluir.

A Oradora: - Vou já terminar, Sr. Presidente.
Sr. Ministro, em que medida esta proposta de lei do código do trabalho se
integra no modelo social e europeu? De que modo países como a Alemanha, a
França, a Inglaterra, os Estados Unidos da América evoluíram a nível da
contratação a termo, a nível do trabalho nocturno e da contratação colectiva?
A nível da protecção da família, e sabendo das verdadeiras preocupações de V.
Ex.ª, Sr. Ministro, em que medida esta proposta de lei traduz e reforça os
actuais direitos da família e nos aproxima, também nesta área, do modelo social
europeu?

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da
Segurança Social e do Trabalho.

O Sr. Ministro da Segurança Social e do Trabalho: - Sr. Presidente, desejo
começar por agradecer as palavras, o estímulo e o apoio da Sr.ª Deputada Ana
Manso, que para nós são importantes para continuarmos, com convicção, a
defender estas ideias.
Partindo do princípio de que o Governo não trabalha para a simpatia mas
trabalha para o progresso, é nesse sentido que nos movemos e é nesse sentido
que procurámos encontrar, através do Código do Trabalho, a expressão de uma
reforma laboral que nos aproximasse do modelo social europeu. É no modelo
social europeu, património importante da cultura ocidental e europeia, que
continuamos a apostar, não na americanização, como ouvi ao longo destes meses, crítica
essa certamente de quem não sabe como é que se separa e se distingue o mercado
americano de trabalho do mercado de trabalho europeu.
Evidentemente, como eu também disse na minha intervenção inicial, não se trata
de um pronto-a-vestir, trata-se de procurar adaptar o modelo laboral ao nosso
tecido económico, ao nosso tecido empresarial, ao estádio de desenvolvimento
das qualificações, a uma série de factores que, naturalmente, condicionam a
solução que deveremos ter em conta.
Em relação às perguntas que me colocou, designadamente as referentes ao
trabalho nocturno e à protecção à família, posso-lhe dizer que, mesmo assim,
Portugal fica aquém do que se passa noutros países. Por exemplo, em Inglaterra,
é considerado trabalho nocturno o efectuado entre as 11 horas da noite e as 6
horas da manhã; em Espanha, entre as 10 da noite e as 6 da manhã; na Alemanha,
entre as 11 da noite e as 5 da manhã. E podia citar mais casos. Apesar de tudo,
a nossa situação é de maior equilíbrio entre os diferentes factores em jogo e,
desse equilíbrio, creio, nasce uma solução boa para o País.
Quanto à protecção à família, creio que avançámos em aspectos importantes, não
só no aumento da licença de paternidade no caso da morte da mãe após o parto,
não só no aumento de seis para doze meses do período de trabalho a tempo
parcial para licença relativamente à assistência de filhos até seis anos de
idade, não só na consideração de faltas justificadas até quatro horas por cada
trimestre para os pais poderem ir à escola saber do aproveitamento escolar dos
seus filhos, como na protecção às grávidas e às puérperas, designadamente
alargando o período de interdição de trabalho extraordinário, de trabalho em
horas nocturnas ou em situações laborais mais agressivas.
Trata-se apenas de exemplos de que considerámos como um aspecto determinante do
desenvolvimento da nossa reforma laboral e social a conciliação entre a família
e o trabalho .

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado
Jerónimo de Sousa.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, gostaria de
começar por uma questão que considero central neste debate. É que houve da sua
parte, na sua intervenção, um tremendo e propositado equívoco sobre o que
estamos aqui a discutir: é na base da proposta de lei n.º 29/IX, partindo dos
direitos consagrados e garantidos actualmente no edifício jurídico-laboral, ou
estamos apenas a discutir um projecto ou um anteprojecto que, durante o seu
percurso, foi sofrendo evoluções, que não quero classificar? Naturalmente, se
fôssemos por esse caminho, que tentou induzir em erro esta Assembleia, nós
seríamos um pouco confrontados com aquela concepção, mais ou menos sádica ou
sinistra, que alguns têm ao dizerem que quando um automobilista atropela alguém
essa pessoa podia ter morrido, mas, afinal, quando muito, ficará com os braços
partidos! Creio que esta é uma questão central. E é por isso que o Sr. Ministro
não foi ao concreto, deu - passe o termo, e sem ofensa - umas "lambuzadelas"
naquilo que lhe parece ser agradável de ouvir.

Mas passemos, então, ao concreto: pode chamar-se código do trabalho a uma
tentativa de passagem de cheque em branco, já que há 40 matérias que vão
precisar de regulamentação posterior?!
Segunda questão: naturalmente, não quer só um cheque em branco, quer também um
cheque assinado por esta Assembleia! É ou não um facto que os contratos a prazo
passam de três para seis anos? É ou não um facto que o trabalho nocturno passa
das 8 para as 10 horas da noite, com todo o benefício que isto dá às empresas?
É ou não um facto que retoma a velha questão das pausas, procurando novamente
prejudicar os trabalhadores? É ou não um facto que, pela via da mobilidade
funcional e geográfica, se tenta transformar o trabalhador em "pau para
toda a obra", com a polivalência negativa que muitas empresas reivindicam?
E é ou não um facto que, com esta proposta de lei, se dá poder discricionário à
empresa para organizar e regulamentar o tempo de trabalho, que pode ir até 50
ou 60 horas/semanais?

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Exactamente!

O Orador: - Quanto aos direitos colectivos, é ou não verdade que este
Governo pretende, por exemplo, cortar em metade o crédito de horas às comissões
de trabalhadores? É ou não verdade que, pela chamada cláusula de paz social, a
que eu chamaria mais "paz de cemitério", através dos serviços mínimos
que tentam inculcar nos trabalhadores, o direito à greve fica de facto
mutilado? E é ou não verdade que, em relação a um direito fundamental, que é a
contratação colectiva, através de um miraculoso conceito de critérios de
aferição da representatividade, uma organização sindical de vão de escada,
representando 5% dos trabalhadores do sector, ou tendo 1500 associados, ou
sendo filiada num dos parceiros da concertação social, ou tendo uma situação
económica mais ou menos estável, pode liquidar e substituir contratos
colectivos que estão em vigor?

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se. Peço-lhe para
concluir.

O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente, dizendo o seguinte: creio que,
fugindo a estas questões concretas, o Sr. Ministro está a tentar induzir esta
Assembleia num erro.
Estamos a discutir uma questão muito séria! Não se trata nada de modernidade,
trata-se de retrocesso!
Sr. Ministro, já que não está cá o Sr. Primeiro-Ministro, lembro-o de que,
aquando da discussão do Programa do Governo, dizia que, para que as
multinacionais não fugissem do nosso país, era necessário rever e cortar
direitos dos trabalhadores. Afinal, estão a tentar cortar direitos, e as
multinacionais vão embora na mesma!

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da
Segurança Social e do Trabalho.

O Sr. Ministro da Segurança Social e do Trabalho: - Sr. Presidente, Sr.
Deputado Jerónimo de Sousa, agradeço-lhe as questões que colocou.
O Sr. Deputado referiu-se ao balanceamento entre modernidade e retrocesso. Tem
razão! No fundo, o que nos separa é o futuro e o passado, e os senhores
continuam a alimentar-se do passado.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - São maus os direitos existentes?!

O Orador: - Continuam a alimentar-se do passado, porque não conseguem
perceber que tudo mudou à nossa volta e que a situação geopolítica, económica e
social da Europa em 2003 não é a de 1975, de 1980 ou de 1990.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Portanto, tem de se cortar nos direitos!

O Orador: - Não, Sr. Deputado, é preciso adaptarmo-nos aos novos desafios,
como estão a fazer os países do antigo bloco comunista, que vão integrar a
União Europeia.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Com belos resultados!

O Orador: - Sr. Deputado, eu gostaria que verificasse a legislação da
Eslovénia, da Hungria, da República Checa, da Eslováquia, da Polónia e que,
depois, nos dissesse como é que conseguiria sobreviver fora desse contexto.

Protestos do PCP.

Afinal de contas, que soluções é que os senhores apresentam ao País?! Para
além dos habituais chavões, que soluções é que apresentam ao País? Digam-nos!
Fechavam as fronteiras?! Aumentavam os salários, sem aumentar a produtividade?!
Decretavam legislativamente a sobrevivência das empresas e a manutenção dos
postos de trabalho?! Preferem conviver com fingimento?! Preferem conviver com
uma realidade artificial e administrativa?! Ou, perante os desafios e as
dificuldades, enfrentá-los com mudanças, com sentido reformista e de
equilíbrio, que é o que pretendemos com este código do trabalho?

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Depois, o Sr. Deputado disse que laborávamos num equívoco.
Devolvo-lhe a crítica, Sr. Deputado, porque os senhores também laboram num
equívoco, que resulta sempre na seguinte reacção: o Partido Comunista Português
está sempre ao lado da contestação (e consequentes greves) quando se fala na
palavra "mudança".

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Para pior já basta assim!

O Orador: - É uma palavra de que os senhores não gostam.

Protestos do PCP.

Não gostam! Não sabem conviver com as palavras "mudança",
"renovação". Não sabem! Sentem-se mal!

Protestos do PCP.

E, ironia das ironias, os senhores apoiaram uma pseudo greve geral para
defender uma legislação, relativamente à qual também foi feita greve, com o
vosso apoio, em 1989.

De acordo com o código do trabalho, que vai ser revisto daqui a quatro anos,
certamente muitos de nós estarão aqui, ou noutro sítio, para, nessa altura,
verificar que os senhores estarão na primeira trincheira a defender este código
do trabalho, que agora tanto diabolizam!

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (Luís Marques Mendes): -
Exactamente! É sempre assim!

Protestos do PCP.

Sobre o código do trabalho, falou-se de uma regulamentação, referindo-se até
60 matérias… O Sr. Deputado foi mais comedido, pois já só falou em 40 matérias
que precisam de regulamentação - matérias em relação às quais, aliás, nos
comprometemos (e isto está, por exemplo, no comunicado da UGT) a discutir com
os parceiros sociais em concertação social, porque, para nós, isto é uma
prática, não é uma pura liturgia.
Sr. Deputado, não se esqueça que, com este código do trabalho, são revogados
mais de 70 diplomas - esta parte esqueceu-se de referir! E para regular as 40
matérias, que são artigos individuais, não é preciso 40, 70, 80 diplomas, como
aqui foi dito, bastam apenas 2 ou 3 diplomas!

Protestos do PCP.

Srs. Deputados, não se preocupem!

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, peço-lhe para concluir, pois o seu tempo
esgotou-se.

O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente.
Srs. Deputados, não se preocupem com a forma. Discutam a substância, com
argumentos sérios, com argumentos credíveis.

Vozes do PCP: - Isso fazemos nós!

O Orador: - Se assim for aqui estaremos para discutir as diferenças a que
todos temos direito.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Protestos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª
Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, o Sr. Ministro pode, ou
não, indignar-se com as perguntas, mas a verdade, incontornável, é que,
independentemente das palavras que utiliza, ou explica exactamente onde está a
modernidade que diz fazer parte da proposta de lei, onde está o humanismo, onde
estão os direitos, ou, manifestamente, não consegue explicá-la aos Deputados da
oposição - e não é com agressividade que o consegue - com as respostas que tem
dado e com as que tem omitido. Isto porque a questão é que temos uma lei injusta
e, sobretudo, uma modernidade feita com o desprezo pelos direitos das pessoas,
que são consideradas meras coisas, que se usam, que se mexem como peças de
xadrez e que são ignoradas, como se o trabalho fizesse esquecer a dimensão
social e ética.
Esta foi a sua escolha. É legítima! Não diga é que isto é uma visão humanizada.
Aliás, pergunto-lhe, Sr. Ministro, que visão humanizada é esta de uma sociedade
e de uma lei do trabalho que consegue fazer propostas que aumentam os horários
de trabalho, que alteram significativamente a vida das pessoas, que modificam
radicalmente a forma de organização familiar, que impõem, sem escolhas,
mobilidade e transferências de zonas de trabalho, que alteram e provocam uma
verdadeira desordem na vida familiar? Que humanidade é esta?! Que protecção é
que o Sr. Ministro pretende arrogar-se em relação à família, quando esta lei
penaliza claramente a protecção às crianças, a maternidade, a escolha de alguém
que queira ser mãe e que, pura e simplesmente, vai significar um recuo imenso
no papel das mulheres, que, no nosso País, é extremamente importante no mundo
laboral?!
Que modernidade é esta, Sr. Ministro, que retrocede, que limita a possibilidade
do direito à greve e que, de forma grosseira, cerceia e invade a privacidade
dos trabalhadores, a pretexto de esse ser o interesse das empresas, e fá-lo de
forma extremamente grave em relação às mulheres?! Que sentido de modernidade é
que existe quando se desregula aquilo que é elementar numa relação de trabalho,
que é a possibilidade de contratação colectiva?!
Sr. Ministro, que equidistância é a sua quando alguém faz batota e brinca ao
faz-de-conta, ignorando toda a evolução do direito do trabalho, a qual não pode
ignorar a imensa desigualdade das partes envolvidas?!
Não vale a pena o Sr. Ministro esconder que tomou o partido dos mais fortes; o
que importaria, além do mais (isto é uma evidência), é que não se fizesse de
conta que todos não entendemos que, em matéria laboral, entre empresários e
trabalhadores há uma imensa e abismal diferença, uma desigualdade de poder,
que, pura e simplesmente, de forma desumana, esta lei ignora!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da
Segurança Social e do Trabalho.

O Sr. Ministro da Segurança Social e do Trabalho: - Sr. Presidente, Sr.ª
Deputada Isabel Castro, em primeiro lugar, devo dizer que a ouvi com toda a
atenção, mas, certamente, não leu a proposta de lei, porque, se a tivesse lido,
não teria dito nada do que disse.

Vozes do PSD: - Exactamente!

O Orador: - Até parece que a sua ideologia é cada vez mais a demagogia!
Falou nas questões da maternidade, dos direitos de personalidade e de uma série
de coisas com os slogans habituais, de que tratamos as pessoas como peças de xadrez
- vejam bem, a UGT a considerar que, no compromisso tripartido, tratamos as
pessoas como peças de xadrez, por exemplo! Esta é a primeira constatação.
Recomendo à Sr.ª Deputada que, pelo menos, leia com mais atenção o que está
escrito na proposta de lei e não aquilo que gostaria de ver lá escrito.
Em segundo lugar, a Sr.ª Deputada também deve andar muito distraída. A Sr.ª
Deputada diz que eu tenho fugido aos debates… O Governo tem fugido aos
debates?! Na concertação social estivemos mais de 130 horas! O

Sr. Primeiro-Ministro foi a três reuniões! O Sr. Secretário de Estado esteve
presente em todas as reuniões! Eu estive presente na maior parte delas!
Participámos em 130 debates, com parceiros sociais, empresariais, sindicais,
universitários, da sociedade civil! Viemos a todas as solicitações deste
Parlamento.
Temos fugido ao debate?! A Sr.ª Deputada, de facto, além de não ter lido com
atenção a proposta de lei, anda bastante distraída!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado
Álvaro Castello-Branco.

O Sr. Álvaro Castello-Branco (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da
Segurança Social e do Trabalho, como todos bem sabemos, as convenções
colectivas são fonte de direito do trabalho, porque permitem a regulação de
normas jurídicas, e, apesar da sua origem convencional, elas operam como leis
em sentido material, o que é de extrema importância para efeitos de
incorporação nos contratos e de aplicação no tempo.
As convenções colectivas vigoram numa dinâmica partilhada entre trabalhadores e
empresas e devem ter, necessariamente, um horizonte temporal limitado, limite
este que se opera na actual lei pela substituição por outro instrumento de
regulação colectiva. Leva isto, actualmente, a situações de bloqueio, que, na
prática, se traduzem na impossibilidade de modificar determinadas disposições
já completamente obsoletas.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Era urgente, Sr. Ministro, modificar este sistema, permitindo
uma verdadeira revitalização e dinamização da contratação colectiva.
Neste sentido, Sr. Ministro, pergunto-lhe: prevê V. Ex.ª, e como, que esta
situação da contratação colectiva poderá evoluir com a entrada em vigor deste
novo código do trabalho?

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - O Sr. Ministro fez saber à Mesa que, por limitações de
tempo, responderá a blocos de três oradores.
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Drago.

A Sr.ª Ana Drago (BE): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, este debate tem de
facto demonstrado que quem quer que tenha entregue este projecto de proposta de
código do trabalho ao Governo encontrou no Sr. Ministro Bagão Félix o melhor
advogado.
Na verdade, o Sr. Ministro tem-se batido por esta proposta de lei, cuja origem
não sabemos exactamente qual é - e não vale a pena o Sr. Ministro tentar dizer
que foi o seu gabinete que elaborou esta proposta, porque mesmo os juristas que
concordam com a orientação política do Governo, até hoje, sempre disseram que
em 3 ou 4 meses não seria possível organizar uma proposta deste tipo e que ela
não nasceu da antiga Comissão de Análise e Sistematização da Legislação
Laboral. E, portanto, este é um dado assente.
E o Sr. Ministro tem, de facto, sido o melhor advogado, quase como um D.
Quixote, que batalha por esta orientação política, de precarizar a relação de
trabalho em Portugal. É verdade que está auxiliado pelo Sr. Secretário de
Estado que… Enfim, não vou comparar o Sr. Secretário de Estado com o Sancho
Pança, que acompanhava D. Quixote, porque o Sr. Secretário de Estado é
demasiado magro e nunca soube colocar as perguntas certas, que Sancho Pança
colocava, ao longo deste processo.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

Mas a verdade é que o Sr. Ministro era conhecido em Portugal como o D.
Quixote da defesa dos valores tradicionais da família.

Vozes do CDS-PP: - Olha quem fala de família!

A Oradora: - E, apesar do que disse hoje - e peço-lhe, por favor, que não
procure dizer que eu não li a proposta de lei, como tem, aliás, acusado o
Partido Ecologista "Os Verdes" e como acusou ontem o Partido
Socialista, aos microfones da TSF -, o Sr. Ministro tem de facto lutado contra
vários moinhos de vento,…

Protestos do PSD.

… mas, na realidade, este projecto de código do trabalho desprotege a
família. Este projecto de código é omisso no que toca aos subsídios que
permitem o gozo de licenças parentais e de licenças especiais para assistência
a filhos e adoptantes. Esta proposta de lei permite que os trabalhadores
trabalhem até 60 horas/semana, 12 horas/dia. Esta proposta de lei permite que a
contratação a prazo se estenda até seis anos e, no caso dos jovens à procura do
primeiro emprego, até sete anos e meio.
Como é que o Sr. Ministro consegue justificar isto como uma defesa da vida
pessoal e uma defesa dos valores da família?! Acho difícil! Aliás, devo
lembrar-lhe que a Comissão Nacional Justiça e Paz, da qual o senhor foi
Presidente, há poucos dias, afirmou que este projecto de código é imoral e
"um factor de agressão à própria família".

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - Não peço que justifique aquilo que é injustificável. Não peço
que me diga que este projecto defende a família e a vida pessoal quando sabemos
que não defende.
Mas o que gostava de lhe perguntar verdadeiramente, Sr. Ministro, é se V. Ex.ª
quer ficar para a História como o paladino de um modelo de sociedade assente
numa família desestruturada e em pais ausentes, como o governante que disse aos
jovens portugueses para desistirem da ideia de fazer planos para o futuro e de
constituir família,…

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Olha quem fala de família!

O Orador: - … porque os tempos não estão de feição.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado
Patinha Antão.

O Sr. Patinha Antão (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Segurança
Social e do Trabalho, a questão que gostava de lhe colocar é a colocada pelo
cidadão comum.
Já tivemos, ao longo deste debate, com registos humorísticos vários, diversos
estilos de discurso, entre os quais o da menina Cunegundes,…

Risos.

… mas, agora, examinando o problema do código do trabalho e das matérias
adjacentes aos olhos do cidadão comum, há uma matéria, Sr. Ministro, que ainda
não foi focada, que é a circunstância de o Governo ter anunciado, há meses, que
pretendia elaborar uma lei de bases da formação profissional.
Ora, aos olhos do cidadão comum, isto pareceu algo surpreendente, desnecessário
até, porque o cidadão comum, entre 1996 e 2001, ouviu dizer que estávamos a
preparar-nos para a Europa do conhecimento, que estávamos a viver uma paixão
pela educação e que estávamos a apostar todo o investimento na riqueza das
pessoas, na sua formação. E o resultado qual foi? O cidadão comum veio a saber,
através da OCDE, do Fundo Monetário Internacional, da União Europeia e do Banco
de Portugal que, afinal, houve rios de dinheiro gastos em formação profissional
e nada aconteceu, porque Portugal continuava na cauda da Europa e, sobretudo,
os trabalhadores mais idosos continuavam com taxas de analfabetismo de 9%, com
problemas graves de iliteracia. Afinal, a formação profissional não foi para
esses trabalhadores. E para os jovens? Para estes ainda houve alguma, mas,
mesmo assim, foi pouca. E o cidadão comum começou a perguntar: mas, afinal, o
que é que fizeram os outros países neste período? Como é que estamos na
comparação com os países europeus, para valores médios e para valores de
excelência? Estávamos na cauda da Europa.
Por isso, o cidadão comum, Sr. Ministro, percebeu a urgência de uma lei de
bases da formação profissional. Era necessário resolver um problema que o
governo anterior tinha descurado. Mas o governo anterior tem nomes. O
ex-Primeiro-Ministro que deixou o governo e os seus Ministros do Trabalho, que
têm assento aqui na primeira fila - os Srs. Deputados Eduardo Ferro Rodrigues e
Paulo Pedroso -, foram os autores da formação profissional que o País teve até
agora.
O cidadão comum, Sr. Ministro, ouviu também o seguinte: o modelo económico está
esgotado: existem salários baixos… É necessário com urgência suprir isto. Ora,
aos olhos do cidadão comum parecia que a formação profissional seria a arma por
excelência para fazer isso. O cidadão comum percebeu hoje que a formação
profissional feita por VV. Ex.as foi um desastre, um fracasso - e isto foi dito
por todas as instituições internacionais -, e também percebeu que o novo
Governo tem de fazer o que os governos do PS não fizeram muito mais depressa e
com muito mais eficácia.
Outra coisa que o cidadão comum vai perceber é que o código do trabalho, na sua
vertente de modernidade e nas suas mudanças, vai ter um contributo
importantíssimo para estimular o espírito empreendedor e de inovação e vai
perceber que isto é essencial para ganhar um resultado maior com a formação
profissional.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, peço-lhe que termine, pois já esgotou o
tempo.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Sr. Ministro, a formação profissional e o código do trabalho vão andar
paredes-meias para termos, efectivamente, um futuro.
É sabido que, no compromisso com os parceiros sociais, o desenvolvimento das
intenções do Governo, já anunciadas no código do trabalho, foi uma pedra
fulcral para o compromisso, por isso pergunto-lhe: os parceiros sociais
sentiram a responsabilidade e a urgência de suprir a falta do anterior governo
nesta matéria? E, se assim foi, gostaria que nos dissesse e desenvolvesse quais
são os elementos desse compromisso que, efectivamente, permitem que deixemos o
passado onde está, que é um passado que não nos entusiasma,…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, tem de concluir.

O Orador: - … e entremos em sede do futuro com responsabilidade e com uma
nova visão da concertação social.

O Sr. Paulo Pedroso (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Foi por ter sido membro do governo!

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Paulo Pedroso (PS): - Sr. Presidente, fui pessoalmente visado como
culpado de uma suposta omissão, que pode ser facilmente corrigida, repondo a
verdade dos factos.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Paulo Pedroso - desculpe-me -, acha que
isso é um motivo…

O Sr. Paulo Pedroso (PS): - Sr. Presidente, é para exercer o direito
regimental da defesa da honra e consideração.

O Sr. Presidente: - … de agravo?

O Sr. Paulo Pedroso (PS): - Acho, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Se acha, dou-lhe a palavra, mas peço-lhe que seja breve.

O Sr. Paulo Pedroso (PS): - Sr. Presidente, serei muito breve.
Quero dizer ao Sr. Deputado Patinha Antão que, em 17 anos, desde a nossa adesão
à União Europeia, a pasta da formação profissional foi gerida durante 11 anos
por pessoas do PSD ou do CDS-PP. O Sr. Deputado ignora, mas eu recordo-lhe que
durante 3 desses 11 anos esta pasta foi gerida pelo Sr. Ministro Bagão Félix.
Mas quero, sobretudo, prestar homenagem aos governantes do PSD, que, em 1990,
celebraram o primeiro acordo com todos os parceiros sociais - …

Aplausos de Deputados do PSD.

… era, aliás, Secretário de Estado o Dr. Bagão Félix -, porque desse acordo
resultou aquilo que o Sr. Deputado ignora que existe: a existência, em anexo,
de uma lei-quadro da formação profissional que ainda hoje está em vigor.
Portanto, Sr. Deputado, não há culpados de uma omissão em relação a uma lei que
existe e que nos empenharemos em revogar.

O Sr. Eduardo Ferro Rodrigues (PS): - Há omissão de conhecimento!

Vozes do PS: - Exactamente!

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Deputado
Patinha Antão. Peço-lhe também que seja breve.

O Sr. Patinha Antão (PSD): - Sr. Presidente, serei brevíssimo.
De facto, o Sr. Deputado Paulo Pedroso tem dificuldades em gerir com humildade
o resultado da vossa actividade.

Risos do PS.

VV. Ex.as não podem ignorar que, durante os seis anos em que estiveram no
governo, anunciaram ao País - lembro-me bem - que iriam fazer uma convergência
rápida para os níveis de qualificação profissional. Todo o País sabe! E sabe
qual é o resultado, Sr. Deputado? Efectivamente, tal como V. Ex.ª diz, é
necessária uma nova lei de bases da formação profissional…

O Sr. Paulo Pedroso (PS): - Ai agora já é nova!

O Orador: - … para fazer aquilo que é correcto, que é um programa eficaz e
urgente para dar a qualificação profissional que os trabalhadores portugueses
precisam para terem segurança no emprego e outro optimismo em relação ao futuro
e poderem, efectivamente, sentir que vale a pena ter um Governo que olha para
as preocupações essenciais dos trabalhadores e não um governo que, quando teve
dinheiros a rodo, fez aquilo que VV. Ex.as fizeram.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para responder aos pedidos de esclarecimento formulados
pelos Srs. Deputados Ana Drago, Álvaro Castello-Branco e Patinha Antão, tem a
palavra o Sr. Ministro da Segurança Social e do Trabalho, dispondo, para o
efeito, de 5 minutos.

O Sr. Ministro da Segurança Social e do Trabalho: - Sr. Presidente, Srs.
Deputados, muito obrigado pelas questões que me colocaram.
Permitam-me que comece por agradecer a recordatória do Sr. Deputado Paulo
Pedroso, pela qual, aliás, se verifica que eu, há 12 anos atrás, já era capaz
de, no governo, contribuir para a celebração de acordos com os parceiros
sociais.

O Sr. Paulo Pedroso (PS): - É verdade!

O Orador: - Portanto, essa cultura de concertação é bem visível, faz parte
do meu ADN, faz parte do meu código genético.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Relativamente à pergunta do Sr. Deputado Álvaro Castello-Branco, creio que
um dos objectivos fundamentais do código do trabalho é revitalizar a
contratação colectiva. Não vou ter tempo para explicar o que está previsto, mas
posso dizer-lhe que é muito mais favorável do que, por exemplo, existe em
Espanha, na Alemanha ou na França.
Mas o que quisemos dizer com isto foram, sobretudo, duas coisas: primeiro, a
sede fundamental de formação da vontade das partes no mercado de trabalho deve
ser a contratação colectiva e não as normas do direito positivo; segundo, as
convenções colectivas são um elemento determinante para a adaptação às mudanças
que constantemente vão existir ao longo dos próximos tempos. E, às vezes,
custa-me ver criticado este objectivo e os meios encontrados, quando, por
exemplo, durante os últimos seis anos, o Partido Socialista conviveu
alegremente com o bloqueio, a "eutanásia", da contratação colectiva.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Quanto às questões da Sr.ª Deputada Ana Drago, não sei se a sua
vasta experiência no domínio do trabalho nas empresas…

Risos.

… lhe permite falar com tanta certeza, saber tudo, sobre aquilo que é a
realidade empresarial e do mercado de trabalho. Mas, dando de barato isso,
creio que a uma coisa a Sr.ª Deputada, de facto, não estava habituada e não
esperava: depois de anos de letargia, não esperava que o Governo trabalhasse
tão bem e depressa. Não estava habituada!

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Pois não!

O Orador: - Mas, de facto, trabalhamos muito. Tem de acompanhar o nosso
ritmo, Sr.ª Deputada! Tem de acompanhar o nosso ritmo.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - No que se refere aos valores tradicionais da família, a Sr.ª
Deputada falou, por exemplo, em subsídios parentais. Ó Sr.ª Deputada, mais uma
vez, pela enésima vez, aqui digo que o código do trabalho não tem toda a
legislação. Essa é legislação que está vertida na área da segurança social e
que não foi modificada. O código do trabalho não é o código prestacional da
segurança social.

Vozes do CDS-PP: - Pois não!

O Orador: - Finalmente, cita a Comissão Nacional Justiça e Paz, mas não
citou a nota da Conferência Episcopal Portuguesa. Mas sobre isto gostava de
dizer-lhe duas coisas, Sr.ª Deputada, e até agradeço que me tenha feito a pergunta:
primeiro, não foi a Comissão Nacional Justiça e Paz que disse que ela era
imoral, foi um membro da actual

Comissão Nacional Justiça e Paz, que, por acaso, é simpatizante do Bloco de
Esquerda, o Prof. Doutor José Manuel Pureza - aliás, creio que candidato à
Assembleia Municipal de Coimbra pelo Bloco de Esquerda.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

E, curiosamente, deixe-me dizer-lhe, o Prof. Doutor Pureza foi meu vogal na
Comissão Nacional Justiça e Paz, a que presidi durante três anos, sem nunca ter
dito que estava na presença de uma pessoa tão diabolizada, que só faz coisas e
leis imorais.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Ora aí está!

O Orador: - Mas fique descansada, Sr.ª Deputada, porque, hoje mesmo, recebi
do Sr. Presidente da Comissão Nacional Justiça e Paz um pedido de desculpas,
dizendo que não há terrenos de afrontamento, que isto tem a ver com uma
situação que, de facto, não aconteceu porque ele nunca disse isso.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Muito bem! E agora?!

O Orador: - Se quiser, posso dar-lhe uma cópia desta carta, porque não me
foi pedido segredo nem confidencialidade, que está assinada pelo actual
presidente da Comissão Justiça e Paz, Professor Doutor Armando Sales Luís.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Está assinada!

O Orador: - Relativamente à lei-quadro da formação profissional, gostava de
dizer-lhe que está praticamente pronta. Algumas disposições já foram inseridas
no código do trabalho, algumas até transcrevendo acordos celebrados pelo
anterior governo nesta matéria, para fique como letra de lei e para que o seu
cumprimento seja absolutamente decisivo.
Mas queremos avançar mais, queremos, sobretudo, avançar em três aspectos, e com
isto termino: primeiro, uma aproximação e um reforço da formação profissional
no próprio sistema de ensino, que é fundamental para o País; segundo,
dignificar e aumentar o valor social e de mérito da formação certificada; e,
terceiro, apostar sobretudo na formação de quadros intermédios, que é onde o País
tem mais défice e onde se travam elementos fundamentais para a modernização,
agilização e desenvolvimento do tecido empresarial português.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar
a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, a interpelação é a propósito
de um incidente que agora foi suscitado pelo Sr. Ministro, e creio que é
rigorosa e importante.

O Sr. Presidente: - Mas, Sr. Deputado, a figura regimental indicada não será
um protesto?

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, é uma precisão, nos termos em
que já ocorreu e que até mereceu, depois, esclarecimentos por parte do Sr.
Ministro, e serei muito breve.
O Sr. Ministro invocou a condição de ex-candidato autárquico de uma figura que
faz parte da Comissão Nacional Justiça e Paz para caracterizar o seu ponto de
vista. Essa atitude é inaceitável…

Protestos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Isso não é uma interpelação!

O Orador: - … face à própria Comissão Nacional Justiça e Paz, visto que o
ponto de vista político de qualquer dos seus membros não é o que determina a
sua escolha, eles têm, naturalmente, toda a liberdade de expressão. Portanto,
tentar catalogar ou definir pontos de vista para os desqualificar é uma atitude
que só fica mal ao Sr. Ministro.

Vozes do BE e de Deputados do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, pretende usar da palavra, utilizando a
mesma figura regimental, para encerrarmos rapidamente este pequeno incidente?

O Sr. Ministro da Segurança Social e do Trabalho: - Sr. Presidente, de
facto, creio que não disse qualquer mentira.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Exactamente!

O Orador: - Foi uma mera coincidência. Limitei-me a uma mera coincidência.
Mas referi-o apenas e pela circunstância de a Sr.ª Deputada Ana Drago ter
falado da posição da lei moral como posição da Comissão Nacional Justiça e Paz.
E, de facto, não é uma posição da Comissão, é uma posição individual, e à
revelia da própria Comissão, de um membro da Comissão Nacional Justiça e Paz,…

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - … que, por acaso e por coincidência, é simpatizante…

Vozes do PSD: - Exactamente!

O Orador: - … e creio que apoiante, público e expresso,…

Protestos do BE.

Vozes do CDS-PP: - Foi candidato à assembleia municipal pelo BE!

O Orador: - … da sua própria formação política.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Protestos do BE.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado
Artur Penedos.

O Sr. Artur Penedos (PS): - Sr. Presidente, o Sr. Ministro da Segurança
Social e do Trabalho, na sua intervenção, começou por nos falar do anteprojecto
do código do trabalho, relativamente ao qual, eu diria, que configura uma
estratégia em que, de alguma forma, o Governo tentou lançar a "bomba
atómica" para a sociedade portuguesa, e, após a discussão que foi
desenvolvendo, apresentou, mais tarde, na Assembleia da República, uma proposta
de lei que configura um "míssil" de grande potência que destruirá
certamente muitas das expectativas dos mais desprotegidos, daqueles que mais
dificuldades têm no dia-a-dia para enfrentar a prepotência e outros malefícios
da nossa sociedade.
Mas o Sr. Ministro também nos falou da bondade desta proposta de lei. Vale a
pena situarmo-nos: estamos a falar da proposta de lei que o Sr. Ministro, o
Governo a que o senhor pertence, apresentou nesta Assembleia, e não noutra
coisa. E, nesta medida, quando ainda há pouco eram desferidos, com justiça,
muitos ataques sobre a proposta de lei em discussão, relativamente às questões
da maternidade, no que toca, por exemplo, às grávidas e a outras situações,
eles são justificados. O Sr. Ministro sabe, perfeitamente, que é verdade que
esta proposta de lei conduz a que situações de despedimento de grávidas, que
hoje são consideradas ilegais, sejam consideradas completamente diferentes.
Dir-me-á: nós vamos mudar isso! Não me importa, neste momento, aquilo que vão
mudar ou deixam de mudar; o que me importa é a intenção que este Governo tinha,
relativamente a uma determinada matéria, em alterar, de uma determinada forma,
a legislação laboral, em Portugal.
Aqueles que hoje ouviram, pela primeira vez, o Sr. Ministro falar ficarão,
eventualmente, surpreendidos e dirão: "afinal, isto até não é tão mau; até
é bom", porquanto toda a construção do discurso vai no sentido de mostrar
o contrário daquilo que temos em presença.
O Sr. Ministro disse ainda que tudo foi tratado ao nível da concertação social,
onde houve grande discussão. Bom, nós não ouvimos todos os parceiros sociais,
nesta Assembleia, e todos eles disseram: não houve negociação alguma!

Vozes do PSD: - Não é verdade!

O Orador: - Não houve negociação alguma!

Vozes do PSD: - Não é verdade!

O Orador: - Não houve concertação!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, peço-lhe que conclua, pois já não dispõe
de tempo.

O Orador: - Vou já terminar, Sr. Presidente.
Não houve concertação, foi o que foi dito aqui pelos parceiros sociais, por
todos - nenhum deles assumiu que tinha havido qualquer concertação.

Vozes do PSD: - Não é verdade!

O Orador: - É a sua verdade!

Uma voz do PSD: - Eu estava lá!

O Orador: - Andou distraído, certamente.
Sr. Ministro, no meio de tudo isto, e porque o tempo não me permite mais,
pergunto: com estes comportamentos, pretende o Governo, em matéria de
constitucionalidade ou inconstitucionalidade das normas, designadamente, no
despedimento, na greve e em outros direitos, alterar o seu comportamento?
Pretende o Governo, com esta proposta de lei, que viola claramente esses
preceitos, vir a fazer aquilo que, de alguma maneira, já se percebeu que vai
fazer, que é "lançar o barro à parede para ver se pega, se cola" -
deixe-me usar esta expressão - e tentar criar condições para a
inconstitucionalidade manifesta das normas, como já ocorreu noutras alturas,
por parte deste Governo, designadamente no Orçamento, em relação à função
pública?

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o tempo esgotou-se. Queira concluir, por
favor.

O Orador: - Por último, diga-me, Sr. Ministro: pretende V. Ex.ª assumir o
papel…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, tem de concluir mesmo. Peço-lhe que o
faça, pois já o meu terceiro apelo. Não me obrigue a carregar no famoso botão!

O Orador: - Termino imediatamente, Sr. Presidente.
Pretende o Sr. Ministro assumir o papel de herói dos poderosos e de vilão dos
mais desprotegidos?

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado
João Pinho de Almeida.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da
Segurança Social e do Trabalho, apesar de, se calhar, ter mais idade para isso,
não vou aqui falar de "heróis" nem de "vilãos". Vou falar
de uma faixa etária que, entendo, tem de ter espaço na discussão deste código
do trabalho - é um código do trabalho e não um pacote laboral, esta é a primeira
razão por que quero saudar o Sr. Ministro. É um código do trabalho que
introduz, de facto, inovação, uma sistematização, que, para nós, é positiva. E
é bom que também aqui, na Assembleia da República, nos preocupemos em
clarificar a linguagem que usamos, e chamemos as coisas pelos nomes: estamos a
discutir um código do trabalho.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - E devo dizer-lhe, Sr. Ministro, que, em pouco tempo, é a
terceira vez que vem à Assembleia da República apresentar propostas, que são
bastantes positivas, no âmbito da juventude. E, não sendo esta uma área
directamente relacionada com a juventude, é bom sabermos que há, neste Governo,
uma preocupação, que é transversal a todas as iniciativas legislativas, de
promover políticas favoráveis à juventude. Foi o caso do rendimento social de
inserção; foi o caso da liberdade de escolha, bastante importante no caso da
segurança social, pois permite aos mais jovens,…

Protestos do PS.

… ao contrário do que disse a Sr.ª Deputada Ana Drago, terem liberdade para
preverem e programarem o seu futuro;…

Protestos do PS e do BE.

… e, agora, é o caso de uma legislação inovadora, de um caminho reformista,…

Protestos do PS.

… no sentido da flexibilização da legislação laboral, da competitividade e
de tornarmos o nosso País muito mais competitivo, ao nível europeu e ao nível
mundial.

Protestos do PS, do PC e do BE.

Eu, ao representar aqui, nesta Assembleia, a juventude popular, represento
vários tipos de jovens: jovens estudantes, jovens desempregados, jovens
empregados e jovens empreendedores, jovens empresários, e todos eles têm os
mesmos direitos!

Vozes do CDS-PP e do PSD: - Muito bem!

O Orador: - São jovens, são cidadãos portugueses, todos têm os mesmos
direitos: os estudantes, porque querem um dia ser trabalhadores; os
desempregados, porque um dia querem ter um emprego; os que já estão empregados,
porque querem ter uma carreira produtiva e subir nessa mesma carreira; e os
empresários, jovens empreendedores, porque querem, neste País, ter espaço para
desenvolver os seus projectos, as suas empresas e também eles querem ter
hipótese de se tornarem competitivos.
É esta a visão que temos da questão laboral. Não é uma visão maniqueísta, não é
a visão da luta de classes - esta não é certamente uma visão do nosso tempo; e,
obviamente, vemos de uma forma quase caricatural - e já foram referidas as
caricaturas neste debate - aquelas tentativas de bloqueio da sociedade a que
alguns apelidam de greve geral. São coisas que, para nós, não fazem qualquer
sentido. Queremos ter espaço! Queremos ter tempo para conseguir produzir!
Queremos ter espaço e tempo para que os jovens portugueses não lutem de
manifestação em manifestação mas para terem o seu emprego! Queremos que os
jovens portugueses lutem para ter o seu lugar, para ter as suas empresas! E
também não é mau que os jovens portugueses queiram ter as suas empresas - é
bom!

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

Vozes do PSD: - Exactamente!

O Orador: - É bom que jovens portugueses tenham as suas empresas, porque,
assim, vai haver emprego para muitos jovens portugueses. É neste sentido que
entendemos que é feita esta reforma da legislação laboral. Assim, pergunto ao
Sr. Ministro, concretamente: no sentido da promoção, do direito que a juventude
tem à iniciativa e também ao trabalho, de que medidas nesta área é que, neste
código do trabalho, a juventude beneficia exactamente?

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado
Pedro Roque.

O Sr. Pedro Roque (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Segurança Social
e do Trabalho, independentemente de toda esta polémica, que perpassou ao longo
destes meses, acerca da proposta de código do trabalho, numa coisa parece
estarmos de acordo: a estagnação dos mecanismos de contratação colectiva.
A acreditar no destaque que hoje vem no Público, para além das divergências,
que todos lemos, no Secretariado Nacional do PS sobre esta matéria, apenas
foram firmados, em 2001, 17 contratos colectivos de trabalho - uma espécie de
corolário de uma redução sistemática do número destes instrumentos ao longo de
vários e sucessivos anos.
Pelo contrário, na maioria dos países da União Europeia, as relações de
trabalho são reguladas sobretudo por este tipo de instrumentos, nos quais, é
bom relembrar, as partes, livremente e de boa fé, acordam um vasto conjunto de
matérias para o período de vigência do contrato colectivo de trabalho e não
meras actualizações salariais, como acontece entre nós, por via da actual
legislação. Refira-se aliás, que a legislação actual instiga claramente ao
imobilismo, agravado pela ausência de arbitragem obrigatória - este é um
mecanismo essencial de desbloqueio da negociação, esgotadas que estejam a
moderação e a conciliação.
Parece-nos, assim, óbvio que, ao contrário da propaganda de uma certa esquerda,
a proposta de código do trabalho não só não mata mas, pelo contrário, reanima a
contratação colectiva.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Assim, Sr. Ministro, a minha pergunta é clara e concisa: de que
modo o código do trabalho permitirá revitalizar a contratação colectiva,
tornando-a, finalmente também em Portugal, um mecanismo eficaz de regulação das
relações laborais, tal como é usual nos países da União Europeia?

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da
Segurança Social e do Trabalho.

O Sr. Ministro da Segurança Social e do Trabalho: - Sr. Presidente, começo
pelas questões colocadas pelos Srs. Deputados João Pinho de Almeida e Pedro
Roque.
De facto, este é um código que procura ser amigo do investimento, amigo do
emprego, e, portanto, potenciador de novas oportunidades, de empresários com
militância de risco e responsabilidade social e dos jovens, que são sempre
enaltecidos nos discursos mas, às vezes, esquecidos na prática política.

Vozes do CDS-PP e do PSD: - Muito bem!

O Orador: - É também em nome deles, é contra a cobardia geracional que
fizemos e propomos ao Parlamento esta reforma. Não queremos pôr a cabeça
debaixo da areia; não queremos conviver com arcaísmos ou visões ultrapassadas e
definitivamente fora do contexto em que nos movemos no mundo e em Portugal.

Protestos do PS.

Por isso, os jovens têm aqui um elemento de esperança, de confiança no seu
futuro,…

Vozes do PS: - Têm!…

O Orador: - … seja, naturalmente, como empresários ou como trabalhadores.
Relativamente às questões de contratação colectiva, permitam-me só uma nota,
dada a escassez de tempo de que disponho e por já há pouco ter, de algum modo,
respondido.
Srs. Deputados, os nossos propósitos, em matéria de contratação colectiva, não
são os de nos substituirmos às partes mas, sim, os de reforçar e robustecer o
trabalho das partes. Por isso, a intervenção administrativa, a intervenção
política, é feita só numa última etapa, depois de falhar a mediação, a
conciliação, a arbitragem voluntária - e só é feita com determinados parâmetros
para a arbitragem obrigatória -, e, aliás, os seus prazos são bem mais longos
do que os que estão vertidos nas propostas de alteração, que conheci, do
Partido Socialista. O que significa que o tal vazio, de que somos acusados
nesta matéria, não vai acontecer, mas, se acontecesse, aconteceria certamente
mais explosivamente e mais depressa do que está vertido nas propostas do
Partido Socialista.

Vozes do CDS-PP e do PSD: - Muito bem!

Vozes do PS: - Não é verdade!

O Orador: - Quanto às questões colocadas pelo Sr. Deputado Artur Penedos…
Sr. Deputado, vamos, de uma vez por todas, perceber qual é a posição do Partido
Socialista.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Tentar!

O Orador: - O código do trabalho é um "míssil" de grande potência,
ou é, como disse o Sr. Deputado Rui Cunha, um "nado-morto"?

Vozes do CDS-PP: - Exactamente!

O Orador: - Estão do lado do autismo negocial da CGTP, ou estão do lado das
convicções negociais moderadas da UGT?

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Esse é o dilema!

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Exactamente!

O Orador: - Estão do lado do "morto", ou seja da legislação cujo
prazo de viabilidade e utilidade já acabou, ou estão do lado de uma legislação
viva, actuante, moderna, eficaz e com sentido de futuro? Estão do lado da greve
geral, embora com falsas partidas, ou estão do lado da concertação, embora em
maratona ou em estafeta pesada?

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Muito bem!

O Sr. Artur Penedos (PS): - Estamos a favor da greve e dos direitos dos
trabalhadores!

O Orador: - Curiosamente, o Partido Socialista tem uma contradição
permanente: o Sr. Deputado Rui Cunha diz que o que apresentamos aqui é um
"nado-morto" e, ao mesmo tempo, outros Deputados do Partido
Socialista, utilizando, aliás, a linguagem da CGTP, dizem que é uma operação de
pura cosmética, um compromisso tripartido. Em que é que ficamos?! Se é uma
operação de pura cosmética, não se trata de "nado-morto"; se se trata
de "nado-morto", não é uma operação de pura cosmética! Entendam-se,
Srs. Deputados! Entendam-se, no Partido Socialista!

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Exactamente!

O Orador: - De facto, relativamente às questões que me colocou, o que fez
foi processos de intenção.
Sobre as grávidas, disse que não houve qualquer negociação. Ó Sr. Deputado, o
que é preciso dizer mais para provar que houve uma profunda negociação, uma
profunda concertação. Pensa que tudo isto caiu do céu?!

O Sr. Artur Penedos (PS): - É evidente que sim!

O Orador: - Pensa que estivemos a falar de aspectos culturais, de moda, de
ópera, nas 130 horas de concertação social?!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Isso era antigamente!

O Orador: - Pensa que nós fazemos o diálogo pelo diálogo, para adormecermos
todos, embalados por ele, sem qualquer resultado definitivo e final?!
Gostava de lhe dizer, Sr. Deputado, que considero isso muito curioso, vindo do
Partido Socialista, que é o especialista na técnica legislativa do
faz-de-conta,…

O Sr. Patinha Antão (PSD): - Exactamente!

O Orador: - … do empata, sempre com comissões e grupos de trabalho,…

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Isso é verdade!

O Orador: - … que é especialista em abortar iniciativas legislativas que
causem a mínima contestação.

O Sr. Artur Penedos (PS): - Essa agora!

O Orador: - Como eu disse há pouco, este Governo não governa para a
simpatia, governa para a utopia do progresso e do futuro de Portugal.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Protestos do PS.

Termino com as acusações de inconstitucionalidade, porque, segundo o Sr.
Deputado, este diploma viola claramente alguns preceitos constitucionais.
Eu sempre disse que esta reforma laboral - e disse-o para os dois extremos das
críticas - teve como método a concertação e como limite a Constituição da
República Portuguesa.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Jorge Strecht (PS): - É falso!

O Orador: - E ontem, perante alguns jornalistas que me questionaram, no
sentido de que há uma, duas ou três normas que podem suscitar dúvidas de
inconstitucionalidade, disse que nós não temos dúvidas de constitucionalidade.
O que fizemos foi consultar mais de 10 conceituados constitucionalistas e a
esmagadora maioria…

O Sr. Artur Penedos (PS): - Está a dizer mal! Disse "vamos
testar"!

O Orador: - Teve acesso a esses pareceres, Sr. Deputado!

Protestos do Deputado do PS Artur Penedos.

O Sr. António Pinheiro Torres (PSD): - Já estão na Comissão!

O Orador: - Estão na Comissão, Sr. Deputado!

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Vieram ontem!

O Orador: - E esses constitucionalistas pronunciaram-se, esmagadoramente,
pela sua constitucionalidade, tendo havido uma minoria que suscitou algumas
dúvidas. Certamente, há órgãos, na democracia portuguesa, para avaliar da
bondade das várias teses em confronto. Agora, nós não temos dúvidas, porque…

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, esgotou-se o tempo de que dispunha.

O Orador: - Vou já terminar, Sr. Presidente.
Como estava a dizer, nós não temos dúvidas, porque propusemos essas normas,
mantivemo-las depois da concertação social e continuamos completamente
confiantes de que são indiscutivelmente constitucionais,…

Protestos do PS.

… como, repito, a grande maioria dos constitucionalistas consultados
entendeu. Aqui não há maniqueísmo constitucionalista, não há os bons e os maus
constitucionalistas; há a maioria dos constitucionalistas que dizem que é
constitucional e uma pequena minoria que suscita dúvidas.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Protestos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo
Pedroso.

O Sr. Paulo Pedroso (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs.
Membros do Governo: O que nos traz hoje aqui é da maior importância:
condicionará o modo como serão geridas mais de 600 000 empresas, influenciará a
vida de mais de 5 milhões de trabalhadores, e não apenas no trabalho mas também
em termos familiares e pessoais.
Estamos a falar de direito do trabalho, um instrumento libertador do tipo de
relação cruel que a literatura do século XIX tão bem e tão dramaticamente
retratou, o qual nasceu e deve continuar a ser uma garantia de que, nas
sociedades em que queremos viver, não há dois mundos: um, fora do trabalho,
feito de democracia, liberdade, responsabilidade e cidadania; outro, na
empresa, de hierarquia, submissão, insegurança, sacrifício da vida pessoal e familiar,
privação da intimidade, restrição do direito de expressão.
Acredito, genuinamente, que ninguém neste Parlamento quer que essa cisão
ocorra, mas, para que assim não seja, o direito do trabalho tem de ser adequado
e eficaz. E a primeira condição de eficácia é o cumprimento da lei.

Aplausos do PS.

Para a efectividade das normas legais acontecer concorrem quatro factores
essenciais: que elas sejam compreensíveis, não contraditórias e acessíveis; que
empresários e dirigentes empresariais tenham uma cultura de respeito pelo
ordenamento jurídico vigente; que trabalhadores possam organizar-se
colectivamente e ter representantes legítimos com influência real na definição
das normas e na sua aplicação; e que os mecanismos de dissuasão, inspecção e
repressão, nomeadamente por parte do Estado, sejam eficazes.
Neste contexto, o imperativo de sistematização legal recolhe hoje um largo
consenso entre especialistas e operadores do sistema de relações de trabalho. A
este respeito, nem a proposta do Governo é pioneira, nem o Governo se revelou,
sequer, um bom gestor do património que recebeu.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Nascida de uma iniciativa de concertação social, uma comissão de
juristas - professores, advogados, magistrados, gestores - entregou a sua proposta
final de sistematização a este Governo, após dois anos de trabalho e dois meses
depois de o Governo tomar posse.
Com base nesse trabalho, teria sido garantida uma transição tranquila da
complexidade existente para uma boa sistematização, que daria a todos a
segurança do ponto de partida, que identificaria com rigor a relação entre as
normas até agora em vigor e as que constariam da sistematização e que
libertaria as nossas energias para a discussão aprofundada das mudanças
necessárias.
Se tal caminho não tivesse sido afastado liminarmente pelo actual Governo,
estaríamos hoje a discutir uma reforma da legislação laboral centrada nos
problemas do presente e do futuro e não a fazer a revisão de contas, olhando
para o trabalho e para a política do passado.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Mas a sede de um pequeno lugar na História das relações de
trabalho impediu o Governo de ver suficientemente longe para perceber isso. Ao
invés, apresentou um anteprojecto de autores cujo nome continua a ser ocultado da
opinião pública, cujos objectivos não discutiu com ninguém, um anteprojecto de
tal modo "desaparafusado" que o próprio Secretário de Estado do
Trabalho dele disse, 12 dias depois de, pela primeira vez, ter visto a luz, que
se tivesse de o preparar de novo, naquele momento, já lhe "… teria
apertado alguns parafusos" (in Público, 31 de Julho de 2002).

Aplausos do PS.

Esses autores quiseram colocar as suas vírgulas na História, refrasear
conceitos, alterar a sequência de normas que se interrelacionam, mesmo onde não
há inovação jurídica.
Em consequência, se este projecto prosseguir o seu caminho, passarão anos,
correrão rios de tinta e dinheiro e prosseguirá a violação das normas, até que,
mesmo as que já existem, voltem a ter interpretações seguras.
O preço desta teima, inútil e sem justificação, será, pois, pago em morosidade
e insegurança acrescidas da justiça, o que, neste caso, significa também a
penalização da parte fragilizada no contrato.
Isto é, não se tem agora o ganho de simplificação que se podia ter tido e que
estava tecnicamente disponível através de uma sistematização que o Governo não
usou por pura teimosia. E não é por lhe chamar código que a iniciativa do
Governo passa a ter as propriedades de um código. Não se sabe exactamente
quantos decretos implicará, mas sabe-se que o Dr. Jorge Leite veio à Comissão
dizer que implicará, pelo menos, 70 pontos de regulamentação. É a
"floresta" que regressa, Sr.as e Srs. Deputados!

O Sr. José Sócrates (PS): - Muito bem!

O Orador: - Afinal, não se simplifica! Dentro em pouco, teremos a mesma
quantidade de páginas vertidas em diplomas que apenas poderão ter, ao longo do
tempo, desenvolvimentos contraditórios, unicamente e só em novas bases.

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

O Orador: - Por que se terá perdido, então, no caminho a intenção de uma lei
unificadora, clara e sistematizadora, acessível aos seus destinatários? Por uma
simples razão: o atalho que o Governo seguiu não é o bom caminho.

O Sr. José Sócrates (PS): - Muito bem!

O Orador: - Mas é certo que a sistematização não deve esgotar a ambição da
reforma da legislação do trabalho.
Como é sabido, a matriz da nossa legislação laboral é ainda, nalguns domínios,
a que resultou de um regime politicamente autoritário, limitador dos direitos
dos cidadãos e da livre concorrência. Por isso, quando o Estado se quis parecer
com um Estado social recorreu a leis detalhadamente imperativas, usou e abusou
da regulamentação administrativa.
É verdade também que a nossa jovem democracia, da segunda metade dos anos 70, quando
se impôs a necessidade de compatibilizar, com urgência, a construção do Estado
de direito com o desenvolvimento da economia de mercado, recorreu, ela também,
a um conjunto extenso de normas para garantir direitos e prevenir, limitar ou
impedir abusos de posição de força.
Mas hoje vivemos numa democracia consolidada. O nosso problema é diferente, é
essencialmente de modulação desses direitos, de compatibilização entre
garantias e de flexibilidade entre esferas da vida dos trabalhadores.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - É necessário consagrar normas de adaptabilidade. Essas normas
são fundamentais em certos sectores e em certas empresas, sobretudo para dar às
pessoas possibilidade de resposta adequada ao imperativo de conciliarem a sua
vida pessoal, familiar e profissional, ao mesmo tempo que se asseguram às
empresas instrumentos eficientes de resposta às flutuações quantitativas e
qualitativas dos mercados em que concorrem.
Ora, também neste capítulo, a lógica desta proposta não é inovadora: os 81 artigos
- repito, 81 artigos - que ostenta sobre tempo de trabalho são a prova do seu
insucesso.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Neste, como noutros domínios da adaptabilidade, em vez de uma
lei que fixa limites fundamentais e deixa à negociação colectiva a margem para,
mediante negociação e acordo, empresários e associações empresariais,
trabalhadores e sindicatos acordarem entre si, com vantagens mútuas, a
adaptação dessas normas aos seus sectores e empresas, esta lei segue a lógica
dos anos 60 e 70:…

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

O Orador: - … quer regulamentar tudo, impor soluções de
"pronto-a-vestir", tamanho único, a uma economia e a uma sociedade
crescentemente diversificadas. E, do mesmo passo, cria outro problema.
Ouvi aqui o Sr. Ministro e as bancadas da maioria dizerem que se trata de um
estímulo à negociação colectiva. Respondo: se a lei tudo fixa, o que há para o
empregador ou a sua associação empresarial negociar com os trabalhadores e os
seus sindicatos?!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Como pode haver negociação colectiva eficaz se as matérias
relevantes estão amarradas pela lei?!

Aplausos do PS.

O Sr. José Sócrates (PS): - Isto é que dói!

O Orador: - Quanto mais a lei imperativa crescer, menos negociação colectiva
haverá. A proposta do Governo despreza a negociação colectiva, despreza que foi
a negociação colectiva, não obstante os problemas e bloqueios, a principal
fonte de inovação de direito do trabalho, entre nós, nos últimos 25 anos.
Nestas circunstâncias, a obsessão da lei pelo detalhe é um erro crasso de
concepção sistémica, mesmo quando consagre soluções substantivas que não sejam
necessariamente erradas.
O que agora ficar escrito estará dependente da flutuação de maiorias, não do
diálogo responsável entre empregadores e trabalhadores; dependerá das
legislaturas e não dos ciclos da economia;…

O Sr. Artur Penedos (PS): - Bem lembrado!

O Orador: - … dependerá das maiorias parlamentares e não dos dinamismos
sociais das pessoas e das empresas; tornará menos fácil a motivação para a
inovação por ambas as partes.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - As empresas ficarão mais rígidas, congeladas no articulado desta
lei, do que flexíveis e abertas à dinâmica do seu próprio ambiente competitivo.

Aplausos do PS.

Digo-vos, claramente, que a lógica de organização da lei deveria ter sido
outra. O que temos em mãos é uma proposta demasiado extensa, que se
multiplicará por muitos outros diplomas, que diminui a margem para a negociação
efectiva entre empregadores e trabalhadores. E fá-lo, por opção deliberada, por
duas vias: por um lado, como já disse, regulamentando, chegando ao ponto de
regulamentar, por exemplo, o número de horas que, em cada trimestre, um
trabalhador pode faltar justificadamente para se inteirar, junto da escola, da
situação educativa de filho menor, mas regulamentando também - pasme-se! - a
supressão do direito, que a lei vigente garante, de suspender a licença de
maternidade quando a saúde da mãe ou do filho obrigarem a um internamento
hospitalar.

O Sr. António Costa (PS): - É a protecção da família!

O Orador: - Sr. Ministro, estou convicto de que o País não precisa que o Sr.
Ministro transforme em letra de lei as suas opiniões sobre estas duas matérias.
E, no caso da segunda, espantar-me-ia que algum empresário lúcido admitisse,
sequer, a hipótese de a competitividade presente ou futura da sua empresa
depender de normas deste teor.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Até quero acreditar que os empresários terão, perante essa mãe,
a compreensão pelas realidades familiares que o Sr. Ministro está agora a
retirar da lei.

Aplausos do PS.

Mas a ideia geral da iniciativa do Governo erra ainda por seguir uma
orientação civilista que desvaloriza a especificidade do contrato de trabalho.
Ficciona uma igualdade inexistente entre empregador e trabalhador, permitindo
que o trabalhador, "livremente" - com todas as aspas -, abdique de
alguns direitos fundamentais, por exemplo, no que se refere à duração da sua
jornada de trabalho.
É socialmente mais justo, sem causar qualquer prejuízo à competitividade
empresarial, que estas e outras normas sejam passíveis de consideração, sim -
estamos de acordo que sejam passíveis dessa consideração -, mas no quadro
negocial, de modo a que empregadores e sindicatos possam, em menor desigualdade,
trocar argumentos, encontrar as soluções globalmente equilibradas e
colectivamente aplicáveis. Esta é a lógica que propomos, esta seria a lógica da
nossa lei!

Aplausos do PS.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Queria! Era mais uma promessa! Uma lei
virtual! Só a despesa é que seria real!

O Orador: - Dir-nos-ão alguns que o bloqueio ou as dificuldades de
negociação colectiva tornam difícil tal operação. Por isso mesmo, estamos de
acordo: impõe-se desbloquear a negociação colectiva, mas, de novo, importa
saber por que caminhos.
Se hoje há convenções desactualizadas, há longos anos sem alterações, o caminho
certo será o de permitir a uma das partes que a denuncie unilateralmente, sem
que daí decorram consequências para si própria, podendo, no limite, se o
ministro do trabalho da época resolver não intervir, ficar os trabalhadores
completamente a descoberto de qualquer convenção colectiva de que hoje
dispõem?!

O Sr. João Rebelo (CDS-PP): - Não é nada disso!

O Orador: - Deve depositar-se este poder nas mãos não digo deste Ministro
mas de qualquer ministro que, um dia, tenha esta pasta?! A nossa resposta é,
claramente, "não"!

Aplausos do PS.

Não será mais razoável, como propõe o PS, que haja a garantia de que, sempre
que uma parte avança para a caducidade, a outra tenha a segurança de que haverá
sempre uma regulamentação colectiva de trabalho, independente do governo da
época, se for essa a sua vontade, nem que seja, no limite, por força de uma
decisão arbitral?!
A proposta do Governo dá dois passos que, combinados, terão efeitos desastrosos
sobre a negociação colectiva: permite que a adaptabilidade resulte de uma
relação individual entre trabalhador e empregador, que deveria ser equacionada
apenas em negociação colectiva, e enfraquece a própria negociação por este mecanismo
de sobrevigência e caducidade de convenções, o qual não garante - sublinho, não
garante - que estará sempre em vigor uma convenção colectiva resultante de
negociação ou de decisão arbitral.
A proposta do Governo consegue a proeza difícil de ser, à vez, excessivamente
interventora e desregulamentadora, promovendo, por dois mecanismos opostos, a
individualização das relações de trabalho, que sempre foi adversária do direito
do trabalho, aliás, uma adversária secular.
É, pois, pelas suas opções de base, e não apenas por meia dúzia de normas mais
chocantes, que esta proposta deve ser abandonada por quem não quiser pôr a
autoridade do Estado ao serviço da americanização das relações de trabalho, da
individualização, do enfraquecimento dos mecanismos de representação dos
trabalhadores e da negociação colectiva nas empresas.
Evidentemente, para quem, hoje, é já vítima do incumprimento, ela não é
particularmente gravosa mas não lhes melhora a situação, ao mesmo tempo que é a
versão portuguesa daquilo a que Robert Castel chamou a "desestabilização
dos estabilizados".
É verdade que não lançará ao mar a História das relações de trabalho em
Portugal. Não tem essa gravidade e concedo, sem custo, que procura abordar
alguns dos mais sérios problemas do nosso mercado de trabalho, mas fá-lo de um
modo ardiloso e inaceitável.

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

O Orador: - O Governo apresentou um anteprojecto extremista, cheio de normas
que existiam para serem retiradas, um verdadeiro míssil que tinha de explodir
no ar.

Paulatinamente, foi retirando, uma a uma, as mais exageradas, reformulando
as mais contestadas. Paulatinamente, foi recuando. Mas, até à proposta que hoje
estamos a discutir, não recuou, não tinha recuado em nenhuma matéria
fundamental.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - O Sr. Deputado não sabe o que é a
concertação!

O Orador: - Só posteriormente surgiu o "nado-morto". Já depois da
proposta fechada e entregue nesta Assembleia da República, e sob a pressão
combinada da negociação e da contestação, vem o Governo prometer alterar 56 dos
artigos que, no entanto, este debate ainda se destina a discutir.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Que melhor prova podíamos recolher da precipitação e do
amadorismo legislativos?! Estamos, formalmente, a discutir muitas normas
propostas pelo Governo que já sabemos que ele abandonará logo que puder para,
pela mão providencial da sua maioria nesta Assembleia, corrigir o que deveria
ter corrigido em tempo útil.

O Sr. Artur Penedos (PS): - Muito bem!

O Orador: - Preferiu mostrar, primeiro, o seu desinteresse pela concertação,
limitando-se, ao longo de meses, àquilo a que os próprios parceiros, e não nós,
chamaram uma mera "auscultação" para, em seguida, vir mostrar o seu
desrespeito por este Parlamento, indo, finalmente, negociar a sério, fora de
horas e de calendário, em concertação social e em jeito de perversidade
neocorporativa, já depois de passado o momento em que deveria ter terminado
essa negociação, pelo facto de o assunto ter passado para a alçada parlamentar.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - E, recorde-se, foi por vontade exclusiva do Governo que a
presente proposta aqui entrou no momento que este escolheu e que ninguém lhe
impôs.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - E se não negociou antes, como o Sr. Ministro aqui recordou, não
foi por incapacidade. Concedo e, aliás, homenageio o Sr. Ministro por ter sido
parte negociadora do primeiro acordo celebrado em Portugal por todos os
parceiros sociais - uma matéria de que a maioria parece ter-se esquecido, pois
a concertação social, mesmo nos anos 90, era tradição do PSD; agora é que o PSD
pensa que é só fora de horas que ela pode surgir.

O Sr. Artur Penedos (PS): - Bem lembrado!

O Orador: - E invoca aqui um parceiro social como subscritor de um acordo -
cujas assinaturas não nos mostrou! -, subscritor, esse, que deixou claro, em
comunicado, que acha que há preceitos inconstitucionais nesta proposta, que
deixou claro, em comunicado, que ela não merece a sua concordância. E mais:
deixou claro, em comunicado, que irá, junto dos grupos parlamentares, pedir que
se empenhem para que ela seja alterada em vários preceitos.
De facto, este diploma, numa parte relevante das suas normas, já tem a sua
morte anunciada pelo seu próprio proponente.

O Sr. Jorge Strecht (PS): - Ainda bem!

O Orador: - Desde logo, desistindo de mexer nos fundamentos para a justa
causa de despedimento, matéria que sempre nos pareceu ter sido colocada na
discussão de forma gratuita e descentrada do que importa discutir.
Mas não percamos o nosso tempo com as normas que já não existem, muitas das
quais, estou convencido, nunca existiram e estiveram no papel apenas para o Sr.
Ministro vir aqui dizer hoje, benevolentemente, que, afinal, as retirava!
O verdadeiro teste à disposição da maioria para elaborar uma lei nova e melhor
está ainda por fazer.
Retiradas as provocações, corrigidos os disparates maiores, finalmente
incluídas questões como a higiene e segurança no trabalho e a formação
profissional, inicialmente negligenciadas e, a custo, incluídas após os avisos
do PS e dos parceiros sociais, o Governo retira-se de cena.
Concentremo-nos, então, agora, Srs. Deputados, na questão séria e profunda, que
é a de decidirmos que lei laboral o País terá. Estará a maioria efectivamente
disponível para continuar a missão de corrigir as propostas do Governo, de modo
a que os apelos à sua melhoria, que por todo o lado se ouvem, possam ser
traduzidos no articulado? Ou, a exemplo do que já aqui fez noutras ocasiões,
insistirá na posição de guardião intransigente do templo, ao ponto de negar a
evidência das inconstitucionalidades certas e insistir até na manutenção de
clamorosos erros?
Por enquanto, esta proposta é claramente inconstitucional. E dou dois exemplos,
apenas: é-o, pelo menos, no que respeita à possibilidade de oposição patronal à
reintegração de um trabalhador despedido ilicitamente; é-o, pelo menos, quando
se prevê a possibilidade de uma convenção colectiva limitar o exercício do
direito à greve que a nossa Constituição reconhece aos trabalhadores.
Mas há mais, como alguns constitucionalistas têm feito notar dentro e fora
desta Assembleia.
Por enquanto, esta proposta, precariza e individualiza as relações de trabalho.
Dizia-nos o Governo que o problema do mercado de trabalho residiria na extrema
rigidez do contrato de trabalho em matéria de despedimento e na pressão que tal
implicaria nos contratos a termo. Na sua própria análise - não na nossa! -, só
haveria ou que diminuir, o que seria errado, a rigidez do contrato de trabalho
ou que melhorar o combate ao uso ilegal das outras formas como compensação
"perversa" deste.

O Sr. José Magalhães (PS): - Claro!

O Orador: - Ora, o que aqui é proposto é um fosso ainda maior do que aquele
que existe.
Sem nenhuma explicação razoável, passa a ser possível estar-se em contrato a
prazo durante seis, em vez de três anos. Porquê?
Ainda sobre esta matéria, onde, hoje, o enunciado dos fundamentos para um
contrato a prazo é taxativo, passa a

estar um "nomeadamente" salvador, que abre a porta ao uso
indiscriminado e não fundamentado da figura. Porquê?

O Sr. Artur Penedos (PS): - Foi de propósito!

O Orador: - Além disso, onde a lei previa, e bem, um acréscimo mínimo por
trabalho nocturno, passaria a haver, se insistirem nesta formulação, valores de
salário diferentes para trabalhadores, ainda que da mesma categoria e da mesma
empresa, trabalhando lado a lado, segundo tenham começado a trabalhar em
horário nocturno antes ou depois de uma data que depende da entrada em vigor do
código. Porquê?

O Sr. Eduardo Ferro Rodrigues (PS): - Porque será?!…

O Orador: - Porquê, senhores, dar aos sindicatos o direito de restringir, em
convenção, o direito à greve que a nossa Constituição, e muito bem, estabelece
como um direito dos trabalhadores?

O Sr. Eduardo Ferro Rodrigues (PS): - Porque será?!…

O Orador: - Por enquanto, esta proposta esquece também que somos um País
onde muitas famílias são casais de trabalhadores e que tudo o que tem a ver com
a conciliação entre as necessidades da economia e a vida pessoal e familiar não
pode acontecer como se estivéssemos a falar ou de trabalhadores sem família ou
de famílias em que só um dos membros adultos trabalha.
Noutro capítulo, o das relações colectivas de trabalho, os diagnósticos
coincidem quanto a que o maior bloqueio é o que resulta da não negociação de
cláusulas de organização do trabalho e de adaptabilidade.
Ora, nesta matéria como noutras, desafio qualquer leitor atento do diploma a
encontrar nele factores relevantes de incentivo à negociação dessas cláusulas.
Pelo contrário, dada a latitude que é dada à gestão dessa matéria directamente
entre empregador e trabalhador, a negociação colectiva torna-se quase acessória
onde não houver uma enorme mobilização e vontade colectiva dos trabalhadores.
Esta proposta é adversária da negociação colectiva e inimiga do sindicalismo.

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

O Orador: - Como bem disse um dos juristas auscultados na Comissão, porá os
sindicatos a negociar em estado de necessidade, afasta-nos, mais ainda, de um
dos pilares do modelo social europeu e da tradição da Europa continental de
investimento na autonomia e na negociação colectiva, afasta-nos, ainda mais,
das leis continentais que investem na negociação colectiva e na autonomia para
a adaptabilidade e para facilitar a competitividade que esta lei, de facto, em
nada ajuda a que melhore. Mas, se não for esse o efeito pretendido, se tudo o
que disse corresponde a defeitos de redacção que podem ser corrigidos, então,
ainda vamos a tempo de o evitar, como propomos.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Nós, PS, entendemos que uma convenção colectiva de trabalho deve
ser celebrada por sindicatos, que pode, em certos casos, ser estendida a todos
os trabalhadores por decisão governamental, mas que nunca pode aplicar-se por
decisão individual de um trabalhador, encorajando-o a deixar de ser
sindicalizado ou a não se sindicalizar. E a maioria está disponível para se
juntar à nossa proposta?
Nós, PS, entendemos que só deve poder ser estendida a convenção colectiva
celebrada por organizações mais representativas. Ora, a proposta do Governo
permite que sindicatos ou associações patronais ultra-minoritários vejam
estendidos, por acto do Governo, os acordos que celebram. E a maioria está
disponível para se juntar a nós na defesa de convenções transparentes e
representativas?

O Sr. Eduardo Ferro Rodrigues (PS): - Muito bem!

O Orador: - Nós, PS, defendemos que os trabalhadores devem ser ouvidos
anualmente nas empresas de maior dimensão, sobre emprego, sobre formação
profissional, sobre higiene e segurança no trabalho, sobre tempo de trabalho,
sobre salários efectivos e protecção social complementar. E a maioria está
disponível para se juntar a nós nessa defesa?

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Nós, PS, defendemos que a adaptabilidade do horário de trabalho
é um assunto de empresa e não de um trabalhador individual. Por isso, apenas
deve existir como resultado de negociação colectiva, impedindo o abuso de
posição patronal e a imposição de sacrifícios à vida familiar sem uma
monitorização da sua necessidade por parte dos representantes legítimos dos
trabalhadores. E a maioria está disponível para defender esta garantia?
Sr.as e Srs. Deputados, a proposta de lei n.º 29/IX, que deu entrada na
Assembleia da República, já não existe no que se refere a boa parte das suas
normas. Não vale a pena que a maioria se atenha muito a ela. Da nossa parte,
merece uma simples e inequívoca reprovação.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - De recuo em recuo, o Governo demonstrou que não tem uma ideia
clara sobre o conteúdo a dar a uma reforma do mercado de trabalho que
consideramos necessária.
Já foi, por diversas vezes, buscar soluções jurídicas ao articulado da Comissão
presidida pelo Prof. Monteiro Fernandes, que tinha abandonado à partida. Mesmo
para quem o defenda, esta proposta já não é mais do que uma base de trabalho.
Não há por que defendê-la agora com fundamentalismo, quando o próprio Governo,
e bem, não o fez e não o faz. "Apertou porcas", "trocou
parafusos", "colocou e retirou pregos e cavilhas".
Em debate anterior, o Sr. Ministro disse aqui que desejava que o projecto fosse
melhor do que o anteprojecto e que a lei fosse melhor do que o projecto.
Aceitem, Srs. Deputados da maioria, o repto do Sr. Ministro.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Ajuízem com independência as propostas que vos vão ser
apresentadas. Nós queremos uma boa lei. Mas terá que ser muito diferente da
proposta que, hoje e aqui, os Srs. Deputados já começaram a abandonar, ainda
que estejam obrigados, compreende-se, a viabilizar.

A Constituição dá-nos a nós, Deputados, a competência de decidir sobre estas
matérias centrais para tantas empresas e tantos trabalhadores.
Aqui estaremos em defesa de uma boa lei, consciente do presente e virada para o
futuro.
Já se viu que o ponto de partida nem sequer para o Governo é muito relevante.
Se a maioria quiser, ainda pode ser muito relevante o ponto de chegada.

Aplausos do PS, de pé.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado
Telmo Correia.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.
Deputado Paulo Pedroso, como é hábito, ouvi-o com a maior atenção e até com
apreço, porque considero que fez um exercício da maior dificuldade: V. Ex.ª
assistiu ao jogo, viu exactamente o mesmo jogo que nós, percebeu que o
resultado que obtivemos foi uma vitória por 3-0 e entreteve-se na tribuna,
durante algum tempo, a explicar por que é que não era bem assim,…

O Sr. Eduardo Ferro Rodrigues (PS): - Essa agora!

O Orador: - … que, afinal, não era bem uma vitória, tentando desculpar-se
com o árbitro ou com outra coisa qualquer, numa tentativa de explicar que o
resultado a que se chegou não foi uma vitória indiscutível do Governo!
Sr. Deputado Paulo Pedroso, só para lhe dar um exemplo da sua extensa
intervenção - de resto, documentada e de quem tem conhecimento destas áreas -,
a certa altura, pareceu-me afadigar-se na demonstração de que, afinal, a
proposta não era simplificadora.

O Sr. José Sócrates (PS): - É isso mesmo!

O Orador: - A certa altura, V. Ex.ª embalou por aí. E eu devo dizer que
considero essa tese extraordinária, porque, tanto quanto sabemos, com este
código, teremos a revogação de, eventualmente, 70 diplomas, sendo 30 ou 40
essenciais. Ou seja, em vez dos 70 diplomas, passamos a ter um código e são
revistas leis importantes, como a Lei do Contrato de Trabalho, a Lei da Duração
do Trabalho, a Lei Sindical, a Lei das Associações Patronais, a "lei dos
três F" (Lei das Férias, Feriados e Faltas), enfim, todo um conjunto de
diplomas que nós, os que nos habituámos a lidar com estas matérias, conhecemos
e sabemos que foram feitos ao longo do tempo e com alterações sucessivas.
Portanto, repito, em vez dos 70 diplomas, passamos a ter 1 e V. Ex.ª consegue
dizer-nos que não há simplificação, que não há uma nova unidade e uma nova
coerência jurídica. Isto demonstra que o seu esforço, embora importante, é
quase um exercício impossível, Sr. Deputado Paulo Pedroso. Aliás, esforça-se
também em demonstrar-nos que, em matéria de contratação colectiva… No limite,
V. Ex.ª diz que não pode haver regulamentação, mas há -…

Vozes do PS: - Não há!

O Orador: - … e V. Ex.ª sabe-o! Há sempre uma solução final de arbitragem e
a designação final dessa arbitragem é feita, inclusivamente, pelo Conselho
Económico e Social. V. Ex.ª sabe isso tão bem como nós!

O Sr. António Costa (PS): - Essa é a nossa proposta!

O Orador: - Não! É a do Governo, como poderão verificar.
V. Ex.ª esforça-se, assim, para demonstrar o indemonstrável e só não responde
àquela que é para nós a questão essencial.
Começou o Secretário-Geral do Partido Socialista este debate dizendo que isto
era um míssil, que era um atentado, que era uma coisa perigosíssima, que era o
conflito pelo conflito, que era um excesso, que era uma coisa de grande perigo.
A seguir, V. Ex.ª diz que vamos de recuo em recuo, que o Governo foi recuando,
recuando…

O Sr. António Costa (PS): - Não, não!

O Orador: - Ora, se, primeiro, estava mal, supõe-se que, depois de todos
esses recuos, deveria de estar bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Telmo Correia, o tempo de que dispunha
esgotou-se.

O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente.
A conclusão lógica é essa! Ou seja, VV. Ex.as não responderam à questão de
saber por que razão criticaram a ausência de diálogo e de concertação e agora
criticam o resultado da concertação.
Esta foi a pergunta e a ela, até agora, não responderam, sendo que eu aprecio
alguns dos esforços que foram feitos e até o cumprimento a si pessoalmente, Sr.
Dr. Paulo Pedroso, pela sua participação no tempo de antena da CGTP, que, em
minha opinião, foi um contributo decisivo para que houvesse compromisso
tripartido!

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo
Pedroso. Dispõe de 3 minutos.

O Sr. Paulo Pedroso (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Telmo Correia, a
minha preocupação é a de que o saldo final deste processo não seja uma derrota
das relações de trabalho em Portugal.

O Sr. José Sócrates (PS): - Muito bem!

O Orador: - A minha intervenção está centrada nessa preocupação. E não precisamos
de mais recuos. Do que agora precisamos é de avanços, ou seja, que os senhores
avancem para a proposta que aqui devia estar e não está.

O Sr. António Costa (PS): - Exactamente!

O Orador: - Se o Sr. Deputado não compreende por que motivo esta matriz é
errada, vou tentar explicar em poucos segundos. É-o por uma razão simples: para
que a lei seja sistemática, transparente e eficaz deveria ser mais pequena,…

O Sr. José Sócrates (PS): - Muito bem!

O Orador: - … deveria ser clara quanto ao que fica para a negociação
colectiva e deveria confiar na responsabilidade dos parceiros.

Aplausos do PS.

Esta lei é excessivamente grande, esta lei é contra a autonomia da
negociação colectiva, esta lei mantém o governo, seja ele qual for, a procurar
comandar as relações de trabalho.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - É melhor do que a vossa, que era muito
pequena!

O Orador: - Para terminar, Sr. Deputado, parece-me que está mal informado
num ponto e se defende isso estamos muito bem, porque certamente irá apoiar as
propostas do PS.
A proposta do Governo deixa, em caso de caducidade, nas mãos de qualquer
governo, em qualquer conjuntura, a possibilidade de decidir se há ou não essa
arbitragem. Nós queremos que quem pede a caducidade se obrigue, logo ali,…

O Sr. António Costa (PS): - Claro!

O Orador: - … repito, logo ali, a que, se a contraparte avançar, haja essa
arbitragem.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Se o Sr. Deputado Telmo Correia está de acordo connosco, então,
junte-se a nós e já estará a dar, nesse avanço, um dos tais passos em direcção
ao bom caminho.

Aplausos do PS.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Isso consta da proposta de lei!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado
Manuel Dias Loureiro.

O Sr. Manuel Dias Loureiro (PSD): - Sr. Presidente, Sr.ª e Srs. Membros do
Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Há um provérbio de que gosto muito, que diz:
"Quando o vento sopra forte, alguns abrigam-se, outros constroem
moinhos".
Não há dúvida de que o vento sopra forte. Sopra forte no mundo e sopra forte em
Portugal.
No caso do nosso país, para não falar de outros aspectos, sopra forte nas
contas públicas, que só com enorme esforço estão a ser controladas;
Sopra forte no sobreendividamento das famílias, das empresas e do Estado;
Sopra forte na dimensão assustadora do nosso défice corrente que, na União
Europeia, só encontra paralelo na Itália do Sul e no Leste da Alemanha e que
está muito acima do défice de países que não têm, de momento, qualquer hipótese
de sonhar com níveis de vida desenvolvidos. Com uma enorme diferença: enquanto
o Norte de Itália e o Ocidente da Alemanha sempre hão-de pagar a factura dos
seus concidadãos do Sul e do Oeste, respectivamente, connosco não vai passar-se
nada de semelhante;
Sopra forte, para abreviar, quando temos de reconhecer - por mim, com tristeza
- que não fomos capazes de aproveitar conjunturas favoráveis que, servidas com
esforço próprio, estratégias correctas, sentido de inovação e de risco,
poderiam ter significado progresso consistente.

O Sr. Patinha Antão (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Há, por isso, uma questão que nos interpela a todos, que
interpela a nossa geração: vamos querer e ser capazes de, no mais curto espaço
de tempo, atingir, pelo menos, os níveis médios de desenvolvimento da União
Europeia, ou não?
Claro que é difícil, claro que o vento sopra forte. E nós, a geração que nós
somos, vamos abrigar-nos ou vamos construir moinhos? Vamos sucumbir ao medo,
acomodar-nos no "deixa andar", ou vamos ousar fazer?
Cada um dará a sua resposta.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados:
O debate que se trava hoje nesta Câmara e que se tem travado no País, ao longo
dos últimos meses, tem tudo a ver com isto.
Este debate provocado pela iniciativa do Governo tem, entre muitas, a vantagem
de separar as águas: de distinguir aqueles que querem ousar, que, perante as
dificuldades, não se dão por vencidos, os que não querem passar à história como
uma geração incapaz, e os outros, os que teimosamente se recusam a olhar de
frente a realidade, reféns de muitas cegueiras, que lhes não deixam ver nem o
futuro nem o abismo para onde caminham.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. José Sócrates (PS): - Nem a luz!

O Orador: - Felizmente para Portugal, a maioria e o Governo estão do lado
dos que fazem, dos que ousam e se não acomodam.

O Sr. António Costa (PS): - Aí é que está o erro!

O Orador: - Felizmente para Portugal, juntamente com a maioria e o Governo,
muitas forças sociais, empresariais e sindicais estão do lado dos que querem
prestar contas à história de cabeça erguida.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - O PSD, hoje pela minha voz, está aqui para dizer que é deste
lado que está. Que está, aliás, no lado onde sempre esteve: no lado onde mora o
inconformismo, onde mora a coragem, onde mora a mudança, onde mora a luta e o
esforço, onde mora a ousadia, a persistência e o sentido de risco.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

E por isso estamos aqui para apoiar esta reforma fundamental.
Para apoiar e felicitar o Governo pela iniciativa, sem dúvida, mas também, e em
primeiro lugar, para o felicitar pelo caminho escolhido.
Já direi como é importante esta reforma, mas deixem-me primeiro dizer do acerto
do método escolhido.
O Governo podia ter escolhido um método diferente de acção. Podia ter submetido
a esta Câmara um projecto de lei e contado com os votos da maioria, que o
apoia, para o aprovar. Sem mais. Faria mal!

Felizmente, o Governo escolheu colocar as suas ideias, com abertura de
espírito, à discussão das forças políticas, sociais e dos cidadãos em geral,
por um período de mais de 6 meses.
E, nesse longo espaço de tempo, dialogou, tentou convencer, ouviu, ajustou,
aqui e ali, as suas ideias às ideias de outros e lutou, serena mas tenazmente, contra
muita desinformação, sempre convicto de que mais importante que aprovar esta
lei era encontrar uma solução que, nesta matéria, mobilize para a acção
empregadores e empregados e o País de um modo geral.
Fez, por isso, muito bem o Governo!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Porque o que move a maioria e o Governo, Srs. Deputados, não é que Portugal
tenha mais uma lei publicada em letra de forma no Diário da República. Não! O
que a maioria e o Governo querem é que aconteça, no dia-a-dia da vida, um
conjunto de atitudes concretas, de factos novos que permitam prosperidade e
progresso para as empresas, para os trabalhadores, para as famílias, numa
palavra, para o País!
Este Governo nunca se proclamou o campeão do diálogo, mas, aí está, sem
proclamações grandiloquentes, levou a cabo um seriíssimo trabalho de diálogo,
direi melhor, de concentração que conduziu aos melhores resultados.
Também nisto os tempos mudaram.
Srs. Deputados e Srs. Deputados do Partido Socialista, diz o povo, e com razão,
que "num lado se põe o ramo e noutro se vende o vinho".
Felicito-o, Sr. Ministro do Trabalho, e, em si, felicito o Governo.
Congratulo-me, também, com o sentido de responsabilidade da CIP e da UGT. Por
um lado, porque, concomitantemente com o acordo que conseguiram, fizeram renascer
em Portugal um instrumento crítico do progresso que é a concertação social. E,
ainda, porque este acordo tripartido constitui para os portugueses um claro
sinal de ânimo e de confiança. No momento de desânimo e preocupações, em que
faz falta realizar tanta coisa difícil, os portugueses ficam a saber que,
juntamente com o Governo, há instituições responsáveis dispostas a juntar
esforços para tornar a vida melhor.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O PSD apoia
com entusiasmo esta proposta de lei.
E deixe-me dizer-lhe, Sr. Deputado Paulo Pedroso - que ouvi com muita atenção
-, que onde há intervenção humana, há sempre imperfeições. É da natureza das
coisas. O problema é saber se estamos, ou não, dispostos a mudar, a corrigir, a
aperfeiçoar. O problema é saber se estamos, ou não, dispostos a ousar fazer. E
o actual Governo, em todo este processo, deu prova cabal de que esteve sempre
disposto a melhorar, a aperfeiçoar. Sabe porquê? Por uma razão extremamente
simples: é que o Governo não quer uma lei, não quer um conjunto de páginas que
são artigos. O Governo quer um conjunto de normas que tenham eficácia,
aplicabilidade e que tenham resultados concretos. E, por isso, está sempre
disposto a mudar, a fazer melhor. Este é o espírito de quem esta na política
desta maneira!

O Sr. Paulo Pedroso (PS): - E vai continuar assim…

O Orador: - Sr. Deputado Paulo Pedroso, o senhor disse que o PS faria uma
lei diferente. E por que não o fez? Esteve seis anos no poder, por que não o
fez?!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Mas vou dizer-lhe por que não o fez! O PS não fez essa lei, não foi por ser
um partido perfeccionista, a quem a imperfeição causa horror e não pode correr
o risco de fazer coisas menos perfeitas. Não! Não foi por isso! Esse ainda
seria um sentido desculpável. O PS não fez essa lei, nem outras leis, pelas
piores razões em política: porque não tem coragem, porque teve medo de perder
votos! Foi por isso que não fez essa lei!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

E esse é o pior espírito, Sr. Deputado, com que se pode estar na política.
Nós apoiamos, de facto, esta proposta de lei. E tem fundadas razões o nosso
apoio.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Vocês não tinham ganho as eleições com esta
proposta de lei!

O Orador: - Numa palavra, podemos dizer que, tratando-se de uma mudança,
Portugal, modernizando-se, atento ao que se passa no mundo, muda de rumo em
matéria de relações de trabalho.
Não é, portanto, uma mudança no que é irrelevante ou acessório. Não é uma
mudança para, apenas, permitir ao Governo afirmar que, nesta matéria, cumpriu
uma promessa eleitoral. Não! Trata-se aqui de mudar no que é essencial e, por
isso, podemos dizer que Portugal muda de paradigma em matéria de relações de
trabalho.
Com vantagens para todos: para os empregadores, para os empregados, para as
empresas e para o País no seu conjunto.
Ganham os trabalhadores em múltiplos aspectos, porque, de facto, a lei é mais
justa para os trabalhadores.
Podia dar um conjunto de exemplos,…

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Até agora, nada disse sobre a proposta de
lei!

O Orador: - … mas vou dar três exemplos.
Pense-se, por exemplo, no regime do trabalho prestado a recibo verde; atente-se
na criminalização do trabalho de menores; repare-se no direito de reclamação de
créditos ao grupo a que a empresa pertence, uma novidade com um valor
inestimável para os trabalhadores que têm direitos de crédito.
Portugal, num estudo da OCDE, tem, até agora, a mais rígida legislação em
matéria de relações laborais.
Quem ganha com esse facto? Aparentemente, pensam alguns, os trabalhadores com
emprego. Puro engano. Na prática, todos perdem: perdem os donos do capital,
perdem as empresas, perde o País, perdem os que procuram emprego - o desemprego
jovem, em Portugal, é elevado e não baixo, como se pode pensar - e perdem
também os trabalhadores empregados.
Atente-se nisto: de que serve esta falsa protecção do emprego se ela prolonga a
vida de empresas obsoletas, para além do economicamente viável? Sim, de que
serve e a quem serve? A ninguém, seguramente.
A quem serve a rigidez que faz com que as empresas, não recrutando mais pessoal
quando precisam, recorram a trabalho extraordinário que aumenta custo e diminui
competitividade e coloca mais jovens que procuram emprego fora das empresas?
E quem pensa nos jovens - e tantos jovens qualificados à procura de emprego,
que a rigidez da lei coloca em fila de espera à porta das empresas?
E quem pensa nos desempregados que, por efeito da rigidez normativa, caem em
Portugal, quase fatalmente, em desemprego de longa duração?
Enfim, não quero ir mais longe. Neste aspecto, termino, dizendo que a
flexibilidade do novo sistema - seja geográfica, horária, funcional ou
contratual - é um passo de gigante no sentido da modernidade, que induzirá a
criação de emprego, fortalecerá as empresas e, portanto, será factor de mais
progresso e desenvolvimento.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - E será assim, porque o novo código representa, como devia, um
equilíbrio sensato entre direitos e obrigações de trabalhadores e direitos e
obrigações de titulares do capital e das empresas.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Falei do vento
que sopra e das duas atitudes que podemos tomar.
Não tenho dúvida de que os tempos são difíceis. Há, no entanto, um enorme
espaço para o optimismo, que é o espaço da vontade, da coragem e do querer.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - E estes, e só estes, são os ingredientes do sucesso.
Vamos ter um novo código do trabalho. Temos de evitar uma tentação: a de pensar
que ele é a panaceia para todos os velhos males e de que ele, por si só, tudo
resolverá.

Vozes do PS: - É isso mesmo!

O Orador: - Nada seria mais errado.
Portugal tem de vencer o problema difícil da produtividade, a que alguns chamam
mesmo o "calcanhar de Aquiles" da economia portuguesa.
A longo prazo, o crescimento do rendimento per capita em Portugal será
totalmente determinado pela evolução de produtividade.
Não tenho qualquer dúvida de que este novo paradigma nas relações de trabalho
vai influenciar de forma positiva a produtividade.
Este código, tendo a enorme vantagem de deixar à contratação colectiva um
vastíssimo campo de acção, atribui, por esse facto, uma enorme responsabilidade
económica - e também social - a empregadores e empregados e, nessa medida,
deixa nas mãos dos empresários e trabalhadores a possibilidade de maior sucesso
para as empresas.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Não duvido de que o factor crítico desse sucesso será a evolução
da produtividade.
Não é por acaso que, a propósito deste código, se falou tanto de produtividade.
É por isso que deixo aqui um alerta: é fundamental evitar a ilusão de que a
produtividade, e sobretudo a sua fraca evolução em Portugal, é culpa exclusiva
dos trabalhadores.
Seria uma ilusão muito perigosa. Se a produtividade evolui mal no nosso país,
não é porque os trabalhadores trabalhem pouco! Pelo contrário. Eu sou dos que
pensam que em Portugal o progresso que temos tido se deve ao muito trabalho dos
trabalhadores, só que muito pouco eficiente!

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - E de quem é a responsabilidade?! Das
empresas?! Da gestão?! Da organização?!

O Orador: - O Sr. Deputado tornou-se um Deputado nervoso. Não se antecipe.
Já digo de quem é a responsabilidade.
E, para mim, a principal culpa desta baixa eficiência não está nos
trabalhadores. Está, desde logo, na organização e gestão empresarial.
Sr.as e Srs. Deputados, não vale a pena fecharmos os olhos à realidade se
queremos vencer os ventos que sopram.
Em Portugal, há empresas de produtividade muito forte e muito competitivas.
Detidas por nacionais e detidas por estrangeiros. Há empresas inseridas em
grupos multinacionais em que a produtividade da empresa portuguesa é das mais
altas que os respectivos grupos têm no conjunto.

O Sr. Eduardo Ferro Rodrigues (PS): - Com as leis laborais que existem!

O Orador: - Poderia nomear muitas dessas empresas.
Por isso, é claro que a questão da organização e da gestão empresarial, que
naturalmente ganha novos instrumentos com este código, é na empresa a questão
crucial.
Só acredito numa empresa que é uma comunidade de interesses de empregadores e
empregados, onde, desde a base, se reconhece e se incentiva o trabalhador à
iniciativa e à criatividade.
O que a prática de vida me tem ensinado é que na empresa só há sucesso - e aí
há sucesso - quando existe uma organização que incute a todos o sentimento de
pertença a uma comunidade, que estimula a iniciativa e a criatividade, que
incentiva e premeia o mérito, e a todos dá - gestão e trabalhadores - o
sentimento de co-responsabilidade pelos resultados alcançados.

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

O Orador: - Mas se assim é, bem se compreende que nesta matéria a primeira
responsabilidade não cabe aos trabalhadores. Cabe, naturalmente, a quem pode
definir a organização, e essa é, obviamente, a gestão!
E, para que não haja outras ilusões, cabe dizer outras coisas. Repito: para que
não haja outras ilusões.
Os níveis de produtividade de que o País necessita de alcançar dependem em grande
medida de acções, de políticas, de estratégias, que não estão, de todo, nas
mãos dos trabalhadores.
Contas públicas saudáveis!
Que culpa cabe aos trabalhadores na política que deixou deteriorar até ao
desastre as contas públicas?

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - É melhor fazer, então, um "código
empresarial"!

O Orador: - E, no entanto, contas públicas saudáveis, num ambiente
macroeconómico saudável, influenciam decisivamente a produtividade de um país!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - E o destino do investimento no nosso país?
Que papel cabe aos trabalhadores na definição dos destinos do investimento
público e privado? Nenhum! E, no entanto, dos destinos do investimento depende
enormemente a produtividade.
Desde há muito, o investimento em Portugal tem sido dos mais elevados da Europa
em termos relativos. O problema é que o destino dos nossos investimentos - da
sua maior fatia - são as obras, os edifícios, as casas, as construções e, até,
as estradas!
O sector da construção civil tem, em Portugal, aproximadamente um peso próximo
do dobro da média da União Europeia.
A quem se atribuirão as culpas por estas reiteradas opções de investimento? Não
é, seguramente, aos trabalhadores. Quem fala em investimento, fala em perfil
produtivo.
Por que é que a elevação do perfil produtivo do nosso país praticamente
estagnou na última década?
Quem pode mencionar um investimento estruturante feito no nosso país que nos
tenha catapultado para outras plataformas de tecnologia, onde o valor
acrescentado é substancialmente maior?
Depois da entrada em Portugal do sector da tecnologia automóvel, onde estão
outros investimentos relevantes que nos tenham aberto novas portas
tecnológicas? Em lugar nenhum!
E, depois, constatamos, com tristeza, o ritmo de desaceleração do emprego de
base tecnológica em Portugal, comparado com a aceleração, nos mesmos domínios,
em países como a Irlanda e a Espanha, para não falar de outros.
E este factos têm a ver - têm tudo a ver - com produtividade e em todos eles
nenhuma responsabilidade cabe aos trabalhadores.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

O Orador: - E a educação e a formação? Onde tem estado um sistema educativo
que ensina a aprender e ensina, sobretudo, uma cultura de exigência e uma ética
de responsabilidade?
E a investigação e o desenvolvimento? Quanto gasta Portugal em I&D, em
percentagem do PIB, comparando com outros países europeus de dimensão
semelhante?

O Sr. José Sócrates (PS): - Pergunte ao Governo!

O Orador: - Srs. Deputados do Partido Socialista, deixem-me dizer-lhes o
seguinte aparte: tenho estado a ver com atenção os vossos acenos de cabeça.
Ainda não perceberam que estou a fazer críticas ferozes àquilo que fizeram
durante seis anos?!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Vozes do PS: - Não é verdade!

O Orador: - Tenham paciência, mas é a verdade!

Protestos do PS.

Os senhores reconhecem que isto é verdade e que tenho razão - por isso o
vosso aceno de cabeça. Só se esqueceram que a culpa é vossa!

Protestos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não entrem em diálogo. Deixem falar o
orador.

O Orador: - Como estava a dizer, e a investigação e o desenvolvimento?
Quanto gasta Portugal em I&D, em percentagem do PIB, comparando com outros
países europeus de dimensão semelhante?

O Sr. Paulo Pedroso (PS): - A política de I&D está a descer no nosso
país!

O Orador: - A Suécia, com uma população idêntica à de Portugal, é o país
mais inovador do mundo.
E o que temos feito, consistentemente, no domínio da fundamental valorização
dos produtos pela marca e pelo design?
E que políticas alimentaram, nos últimos anos, uma estratégia consistente de
investimento no aproveitamento das nossas condições naturais e na produção de
bens transaccionáveis?
E por onde tem andado a capacidade de Portugal na captação da IDE (Investimento
Directo Estrangeiro)?
E tudo isto, Sr.as e Srs. Deputados, tem tudo a ver com a produtividade
portuguesa.
E que relevância - falo de relevância económica - tem tido o facto de
pertencermos a uma comunidade de quase 200 milhões de pessoas que se exprimem
em português?
E por que nos temos queixado de ser um País periférico, em vez de, como fez,
por exemplo, a Irlanda, nos preocuparmos com estratégias que transformem a
nossa periferia em relação à Europa numa vantagem competitiva que nos coloque
numa nova e rentável centralidade? E Portugal tem todas as condições para isso:
no centro da Europa, por um lado, África, por outro, América do Norte e do Sul,
por outro. Por que não o fazemos?
E por que nos queixamos da invasão do nosso mercado por produtos espanhóis, em
vez de repararmos que entre Portugal e Espanha há uma via de sentido duplo e
que, portanto, as nossas estratégias empresariais têm, pelo menos, de ser
pensadas para o mercado de 50 milhões de pessoas, que é o mercado ibérico?
Por que é que a Espanha já vende por ano tanto a Portugal como vende à América
Latina?
Em que medida estamos nós, portugueses - sobretudo Governo, associações
empresariais e empresas -, a preparar-nos para tirar proveito deste enorme
mercado?
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Tudo o que
venho de dizer são outros tantos aspectos fortemente críticos da nossa
produtividade. E em todas as questões muitos serão os responsáveis, mas entre
eles não se contam os trabalhadores.

Pareceu-me, por isso, adequado que, no debate que conduzirá à aprovação do
novo código do trabalho, ficasse claro que nós, no PSD e na maioria, estamos
conscientes das responsabilidades que cabe a cada um: ao Estado, ao Governo, às
empresas e, também, aos trabalhadores. Mas nunca cairemos na tentação de passar
responsabilidades ou culpas a quem, de todo, as não tem.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - E, mais do que isso: no momento em que aprovamos uma reforma
estrutural de magna importância, quis deixar claro que para nós próprios
políticos, sobretudo para nós, maioria, quanto temos pela frente, em tantos
domínios, ainda para fazer.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O que nos
preocupa é que todos sejamos capazes de construir um País consistentemente
progressivo e solidário - solidário, porque, para nós, o crescimento só é
económico para ser social.
Sabemos que os tempos não são fáceis. Temos, no entanto, um espírito aberto à
mudança e à reforma e acreditamos que o trabalho e a inteligência são as fontes
mais consistentes do progresso dos povos.
Sabemos que os tempos não são fáceis e que à nossa volta há ventos que sopram
forte. Podemos procurar abrigos ou construir moinhos. É connosco, portugueses.
É só connosco!
Nós, na maioria e no PSD, como sempre, escolhemos construir moinhos!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o
Sr. Deputado Paulo Pedroso.

O Sr. Paulo Pedroso (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Manuel Dias Loureiro,
não seria necessário mais do que a sua intervenção para demonstrar que o Código
do Trabalho que aqui está a ser discutido é irrelevante para as questões da
produtividade e da competitividade em Portugal. O senhor demonstrou-o e
cumprimento-o por isso.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Deputado, pergunto-lhe: face ao seu diagnóstico, vai
viabilizar o conjunto de propostas do Partido Socialista relativamente à
competitividade? É porque são essas que vêm responder às suas preocupações e
não este Código.
Em segundo lugar, o Sr. Deputado fala em investigação científica e em educação.
Assim, pergunto-lhe se está ou não plenamente consciente de que são os
Orçamentos do Estado deste Governo que estão a fazer descer o investimento de
Portugal em investigação científica e em educação, invertendo uma curva que
durou seis anos.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Em terceiro lugar, disse o Sr. Deputado, com grande injustiça,
que não houve coragem para governar. Ora, a situação do País que herdámos em
1995 seguiu-se a oito anos de maioria absoluta do seu partido. A legislação do
trabalho que herdámos em 1995 seguiu-se a oito anos da vossa maioria absoluta!!
Quem fez a lei das 40 horas? Quem fez a primeira lei relativa à flexibilidade e
à polivalência no trabalho? Quem mexeu nos contratos a prazo? Quem fez a nova
fórmula de cálculo das pensões? Quem fez a co-incineração que os senhores
suspenderam sem a substituir por nada?

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Manuel Dias Loureiro, tem mais um pedido de
esclarecimento. Quer responder agora ou em conjunto?

O Sr. Manuel Dias Loureiro (PSD): - Respondo já, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Então, tem a palavra para o efeito.

O Sr. Manuel Dias Loureiro (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Paulo
Pedroso, não acredito no que diz. Não acredito que o senhor pense para si
próprio que esta proposta de lei não tem que ver com produtividade, porque, de
facto, tem!
Não temos tempo para debater agora o que já foi debatido e está claro, mas
dou-lhe um exemplo.
Sr. Deputado, não acredito que o senhor, que foi responsável pela pasta do
Trabalho, não saiba o que se passa hoje, por exemplo, em matéria de organização
do trabalho. Não acredito que não saiba o que são weekend only work rolling
two-shift e horas anuais de trabalho… Isto tem que ver com aquilo de que
falamos aqui. Nada disto é possível no âmbito das actuais leis. Tudo isto de
que falo equivale a outros tantos aspectos críticos em relação à produtividade.
Portanto, o senhor sabe perfeitamente que não acredita que este código não tem
muito a ver com produtividade. Aliás, no futuro, este código tem seguramente
muito a ver com empresas que sejam mais competitivas. É nesse sentido que apoio
esta proposta de lei.
No entanto, o que eu disse é diferente: eu disse que isto tem a ver com
produtividade, mas não tem tudo a ver com produtividade. Melhor: a
produtividade não depende só disto, depende de muitas mais coisas.
Fala em I & D. Ora, Sr. Deputado, não estou aqui para falar apenas no que
nós próprios fizemos ou no que os senhores fizeram nessa matéria, estou a dizer
que o País - e fiz uma comparação com a Suécia - tem de preocupar-se com esta
questão e investe pouco em I & D. Não estou sequer a dizer que isto depende
só de políticas públicas, digo que as empresas investem pouco em I & D.

O Sr. António Costa (PS): - É verdade!

O Orador: - Quer dizer, esta é uma questão nacional que envolve todos.

O Sr. António Costa (PS): - Exactamente!

O Orador: - O senhor não tem de estar aí a dizer, com grande euforia,
"não, agora". Não é assim. Esta é uma questão que o País tem de
resolver.
Sr. Deputado, o que me move não é vir aqui fazer um brilharete parlamentar,
pois já tenho muitos anos de política. O que me move é contribuir para que o
País e as empresas tenham condições para andar para a frente, o que me move é
que, como geração - que é também a sua,

embora seja mais novo do que eu -, possamos aparecer perante os nossos netos
de cabeça erguida pelo que fizemos. É isso que me move fortemente e que penso
que deve mover-nos a todos.
Em terceiro lugar, devo dizer-lhe que creio que o PS tem três dificuldades.
Digo-lhe isto sem qualquer acrimónia e com todo o respeito, pois tenho imenso
respeito por toda a gente e por todos os Deputados, por maioria de razão.

O Sr. José Sócrates (PS): - Vai dizer com acrimónia, vai!

O Orador: - Não! Verá que vou dizê-lo sem qualquer acrimónia, Sr. Deputado!
Como dizia, considero que o PS tem três dificuldades: por um lado, tem a
dificuldade de que, estando convencido de que esta lei é necessária - está
convencidíssimo; não acredito que, no PS, haja quem não pense que esta lei é
fundamental! -, apesar de tudo, pensa que "tem de estar contra",
pensa que nasceu para estar no contra. É que o PS tem um problema fatal, uma
marca indelével com que nasceu: mesmo quando está no poder, o PS é um partido
do reviralho e do contra... Os senhores nasceram assim e hão-de morrer assim.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. José Sócrates (PS): - Não resiste à politiquice!

O Sr. António Costa (PS): - É muito coimbrão!

O Orador: - Não sou coimbrão! Isto é bem verdade, Sr. Deputado! Aliás,
durante os seis anos que estiveram no poder, provaram-no bem!
A outra dificuldade que o PS tem é a de que não sabe como há-de
"coser" o seu próprio discurso com a atitude que a UGT teve nesta
matéria. É uma dificuldade vossa e não posso resolvê-la.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra a
Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, roubando 1 minuto ao 15 minutos
de que o PCP dispõe para discutir quase 700 artigos da proposta de lei, pediria
ao Sr. Deputado Manuel Dias Loureiro que resolvesse uma perplexidade que a sua
intervenção me suscitou.
Primeiro, pensava que a conclusão da sua intervenção seria a de que era preciso
um código de conduta empresarial.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Exactamente!

A Oradora: - Segundo, não explicou V. Ex.ª, na sua intervenção, afinal, por
que é que era necessário um código do trabalho. Assim, agradecia se pudesse explicar-me,
porque penso que muita gente ficou perplexa, já que o seu discurso é diferente
do do Sr. Ministro do Trabalho.

O Sr. António Costa (PS): - Isto é um elogio!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Dias
Loureiro que dispõe de 3 minutos.

O Sr. Manuel Dias Loureiro (PSD): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Odete
Santos, ainda bem que me faz essa pergunta porque estive para falar nisso na
minha intervenção e não o fiz por esquecimento.
Sabe, há um erro que está a ser cometido em relação a esta proposta de lei. É
que as pessoas pensam que este código é para os trabalhadores, mas não é. Este
é um Código para empregadores e para trabalhadores. Não ter percebido isso é
não ter percebido o essencial em relação a esta matéria.
Espero é que trabalhadores e empregadores, com as potencialidades que podem
retirar desta nova lei, consigam trazer mais sucesso para as empresas que, na
minha perspectiva, são aquelas de que falei, empresas que são entendidas como
eu próprio as vivo no dia-a-dia.
É que, sabe, Sr.ª Deputada, não estou aqui a falar de cor, estou a falar de
coisas com que lido no dia-a-dia, muitas horas por dia, e sei como é que isto
funciona.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Quanto ao que disse sobre os empresários, sim,
senhor!...

O Orador: - Portanto, Sr.ª Deputada, quero dizer-lhe que este é um Código
para os trabalhadores, que terão de respeitá-lo e do qual terão de valer-se
para valorizar o seu próprio trabalho dentro da empresa, e também para os
empregadores.
Se assim for, se uns e outros tirarem deste Código vantagens novas, por
exemplo, em termos de organização do trabalho, então, sim, penso que valeu a
pena, penso que alcançámos o que pretendíamos, isto é, trazer para as empresas
possibilidade de melhor trabalho, mais sucesso, mais desenvolvimento, mais
crescimento, para as empresas, as famílias e o País, pois é do que se trata.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado
Álvaro Castello-Branco.

O Sr. Álvaro Castello-Branco (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro do
Trabalho e da Segurança Social, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, Srs.
Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Desde há muito que a necessidade
de uma reforma da legislação laboral era sentida como imperativa pela sociedade
portuguesa ou, no mínimo, por uma larga maioria desta.
E isto porque a maior parte da legislação dispersa sobre esta matéria tem, em
média, mais de 15 anos. Traduz, pois, muita desta legislação um completo
desfasamento da realidade sócio-económica portuguesa e europeia.
É por demais evidente que as realidades actuais pouco, ou nada, têm a ver com
aquilo que se passava há 15, 20 ou 25 anos atrás.
Era necessário e premente agir.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Aliás, necessidade que o governo anterior, o governo socialista,
também sentiu quando, em Março do ano 2000, nomeou a chamada Comissão de
Análise e Sistematização da Legislação Laboral, que tinha como objectivo (e
cito) "a acessibilidade dos regimes legais, a necessidade de abrir espaços
à negociação colectiva e, ainda, o propósito de elevar o nível de adequação e
eficiência da legislação laboral (…)".

O Sr. Paulo Pedroso (PS): - Muito bem!

O Orador: - Todos sabemos que ao fim de dois anos - e isto são factos -, ou
seja, até à entrada em funções do actual Governo, esta Comissão limitou-se a
apresentar ao anterior governo, em Setembro de 2001, um número reduzido de
propostas de sistematização e absolutamente nenhuma proposta de alteração da
legislação laboral.
O governo socialista deu como assente a necessidade da reforma, mas não foi
capaz de fazê-la!
Diferentemente, este Governo, perante este imperativo, fez aquilo que se espera
de um governo: agir!

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - E fê-lo de uma forma que não posso deixar de realçar, de uma
forma que se consubstanciou num anteprojecto de código do trabalho que serviu
de documento de suporte, quer para uma ampla discussão pública quer como base
de trabalho ao nível da concertação social;
De uma forma que se traduziu em mais de 130 horas de reuniões à mesa dessa
mesma concertação social;
De uma forma que levou o Sr. Ministro Bagão Félix e o Sr. Secretário de Estado
do Trabalho a percorrerem o País de lés a lés, participando em mais de 120
debates e conferências;
De uma forma que levou o site do Ministério a ser visitado, nestes cerca de
seis meses desde a apresentação do anteprojecto, por mais de meio milhão de
pessoas, contribuindo com a sua opinião e as suas sugestões.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: A proposta de
lei que hoje apreciamos, na generalidade, é fruto de todo este amplo e exemplar
processo de discussão e debate.
Permita-me, pois, Sr. Ministro, em nome do CDS-PP, saudar o processo de diálogo
e abertura, com que V. Ex.ª conduziu toda esta tramitação da reforma da
legislação laboral: uma reforma que permite, finalmente, uma codificação,
obviando as enormes dificuldades de uma legislação até agora dispersa em cerca
de 120 diplomas; uma reforma que vem permitir a adaptação do regime de trabalho
à realidade do mundo laboral, conseguindo, assim, uma maior efectividade do
Direito do Trabalho, pois quanto mais próximo este estiver da realidade mais
garantias são asseguradas ao trabalhador.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Estamos perante uma proposta de lei que reforça a importância
dos direitos de personalidade, que não trata de maneira igual o que é
diferente, premiando a assiduidade e a competência, ou seja, aqueles que, efectivamente,
querem trabalhar.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Uma proposta de lei que acentua a protecção da maternidade e da paternidade,
valores que, incondicionalmente, devem ser protegidos; uma proposta de lei que
aposta no reforço da formação profissional, matéria fundamental para a tão
necessária qualificação.
Uma proposta de lei que acentua a preocupação com o cumprimento das normas de
higiene, saúde e segurança no local de trabalho.
Uma proposta de lei que promove a adaptabilidade e a flexibilidade da disciplina
laboral, nomeadamente, quanto à organização do tempo, espaço e funções
laborais, de modo a aumentar a competitividade da economia, das empresas e o
consequente crescimento do emprego.
Uma proposta de lei que introduz uma maior responsabilização das partes, quer
quanto ao cumprimento do contrato de trabalho quer quanto ao cumprimento da
regulamentação colectiva de trabalho, responsabilização que se traduz pelo
agravamento das sanções disciplinares e pelo aumento das coimas.
É, também, objectivo desta reforma o combate à situação de estagnação em que
vive a contratação colectiva, dinamizando-a, nomeadamente, através da limitação
temporal da sua vigência e da introdução de mecanismos condutores à sua
renegociação.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Esta revisão
da lei laboral tem a consequência de contribuir para um Portugal moderno e
aberto aos desafios da concorrência europeia.
Temos o desafio de adaptar a legislação laboral à realidade dos tempos actuais,
enfrentando as dificuldades estruturais de uma economia comum, colocando a
tónica sobre aspectos, como produtividade, qualidade no trabalho,
competitividade, estabilidade no emprego e, fundamentalmente, no combate ao
desemprego, sem dúvida um dos maiores problemas que enfrentam as novas
sociedades.
É inadiável aproximar o modelo social europeu dos parceiros comunitários,
adequando a legislação laboral às necessidades da nossa economia, criando as
condições para mais e melhor trabalho, mais e melhor produtividade, mais e
melhor investimento e, necessariamente, mais e melhor emprego.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Acresce que, hoje em dia, a questão laboral tem de ter uma visão
da empresa como um todo.
A legislação laboral não pode defender os patrões contra os trabalhadores ou os
trabalhadores contra os patrões, mas, sim, defender a empresa enquanto
comunidade de pessoas e de produção.
Os problemas dos patrões não são destacáveis dos problemas dos trabalhadores
nem os dos trabalhadores são separáveis dos dos patrões.
Sem empresas saudáveis e com lucros, não há trabalhadores com empregos
sustentáveis. Sem trabalhadores motivados e qualificados, não há empresa que
resista!

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados:
Há duas filosofias subjacentes à questão laboral. O modelo de inspiração
marxista, que entende a empresa como um palco privilegiado para o confronto e
conflito permanente, transportando para a empresa uma constante luta de
classes, quase que numa reminiscência histórica, lembrando o século XIX e os
tempos da Revolução Industrial.
Paralelamente a esta concepção, defendida por alguns, há uma filosofia que
assenta em princípios bem distintos e que entende a empresa como um todo,
enquanto comunidade de pessoas e produção, onde o seu interesse legítimo não
obsta a que haja interesses comuns entre os patrões e os trabalhadores. Esta
foi a concepção que triunfou. E esta vitória deve ser partilhada por todas as
correntes ideológicas que partilham princípios como o tripartismo e o da paz
social, do socialismo democrático, passando pela social-democracia, até à
democracia cristã.
Este acordo tripartido, entre entidades patronais, sindicatos e governo, é um
claro exemplo de triunfo desta concepção, onde se alcança a paz social, através
da concertação e do diálogo, permitindo, assim, uma tranquilidade maior nas
relações laborais.
Deste modo, o CDS saúda, uma vez mais, o Governo por este resultado, muito
significativo e de grande importância para este sector e que se traduz na plena
expressão do modelo que sempre defendemos.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada
Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Segurança Social
e do Trabalho, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Há várias
formas de estar no debate sem debater, mesmo falando. Foi o que aconteceu neste
debate com o Sr. Ministro da Segurança Social e do Trabalho, que a perguntas
muito concretas, colocadas, por exemplo, pelo meu camarada Jerónimo de Sousa,
disse nada; e, embora tivesse apelado ao debate da substância, sobre a
substância disse nada.
Esta proposta de lei apareceu, logo desde o início, sob o lema do combate aos
direitos dos trabalhadores - isso é inequívoco! E apareceram os trabalhadores -
e por isso eu disse que a intervenção do Sr. Deputado Manuel Dias Loureiro se
distanciava das várias afirmações que o Sr. Ministro do Trabalho tem feito -
como culpados da baixa produtividade e da baixa competitividade das empresas.
Isto foi o que resultou, logo ao princípio, das afirmações do Sr. Ministro do
Trabalho...

Vozes do PSD: - Não!...

A Oradora: - Foi, sim! E tanto que esta proposta de lei contém disposições
que vão baixar a produtividade. Como as vistas são, às vezes, muito curtas,
pensa-se que, barateando o custo do trabalho, pondo os trabalhadores com
horários desregulamentados, pondo-os a trabalhar de noite, sem o respectivo
pagamento do trabalho nocturno, se baixa o custo do trabalho e se aumenta a
produtividade. Mas é falso! É falso e há estudos, como, por exemplo, o da
Fundação Dublin, que fazem o retrato e tiram conclusões sobre o panorama geral
da situação dos trabalhadores na União Europeia, desde 1990 até ao ano de 2000,
estudos esses que revelam que a flexibilização e a desregulamentação têm
colocado os trabalhadores sob condições de trabalho terríveis, afectados por
graves doenças, de toda a espécie. Se lerem esse estudo, verificarão que está
lá tudo o que temos dito em defesa dos direitos dos trabalhadores.
Neste processo, os trabalhadores apareceram até injustiçados. É que haverá
maior insulto para um trabalhador do que ser apontado como fraudulento, de um
modo geral? O absentismo, que se apontou logo ao princípio, dava a ideia de que
as fraudes não eram situações excepcionais, que devem ser combatidas mas, sim,
habituais entre os trabalhadores.
E não ouvi falar aqui hoje na situação grave em que se encontram os
trabalhadores portugueses, apontada nesse estudo da Fundação Dublin, o qual
salienta que, em Portugal, a maior parte dos trabalhadores está ocupada naquilo
a que a Fundação chama de "trabalho servidão", trabalho não
qualificado. E há outros estudos sobre competitividade, a nível da União
Europeia, que também apontam, em relação a Portugal, a fraca qualificação dos
trabalhadores.
Em Portugal, a maioria dos trabalhadores não tem, de facto, um trabalho decente
e produtivo, como a OIT o define: um trabalho em condições de liberdade, de
equidade, de segurança e de dignidade.
E esta proposta de lei, visando a redução dos custos do factor trabalho (custo
que é o mais baixo da União Europeia), contribui ainda para uma maior
degradação das condições de vida dos trabalhadores!!
Acusamos esta proposta de lei, que constitui uma verdadeira hidra de várias
cabeças e que esconde ainda muitas outras, de ter no seu tronco uma matriz que
contraria o paradigma da nossa Constituição laboral.
A sua matriz é a de considerar que o trabalhador dispõe de liberdade contratual
quando celebra o contrato. Encontramos essa matriz em várias disposições,
nomeadamente naquelas em que se permite que um trabalhador possa celebrar um
contrato individual de trabalho com cláusulas mais desfavoráveis do que as
constantes dos instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho e da
própria lei (caso da mobilidade).
Encontramo-la emblematicamente nas disposições sobre direitos de personalidade,
em que houve o cuidado de proteger, em paralelo (como se estivessem em
igualdade) com os direitos dos trabalhadores, os direitos dos empregadores.
Acusamos esta hidra de trazer numa das suas cabeças uma ainda maior
precarização das relações laborais e uma precarização ainda maior no que toca
ao emprego jovem.
E não são as últimas negociações com dois parceiros sociais que vieram modificar
substancialmente este quadro. Essa última negociação, que pode ter um ou outro
ponto positivo, não altera o retrocesso social que resultará desta proposta de
lei. Nesse acordo, chega mesmo a fazer-se uma afirmação num número de um
artigo, que se reduz logo no número seguinte. É o que acontece com os contratos
a prazo que, afinal, não vão ficar em três anos mas, sim, em seis anos.
Acusamos esta hidra de várias cabeças de trazer numa delas uma maior
desregulamentação, já aqui referida, do horário de trabalho, havendo semanas em
que se trabalha 50 horas, 10 horas por dia, e permitindo-se que, por
contratação colectiva, se aumente os horários semanais para 60 horas, 12 horas
por dia, com um aceno amigável, claro, para a CIP!...
Acusamos a proposta de lei de contribuir também para a flexibilização, com a
alteração dos limites do trabalho nocturno, numa clara submissão dos
trabalhadores a uma organização de trabalho puramente ditada pelas regras do
mercado.
Acusamos esta proposta de lei de brandir, numa das suas cabeças, ferozes
ataques aos direitos conquistados pelos trabalhadores em contratação colectiva,
quando prevê a caducidade de convenções antes de serem substituídas por outras.

Acusamos a proposta de lei de enveredar, desta forma, pela individualização
das relações laborais, limitando o direito à contratação colectiva,
individualização que se reforça com o tal acordo relativamente ao artigo 15.º
do diploma preambular, já aqui referido pelo meu camarada Jerónimo de Sousa.
Acusamos esta proposta de lei, ainda quanto ao direito à contratação colectiva,
de violar a Convenção 98 da OIT ao prever, na forma por que o faz, a arbitragem
obrigatória.
Acusamos ainda esta hidra, que saiu à rua, com pompa e circunstância, mascarada
de código, de trazer numa das suas cabeças restrições inconstitucionais ao
direito à greve, na fixação de serviços máximos em vez de serviços mínimos,
violando a autonomia dos trabalhadores consagrada na Constituição, no próprio
regime de definição dos serviços mínimos, aniquilando o direito nas greves que
visem a satisfação de interesses meramente laborais.
Acusamos ainda esta hidra: de pôr em causa e violar o princípio constitucional
de proibição dos despedimentos sem justa causa, ao permitir, em certos casos, a
substituição da reintegração por indemnização; de permitir restrições a
direitos fundamentais dos cidadãos trabalhadores nas empresas, submetendo esses
direitos à definição pelo empregador do normal funcionamento da empresa; de
permitir a maior devassa da vida privada dos trabalhadores, admitindo que a
entidade patronal recolha informações sobre a gravidez de trabalhadora ou
candidata a emprego, sobre doenças genéticas, sobre os antecedentes biológicos
do trabalhador, sobre a sua origem ética ou racial, sobre orientação sexual; de
tornar impossível, com a flexibilização, a conciliação da vida familiar com a
vida profissional; de tornar possível a discriminação em razão do sexo, com o
conceito de retribuição.
Acusamos ainda a proposta de lei: de contribuir para a desqualificação do trabalho
com um novo regime de mobilidade funcional; de ser motor de degradação da vida
familiar, com a flexibilização e com a mobilidade.
Foram estas e outras acusações, que não cabem no tempo de que dispomos, que os
trabalhadores fizeram na greve geral. E a evolução do debate demonstrou que
vale a pena lutar e que a luta tem de prosseguir.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada
Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Membros do
Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Esta proposta de lei constitui uma das maiores
afrontas à Constituição da República Portuguesa e um verdadeiro retrocesso nos
direitos conquistados pelos cidadãos no que diz respeito à legislação laboral.
Da violação do princípio constitucional da segurança no emprego, com o
alargamento da contratação a termo, passando pela violação do princípio da
proibição dos despedimentos sem justa causa, com a não integração do
trabalhador em caso de despedimento declarado ilícito, até ao condicionamento
da acção dos representantes eleitos dos trabalhadores, até à restrição do
direito de contratação colectiva, até à restrição do direito à greve, entre
outros, o desrespeito pela Constituição é intolerável.
Esta proposta de lei, de revisão da legislação laboral, tem alguns objectivos
centrais que importa denunciar: trabalho como um custo a ser urgentemente
reduzido, à custa da precariedade, do desemprego, da debilidade dos sindicatos,
dos menores salários e da consequente curva descendente de condições de vida,
gerando e acentuando a insegurança no futuro da grande maioria das famílias.
Argumenta o Sr. Ministro que se trata de dar uma oportunidade aos jovens. Qual
é o jovem, Sr. Ministro, que quer a garantia de emprego precário? Qual é o
jovem que quer a perspectiva da insegurança no emprego? Qual é o jovem que
deseja uma vida de baixos salários? Qual é o jovem que pensa em ter uma casa,
ter autonomia, ter filhos e que não sabe se tem emprego, ou tendo-o não tem
garantia no seu emprego? Qual é o jovem que perspectiva com desejo uma vida de
ameaça a troco de emprego e de submissão total à vontade da empresa para
definição de horários, locais e condições de trabalho?
O Sr. Ministro não devia atrever-se a acenar a bandeira dos jovens, porque os
jovens de hoje, como os de ontem, como os de amanhã, querem ter segurança na
sua vida e os senhores negam-lhes isso, e, pior, retiram-lhes isso à força.
Num País onde os contratos a prazo já são superiores à média europeia, o
Governo pretende generalizá-los, intensificá-los, quando em diferentes estudos
realizados a estabilidade no emprego é revelada como o valor mais importante
associado ao trabalho.
Mas o grande pretexto do Governo para a apresentação desta proposta reside na
competitividade e na produtividade. Que ousadia, Sr. Ministro, considerar que
os trabalhadores são obstáculo ao sucesso das empresas! Que ousadia considerar
que os trabalhadores querem o fracasso da empresa! Atrever-se-á o Sr. Ministro
a negar que os trabalhadores lutam até ao limite pelo sucesso das suas
empresas, cujos empresários, tantas vezes, insistem na deslocalização das
mesmas por motivos sobejamente conhecidos e alheios à acção dos trabalhadores e
ao exercício dos seus direitos?!
Veja-se o caso da Clarks, em Castelo de Paiva. O ciclo vicioso em que os
senhores insistem em "mergulhar" é a grande causa de encerramento de
muitas empresas e, igualmente, de fracasso de uma política social necessária.
Baixos salários e precarização geram tendência para mudança de emprego e aumento
de níveis de rotatividade no emprego.
Este facto gera inexistência de formação profissional aos largos trabalhadores
contratados a termo e isso gera, também, mais baixas qualificações, menos know
how, o que, por sua vez, é causa de mais baixa capacidade de inovação das
empresas gerando, desta feita, mais baixo investimento.
Isto, confrontado com baixos preços, é o vosso contributo para o convite ao
encerramento ou à deslocalização das empresas.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Afinal, Sr. Ministro, as medidas que os senhores propõem poderão
mesmo é acentuar problemas de competitividade e de produtividade, não só pelo
ciclo vicioso focado, mas porque, simultaneamente, ignoram questões de
capacidade de gestão, de qualificação, de investigação, de novas formas de
produção, e por aí fora.
De facto, o Sr. Ministro nunca conseguiu explicar como é que há empresas em
Portugal que conseguem obter altos níveis de produtividade com a actual
legislação em vigor. É que o problema não reside onde o Sr. Ministro diz que
reside.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, esta proposta do Governo tem um objectivo
claro: fragilizar os direitos dos trabalhadores e as suas estruturas
representativas para dar toda a margem de manobra aos empresários.
As implicações desta proposta para a vida dos trabalhadores são dramáticas,
também no que respeita à compatibilização da vida familiar com a vida
profissional: numa semana podem trabalhar até às 50 ou 60 horas e até 10 ou 12
horas por dia, desregulando todos os mecanismos de apoio e de acompanhamento
familiar.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - O Governo quer o trabalhador ao serviço da empresa; o resto,
entenda-se também a família, vem por acréscimo. Que grande protecção às
famílias portuguesas, Sr. Ministro!
Mas para as mulheres propõem-se outras alternativas, também para
compatibilização da sua vida profissional com o trabalho doméstico e a vida
familiar: o trabalho a tempo parcial. Conhecem-se bem os efeitos desta
modalidade de trabalho noutros países, onde já está generalizado, nomeadamente
com a reduzidíssima ou mesmo impossível oportunidade de progressão na carreira
ou com os consequentes salários reduzidos, criando maior dependência económica
das mulheres.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - Esta é a vossa visão de família, visão retrógrada de homem como
ganha-pão da família e a mulher de regresso a casa, remetida ao espaço privado
e aos cuidados da família. Certamente, não se trata do respeito pela
Constituição da República Portuguesa mas, sim, de outra Constituição, a de
1933, que, no seu artigo 5.º, bem delineava, assim, o papel da mulher na
sociedade.
Como insustentável, Sr. Ministro, é aquilo que está previsto no artigo 16.º da
proposta de lei, que permite que a empresa averigúe sobre a gravidez ou a
potencial gravidez das trabalhadoras, permitindo que esta se intrometa de modo
inaceitável na vida privada dos trabalhadores, norma escandalosa num Estado
democrático.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, o seu tempo esgotou-se. Peço-lhe para
concluir.

A Oradora: - Sr. Presidente, termino dizendo: o Sr. Ministro acena a
bandeira da modernidade, mas modernizar não é fazer com que as pessoas sejam
travadas na sua acção pelo medo, que aceitem tudo, que se sujeitem a tudo no
trabalho pelo medo de perder o emprego. Isso foi próprio de tempos que já lá
vão!
O Sr. Ministro joga, nesta proposta, com a ainda maior força da parte mais
forte na relação de trabalho e com o medo da parte mais fraca, não joga com
regras de liberdade e de igualdade. Isso não é sinal de progresso, Sr.
Ministro, é exactamente o contrário.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Sónia Fertuzinhos.

A Sr.ª Sónia Fertuzinhos (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo,
Sr.as e Srs. Deputados: Em matéria de igualdade entre mulheres e homens e em
matéria de protecção da maternidade e da paternidade e da família, esta
proposta de código do trabalho envergonha o Governo e o País. E, muito especialmente,
deveria envergonhar o Ministro, que se proclama defensor das famílias e das
pessoas.

O Sr. Artur Penedos (PS): - É verdade!

A Oradora: - Da primeira à última versão desta proposta, o Governo foi
obrigado a reconhecer e a corrigir algumas das falhas mais básicas e
inaceitáveis em matéria de direitos da paternidade e da maternidade e de
igualdade de género.
No entanto, a proposta que hoje discutimos, mesmo tendo em conta essas
alterações, consegue ficar ainda aquém das normas actualmente em vigor na ordem
jurídica portuguesa, das directivas da União Europeia aplicáveis e de vários
acordos internacionais, aos quais Portugal se encontra vinculado.
Em matéria de igualdade de género, esta proposta do código do trabalho
apresenta três defeitos genéticos, absolutamente lamentáveis: a subordinação da
igualdade de género às outras igualdades e uma permanente confusão entre
igualdade e não discriminação; a omissão flagrante do chamado princípio de main
streaming, ou de transversalidade, e da sua concretização; a ausência da noção
e promoção da conciliação entre vida profissional e familiar para as mulheres e
para os homens, ainda que na versão final do Governo, que os grupos
parlamentares da maioria se encarregarão de apresentar como suas, possa haver a
introdução do princípio da conciliação relativamente ao tempo de trabalho.
Desenganem-se os que pensam que este assunto só diz respeito e só prejudica as
mulheres. Não é verdade, todos perdem: mulheres, homens, crianças!

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - Perdem as famílias e a sociedade, que se confronta com a
degradação da qualidade de vida e de direitos essenciais, fruto de uma
organização social que perde eficiência e produtividade porque não se organiza
em função da realização pessoal do género, ou seja, das mulheres e dos homens
que a compõem.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - Sr. Ministro, como é que fica, com esta proposta, a promoção da
igualdade de género? Onde é que fica o compromisso assumido no Programa do
Governo, nestas matérias?

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - Sr.as e Srs. Deputados: o Governo começou por ignorar completa
e despudoradamente a necessidade da conciliação entre a vida profissional e
familiar. Ora, a Constituição impõe a obrigatoriedade de se proceder à
organização do trabalho, e não apenas do tempo de trabalho, tendo em conta a
conciliação da vida profissional com a vida familiar.
Mas a conciliação não tem que ver apenas com o trabalho, sendo essencial a
promoção da partilha de responsabilidades. Se as mulheres são prejudicadas no
exercício dos seus direitos de participação na vida pública, os homens são
prejudicados no exercício dos seus direitos de participação na vida familiar.
Com esta proposta de código do trabalho há um desencorajamento claro ao
exercício dos direitos de paternidade. Vejamos três exemplos: a supressão do
direito à licença parental de 15 dias remunerada; a supressão da proibição de
transmissibilidade do direito à licença parental; o recuo do Governo quanto à
irrenunciabilidade da licença por paternidade de cinco dias.
Na verdade, o Governo deve ter-se esquecido do que aprovou, em Novembro de
2002, no Plano Nacional de Emprego que refere, na medida 18.5 do IV Pilar, a
obrigatoriedade do gozo da licença por paternidade de cinco dias. O PS
apresentará uma proposta, em sede de especialidade, que corrigirá este lapso do
Governo e a maioria terá uma oportunidade de votar a favor, numa atitude de
coerência com o referido Plano Nacional de Emprego.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Esta proposta do código
também contribui para a precarização da situação das mulheres no mercado de
trabalho. Por exemplo, não prevê a suspensão da licença por maternidade em
situação de internamento hospitalar. Atribui a isenção do trabalho suplementar
só às mães, sendo exemplo mais gritante a desprotecção das grávidas, puérperas
e lactantes, em caso de despedimento, tal como consta no artigo 50.º da
proposta do Governo.
Quanto é que o País ganha, Sr. Ministro, em produtividade, com este tipo de
medidas?

O Sr. António Costa (PS): - Zero!

A Oradora: - É assim que pensa incentivar o aumento da natalidade?
Finalmente, Sr. Ministro e Srs. Deputados, esta proposta de código do trabalho
nem sequer é coerente com o Programa do Governo em matéria de igualdade de
género, de apoio à família e de conciliação. E também consegue esquecer, de uma
penada, as boas intenções personalistas e de inovação apregoadas no preâmbulo
da proposta de lei.
Resumindo: esta proposta de lei viola a Constituição e o direito comunitário;
ofende direitos sociais e económicos dos portugueses; despreza a dimensão
integral dos seres humanos; prejudica gravemente as famílias - é que os
trabalhadores e as trabalhadoras têm família! -; agrava as condições que
contribuem para o declínio da natalidade dos portugueses e, em última análise,
põe em causa o desenvolvimento equilibrado da nossa sociedade. É por tudo isto
que o Grupo Parlamentar do PS não pode votar favoravelmente esta proposta de
lei.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Strecht.

O Sr. Jorge Strecht (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e
Srs. Deputados: Esta proposta, os senhores reconhecerão, o próprio Governo o
reconhece, é uma falácia! E é-o por uma razão simples: é que dizem que
negociaram outra proposta, já depois desta proposta ter entrado no Parlamento.
Se estivessem de boa-fé e quisessem, realmente, discutir com os outros grupos
parlamentares, teriam mandado dar entrada no Parlamento da tal proposta que
dizem estar concertada com um parceiro, que é a UGT.
Os senhores sabem muitíssimo bem que quem fez a afirmação mais dura contra esta
proposta foi o Secretário-Geral da UGT, que disse que ela era um ajuste de
contas com o 25 de Abril. Foi o Secretário-Geral da UGT que o disse, não foi o
da CGTP!
Mais: contra esta proposta concreta está a CGTP, a UGT e todos os demais
sindicatos deste País. Todos a repudiaram!
O que o Sr. Ministro aqui veio dizer foi que, depois da entrada desta proposta,
uma outra, que ignoramos, terá um eventual compromisso; mas mesmo essa outra,
de que deveriam ter dado entrada neste Parlamento e não deram - agiram
claramente com reserva mental -, repito, mesmo essa, suscita da parte da UGT os
reparos que já aqui foram lidos e deveriam ter sido ouvidos pelos Srs.
Deputados da maioria, dizendo que não obstante o recuo da proposta inicial do
Governo, mesmo assim, a proposta era globalmente negativa e não era aceite.
Portanto, é falso tudo o que aqui estiveram a dizer todo este tempo.
Mais: é pura perda para este Parlamento, porque, afinal, debateremos,
provavelmente, uma proposta que ignoramos. Deveriam, ao menos, ter tido a
coragem de retirar a proposta que entrou, avançando com a nova proposta, para
então a debatermos.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Os senhores tinham consciência plena que a primeira proposta
está eivada de várias inconstitucionalidades, mas não nó, vai contra a matriz
da Constituição no que toca às relações laborais.
Mais grave, ainda: os senhores sabem que esta é uma contra-reforma e não uma
reforma, pois sabem que a reforma, no plano laboral, tem sido, ao longo de
dezenas de anos, o acréscimo sucessivo dos direitos sociais conquistados
durante as vigências de tantos governos diferentes e sabem muito bem que para o
modelo social europeu contribuíram democratas-cristãos, verdadeiros
sociais-democratas e socialistas. Portanto, os senhores apelam ao voto nesta
proposta contra alguns de vocês próprios: os que se dizem
personalistas-cristãos, os que se dizem verdadeiros democratas-cristãos e os
que se dizem sociais-democratas votarão, silenciosa e cumplicemente, esta
proposta concreta que os senhores aqui apresentaram e não a outra, que não
conhecemos e não podemos debater.
Seria, aliás, absurdo que o PS votasse esta proposta, porque nem os senhores a
vão votar. Os senhores dizem que vão votar uma outra proposta que há-de vir, de
um compromisso tripartido.
Repito: por isto, esta proposta é uma falácia e, se mais que não houvesse,
merecia, evidentemente, a recusa da aprovação do Partido Socialista.
Portanto, se quiserem, retirem-na, apresentem a nova proposta que os senhores
dizem que têm, e, então, debateremos seriamente a vossa proposta.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não há mais oradores inscritos para o
debate.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Lino de Carvalho, pede a palavra para que
efeito?

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, pensávamos que havia mais
oradores inscritos e que o debate iria continuar. Em todo o caso, gostaríamos
de usar os 49 segundos de que ainda dispomos para uma segunda intervenção, que
será feita pelo Sr. Deputado Jerónimo de Sousa.

Risos.

O Sr. Presidente: - Nesse caso, para uma intervenção, tem a palavra o Sr.
Deputado Jerónimo de Sousa.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Sr. Presidente, aproveitando os 49 segundos
de que ainda disponho e as pequenas tolerâncias da sua disponibilidade
democrática, queria apenas tecer uma consideração final.
Este debate manteve um equívoco até ao fim. Tanto a bancada do PSD como o Sr.
Ministro do Trabalho não foram capazes de responder a uma questão colocada pelo
próprio Ministro do Trabalho. De facto, não fomos à substância, ficámos por
declarações mais ou menos bem intencionadas, e ficou aqui claramente
demonstrado - foi a demonstração mais clara que aqui surgiu disso, que
perpassou por momentos - que este Governo hostilizou quem usa os direitos, quem
os defende, exercendo-os, hostilizou o cidadão, o trabalhador que luta e que
conquistou esses mesmos direitos que os senhores querem pôr em causa.
Naturalmente, muita água vai correr sob as pontes, mas este Governo ficará, com
certeza, com o "ferrete" histórico de ser responsável pelo retrocesso
da legislação do trabalho, que constitui um avanço da civilização humana. Fica
esta marca, mas com certeza que, um dia, os trabalhadores haverão de recuperar
esses direitos agora ameaçados.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, nestes momentos finais de debate
"chovem" sempre as inscrições.
Também para uma intervenção, tem agora a palavra o Sr. Ministro da Segurança
Social e do Trabalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Quer falar sem ser questionado!

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - E não pode?!

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Tem receio das perguntas! Tem receio e quer
ser o último a falar!

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Ainda mais questionado do que
foi há bocado?!

O Sr. Ministro da Segurança Social e do Trabalho: - Sr. Presidente, Sr.as e
Srs. Deputados: Creio que o facto de o Governo ter apresentado esta proposta de
lei de código do trabalho, ao contrário do que os Srs. Deputados estão a
sugerir, significa que não temos absolutamente nenhum receio.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Mas esteve à espera que se esgotasse o tempo
de debate!

O Orador: - Sobretudo, temos a consciência de que é preciso mudar perante os
momentos históricos que o País atravessa.
Esta proposta de lei que acabou de ser discutida, na generalidade,
consubstancia uma importante reforma estrutural a que o Governo se propôs com
coragem, sentido de equilíbrio, justeza, inconformismo e espírito aberto.
Sabíamos de antemão das reacções e incompreensões que iríamos enfrentar e que,
aliás, ficaram hoje aqui bem evidenciadas com a posição tomada pelas oposições,
defensoras, em maior ou menor grau, do imobilismo, reveladoras da incapacidade
de ver que tudo mudou à nossa volta e imbuídas do carácter inquinado com que
perspectivam a ideia de empresa (a ideia de empresa que o Sr. Deputado Dias
Loureiro tão bem traduziu), ou ainda alimentadas pela serôdia saudade da luta
de classes, que já não é o que gostariam que continuasse a ser.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Perante a falta de argumentos para contrariar uma reforma
equilibrada, viraram-se para a tentação dos chavões de elevada usura e para os
espantalhos redutores e superficiais.
No essencial, perante reformas de fundo como esta, recriam os seus próprios
fantasmas. E não admira que tenham pesadelos, vendo neoliberalismo por todo o
lado, não resistindo à oca e ignorante comparação da americanização laboral, ou
ao cliché sempre imprescindível do economicismo, ou exprimindo ainda visões
mais delirantes, como sejam as acusações de ajuste de contas com o 25 de Abril
ou o regresso - pasme-se! - ao século XIX.

O Sr. Artur Penedos (PS): - Basta ouvir as suas declarações!

O Orador: - Nada disto vai acontecer, Srs. Deputados!
Portugal vai ter, certamente, uma legislação laboral que favorecerá a confiança
dos agentes investidores, a dignificação do trabalho e a defesa dos
trabalhadores. Não será uma legislação do "ou oito ou oitenta", do
"ou tudo ou nada", mas estamos absolutamente convictos de que é uma
reforma que nos coloca mais perto dos nossos parceiros e concorrentes, que
acaba com o pântano de leis fixistas, desajustadas e estáticas, que concilia
com justiça e sentido de eficácia os diversos e legítimos interesses em causa.

O Sr. António Costa (PS): - Os investidores têm dado sinais disso!…

O Orador: - Do Partido Socialista, cuja posição, aliás, não se percebeu
neste debate - uns chamaram-lhe "nado-morto", outros
"contra-reforma"; uns chamaram-lhe "míssil", outros
"operações de cosmética", enfim, não se chegou a perceber! - …

Protestos do PS.

… e, apesar de ter custado muito ao Partido Socialista aceitar o compromisso
firmado com os parceiros sociais (sei que é difícil, para vós,
"engolir" esse facto, sei que é bem difícil…

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Deve ser duro!

O Sr. Eduardo Ferro Rodrigues (PS): - Nós não "engolimos" nada!

O Orador: - … e bem gostariam que não tivesse havido esse acordo), apesar de
tudo, do Partido Socialista esperamos sentido de responsabilidade e
manifestação de saudável coerência, pois, como dizia na altura o então Ministro
Paulo Pedroso, em entrevista de 8 de Novembro de 2001 (não há muito tempo!),
"a questão da legislação do trabalho não deve ser uma questão de
bandeiras, deve ser uma questão concreta".

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - E acrescentava: "Acho que uma atitude de esquerda não se
mede na grandiosidade dos discursos, mede-se numa prática transformadora".

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Pelos vistos, não querem a prática transformadora!… E disse
ainda que o nosso Direito do Trabalho é bastante confuso.

O Sr. António Costa (PS): - E consegue ficar pior, o que é extraordinário!

O Orador: - Este código não é, Srs. Deputados, uma reforma contra ninguém;
antes é, em primeiro lugar, uma reforma por Portugal e pela superação de
factores estruturais causadores de pobreza relativa do nosso país; é uma reforma
ao mesmo tempo equilibrada e ousada, que atende à sua malha empresarial e à
condição de vida dos que trabalham, reforça o sentido de responsabilidade
pessoal e social dos empresários e dos trabalhadores e estimula as novas
gerações de empresários e os jovens para gerarem e partilharem mais riqueza num
eficiente e solidário mercado.
Quebra-se, Srs. Deputados, deste modo um "muro de Berlim" no
ordenamento juslaboral, ao mesmo que se proporcionam novas pontes para o
desenvolvimento sustentado da nossa economia. Esta reforma, ao contrário do que
aqui foi afirmado pelas oposições, vai nascer de boa saúde, não vai pedir
atestado médico para entrar de baixa ou num coma profundo, como aconteceu nos
seis anos de governação socialista.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Não precisou de cesariana, de uma qualquer operação cosmética,
de um qualquer livro, comissão ou grupo de trabalho para se concretizar
depressa e bem.

O Sr. António Costa (PS): - Mas olhe que fez mal!

O Orador: - Não foi precipitadamente abortada com medo de uma qualquer
pseudo-greve geral.
Ela está aí para dar início a uma nova fase no mercado de trabalho, para
erradicar a irresponsabilidade, a inércia, a indiferença, a acomodação
anestesiante; para construir a esperança da grande maioria dos portugueses
cansados da indecisão, do "deixa andar", da verbalização do conteúdo
e dos pseudo-visionários do passado.

O Sr. Patinha Antão (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Não confundimos os megafones e os holofotes das organizações ou
de grupos que "pavlovianamente" sempre contestam a mudança com a
opinião maioritária dos portugueses. O que os portugueses pensam disseram-no há
meses, nas urnas eleitorais.

O Sr. António Costa (PS): - O código do trabalho foi a votos?!

O Orador: - E com isso as bancadas da oposição não se conformam! É natural
que não se conformem, mas têm de aguentar, por respeito pelos valores
democráticos.
Foi em nome do povo português que o Governo apresentou esta proposta de lei. É
em seu nome que continuará a trabalhar, sem desfalecimento, por um Portugal
melhor, por um Portugal de esperança, de confiança e de futuro.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana
Drago.

A Sr.ª Ana Drago (BE): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Segurança Social e
do Trabalho, V. Ex.ª é, de facto, um homem extraordinário: honra o debate
democrático trazendo escrito à máquina o discurso de conclusões sobre o que foi
o debate ao longo desta tarde!

Aplausos do BE, do PS, do PCP e de Os Verdes.

É extraordinária a sua capacidade de previsão! Como são extraordinários os
argumentos que o Sr. Ministro usou hoje, argumentos que usou desde o início da
discussão da legislação do código do trabalho. De facto, o Sr. Ministro sempre
justificou a necessidade deste código do trabalho com os piores argumentos.
Durante meses, o Sr. Ministro insinuou que o problema dos trabalhadores
portugueses é o de trabalharem pouco, quando sabemos que, em média, os
trabalhadores portugueses trabalham mais do que os seus congéneres europeus,
pelo que não está aí o drama da produtividade.
Em segundo lugar, o Sr. Ministro sempre alegou que o problema da legislação
laboral portuguesa era o de ser demasiado rígida. Ora, o que as estatísticas
revelam - se o Sr. Ministro não sabia disso no início da discussão do código do
trabalho, agora já deveria saber - é que Portugal tem a força de trabalho mais
precarizada da Europa. Essa é que é a realidade!
O Sr. Ministro insinuou ainda que, no fundo, a legislação vigente sobre as
relações de trabalho era demasiado garantística, dava demasiados direitos,
quando sabemos que o drama do Direito do Trabalho na realidade portuguesa é o
da sua fraca aplicabilidade na prática. Eram estes os problemas a que uma
modernização da legislação do trabalho deveria ter respondido.

Esta tarde, bem como ao longo dos últimos meses, dissemos ao Sr. Ministro e
ao Sr. Secretário de Estado do Trabalho que esta proposta de código do trabalho
conduz à precarização das relações laborais, à desprotecção dos trabalhadores,
ao aniquilamento da negociação e da contratação colectiva e à desestruturação
da vida familiar e da vida privada dos trabalhadores portugueses. Mas o Sr.
Ministro - o Governo - não quis ouvir, "fez orelhas moucas"!
Era necessária uma proposta de código do trabalho que fosse capaz, de facto, de
modernizar as relações de trabalho em Portugal, nomeadamente, tal como referi
na minha intervenção anterior, através da fixação de um subsídio que permitisse
o gozo da licença parental e da licença especial de assistência a filhos e
adoptandos, situação que não está prevista na legislação actual. Essa, sim, é
que seria verdadeiramente uma medida de protecção à família.
Modernizar a legislação laboral, em Portugal, é permitir uma redução da
contratação a prazo, porque ela é totalmente desestruturadora das expectativas
de vida dos trabalhadores portugueses; modernizar a legislação do trabalho em
Portugal é estabelecer mecanismos que sejam capazes de dar efectividade à
igualdade e à não discriminação e não fazer afirmações genéricas, como as que
estão inscritas no código do trabalho; modernizar a legislação laboral em
Portugal seria nada mais, nada menos do que caminhar em direcção a uma redução
do horário de trabalho para 35 horas, porque isso, sim, é que dá qualidade de
vida e permite participação democrática, direito ao trabalho, direito à vida
familiar e direito ao lazer.
Ao fim de vários meses de discussão, ao fim de vários contraditórios de
opinião, depois de ouvirmos aqui e na comunicação social as opiniões, as críticas,
os erros que foram apontados a esta proposta de código do trabalho, o Sr.
Ministro apresentou ao País, há poucos dias, um acordo tripartido, assinado por
alguns parceiros socais. Porém, a única novidade de vulto que o Sr. Ministro
soube apresentar ao País, depois de todas as propostas e sugestões que lhe
foram feitas, foi a de introduzir a possibilidade de o Estado financiar as
associações sindicais e as associações patronais. Não percebemos, Sr. Ministro,
como é que esta medida vai ao encontro da competitividade e à produtividade da
economia portuguesa.
Mas, acima de tudo, hoje, o Sr. Ministro assumiu politicamente o seu projecto
de desprotecção aos trabalhadores e não soube responder que parceiro social
apresentou a proposta relativa a este financiamento do Estado nem, numa maré de
tempos de contenção, qual é o impacto orçamental de uma medida deste género.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Rui Cunha concorre ao Guinness da
intervenção parlamentar mais curta, candidatando-se a 12 segundos de
intervenção.
Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Rui Cunha (PS): - Sr. Presidente e Srs. Deputados: Queria apenas
manifestar todo o interesse do Partido Socialista em que as propostas
anunciadas pelo Governo na noite do passado dia 8 - em contraposição, aliás, às
promessas aqui feitas em sede de discussão da apresentação do Programa do
Governo, uma vez que o Sr. Primeiro-Ministro garantiu que o Parlamento seria
sempre o primeiro a receber as informações do Governo - sejam distribuídas
pelas várias bancadas o mais rapidamente possível, para que possamos, desde já
e com todo o interesse, começar a trabalhar na especialidade.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado
Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo,
Sr.as e Srs. Deputados: Hoje será uma data memorável…

Vozes do PS: - Histórica!…

O Orador: - … para a Assembleia da República e para o País.

Vozes do PCP: - Nomeadamente para os trabalhadores!

O Orador: - Já estamos habituados a que o Partido Socialista chegue
sistematicamente atrasado à História,…

Protestos do PS.

… tal como estamos habituados a que o Bloco de Esquerda e o PCP pensem que a
História parou!

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Quem pensa assim são os senhores!

O Orador: - Mas a realidade é outra.

Protestos do PCP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, peço-lhes um pouco de silêncio para
podermos ouvir o orador.

O Orador: - A posição do Governo e dos grupos parlamentares que integram a
maioria ficou muito clara através das intervenções do Sr. Ministro da Segurança
Social e do Trabalho e dos Srs. Deputado Álvaro Castello-Branco e Dias
Loureiro.
Temos a perfeita consciência de que os problemas do País e os problemas em que
se insere, em termos do tecido empresarial, a componente trabalho não
constituem as únicas chaves das questões da competitividade e da produtividade,
num mundo cada vez mais globalizado em que vivemos.
Mas também temos a consciência de que não era possível continuar com legislação
do regime corporativo, associada a soluções estatistas do PREC, para poder
assegurar a Portugal o desenvolvimento, a competitividade e a produtividade que
temos de dar à nossa economia.

Protestos do PS e do PCP.

E esta lei dá o sinal adequado a esse desiderato.
Os senhores têm a tendência para reivindicar para vós próprios o espírito de
diálogo e acusarem a maioria de autoritarismo. Realmente, temos uma diferença
em relação a VV. Ex.as…

O Sr. António Costa (PS): - Ainda bem!

O Orador: - … no que diz respeito ao diálogo: não o usamos como forma de
adiar, de protelar, de arrastar, usamo-lo como instrumento de decisão em
concertação social.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Usámo-lo com êxito e com sucesso neste acordo tripartido.

O Sr. Artur Penedos (PS): - É falso!

O Orador: - Em termos de relação Governo/oposição podia dizer que é com
satisfação que vejo esse passo negativo do Partido Socialista, mas em termos da
nossa democracia é doloroso. Em termos institucionais, é lamentável que, entre
a UGT e a CGTP, o Partido Socialista, nessa estratégia, tenha optado pela CGTP,
encostando-se ao Bloco de Esquerda e ao PCP.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Em termos institucionais, é lamentável que o maior partido da
oposição tenha optado por esta solução.
Bem sei que essa não era a posição unânime do Partido Socialista e vi a timidez
com que o Deputado José Sócrates fazia um simulacro de aplausos ao Deputado
Paulo Pedroso. Coitado, quase que não juntava as mãos quando, olhando para os
lados, via alguns entusiasmos relativamente ao aplauso da intervenção.

Protestos do PS.

Seguramente, o Deputado José Sócrates não ficou com as mãos a doer de
aplaudir o Deputado Paulo Pedroso, que parecia ser o único a querer viabilizar
esta lei.

Protestos do PS.

Isto é muito próprio do Partido Socialista. O Partido Socialista
ziguezagueava quando estava no governo e continua agora a ziguezaguear na
oposição. É um instinto que lhe ficou e do qual já não se consegue libertar em
nenhuma das posições, quer esteja no governo quer esteja na oposição.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, o caminho que o Governo
tomou, na discussão e na preparação desta lei, é um caminho que temos de
louvar. Como aqui já foi reconhecido, foram governos do PSD que deram passos
importantes na concertação social. Esta foi, com o devido respeito, uma das
poucas coisas acertadas que o Deputado Paulo Pedroso disse na sua intervenção.

Protestos do PS.

Foi na linha dessa preocupação que se escolheu este caminho da concertação
social, e com sucesso.
Queria, pois, em nome do Grupo Parlamentar do PSD, saudar o Sr. Ministro e o
Governo por esse caminho e por essa opção, porque demonstra ao País que a ideia
de diálogo do passado, que era a de enrolar, arrastar e atrasar, não é de
seguir. É possível e desejável fazê-lo, com êxito e com sucesso.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Ontem um jornalista dizia-me: "Os senhores vão discutir na
Assembleia da República a proposta de lei do código do trabalho e parece que
estão anunciadas, fora da Assembleia, uma séria de manifestações da CGTP, que
já anunciou mais greves e mais manifestações." Eu respondi-lhe que vivemos
em democracia e que em democracia há três coisas sagradas: a vontade popular
expressa nas urnas, a aprovação do Programa do Governo decorrente desse
resultado eleitoral e a execução desse Programa. Para além disso, há ainda
outra coisa sagrada em democracia: a liberdade de expressão e de manifestação
das pessoas e o direito à greve. Mas há uma hierarquia. Respeitamos essas
manifestações, mas não aceitamos nem deixaremos nunca que elas sejam um factor
que subverta este respeito pela vontade popular que é aqui respeitada nesta
instituição, e é nesse caminho que vamos prosseguir.
Sr. Ministro, bem-haja por mais este passo a favor de Portugal, em benefício do
nosso país, em benefício da modernização da nossa economia, em benefício dos
portugueses.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. António Costa (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. António Costa (PS): - Sr. Presidente, ainda não estou bem ambientado
com o novo Regimento, mas presumo que seja para defesa da consideração da
bancada.

O Sr. Presidente: - E qual é a razão do seu agravo, Sr. Deputado?

O Sr. António Costa (PS): - Foi uma indelicadeza e descortesia do Sr.
Deputado Guilherme Silva. Seria admissível a qualquer outro Sr. Deputado, mas
não pode ser admissível ao líder de uma bancada parlamentar a referência que
foi feita ao meu camarada José Sócrates.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. António Costa (PS): - Sr. Deputado Guilherme Silva, creio que não terá
dificuldade em reconhecer que as referências que fez ao Deputado José Sócrates
foi um excesso que manifestamente não é aceitável. É deselegante, é descortês e
não corresponde à verdade substancial daquilo que quis insinuar.
O Sr. Deputado Guilherme Silva anda há muitos anos na vida política e devia ter
a prudência de saber que nem tudo o que se lê nos jornais corresponde à
realidade. E, neste caso, não corresponde à realidade.
Lamento, sobretudo, que essa referência tenha sido feita no primeiro momento em
que o Deputado José Sócrates já não estava aqui sentado na primeira fila,
quando esteve largas horas, durante a tarde,…

Vozes do PSD: - Já cá está!

O Orador: - … e se retirou para as filas de trás, por razões normais de
rotação da primeira fila.
Sr. Deputado Guilherme Silva, o que é essencial em toda esta encenação à volta
deste debate e desta temática, e que devia ser tema de reflexão para a sua
bancada e para a maioria, é que o Governo, depois de apresentar a proposta de
lei na Assembleia da República, em vez de negociar com os grupos parlamentares
do Bloco de Esquerda, do PCP, do PS, do PSD e do CDS-PP, tenha tratado de fazer
a negociação que não tinha feito.

O Sr. José Magalhães (PS): - Exactamente!

O Orador: - E fecha o acordo, como o Sr. Deputado, o Sr. Presidente e o Sr.
Ministro dos Assuntos Parlamentares sabem (e este poderá explicar aos colegas
de Governo), no momento em que o Governo já não tem direito de iniciativa!
Portanto, o Governo não vai apresentar qualquer proposta de alteração à
proposta de lei. Quem o poderá fazer é o PSD e o CDS-PP, se estiverem
disponíveis para serem aqui a "correia de transmissão" de um acordo
que o Governo firmou, algures, numa noite, com dois parceiros sociais!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Ora, o que vamos votar amanhã é uma proposta de lei em relação à
qual os próprios Deputados que a vão votar favoravelmente já assumiram o compromisso
público de desfazer na especialidade.

O Sr. Jorge Strecht (PS): - Exactamente!

O Orador: - Este é o maior atestado de incompetência política que a maioria
pode passar ao Governo!
Como sabem, quando há situações destas, a decência e a boa prática parlamentar
mandam que o Governo substitua a sua proposta para debatermos aqui não uma
proposta de que ele próprio já desistiu, mas uma proposta que ele deseja nesse
momento, neste caso hoje - vai-se lá saber o que ele deseja para a semana…
Nós não temos a visão marialva da política de que os senhores gostam muito, ou
seja, de firmeza, de afirmação, de autoridade…, essa atitude marialva que vos
caracteriza na vida!

Risos do PS.

Nós não medimos a vida política por avanços e recuos, portanto não queremos
mais recuos. O que queremos é que os senhores e o Governo avancem, mas no bom
caminho. Aí terão sempre a nossa companhia. Se persistirem na asneira,
continuamos a desejar-vos boa-viagem, mas não contarão connosco nem com a nossa
companhia.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Deputado
Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Costa,
percebi a necessidade que V. Ex.ª teve de evocar a defesa da consideração para
justificar o injustificável.
Quero também deixar aqui uma nota. V. Ex.ª começou por dizer que ia defender a
honra do Deputado José Sócrates, o que significa que o Deputado José Sócrates é
a bancada do Partido Socialista. Espero que, sendo assim, para a próxima ele
tenha mais peso na defesa das suas posições dentro da bancada do Partido
Socialista.

Risos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. António Costa (PS): - A nossa solidariedade é total!

O Orador: - Em relação à afirmação de V. Ex.ª de que nem tudo o que os
jornais dizem é verdade - é certo quando vos convém, mas noutras matérias é ao
contrário - foi exactamente para testar a veracidade do que dizia o jornal que
estive atento às palmas do Deputado José Sócrates. Por isso, fiz a observação
que fiz. Tive um cuidado que os senhores não tiveram.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Em relação à questão de que não é o Governo que apresenta alterações, mas os
grupos parlamentares, vê-se mesmo que à falta de razões de fundo, à falta de
razões de substância política V. Ex.ª vai para a forma. Toda a gente sabe - e
V. Ex.ª tinha obrigação de saber -, e é com muito gosto que vamos subscrever as
propostas de alteração, que uma coisa é uma discussão na generalidade e outra é
uma discussão na especialidade. E se se dá esta circunstância de termos de acolher
o acordo feito é por uma boa razão, e a boa razão é a de que aceitámos de bom
grado prolongar este diálogo e esta discussão na concertação social. É tão
simples quanto isto! Beneficiou o País, e pelo País estamos dispostos a isso e
a muito mais.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Não havendo mais oradores inscritos nem tempo
disponível, está encerrado o debate, na generalidade, da proposta de lei n.º
29/IX.
Srs. Deputados, a Sr.ª Secretária vai dar conta de um diploma que deu entrada
na Mesa.

A Sr.ª Secretária (Isabel Gonçalves): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, deu
entrada na Mesa, e foi admitido, o projecto de lei n.º 201/IX - Designação de
titulares de cargos exteriores à Assembleia da República (PSD, PS, CDS-PP, PCP,
BE e Os Verdes), que baixou à 1.ª Comissão.

O Sr. Presidente: - Este diploma será objecto da agenda da reunião plenária
de amanhã, juntamente com o parecer da Comissão, e, conforme orientação da
Conferência de Líderes, votá-lo-emos na generalidade, na especialidade e em votação
final global, a fim de viabilizarmos algumas eleições de órgãos exteriores à
Assembleia que são da nossa responsabilidade.
Lembro a todos que amanhã também é dia de votações e que vamos fazer uma
segunda tentativa na utilização do sistema electrónico. Por favor, não se
esqueçam de trazer o respectivo cartão e não me obriguem a recorrer a meios
sobrenaturais para votarmos.
Srs. Deputados, a próxima reunião plenária terá, pois, lugar amanhã, pelas 15
horas, e terá como ordem do dia a

Hoje, debateu-se no Parlamento a legislação laboral, nomeadamente a questão da contratação colectiva.

Era muito conveniente voltar ao passado para perceber ideias, convicções, promessas que ficaram pelo caminho.

Estávamos em 2003 e a maioria de direita no Parlamento, colocou à discussão uma promessa de Código de Trabalho, elaborada de forma não transparente num escritório de advogados. Nem foi na concertação social, veja-se lá!

Era o ministro do Trabalho, António Bagão Félix no governo Durão Barroso.

Não guardei o link da sessão, mas podem ler na íntegra no final, como se fosse em anexo. Mas dizia ele na sessão de a 16 de Janeiro de 2003:

Orador: Acabou definitivamente o tempo de emprego para toda a vida. Há, agora, que criar as condições de trabalho com qualidade e por toda a vida activa.
(...)
Todos consideram que um dos grandes problemas
nacionais é o baixo nível de produtividade. O Código do Trabalho procura, na
medida do seu âmbito, contribuir para a sua melhoria, pela alteração do
paradigma da relação entre empregadores e trabalhadores, sabendo-se que a
economia só se desenvolve com as pessoas e pelas pessoas.
(...)
A reforma laboral é necessária para fortalecer as empresas, dignificar o
trabalho, proteger os que trabalham. Ganhará com ela o País que trabalha e quer
trabalhar, os empresários responsáveis e com sentido de risco, os jovens à
procura da inserção no mercado de trabalho. Ajudar-se-á a quebrar o ciclo
vicioso de baixa produtividade indutora de baixos salários. Dar-se-ão novas
oportunidades a quem, querendo trabalhar, não tem emprego e ser-se-á mais
exigente para quem, tendo emprego, não quer trabalhar.

Orador: Foi este o desafio que aceitámos. Será este o desafio a que Portugal vai
responder patrioticamente.

Aplausos do PSD e do CDS-PP, de pé.

(...)
Orador: Primeiro, a ideia de cooperação solidária no seio da empresa. De facto, é elementar perceber-se hoje que entre o empregador e o trabalhador há a empresa, que entre a empresa e o emprego há o trabalho, que entre o empregador e a empresa há a responsabilidade social.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Segundo, o justo equilíbrio entre competitividade económica, personalismo laboral, coesão social e justiça distributiva.

Terceiro, a modernização das nossas empresas e da nossa economia, tendo em atenção as exigências da mundialização das trocas e do alargamento da União Europeia.

Quarto, o primado da co-responsabilidade e da exigência, o reforço da ética do esforço e do mérito como elementos estruturantes do progresso e da justiça, no pleno respeito pela igualdade de oportunidades, mas afastando o igualitarismo artificial de resultados. É preciso não esquecer que a pior injustiça é a que nivela o que é diferente.

Quinto, a necessidade de adaptar a legislação a novas formas de trabalho e a novas categorias de trabalhadores, como sejam os que trabalham a tempo parcial, os tele-trabalhadores, os jovens pais e mães trabalhadores, as situações de cedência ocasional ou de trabalho temporário, os trabalhadores deficientes ou com menor capacidade de trabalho, bem como a consideração específica das empresas de menor dimensão, em regra, aliás, boas geradoras de novos empregos.

Sexto, a expressa consagração de direitos de personalidade dos trabalhadores e de um conjunto de garantias dos seus direitos e créditos, designadamente face às novas formas de organização societária.

Sétimo, a justa, responsável e harmoniosa conciliação entre direitos e deveres de todas as partes no seio da empresa.

Oitavo, a contribuição para um dos mais decisivos desafios de uma economia humana e humanizada: a melhor partilha entre o trabalho, a família e os tempos livres das pessoas.

Nono, o reconhecimento da adaptabilidade, da flexibilidade e da organização do tempo de trabalho como factores imprescindíveis numa economia em permanente mutação, devendo sublinhar-se que, com a nova lei e nesta matéria, os trabalhadores deixam de ser objecto para serem parte nas decisões que a eles respeitam.

Décimo, o reforço e a revitalização da contratação colectiva, como sede, por excelência, da livre e responsável formação de vontade das partes, eliminando bloqueios ao seu ajustamento e desenvolvimento, como, aliás, é a regra nos países mais desenvolvidos da Europa. É que subsistem, ainda, muitas convenções colectivas feitas à medida de um mundo que já não existe e que, na aparência da defesa dos chamados "direitos adquiridos" e irreversíveis, acabam por prejudicar o futuro das empresas e os respectivos postos de trabalho.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Décimo primeiro, a salvaguarda da efectividade da lei e da defesa do Estado de Direito que erradique o sentimento de impunidade resultante do acentuado grau de incumprimento das normas laborais, que desincentive formas de emprego clandestinas, que previna abusos, sancione irregularidades e penalize a irresponsabilidade, o desleixo e o absentismo.

Uma lei, enfim, que reforce o Estado fiscalizador em detrimento do Estado controlador de procedimentos meramente administrativos.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Décimo segundo, o fortalecimento do investimento nacional e a criação de condições de atracção de investimento estrangeiro gerador de riqueza e de postos de trabalho, bem como da promoção da qualidade empresarial, gestionária e profissional.

Décimo terceiro, a criação de condições que estimulem o emprego produtivo e, sobretudo, dêem renovadas esperanças aos que não têm trabalho e aos jovens no início das suas vidas activas.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

Falou José António Vieira da Silva (PS):
"Havia pelo menos quatro questões que, para nós, era fundamental que tivessem sido trazidas ao debate através do relatório da Comissão e do Sr. Deputado relator. Em primeiro lugar, foram muitas e de diferentes
origens as opiniões de que a solução legislativa encontrada não é uma boa
solução.

Em segundo lugar, foram muitas e diversas as vozes
que nos trouxeram uma preocupação fundamental: a de que esta proposta desloque
a favor das entidades patronais o frágil equilíbrio das relações de trabalho,
nomeadamente por obrigar - e cito alguém que participou nos nossos debates - os
sindicatos a negociar em situação de necessidade. 

Falou Jerónimo de Sousa (PCP):
"Quanto aos direitos colectivos, é ou não verdade que este Governo pretende,
por exemplo, cortar em metade o crédito de horas às comissões de trabalhadores?

É ou não verdade que, pela chamada cláusula de paz social, a que eu chamaria
mais "paz de cemitério", através dos serviços mínimos que tentam
inculcar nos trabalhadores, o direito à greve fica de facto mutilado?

E é ou
não verdade que, em relação a um direito fundamental, que é a contratação colectiva,
através de um miraculoso conceito de critérios de aferição da
representatividade, uma organização sindical de vão de escada, representando 5%
dos trabalhadores do sector, ou tendo 1500 associados, ou sendo filiada num dos
parceiros da concertação social, ou tendo uma situação económica mais ou menos
estável, pode liquidar e substituir contratos colectivos que estão em vigor?

Respondeu Bagão Félix:
"No fundo, o que nos separa é o futuro e o passado, e os senhores continuam a
alimentar-se do passado."

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - São maus os direitos existentes?!

O Orador: - Continuam a alimentar-se do passado, porque não conseguem
perceber que tudo mudou à nossa volta e que a situação geopolítica, económica e
social da Europa em 2003 não é a de 1975, de 1980 ou de 1990.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Portanto, tem de se cortar nos direitos!

O Orador: - Não, Sr. Deputado, é preciso adaptarmo-nos aos novos desafios,
como estão a fazer os países do antigo bloco comunista, que vão integrar a
União Europeia.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Com belos resultados!

O Orador: - Sr. Deputado, eu gostaria que verificasse a legislação da
Eslovénia, da Hungria, da República Checa, da Eslováquia, da Polónia e que,
depois, nos dissesse como é que conseguiria sobreviver fora desse contexto."

Foi há 13 anos! Aonde estamos?

ANEXO:

3148 | I Série - Número 074 | 16 de Janeiro de 2003

Vamos, então, guardar 1 minuto de comovido silêncio em memória do nosso
antigo Colega João Amaral.

A Câmara guardou, de pé, 1 minuto de silêncio.

Srs. Deputados, transmitirei este voto de pesar, antes de mais, à família do
Dr. João Amaral, cuja presença parcial na galeria assinalo, e enderecerei
igualmente estas condolências à cidade e ao concelho de Lisboa, que, como
Presidente da Assembleia Municipal, tão bem serviu durante tantos anos.
Passamos ao ponto da ordem do dia de hoje, que tem por objecto a apreciação, na
generalidade, da proposta de lei n.º 29/IX - Aprova o Código do Trabalho.
De acordo com o disposto pelo Regimento, o debate na generalidade é introduzido
pelo autor da proposta de lei, o Sr. Ministro da Segurança Social e do
Trabalho, após o que darei a palavra ao relator da comissão para apresentar as
principais conclusões contidas no relatório.
Tem, pois, a palavra o Sr. Ministro da Segurança Social e do Trabalho, para
proceder à apresentação da proposta de lei.

O Sr. Ministro da Segurança Social e do Trabalho (Bagão Félix): - Sr.
Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro: No exacto
cumprimento do seu Programa, o Governo apresentou nesta Câmara a proposta de
lei que consagra uma importante reforma da legislação laboral.
O Código do Trabalho, aqui, hoje, em debate, é a expressão dessa vontade
reformista, visando consagrar um instrumento virado para o futuro, produtor de
confiança, dignificando o trabalho e proporcionando condições de maior
capacidade empresarial.
Trata-se do projecto legislativo mais debatido desde o 25 de Abril. Desde o
início, houve o propósito de um debate profundo e esclarecedor. Por isso, em 18
de Julho do ano passado, o País pôde começar a reflectir sobre um anteprojecto
que esteve mais de quatro meses em discussão a diferentes níveis. Um
anteprojecto que constituiu um ponto de partida concreto, não um mero alinhavar
de ideias soltas ou uma simples sistematização para limpeza de
"impurezas" técnicas.
Depois de transformado em proposta de lei, foi submetido, pela Assembleia da
República, a discussão pública, que se prolongou por quase dois meses.
No fim de um longo mas profícuo tempo, foi possível realizar mais de 130 horas
de reuniões da Comissão Permanente da Concertação Social, ouvir especialistas
nesta matéria, participar em cerca de 130 debates públicos, receber sugestões,
observações, críticas e comentários de muitos portugueses. O sítio do
Ministério na Internet foi objecto, neste período, de cerca de 340 000 visitas,
o que significa uma média diária de cerca de 2500 consultas. A Comissão de
Trabalho e dos Assuntos Sociais procedeu, por sua vez, a um vasto conjunto de
audiências que, por certo, enriqueceu o seu trabalho e terá esclarecido os Srs.
Deputados.
O Governo sempre afirmou que o Código do Trabalho é uma condição importante,
embora parcelar, para vencermos os desafios da competitividade, da
produtividade e da coesão social. É um passo para reforçar o modelo social
europeu nas relações de trabalho, sem se transformar, porém, num
pronto-a-vestir insensível à nossa própria realidade.
A actual legislação é um emaranhado de normas e regulamentos que, desde há
muito, esgotou o seu prazo de validade. Dispersa, anacrónica, reflectindo
momentos políticos e sociais bem diversos, virada para o passado, facilmente
manipulável, transformou-se crescentemente no paraíso dos não cumpridores,
evidenciou um reduzido grau de efectividade e transformou a sua rigidez num
perverso e objectivo aliado da ineficiência económica e da injustiça social.
O primeiro activo desta iniciativa governamental é, assim, largamente
conseguido: o de suscitar uma maior consciencialização da sociedade e dos
parceiros sociais para a necessidade de uma mudança que já não é compaginável
com o imobilismo e a indiferença. Quebrou-se um tabu que, se persistisse, nos
atrasaria irremediavelmente no contexto europeu e mundial.
O anteprojecto, pelo simples facto de o ter sido, incorporou uma explícita
ideia e uma assumida vontade de boa fé negocial, não de cego autismo ou de
suspeita imposição.
Acreditamos na concertação como um activo público que permite dar grandes
passos em frente. Provou-se que a cultura e a prática de negociação saudável,
mesmo que dura e incisiva, é mais proveitosa que a prática de pura
confrontação. Provou-se a inutilidade de greves provocadas em pleno período de
discussão pública.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - A greve - é dos manuais - é o último recurso, não pode ser nem
uma ameaça instantânea e instintiva, nem a primeira arma de arremesso ou um
ritual tornado quase obrigatório para alguns.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - E porque acreditamos na concertação, sempre dissemos que a
proposta de lei presente ao Parlamento seria melhor que o anteprojecto inicial,
tal e qual como estamos convictos que a lei, na sua versão definitiva, será
melhor que a proposta de lei que deu entrada no Parlamento.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - A iniciativa legislativa - e, como tal, o País - muito
beneficiou do debate público e da discussão aberta e leal, em particular com os
parceiros sociais. Por isso, o Governo congratula-se vivamente com o recente
compromisso tripartido a que chegou, responsável e livremente, com alguns dos
parceiros.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Encaminharemos agora o seu resultado para apreciação dos Srs.
Deputados, convictos de que vão melhorar a proposta ora em debate.
Sr.as e Srs. Deputados: Quando se fala de concertação, alguns logo buscam nos
consensos alcançados vencedores e derrotados. Outros, ou até os mesmos,
perscrutam recuos e cedências, como se se tratasse de um jogo de xadrez onde o
objectivo é o xeque-mate de uma qualquer parte. Não há contabilidade de
negociação social.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Mas há "resultado líquido" da mesma, onde ninguém cedeu a ninguém,
mas onde todos, e, sobretudo, o País, ganharam. Por isso, o resultado final é
superior à soma da posição das partes. Sabemos que há quem pense que unir
esforços é um sinal de fraqueza. O Governo pensa, pelo contrário, que é uma
expressão de amadurecimento político e social.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Em política social e laboral, não há óptimos sociais, mas pode e
deve haver boas soluções na moderação das divergências.
Por isso, a posição do Governo foi, desde o início, uma posição equilibrada na
busca do maior denominador comum. Equidistante no método, estimuladora de
consensos. Como árbitro de posições legitimamente diferentes, mas não como
parte de qualquer parte.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Até parece que é verdade!

O Orador: - Não procurámos a concertação em nome de uma lei inócua ou da
desvirtuação do propósito inicial. Não fizemos concertação com receio de uma
greve. Sempre dissemos, aliás, que era preferível uma boa lei com uma greve do
que uma paz social artificial com uma lei que tudo adiava.
A concertação - como a justiça social - não é detida em regime de monopólio por
qualquer força política ou social. Ficou provado que, com muita vontade,
autenticidade nos propósitos, firmeza reformista e persistência no método, é
possível bons resultados em nome do interesse geral e do bem comum.
Sr.as e Srs. Deputados: Permitam-me que, sumariamente, enuncie, neste momento,
as principais linhas orientadoras da proposta de Código do Trabalho:
Primeiro, a ideia de cooperação solidária no seio da empresa. De facto, é
elementar perceber-se hoje que entre o empregador e o trabalhador há a empresa,
que entre a empresa e o emprego há o trabalho, que entre o empregador e a
empresa há a responsabilidade social.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Segundo, o justo equilíbrio entre competitividade económica,
personalismo laboral, coesão social e justiça distributiva.
Terceiro, a modernização das nossas empresas e da nossa economia, tendo em
atenção as exigências da mundialização das trocas e do alargamento da União
Europeia.
Quarto, o primado da co-responsabilidade e da exigência, o reforço da ética do
esforço e do mérito como elementos estruturantes do progresso e da justiça, no
pleno respeito pela igualdade de oportunidades, mas afastando o igualitarismo
artificial de resultados. É preciso não esquecer que a pior injustiça é a que
nivela o que é diferente.
Quinto, a necessidade de adaptar a legislação a novas formas de trabalho e a
novas categorias de trabalhadores, como sejam os que trabalham a tempo parcial,
os tele-trabalhadores, os jovens pais e mães trabalhadores, as situações de
cedência ocasional ou de trabalho temporário, os trabalhadores deficientes ou
com menor capacidade de trabalho, bem como a consideração específica das
empresas de menor dimensão, em regra, aliás, boas geradoras de novos empregos.
Sexto, a expressa consagração de direitos de personalidade dos trabalhadores e de
um conjunto de garantias dos seus direitos e créditos, designadamente face às
novas formas de organização societária.
Sétimo, a justa, responsável e harmoniosa conciliação entre direitos e deveres
de todas as partes no seio da empresa.
Oitavo, a contribuição para um dos mais decisivos desafios de uma economia
humana e humanizada: a melhor partilha entre o trabalho, a família e os tempos
livres das pessoas.
Nono, o reconhecimento da adaptabilidade, da flexibilidade e da organização do
tempo de trabalho como factores imprescindíveis numa economia em permanente
mutação, devendo sublinhar-se que, com a nova lei e nesta matéria, os
trabalhadores deixam de ser objecto para serem parte nas decisões que a eles
respeitam.
Décimo, o reforço e a revitalização da contratação colectiva, como sede, por
excelência, da livre e responsável formação de vontade das partes, eliminando
bloqueios ao seu ajustamento e desenvolvimento, como, aliás, é a regra nos
países mais desenvolvidos da Europa. É que subsistem, ainda, muitas convenções
colectivas feitas à medida de um mundo que já não existe e que, na aparência da
defesa dos chamados "direitos adquiridos" e irreversíveis, acabam por
prejudicar o futuro das empresas e os respectivos postos de trabalho.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Décimo primeiro, a salvaguarda da efectividade da lei e da
defesa do Estado de Direito que erradique o sentimento de impunidade resultante
do acentuado grau de incumprimento das normas laborais, que desincentive formas
de emprego clandestinas, que previna abusos, sancione irregularidades e
penalize a irresponsabilidade, o desleixo e o absentismo. Uma lei, enfim, que
reforce o Estado fiscalizador em detrimento do Estado controlador de
procedimentos meramente administrativos.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Décimo segundo, o fortalecimento do investimento nacional e a
criação de condições de atracção de investimento estrangeiro gerador de riqueza
e de postos de trabalho, bem como da promoção da qualidade empresarial,
gestionária e profissional.
Décimo terceiro, a criação de condições que estimulem o emprego produtivo e,
sobretudo, dêem renovadas esperanças aos que não têm trabalho e aos jovens no
início das suas vidas activas.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Décimo quarto, a consideração da formação profissional, do
reforço de condições de higiene, saúde e segurança laborais como investimentos
estratégicos e verdadeiros activos das empresas e dos trabalhadores e não como
meros exercícios formais sem consistência.
Sr.as e Srs. Deputados: Com este Código podemos passar a ter uma lei de
progresso social que afasta duas visões radicais do mundo empresarial e
laboral: a tese ultra liberal, para a qual a parte mais débil ficaria, em maior
ou menor grau, submetida aos ditames da parte mais forte, mas também a tese
resignada, retrógrada e imobilista pela qual não se distingue o mérito, a
responsabilidade e os resultados, "cai o Carmo e a Trindade" logo que
se fala de flexibilidade ou de produtividade e o dono da empresa aparece sempre
como o "inimigo" a abater. Dizemos claramente "não" à
precariedade social e moralmente reprovável,…

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Vê-se…!

O Orador: - … como repudiamos o proteccionismo artificial que esconde as
diferenças e empobrece o mérito.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Por isso, não alimentamos autismos corporativos ou
fundamentalismos radicais.

Risos do Deputado do PCP Jerónimo de Sousa.

Não temos uma visão maniqueísta das relações de trabalho. Assim como não se
pode generalizar abusivamente a ideia do mau trabalhador, não se pode induzir a
ideia do patrão explorador e insensível.
Por outro lado, a segurança de emprego não pode ser dissociada da ideia da
saúde das empresas. Por isso, aquela não existe a nível absoluto e não pode ser
salvaguardada apenas com base em requisitos formais e adquiridos. Por exemplo,
o que é melhor para o trabalhador, um contrato permanente numa empresa falida
ou um contrato a termo numa empresa com futuro?

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Mas só há essas duas hipóteses?

O Orador: - Acabou definitivamente o tempo de emprego para toda a vida. Há,
agora, que criar as condições de trabalho com qualidade e por toda a vida
activa.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Uma empresa é, em primeiro lugar, uma comunidade de pessoas e de
progresso. Não há trabalhadores sem empresas, como não pode haver boas empresas
sem trabalhadores motivados. A vitalidade das empresas não pode ser apenas
do interesse dos patrões e indiferente para os trabalhadores, como a partilha
de resultados não pode ser um acto isolado e egoísta, mas uma expressão de
respeito e de estímulo pelo trabalho. Os postos de trabalho dependem cada vez
mais da capacidade das empresas para não soçobrarem perante mercados cada vez
mais concorrenciais. Uma empresa de sucesso não se faz separando o
empregador dos trabalhadores. A dignificação do trabalho e dos
trabalhadores não se opõem mas completam-se e entrecruzam-se.
Este Código repudia também a inércia e exprime uma posição socialmente
equilibrada e adaptada aos novos desafios. Não é um "faz de conta"
legislativo pelo qual, com alguma cosmética e certa estética, se muda o
acessório para que o essencial permaneça intocável, nem é uma expressão de
radicalismo liberal que não compreende a natureza eminentemente social do
direito do trabalho e ignora completamente os preceitos constitucionais que
sempre terão de ser respeitados.
Este Código, para uns, sempre incomodados com a ideia da mudança, é demais;
para outros, sempre obcecados com a idolatria do mercado sem preocupações
sociais e humanistas, será de menos. Por isso, os primeiros diabolizam o Código
como uma constante ameaça, defendendo administrativamente os empregos que
existem, não os que é necessário criar, convencidos que o progresso existe por
definição legal sem esforço, sem dedicação e desprezando a função social do
mérito, e os segundos, sempre cépticos e às vezes cínicos, desvalorizam-no como
um insuficiente passo, ansiosamente sempre à espera do passo seguinte que, para
eles, nunca vem.
Para o Governo, esta reforma é um instrumento para favorecer a produtividade e
a competitividade. Não o único, como sempre dissemos, nem certamente o mais
decisivo, mas seguramente necessário e inadiável. Uma reforma suficientemente
flexível para ser eficaz, suficientemente diferenciadora para ser progressista,
suficientemente equilibrada para ser justa. Uma lei para usar e não para dela
se abusar.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Uma lei onde a regra do jogo nunca possa passar pelo jogo sem regras, mas
também uma lei onde se repudia a excessiva rigidez dos actuais normativos que,
na prática, beneficiam quem não investe, quem não é responsável, quem não quer
trabalhar, quem não se preocupa com a qualificação profissional

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Um Código que, em qualquer caso, jamais será um conjunto de
normas para definhar a responsabilidade de quem, às vezes, exige da lei o que
deve resultar da maior autoridade legítima, que é o exemplo, e do mais sério
pacto não escrito, que é a confiança.
Todos consideram que um dos grandes problemas nacionais é o baixo nível de
produtividade. O Código do Trabalho procura, na medida do seu âmbito,
contribuir para a sua melhoria, pela alteração do paradigma da relação entre
empregadores e trabalhadores, sabendo-se que a economia só se desenvolve com as
pessoas e pelas pessoas.
É redutor e incorrecto atribuir-se aos trabalhadores a responsabilidade única
pelos níveis de produtividade. Mas é igualmente redutor e incorrecto colocá-los
fora deste processo. Estamos todos conscientes que, se é certo que o trabalho
se repercute directamente nos custos de produção, a batalha de produtividade
passa, também e decisivamente, por muitos outros factores endógenos às empresas,
como a formação dos próprios empresários, a organização, a inovação, a
formação, a participação motivadora, a capacidade comercial, a política de
reinvestimento dos lucros e também por factores exógenos, como a política
fiscal, a administração da justiça, a agilidade do aparelho administrativo,
entre muitos outros. Por isso, a batalha da produtividade exige a acção
interdependente de empresários, de trabalhadores, do Estado, das autarquias e
da sociedade em geral.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Sr.as e Srs. Deputados: Não podemos adiar por mais tempo aquilo
que há demasiados anos se vem adiando.
Estamos no século XXI. Não estamos em 1969, nem em 1975, nem mesmo nos anos 80
ou 90.
Somos membros de pleno direito do mais importante espaço político, económico e
social. A nossa legislação laboral deverá inscrever-se no modelo social europeu
e não noutros modelos historicamente ultrapassados e definitivamente rejeitados
numa sociedade democrática.
A reforma laboral é necessária para fortalecer as empresas, dignificar o
trabalho, proteger os que trabalham. Ganhará com ela o País que trabalha e quer
trabalhar, os empresários responsáveis e com sentido de risco, os jovens à
procura da inserção no mercado de trabalho. Ajudar-se-á a quebrar o ciclo
vicioso de baixa produtividade indutora de baixos salários. Dar-se-ão novas
oportunidades a quem, querendo trabalhar, não tem emprego e ser-se-á mais
exigente para quem, tendo emprego, não quer trabalhar.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Diferenciar-se-á o empregador responsável e criador de novas
oportunidades de emprego do empresário incumpridor, subsídio-dependente e
insensível aos seus empregados.
Foi em nome de todos estes valores que o Governo foi mandatado pelo povo
português para, com coragem, sentido de justiça e discernimento, proceder a
esta reforma de fundo.
Foi este o desafio que aceitámos. Será este o desafio a que Portugal vai
responder patrioticamente.

Aplausos do PSD e do CDS-PP, de pé.

O Sr. Presidente: - Nos termos estabelecidos no Regimento, tem a palavra o
relator da Comissão de Trabalho e dos Assuntos Sociais para apresentar a
síntese do relatório e as respectivas conclusões mais relevantes.
Tem, pois, a palavra o Sr. Deputado Francisco José Martins. A Mesa concede-lhe
7 minutos, atendendo a que o relatório é muito longo.

O Sr. Francisco José Martins (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro,
Srs. Ministros, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Procurarei
ser breve e respeitar o tempo de 7 minutos que o Sr. Presidente me concedeu.
No entanto, permitam-me que, como nota prévia, transmita que este relatório foi
elaborado em concordância com o novo Regimento, o mesmo é dizer que o relatório
foi apresentado em Comissão, não foi submetido a votação, mas, sim, as respectivas
conclusões obrigatórias e o parecer. Nessa medida, procurarei aludir ao
relatório de uma forma sintética, tão-somente referindo o que foram que aí os
pontos abordados e, depois, enunciando as conclusões e o respectivo parecer.
Quanto ao relatório, ele aborda naturalmente a apresentação da proposta de lei
por parte do Governo, a qual deu entrada nesta Assembleia e foi objecto de
despacho de admissão do Sr. Presidente da Assembleia em 14 de Novembro de 2002.
Refere obviamente as questões suscitadas, relativamente à sua admissibilidade,
nos recursos interpostos pelo Bloco de Esquerda e pelo Partido Comunista
Português, os quais mereceram, como é sabido, um parecer da 1.ª Comissão, que
concluiu pela inexistência de quaisquer inconstitucionalidades que pudessem pôr
em causa a admissibilidade dessa proposta de lei e, por conseguinte, que ela
estava em condições de ser admitida e discutida.
Depois, em sede de relatório, é apreciado aquilo que o proponente desta
iniciativa, o Governo, enuncia como motivos para a sua apresentação. Tudo isto,
neste particular, segundo o proponente, assente no princípio programático da
absoluta indispensabilidade de rever a legislação laboral e de a adaptar à nova
organização do trabalho, ao reforço da produtividade e também ao natural
objectivo de competitividade da própria economia nacional.
Voltando à análise da proposta de lei, o relatório também aborda aquilo que é a
orientação, a opção, a estrutura e o conteúdo da proposta de lei, para, depois,
fazer uma análise, ainda que sintética, dos 21 artigos que integram a proposta
de lei, a qual tem em anexo o próprio Código do Trabalho que lhe está
subjacente. No que respeita a esses 21 artigos da proposta de lei, permitam-me
que aqui dê relevo a um aspecto essencial, que tem a ver com a transposição de
directivas comunitárias, quer na totalidade quer parcialmente. De facto, todo
um conjunto de directivas, à luz de uma harmonização, que se deseja, do direito
nacional com o direito comunitário, é aí transposto.
Também é referido um conjunto de matérias fundamentais que merecem uma
relevância especial. Estou a falar no trabalho de menores, nos acidentes de
trabalho e também no estatuto do trabalhador-estudante.
É referida a forma de regulamentação da própria lei, quer em sede de decreto-lei,
relativamente a algumas matérias e alguns artigos, quer por decreto
regulamentar, para, depois, se acentuarem dois aspectos fundamentais. Em
relação a um deles, o prazo de vigência do próprio Código do Trabalho, está
expresso que a sua periodicidade é de quatro anos, findos os quais é
pressuposto a sua revisão. Depois, enumera-se no último artigo, no artigo 21.º,
todo um conjunto (e bastante) de diplomas que serão revogados.
É também matéria constante do relatório - e penso que muito importante - uma abordagem,
ainda que sintética, ao direito comunitário do trabalho. Portugal está
integrado na União Europeia e todos sabemos quão importante é a harmonização da
nossa legislação com o direito comunitário. O relatório expressa, ainda que
sinteticamente, como referi, a evolução das questões sociais e da legislação,
desde o Tratado de Roma até hoje, significando a importância crescente da
legislação laboral no âmbito da Comunidade, mas concluindo, apesar de tudo, por
aquilo que é evidente e ainda hoje corolário dessa legislação, ou seja, que os
direitos de cada um dos Estados-membros ainda prevalecem sobre o direito
comunitário.
Uma nota também sobre aquilo que é a Organização Internacional do Trabalho
(OIT) e aquilo que de importante releva relativamente ao nosso ordenamento
jurídico, em termos laborais, face, sobretudo e fundamentalmente, às convenções
que emanam dessa organização, as quais, como é sabido, fazem parte integrante
da nossa ordem jurídica, nos termos do artigo 8.º da Constituição da República Portuguesa.
Depois, em termos de nota final, faz-se referência - e o Sr. Ministro já hoje o
mencionou - ao processo de consulta pública. Processo de consulta pública,
desde logo, na óptica da própria Assembleia da República, já que, em sede de
Comissão do Trabalho e dos Assuntos Sociais muitas foram as entidades que aqui
vieram deixar o seu contributo e promover o debate em sede da própria comissão,
o que foi seguramente muito rico e será muito importante para o debate na
especialidade.
Refere-se também, nesse processo de consulta pública, o papel do Governo na
discussão com os parceiros sociais, e depois sublinham-se, nesse mesmo
processo, como direito próprio das organizações representativas dos
trabalhadores e dos empregadores de participarem na elaboração da legislação
laboral, os quase 300 pareceres que foram canalizados para a Comissão do
Trabalho e dos Assuntos Sociais, como contributos dados à luz da legislação.
Permitam-me, agora, que transmita também a esta Câmara as oito conclusões
constantes do relatório, que são as seguintes: "1. A proposta de lei em
apreciação não enferma de quaisquer inconstitucionalidades que possam pôr em
causa a admissibilidade e discussão da iniciativa legislativa.
2. A proposta de lei não é uma mera sistematização mas significa uma
codificação assente, nomeadamente, nos estudos e jurisprudência dos últimos
quarenta anos e pelo facto do Direito do Trabalho já ter alcançado uma
estabilidade suficiente para se proceder a essa codificação.
3. As alterações introduzidas respeitam os limites constitucionais como a
segurança no emprego, o papel das comissões de trabalhadores e das associações
sindicais ou o direito à greve e, por outro lado, procedem a adaptações do
Direito do Trabalho nacional a diversas directivas comunitárias em matéria
social."

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se. Peço-lhe que
abrevie.

O Orador: - Vou só acabar de referir as conclusões, Sr. Presidente.
"4. Esta proposta vem também acentuar a importância dos direitos de
personalidade, a limitação do trabalho de menores, a protecção da maternidade e
paternidade, o respeito pelo trabalho dos cidadãos portadores de deficiência,
acentuando ainda a preocupação com a observância das normas de higiene, saúde e
segurança no local de trabalho, tudo isto inserido numa preocupação reforçada
pela dignidade da pessoa humana e pela prestação de trabalho em condições
socialmente dignificantes.
5. Esta proposta, nomeadamente nas alterações que introduz ao nível da
flexibilidade em determinadas áreas, não esquecendo nem ignorando a posição
jurídica do trabalhador, constitui um instrumento importante para a elevação da
produtividade e competitividade externa da economia nacional numa base
sustentada.
6. Esta proposta tem ainda como objectivo estruturante inverter a actual
situação de estagnação da contratação colectiva, dinamizando-a e criando uma
responsabilização das partes no que respeita ao seu cumprimento efectivo.
7. Esta proposta inova ainda em matéria de responsabilização dos empregadores e
agrava o quadro sancionatório por inobservância das leis laborais, em sede de
matéria penal e contra-ordenacional.
8. A participação no processo de consulta pública registou um interesse e
abrangência na sociedade portuguesa extraordinários que muito enriqueceu o
processo de formação desta lei."
Estas conclusões foram aprovadas, ontem, por maioria, na Comissão do Trabalho e
dos Assuntos Sociais, tal como o parecer, que, de forma sintética, nos diz que
a proposta de lei n.º 29/IX reúne os requisitos constitucionais, legais e regimentais
indispensáveis para subir a Plenário da Assembleia da República e aí ser
discutida, como está hoje a acontecer.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Antes de dar a palavra aos Srs. Deputados inscritos para
pedir esclarecimentos ao Sr. Ministro da Segurança Social e do Trabalho,
constato que há dois pedidos de interpelação à Mesa, por parte dos Srs.
Deputados Lino de Carvalho e António Costa.
Começo por perguntar ao Sr. Deputado Lino de Carvalho qual é o motivo da sua
interpelação.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, era para informar a Mesa que
queremos usar da faculdade prevista no n.º 6 do artigo 158.º do Regimento,
utilizandoutilizando o tempo autónomo de 5 minutos dado a cada grupo
parlamentar, para comentar, intervir e pedir esclarecimentos sobre o relatório,
e que, para esse fim, queremos inscrever a Sr.ª Deputada Odete Santos.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado António Costa, qual é o motivo da sua
interpelação.

O Sr. António Costa (PS): - Sr. Presidente, é para chamar a atenção de que
já tínhamos inscrito, para o mesmo efeito referido pelo Sr. Deputado Lino de
Carvalho, o Sr. Deputado Vieira da Silva.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados Lino de Carvalho e António Costa, com
toda a franqueza, julgo que esse preceito deve ser integrado com o princípio
geral da atribuição dos tempos para a fixação de grelhas de debate. Esse deve
ser um preceito que sobreviveu dos tempos em que a regra era não haver grelhas.
Em todo o caso, sobre isso, pergunto se há mais algum Sr. Deputado que se
queira pronunciar, já que estamos a lidar com um Regimento revisto e é provável
que haja dúvidas na apreciação de alguns dos seus preceitos. Faço notar que
esse preceito já existia, sobreviveu intacto do Regimento anterior e nunca foi
relembrado.
Alguém quer usar da palavra?

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, só para ajudar a Mesa, tenho
a ideia de que esse preceito só se aplica, nos termos do artigo 141.º do
Regimento, a propósito da intervenção do autor da iniciativa legislativa. Isto é,
para esse efeito é que esse tempo não conta, quando a Conferência de Líderes
tiver fixado o tempo global de debate. Mas isso é só quando se refere ao autor
da iniciativa. Fora desse caso, há a possibilidade de o relator intervir (e ele
usou dessa faculdade), sendo o n.º 5 do artigo 158.º claro, ao atribuir um
tempo autónomo para esse processo, 5 minutos, e dando igualmente o n.º 6 um
tempo autónomo a cada grupo parlamentar para intervir sobre o relatório.
Portanto, não tinha sentido que, para a apresentação do relatório, houvesse um
tempo autónomo e que, para sobre ele intervir, cada grupo parlamentar não o
tivesse.

O Sr. Presidente: - Com toda a franqueza, acho que não vale a pena
prolongarmos este debate procedimental, com o qual certamente perderemos muito
mais tempo do que se a Mesa der a palavra ao Sr. Deputado Vieira da Silva e à
Sr.ª Deputada Odete Santos.
Por agora, fica assim decidido; é mais prático do que estar a discutir isto
interminavelmente.
Tem a palavra o Sr. Deputado Vieira da Silva.
O Sr. Vieira da Silva (PS): - Sr.
Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O Partido
Socialista não pode associar-se às conclusões do relatório aqui apresentado nem
se revê no seu conteúdo.
Não quer isto dizer que não louvemos o mérito e o trabalho do Sr. Deputado
Francisco José Martins, que se empenhou e desenvolveu um conjunto de reflexões
importantes acerca da proposta de lei aqui em debate, nem votámos contra as
conclusões por algumas divergências que tínhamos relativamente a esse relatório
ou às suas conclusões. Votámos contra, fundamentalmente, porque o relatório e
as conclusões contêm, para nós, omissões inaceitáveis.
Concluímos, há cerca de uma semana, um extenso processo de discussão pública,
conduzido pela Comissão do Trabalho e dos Assuntos Sociais, onde foram ouvidos
e connosco discutiram diversos sectores da sociedade portuguesa. Não faz
sentido que o relatório desse trabalho se resuma à mera enunciação de quem
participou nessa discussão pública.

O Sr. Paulo Pedroso (PS): - Muito bem!

O Orador: - É essencial para esta Câmara que o conteúdo desse debate esteja
também presente, de modo a que todas as Sr.as e Srs. Deputados possam
analisá-lo.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - E, nesse debate, havia pelo menos quatro questões que, para nós,
era fundamental que tivessem sido trazidas ao debate através do relatório da
Comissão e do Sr. Deputado relator.
Em primeiro lugar, foram muitas e de diferentes origens as opiniões de que a
solução legislativa encontrada não é uma boa solução. Trata-se de um código
que, antes de o ser, já não o é, porque, segundo diferentes opiniões, são
necessários entre 40 a 70 diplomas adicionais para formar a nova arquitectura
jurídica do direito laboral. Não se trata de um código e é uma má solução para
muitos daqueles com quem falámos.
Em segundo lugar, foram muitas e diversas as vozes que nos trouxeram uma
preocupação fundamental: a de que esta proposta desloque a favor das entidades
patronais o frágil equilíbrio das relações de trabalho, nomeadamente por obrigar
- e cito alguém que participou nos nossos debates - os sindicatos a negociar em
situação de necessidade.
Em terceiro lugar, foram também muitas e diversas as vozes que questionaram o
enquadramento constitucional de normas de relevante importância material e
simbólica desta proposta de lei, normas que se prendem com a admissibilidade
objectiva, ainda que limitada a alguns sectores, do despedimento sem justa
causa e normas referentes ao direito à greve.
Em quarto lugar (e a quarta razão por que não pudemos associar-nos a este
relatório e às suas conclusões), foram também muitas as vozes - aqui, talvez
unânimes - que questionaram a existência de recuos na igualdade de género, na
conciliação da vida profissional e da vida familiar e na protecção à família.
São quatro questões que, no exercício do debate democrático que levámos a cabo
na Comissão de Trabalho, teriam de ter reflexo neste relatório.
Na verdade, não esperávamos que o Sr. Deputado Relator viesse subscrever muitas
dessas questões, mas pensamos que deveria trazer para aqui esse debate, que foi
um debate importante. Sem ele, sem a presença das vozes que aí ouvimos, as
nossas conclusões, o nossos trabalho, serão mais pobres e a nossa esperança é
que ainda seja possível fazer, nos debates na generalidade e na especialidade,
com que as preocupações, o interesse, o empenhamento que esta proposta de lei
suscitou em muitos sectores da sociedade portuguesa se possa fazer ouvir,
conduzindo a uma melhoria da qualidade do nosso debate democrático.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos, que dispõe
de 5 minutos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs.
Membros do Governo, Srs. Deputados, Sr. Deputado Francisco José Martins: Sei
muito bem que V. Ex.ª teve muito pouco tempo para elaborar o relatório, o que
prova, afinal, que o debate desta proposta de lei, ao contrário do que é para
aí veiculado, não se fez nas melhores condições. Veremos agora na
especialidade.
Por isso, cumprimento o seu trabalho, mas não posso, até em obediência ao
Regimento que temos, que refere que os relatórios têm o nome do seu autor,
deixar de dizer que, nesta matéria, como em todas, o relatório tem muito mais
exigências que o mero enunciado de propostas sem a devida "densificação"
no próprio relatório, e os argumentos contrários foram muitos para muitas
matérias.
Passo a dar alguns exemplos e, desde logo, em relação à questão da precarização
para que aponta esta proposta de lei, segundo alguns dizem. Aliás, esperei até
que V. Ex.ª aproveitasse o relatório para contrariar algumas afirmações que o
Sr. Ministro do Trabalho tem vindo a fazer, como fez, por exemplo, em Setembro,
e que são uma crítica a uma legislação do PSD, do Prof. Cavaco Silva. Isto
porque diz que a actual legislação permite uma precarização absoluta, e até dá
o exemplo dos contratos a prazo incerto - a actual legislação é de 1989, é de
um governo de VV. Ex.as -, e que é esta que vem moralizar a precarização da
vida laboral. Isto foi dito numa entrevista dada em 1989, onde o Sr. Ministro
diz que "todos" fazem batota.
Mas deveria incluir-se também nesses "todos", porque é uma batota
dizer que esta proposta de lei não permite contratos sucessivos até quase à
exaustão e não permite contratos a prazo incerto com muito mais facilidade que
a actual lei, que é má. É que esta ainda permite mais, permite sucessivos
contratos a prazo quando alarga as excepções pelas quais, segundo a proposta de
lei, é possível substituir, logo de seguida, um trabalhador contratado a prazo
certo e mandado embora por outro contratado a prazo certo.
Na verdade, isto acontece, nomeadamente, para os jovens à procura do primeiro
emprego - está ressalvada essa excepção -, pois podem fazer caducar o seu
contrato de trabalho e depois admitir outro trabalhador a prazo para o mesmo
posto de trabalho, ou para um posto lateral da empresa. Por isso, esta proposta
de lei, alargando as excepções, de facto, é mais brutal que a actual lei.
Quanto aos contratos a prazo incerto, em relação aos quais o Sr. Ministro
também disse que a actual lei era má, que não servia, porque permitia um grande
alargamento da contratação a prazo incerto, basta só ler as várias alíneas
desta proposta de lei para concluir que aqui ainda se permite mais incerteza na
contratação, desde logo pela questão da contratação para substituir
trabalhadores directa ou indirectamente e também nas contratações para as obras
da construção civil.
Este é um exemplo de uma matéria que V. Ex.ª deveria ter discutido e tratado,
tal como a flexibilização. Gostaria de saber se, de facto, dar a possibilidade
de trabalhar 12 horas por dia, 60 horas por semana, é bom para conciliar a vida
profissional com a vida familiar, se é uma protecção às famílias o que se quer
estabelecer desta maneira.

Vozes do PCP: - Exactamente!

A Oradora: - Também gostaria de saber, por exemplo, se para a saúde dos
trabalhadores é bom acabar com as pequenas pausas e intervalos de descanso em
uso nas empresas. É ou não verdade que há um debate muito intenso, a nível da
União Europeia, sobre as profundas doenças que afectam os trabalhadores,
nomeadamente as doenças músculo-esqueléticas?

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - Para terminar, Sr. Deputado Francisco José Martins, este é um
simples exemplo e V. Ex.ª, no pouco tempo que tem, poderia, de qualquer forma,
abordar estas questões e outras, como a questão de Castelo de Paiva, pois, ao
contrário do que o Sr. Ministro gostaria, isto prova que esta não é uma
legislação laboral precarizante, de facto, fixa o investimento.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno
Teixeira de Melo.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Sr. Presidente, gostaria de colocar
a seguinte questão prévia: era suposto que, nos termos do artigo 158.º, n.º 6,
do Regimento da Assembleia da República, se discutisse, nesta fase, o
relatório, não o diploma.
Curiosamente, as bancadas do Partido Socialista e do Partido Comunista
aproveitaram para subverter esta regra regimental, antecipando um debate, que
vão ter tempo de travar já a seguir, porventura, para usarem tempo que, de todo
o modo, já têm.
Sr. Presidente, não queremos subverter as regras do jogo, mas para que não
julguem que tememos o debate - e não o tememos - não deixo de suscitar, também,
em jeito de antecipação, uma questão prévia.
O Sr. Deputado Vieira da Silva falou de recuos, dirigindo-se a nós e ao
Governo. Gostava de dizer que não houve recuos, houve sim, Srs. Deputados do
Partido Socialista e do Partido Comunista, aquilo que VV. Ex.as nunca conseguiram
e nunca promoveram, que é a verdadeira concertação social.

Aplausos do CDS-PP e doPSD.

E VV. Ex.as confundiram concertação social, debate amplo, profundo, genuíno,
com recuos, o que se compreende.
Porém, gostava de dizer-vos, Srs. Deputados, que, apesar de tudo, mesmo com o
que hoje apelidam de recuos ficou-se já muito além daquilo que VV. Ex.as alguma
vez sonharam e que há muito deviam ter proposto e promovido, mas nunca o
fizeram. E isso será, agora sim, em sede de discussão do diploma, trazido à discussão
pela minha bancada e por todas as que sobre ele se vão pronunciar.
Quanto ao relatório, importa assinalar o seguinte: desde logo, apreciar a
extensa, rica e feliz argumentação do relator que, desde logo, como pudemos
ver, contribuiu para este debate; em poucas palavras, diria que a proposta de
lei faz todo o sentido, porque sistematiza, simplifica, sintetiza legislação
laboral dispersa por numerosos diplomas legais; procede à transposição para a
ordem interna de várias directivas comunitárias; representa um fortíssimo contributo;
e foi, desde que há memória, o projecto de diploma mais debatido com parceiros
sociais e outras organizações representativas da sociedade civil.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Releva também que, mesmo em sede de discussão do relatório, o
Partido Socialista não teve uma palavra para com a UGT, o que não é de
estranhar - não sei se tem a ver com a presença de alguns Srs. Deputados desse
partido em recentes iniciativas da CGTP, mas isso são coisas do Partido
Socialista

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Trata-se de um diploma profundamente inovador e representa uma
coragem reformista que este Governo, também nesta matéria, demonstrou. E fê-lo
de uma forma que não tem comparação com exemplos do passado.
Por tudo isto, e por tudo o mais que há-de vir e que, em sede de discussão
substancial do diploma, vai ser suscitado por todas as bancadas, gostaria de
reiterar o nosso acordo com os fundamentos do relatório, saudar, uma vez mais,
o Sr. Relator e, finalmente, esperar que com este excelente trabalho do
Governo, que pelo menos conta com o contributo das bancadas da maioria, se
possa dar um grande avanço na legislação laboral em benefício dos
trabalhadores, em benefícios das entidades patronais, em benefício de Portugal.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Drago.

A Sr.ª Ana Drago (BE): - Sr. Presidente, ontem, o Bloco de Esquerda, na
Comissão de Trabalho e dos Assuntos Sociais, votou contra as conclusões e o
parecer do relatório que está agora em discussão e basta olhar para essas
conclusões, que foram apresentadas pelo Sr. Deputado Francisco José Martins,
para perceber que elas são, nada mais, nada menos, que um elogio rasgado à
orientação política da proposta que foi apresentada pelo Governo.
Nós não nos revemos nessas conclusões.
Tal como várias organizações e várias entidades que ouvimos na Comissão de
Trabalho e dos Assuntos Sociais demonstraram, este projecto do código do
trabalho não vai simplificar a legislação - pelo contrário, agora faltam 50,
60, 70, mais diplomas para completar o que está expresso no código -, não vai
proteger os trabalhadores portugueses - pelo contrário, vai-lhes retirar
direitos; não faz a transposição daquilo que são as directivas comunitárias, como
por exemplo em matérias de igualdade e não discriminação. Nessa medida, não
responde a nada do que eram os objectivos que, inicialmente, o Sr. Ministro
tinha proposto para este código do trabalho.
No que respeita ao relatório que o Sr. Deputado Francisco José Martins
elaborou, fizemos-lhe ontem um elogio, pois nota-se que o Sr. Deputado
trabalhou afincadamente. Contudo, ele omite matérias que são fundamentais e
omite, principalmente, aquilo que foram as divergências e o contraditório de
opiniões das várias entidades, dos especialistas, dos próprios Deputados da
Comissão de Trabalho e dos Assuntos Sociais. O Sr. Deputado resolveu não
incluir esse contraditório de opiniões no seu relatório, e relativamente a isso
nós criticámo-lo.
E fizemo-lo especialmente quando nesta matéria estava em discussão aquilo que
consideramos serem inconstitucionalidades grosseiras, que foram, aliás,
argumentadas pelo Bloco de Esquerda e pelo PCP, e que o Sr. Deputado também
entendeu não incluir no relatório, tendo feito apenas uma descrição dos
acontecimentos e nunca para ele transpondo aquilo que era a substância da nossa
argumentação.
Ao que parece, as declarações do Sr. Ministro feitas ontem à rádio TSF poderão
estar correctas: terá reconhecido que haverá, de facto, problemas de
inconstitucionalidade relativamente à não reintegração com despedimento sem
justa causa. Se calhar, isto não preocupa o Sr. Ministro, mas preocupa-nos a
nós, e foi nesse sentido que votámos contra as conclusões e o parecer do seu
relatório.

Vozes do BE e do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo,
Sr.as e Srs. Deputados: Tendo em conta o estabelecido no nosso novo Regimento,
penso que um relatório da Assembleia da República tem responsabilidades
acrescidas, uma vez que passa a ser publicado.
Entendemos que, independentemente do trabalho exigente que compete ao relator e
tendo em conta o imenso universo de entidades que foram ouvidas pela Comissão,
é evidente que uma leitura atenta de todos os documentos chegados e que os
imensos depoimentos feitos perante a Comissão não estão de modo algum
reflectidos num relatório que, em nosso entendimento, deveria ser factual.
Desde logo, há aspectos que não são menores e que foram, pura e simplesmente,
ignorados e não foram equacionados neste relatório.
Do ponto de vista da forma, não foram poucos aqueles que, para além do que já
tinha sido debatido em Plenário, alertaram para inconstitucionalidades grosseiras
do diploma que a Assembleia vai ter hoje presente para uma primeira discussão
em Plenário.
Trata-se de problemas graves, nomeadamente, entre outros, os que foram
levantados em relação ao desprezo e ao desrespeito pelo direito à reserva da
vida privada, que é sacrificada ao serviço dos interesses da empresa e do seu
funcionamento.
Este é, seguramente, um relatório que não reflecte algo que é, para nós, da
maior importância. Aliás, todo um conjunto de organizações, não apenas
sindicais (como a CDIM e a Associação Portuguesa de Mulheres Juristas) chamou a
atenção para o facto de não ser aceitável que um diploma com a pretensão de
estar virado para o futuro e de constituir um instrumento importante do ponto
de vista do direito ao trabalho desconsidere, despreze e, pura e simplesmente,
ignore questões fundamentais em relação às quais estamos obrigados, quer por
deveres constitucionais quer por directivas. Refiro-me às questões de género,
da protecção dos direitos das mulheres, direitos sexuais e reprodutivos que,
pura e simplesmente, não têm expressão no diploma que está em discussão,
direitos que foram enfatizados mas não estão reflectidos neste Em nossa
opinião, também não deixa de ser empobrecedor para o relatório (e para o
esforço que o mesmo deveria conter em termos de objectividade) que nele se
ignorem aspectos importantes que se prendem com uma imoral flexibilidade que
foi identificada como um elemento que será factor de instabilidade, de
insegurança e de perturbação social. Estas não são questões menores e, nesse
sentido, foi pena - e é negativo - que não estivessem reflectidas num documento
com esta responsabilidade.

Vozes de Os Verdes e do Deputado do PCP Bernardino Soares: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Francisco José Martins.

O Sr. Francisco José Martins (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro,
Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Uma primeira palavra para
agradecer algumas intervenções simpáticas em relação à minha pessoa, enquanto
relator da Comissão de Trabalho e dos Assuntos Sociais no que respeita à
proposta de lei n.º 29/IX.
Em primeiro lugar, para o PSD é sabido o quanto é importante a figura do
relatório em comissão, quer por privilegiar o debate na própria comissão, quer
pela dignificação desse mesmo trabalho. Por conseguinte, esta é uma inovação
introduzida no Regimento que apoiamos.
Em segundo lugar, estamos a intervir em sede de apreciação do relatório e,
portanto, não devemos - não é esse o nosso propósito - antecipar a discussão de
fundo sobre a matéria concreta que consubstancia esta proposta de lei. Em
momento e em sede própria, isto é, no debate que se segue, teremos muito gosto
e muito prazer em fazê-lo.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Em todo o caso, permitam-me duas ou três notas que me parecem
muito pertinentes.
Há que respeitar as posições do Partido Socialista, do Partido Comunista
Português, do Bloco de Esquerda e de Os Verdes (este último, com certeza por
razões muito especiais, não esteve presente no debate de ontem, em comissão),
mas nós, PSD e PP, temos posições diametralmente opostas, posições que são
interpretadas à luz do próprio relatório e que, na nossa óptica, contribuem
para um contributo valioso, uma mais-valia que, realmente, este código do
trabalho vai trazer para o ordenamento jurídico português, para aquele que é o
quadro legal das relações de trabalho.
É muito importante verificar que há inovação quando se consagra um capítulo dos
direitos de personalidade, no qual se podem incluir direitos já previstos constitucionalmente
e no Código Civil.

Protestos da Deputada do PCP Odete Santos.

Mas, Sr.ª Deputada Odete Santos, há uma mais-valia, que é a preocupação com
a saúde dos trabalhadores!
Também no que se refere às questões do direito à protecção à maternidade e à
paternidade, todos os direitos actualmente previstos na legislação estão
consagrados nesta proposta de lei, onde muitas dessas preocupações são
evidenciadas. Basta uma para o atestar: a preocupação relativamente aos filhos
e a consagração de, numa periodicidade trimestral, o pai ou a mãe faltarem ao
trabalho para irem à escola do filho.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Se estiverem com contrato a prazo vão usar
muito esse direito!…

O Orador: - Já para não falar da questão do trabalho a tempo parcial e do
trabalho suplementar não obrigatório. Tudo isto ajuda a perceber o quanto está
presente nesta proposta de lei a preocupação da conciliação entre as vidas
profissional e familiar.
Permitam-me mais uma pequena nota relativamente à segurança, higiene e saúde no
trabalho. Quando muito se fala e pugna por essa questão, porque não dizer aqui,
com a autoridade do que foram os governos do PSD, que a directiva…

O Sr. Paulo Pedroso (PS): -Na proposta está zero!

O Orador: - Sr. Deputado, lá chegarei!

O Sr. Paulo Pedroso (PS): - No seu relatório está zero!

O Orador: - Tenha calma, vou explicar em 30 segundos!
Como dizia, esta matéria advém de uma directiva de 1989, que foi transposta
para Portugal, e é bom que saibamos que entre 1991 e 1995, durante os governos
do PSD, construiu-se nesta área um verdadeiro e efectivo edifício legislativo,
com a Lei-quadro da Segurança, Higiene e Saúde no Trabalho, com o diploma
relativo ao regime de organização e funcionamento dos serviços de higiene,
segurança e saúde no trabalho…

Protestos do Deputado do PS Paulo Pedroso.

Sr. Deputado Paulo Pedroso, é triste mas foi o seu governo - e fica esta
nota - que entre 1995 e 1999 nada fez sobre esta matéria. E isso agora vai ser
consagrado, evidenciado como uma referência em termos de quadro legal!
Estes são apenas alguns exemplos que evidenciam o que de positivo está
estabelecido nesta proposta de lei, que vai ser, seguramente, um instrumento
indispensável para reforçar a produtividade e melhorar a competitividade das
empresas portuguesas.
Como nota final, permitam-me que refira algo que é significativo,
inquestionável e que ninguém pode pôr em causa: a concertação social como
referencial para as relações de trabalho. O Sr. Primeiro-Ministro, aqui
presente, disse-o muitas vezes: há que privilegiar a concertação em detrimento
da confrontação. Desse modo, conseguiremos um novo normativo que, seguramente,
enriquece o País, interessa aos portugueses e que será muito importante para
todos nós.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, encerrado este período de discussão do
relatório da Comissão de Trabalho e dos Assuntos Sociais sobre a proposta de
lei n.º 29/IX, vamos passar aos pedidos de esclarecimento ao Sr. Ministro da
Segurança Social e do Trabalho Antes, porém, quero assinalar que, havendo no
meu espírito dúvidas sobre a articulação de diversos preceitos do Regimento -
n.º 2 do artigo 154.º e n.º 6 do artigo 158.º -, pedirei à 1.ª Comissão um
parecer sobre a matéria. Tenho dúvidas, sobretudo, de que esta discussão sobre
o relatório exorbite os tempos fixados pela Conferência de Líderes. Digo isto
porque, conforme estabelece o n.º 2 do artigo 154.º, só o tempo atribuído ao
relator é expressamente excluído dos tempos globais de debate distribuídos aos
grupos parlamentares.
Quero apenas assinalar este assunto para que não constitua um precedente sem
mais. Tal como referi, oportunamente pedirei um parecer sobre a matéria à 1.ª
Comissão.
Vamos, então, dar início aos pedidos de esclarecimento ao Sr. Ministro da
Segurança Social e do Trabalho, cabendo o primeiro deles ao Sr. Deputado Telmo
Correia.
Tem a palavra, Sr. Deputado. Dispõe de 3 minutos.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Segurança
Social e do Trabalho, queria começar por sublinhar, entre outras matérias, os
importantes avanços que se fazem em matéria de contratação colectiva e
dizer-lhe, Sr. Ministro, que este código que hoje aqui chega representa uma
vitória indiscutível.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Uma vitória indiscutível, em primeiro lugar, de todos aqueles
que acreditam num Portugal moderno e competitivo!

Vozes do CDS-PP e do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Uma vitória daqueles que acreditam que é possível conciliar mais
flexibilidade laboral com o respeito integral pelos direitos dos trabalhadores!

Vozes do CDS-PP e do PSD: - Muito bem!

O Orador: - E uma vitória daqueles que acreditam que os princípios do
tripartismo e da concertação social são úteis e fazem sentido!

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Exactamente!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Mas, se há uma vitória, também há uma derrota. E a grande
derrota neste processo é a daqueles que sempre procuraram o conflito pelo
conflito!

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - A grande derrota neste processo é a dos profissionais do
protesto e a dos profissionais da greve, ainda que ela seja parcial!

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A grande derrota neste processo é a de todos os que recorreram,
sistematicamente, à demagogia e à falsidade para atacar este mesmo processo!

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Quero dizer-lhe, Sr. Ministro, e recordar aqui claramente, para
que não fiquem dúvidas, que o que aconteceu neste processo, com o PCP e com o
BE, ultrapassou, em variadíssimas circunstâncias, o que é admissível em
democracia no grau de ataque e no grau de insulto ao Ministro do Trabalho!

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Sr. Deputado Bernardino Soares, o meu gabinete fica por trás de uma das
portas desta Sala e, dia sim, dia não, ouço as cornetas de uma carrinha que
passa a gritar na rua: "Bagão lacaio do patrão".

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Uma vergonha!

O Orador: - Mais ainda, Sr. Deputado Francisco Louçã, o vosso grau de
insulto chegou a um nível que não era pensável, um insulto do tipo que lhe vou
mostrar e recordar. Refiro-me ao autocolante do Bloco de Esquerda de apoio à
greve geral.

Neste momento, o orador exibe uma cópia do referido autocolante.

Nele se reproduz aquilo que o Bloco de Esquerda, no seu imaginário
delirante, imagina ser um capitalista que nem no século XIX existia,
reproduzindo o Ministro como se fosse um cão do patrão.
A este grau de insulto não estamos habituados.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Quando o Ministro, que é um homem sério, chega a esta Assembleia com um
acordo firmado com patrões e com sindicatos responsáveis era tempo e hora de os
senhores se retratarem e pedirem desculpa.

Vozes do CDS-PP e do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Esse era o momento e essa era a hora.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o tempo de que dispunha esgotou-se.
Peço-lhe para concluir.

O Orador: - Concluo já, Sr. Presidente. Tenho sido sistematicamente
interrompido, portanto tenho dificuldade em concluir…

O Sr. Presidente: - Não muito, Sr. Deputado. Tenha a bondade de concluir.

O Orador: - Concluo, dizendo que esta é, de facto, uma vitória da
concertação. Era bom que soubéssemos onde ficam, perante esta concertação,
aqueles que, primeiro, diziam que não havia concertação e, depois, que a
proposta é um recuo.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Pergunto-lhe, Sr. Ministro, se considera, como diz o Partido
Socialista, que esta proposta é um recuo ou se, bem pelo contrário, o resultado
final e este acordo tripartido melhoram a proposta inicial. Esta é a questão
que quero deixar-lhe, felicitando-o mais uma vez pela concertação e por uma
reforma que é fundamental para Portugal.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da
Segurança Social e do Trabalho. Dispõe de 3 minutos.

O Sr. Ministro da Segurança Social e do Trabalho: - Sr. Presidente, Sr.
Deputado Telmo Correia, muito obrigado pelas suas palavras e pelo estímulo que
elas representam para o Governo em geral e, em particular, para o Ministro e
Secretários de Estado aqui presentes do Ministério da Segurança Social e do
Trabalho.
Faço apenas o seguinte comentário: neste momento, devemos sobretudo
congratularmo-nos pela vitória de Portugal.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - As calúnias já lá vão - só faz calúnias quem não tem argumentos…

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - … - e sinto-me muito orgulhoso em poder ter sido parte activa
nesta profunda reforma a favor de Portugal, dos trabalhadores portugueses, das
empresas portuguesas e daqueles que procuram emprego. Não caluniem os outros
parceiros sociais que assinaram, também, o compromisso tripartido.

Vozes do PS: - Assinaram?!

O Orador: - Por isso, Srs. Deputados, creio que é Portugal que tem agora um
factor renovado de esperança, de esperança em melhores condições de vida para
os trabalhadores portugueses. Temos um código laboral produtor dessa esperança
e dessa confiança e é em nome desses valores, do personalismo laboral, da
competitividade económica, da coesão e da justiça social que continuaremos a trabalhar.
Nesse sentido, todo o estímulo das bancadas da maioria é, para nós, um grande
elemento de conforto e de alento para prosseguirmos esta batalha decisiva para
Portugal.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Paulo Pedroso pediu a palavra para que
efeito?

O Sr. Paulo Pedroso (PS): - Para uma interpelação à Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Qual é o tema da sua interpelação, Sr. Deputado?

O Sr. Paulo Pedroso (PS): - Sr. Presidente, gostaria de solicitar cópia das
assinaturas do acordo a que o Sr. Ministro se referiu, uma vez que o Sr.
Deputado Telmo Correia também já tinha falado de um acordo tripartido e a única
informação que tenho é a de um comunicado da União Geral de Trabalhadores em
que está escrito o seguinte: "Mesmo com as alterações, a proposta de lei
continua a não merecer a concordância da UGT, tanto por razões de forma como de
conteúdo."
Há algum acordo? Há alguma assinatura? Se houver, peço-lhe o favor, Sr.
Presidente, de disponibilizar às bancadas parlamentares cópia do acordo e das
assinaturas.

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Paulo Pedroso, a Mesa não dispõe desse
documento, mas talvez seja possível esclarecer a sua posição em momento
oportuno do debate.

O Sr. Ministro da Segurança Social e do Trabalho: - Sr. Presidente, peço a
palavra também para uma interpelação à Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro da Segurança Social e do Trabalho: - Sr. Presidente, Sr.
Deputado Paulo Pedroso, o senhor foi Ministro do anterior governo…

O Sr. Patinha Antão (PSD): - Mas não parece!

O Orador: - … e sabe perfeitamente que nunca houve na história da
concertação social portuguesa qualquer acordo escrito sobre um projecto
legislativo.

Vozes do PS: - Não é verdade!

O Orador: - Certamente o Sr. Deputado só leu parte do comunicado que a UGT
tornou público, porque está lá escrito…

O Sr. Paulo Pedroso (PS): - Não é verdade!

O Orador: - Não jogue com palavras, Sr. Deputado. Não jogue com argumentos
formais,…

O Sr. Eduardo Ferro Rodrigues (PS): - Formais?!

O Orador: - … quando sabe perfeitamente que a UGT deu o seu acordo ao que
chamámos compromisso tripartido, que permite para todos uma lei melhor do que a
proposta que inicialmente entregámos no Parlamento.
Isso é que é decisivo e esse é que é o resultado da concertação social.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Antes de dar a palavra ao orador seguinte, quero
assinalar a presença na tribuna dos diplomatas estrangeiros de uma nossa colega
australiana, a Sr.ª Deputada Kelly Hoare, a quem, em nome da Câmara, dirijo uma
saudação muito amiga.
A Sr.ª Deputada, que veio tão longe, do outro lado do mundo, é aqui acolhida
fraternalmente. Muito obrigado pela sua visita.

Aplausos gerais, de pé.

Para pedir esclarecimentos ao Sr. Ministro, tem a palavra o Sr. Deputado
João Teixeira Lopes.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Sr. Presidente, este debate, pelo menos
até ao momento, deu para descobrirmos no Sr. Deputado Telmo Correia uma fulgor
censório que não lhe conhecíamos. O Sr. Deputado decerto não ignorará que as
caricaturas são a livre expressão da criatividade e da interpretação de quem as
faz.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Já me lembrei de o caricaturar.

O Orador: - Provavelmente, o Sr. Deputado Telmo Correia também não apreciará
a Mafaldinha, de Quino, o Calvin & Hobbes, Rafael Bordalo Pinheiro…, mas
isso é uma questão de gosto. Não queira é impor o seu gosto, porque, como sabe,
gostos não se discutem!

Protestos do CDS-PP.

Estão um pouco nervosos! Estão incomodados? Querem censurar a minha
intervenção?

Vozes do CDS-PP: - Não, não!

O Orador: - Muito obrigado.
O Sr. Ministro referiu há pouco que este código do trabalho não quer ser
conotado com a época de 1969, com a época do pós-25 de Abril. Pois dir-lhe-ei
que o senhor falha os encontros com a História e com o tempo.
De facto, Sr. Ministro, este código do trabalho encontra as suas raízes no
século XIX, encontra as suas raízes no período anterior ao modelo social
europeu, que o senhor teve - perdoar-me-á - a coragem de evocar. Este código do
trabalho (ele, sim, uma calúnia para os trabalhadores portugueses) é anterior
ao contrato social que funda as democracias ocidentais tal como hoje as
conhecemos.
Como é que o Sr. Ministro explica tamanha contradição entre o facto de termos
uma empresa, a Auto Europa, em Palmela, que na actual legislação consegue dos
melhores resultados no conjunto das suas empresas a nível internacional,
produzindo mais de 130 000 carros, e que, simultaneamente, a Clarks, em Castelo
de Paiva, feche as suas portas? E fecha as suas portas porque o código do
trabalho não é para ela uma questão decisiva e não é com ele que vai atrair o
"investimento beduíno", o "investimento nómada", que tantos
governos, infelizmente, têm permitido no nosso país.
Sr. Ministro, sabe o que significa para muitos trabalhadores o trabalho para
toda a vida? Significa a impossibilidade de trabalhar durante o resto da sua
vida, porque são demasiado velhos para terem emprego e demasiado novos para
terem reforma.
Perdoar-me-á, mas não é por colocar na sua boca palavras como
"moderno", "competitividade" ou "produtividade"
que o senhor encontra a modernidade. Com este código o senhor arrisca-se a ser
não o árbitro que reclama ser - e isso é uma ofensa a todos os árbitros isentos
e imparciais -, mas, sim, alguém que dribla, que passa a bola para meter o
golo. E ainda por cima faz batota!
Sr. Ministro, este código, ele sim, é uma calúnia aos trabalhadores
portugueses!

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Telmo Correia sentiu-se agravado por o
Sr. Deputado Teixeira Lopes o ter chamado censor. De facto, é uma palavra muita
feia.
Para defesa da honra, tem, pois, a palavra o Sr. Telmo Correia, que me prometeu
ser extremamente breve.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Serei muito breve, Sr. Presidente.
Sr. Deputado Teixeira Lopes, não só não tenho qualquer intuito censório em
nenhuma circunstância como até sou um apreciador de banda desenhada. Só lamento
a sua pretensão de se comparar a alguns dos autores que citou, que são autores
notáveis na banda desenhada.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Deputado Teixeira Lopes, em relação à questão concreta que
está em causa, aquilo que considerei um insulto não tem a ver com o facto de se
tratar de banda desenhada, de um cartoon ou seja do que for. O insulto - repito
- foi a insinuação sistemática de que o Ministro, reproduzido como um cão -
trata-se de banda desenhada de mau gosto, mas esse é problema vosso, pois cada
um tem o seu gosto, como diz -, era o instrumento do patrão. Isso é que é
insultuoso para uma pessoa que consideramos séria.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Pelo contrário, o Sr. Ministro demonstrou, com o compromisso
tripartido, que não esteve ao serviço de ninguém, tendo, ao representar o papel
do árbitro, feito aquilo que deve ser.
Os senhores deviam reconhecê-lo e deviam ter lamentado este tipo de ataques,
este tipo de acusações e este tipo de insultos.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Deputado
Teixeira Lopes.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Sr. Presidente, anoto que o Sr. Deputado
Telmo Correia faz a defesa da honra do Ministro e não a sua própria!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Foi a mim que me chamou censor!

O Orador: - No seu caso, só posso aconselhá-lo a ter sentido de humor em
relação às caricaturas, porque é para isso que elas servem.
No que diz respeito ao teor da caricatura, a sua ingenuidade, Sr. Deputado, é
angelical! O Sr. Deputado acreditará no que diz?! Acreditará que, de facto, o
Sr. Ministro é um árbitro imparcial?! Acreditará que o Sr. Ministro não tem
tomado uma posição por uma das partes?! Acreditará que o Sr. Ministro não está
ao serviço dos interesses mais poderosos e, inclusivamente, mais
"cegos" da economia portuguesa?! O senhor ignorará que todo este
código representa a consagração da vingança sobre o 25 de Abril, que há muito
tempo vêm pretendendo?!

Protestos do PSD e do CDS-PP.

Sr. Deputado Telmo Correia, a sua ingenuidade merecia uma bem humorada
caricatura!

O Sr. Presidente: - Para responder ao pedido de esclarecimento do Sr.
Deputado João Teixeira Lopes, tem a palavra o Sr. Ministro da Segurança Social
e doTrabalho.

O Sr. Ministro da Segurança Social e do Trabalho: - Sr. Presidente, Sr.
Deputado Teixeira Lopes, tenho de reconhecer que o Sr. Deputado não me
insultou, mas ao dizer que nunca fui um árbitro imparcial acabou por fazer um
grave insulto aos parceiros sociais que assinaram o compromisso tripartido.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Quanto às lições de história, muito obrigado. Aliás, o Bloco de
Esquerda sabe de tudo, tem soluções para tudo, nada lhe escapa, tudo o que faz
é bendito, tudo o que os outros fazem é maldito!

Vozes do CDS-PP: - Exactamente!

O Orador: - Só há um problema, é que não têm os votos dos portugueses!

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - A propósito da acusação de que estamos a voltar ao século XIX em
matéria de legislação laboral, eu trouxe a legislação laboral do século XIX,…

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - … que apenas no Código Civil de 1867 consagrava os únicos três
tipos de trabalho existentes na altura do ponto de vista normativo: serviço
doméstico, criados de lavoura e aprendizagem.

O Sr. Patinha Antão (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Curiosamente, já só no século XX, em 1907, mais precisamente no
Decreto Real de 3 de Agosto, é que foi consagrado expressamente o princípio da
obrigatoriedade de um dia de descanso semanal.
Como vêem, obtivemos aqui uma grande lição de história ao comparar-se o código
de trabalho ao século XIX! Palavras mais não são necessárias!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Quanto à questão da Auto Europa, estou de acordo com o Sr. Deputado, que
certamente ouviu com muita atenção a minha intervenção. Eu não disse que este
código de trabalho era uma panaceia para o problema da produtividade, disse que
era uma condição necessária, mas insuficiente. Elenquei uma série de medidas
que também são necessárias, onde estão alguns dos factores de sucesso, de
produtividade da Auto Europa.
Relativamente à Clarks, que aqui focou, e que, como portugueses, solidariamente
todos lamentamos, o que está a acontecer ou pode vir a acontecer aos
trabalhadores nessas circunstâncias, o código do trabalho ainda não tem culpa
disso. Eventualmente, a culpa disso pode ser da legislação laboral que existe,
que os senhores querem que não mude.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado
Rui Cunha.

O Sr. Rui Cunha (PS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, em primeiro lugar,
queria agradecer-lhe por me ter dispensado de lhe formular a primeira pergunta,
visto que já nos esclareceu que não existe nenhum acordo, que, como dizem os
nossos irmãos brasileiros, não há nenhum "papel passado".
O único papel passado que existe é este comunicado da UGT que tenho comigo, do
qual, além do período lido pelo meu camarada Paulo Pedroso, ainda me permito
ler mais dois: "(…) que por isso continuaremos um diálogo com os grupos
parlamentares e com a Comissão de Trabalho e dos Assuntos Sociais da Assembleia
da República, visando a introdução de alterações na especialidade (…)",
"(…) que continua a haver inconstitucionalidades que têm de ser sanadas
(…)".

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - E o resto? Leia tudo! Isso é que é
censura!

O Orador: - Este é o "papel passado". Para tudo o mais não há
"papel passado"!
O Sr. Ministro anunciou, no início da noite do passado dia 8, um conjunto de
propostas de alteração que supomos venham a ser apresentadas pelos partidos da
maioria em sede de especialidade.
Esse anúncio conduziu, por um lado, à situação sui generis de hoje e de amanhã
estarmos a discutir e a votar um "nado morto" e, por outro,
corresponde ao segundo recuo do Governo, o que demonstra claramente o
reconhecimento de que estamos perante uma má proposta de revisão da legislação
laboral.
Mas, Sr. Ministro, queria colocar-lhe algumas questões muito concretas.
Algumas das propostas anunciadas pelo Sr. Ministro, na noite do passado dia 8,
vieram ao encontro de propostas do PS divulgadas na manhã desse mesmo dia.
Queria começar por registar o abandono das alterações que o articulado hoje em
discussão preconizava no que respeita ao regime de faltas que constituem justa
causa para despedimento.
Ao longo das várias intervenções, o Sr. Ministro sempre afirmou a necessidade
de introdução dessas alterações como decisivas no combate ao absentismo e no
aumento da produtividade. Sr. Ministro, ao abandonar estas alterações, ou se
estava perante uma falácia com objectivos que nos escapam - tal como o PS
sempre afirmou - ou o Sr. Ministro decidiu abandonar o combate ao absentismo e
a luta pelo aumento da produtividade. Em que ficamos, Sr. Ministro?
No anteprojecto apresentado em Julho, a duração dos contratos a termo era
praticamente ilimitada. No articulado ora em apreço, e mesmo após a
"operação cosmética" da proposta divulgada no passado dia 8,
constatamos que a duração desses contratos passa de três para seis anos. Sr.
Ministro, gostaríamos de saber o porquê desta obsessão do Governo no aumento da
duração dos contratos a termo. Que movimentações existem na sociedade
portuguesa que conduzam à exigência destas alterações, agravadas ainda pelo
desaparecimento do objectivo da celebração do contrato a termo que actualmente
é exigido?
Sr. Ministro, não me responda com as obras de construção civil que duram mais
do que três anos, porque, para isso, a lei prevê a celebração de contratos por
tempo indeterminado.
Sr. Ministro, não vou cometer a indelicadeza de lhe perguntar se é ou não
sindicalizado, mas, caso seja, o Sr. Ministro aceita que o seu sindicato
prescinda do direito à greve?

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro.

O Sr. Ministro da Segurança Social e do Trabalho: - Sr. Presidente, Sr.
Deputado Rui Cunha, sei que lhe custa muito este acordo, este compromisso
tripartido com a UGT e com a CIP, mas, de uma vez por todas, tem de se perceber
qual é a posição do Partido Socialista: se quer estar do lado da moderação e da
vontade de concertação da UGT ou se quer estar do lado do autismo e do
radicalismo fundamentalista da CGTP.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Parece-nos que está a ser inclinado para o lado da CGTP! É esta a questão
que está, neste momento, aqui, verdadeiramente em causa.
O Partido Socialista tem também de se entender internamente sobre de que lado
quer estar: quer estar do lado da legislação actual ou quer estar do lado do
progresso e da adaptação? É que basta ler algumas declarações de anteriores
responsáveis socialistas, quer como Ministros ou Secretários de Estado, quer,
agora, como Deputados, para se perceber que, de facto, nós viemos ao encontro -
creio eu - daquilo que o PS sempre pensou. Por exemplo, Paulo Pedroso dizia há
algum tempo: "É fundamental que os parceiros sociais exprimam, através de atitudes
negociais, o desejo de participar de forma responsável neste processo,
evidenciando disponibilidade para se adaptarem às condições impostas pela
modernidade, quer explorando novas possibilidades que se lhe oferecem, quer
partilhando solidariamente os riscos e os problemas que se lhe colocam."
Portanto, vamos ver de que lado querem estar.
Por outro lado, se algumas propostas constantes do compromisso tripartido vão
ao encontro do PS, então porque é que não vão votar a favor desta proposta de
lei?
Quanto ao recuo, é interessantíssimo que o PS, que se julgava o pai monopolista
da concertação… Aliás, na minha perspectiva, o PS entende o diálogo como um fim
e não como um meio para atingir objectivos! O que o PS nunca pensava é que nós
fossemos capazes de concertar! O Sr. Deputado Ferro Rodrigues, em 26 de Junho,
dizia a um jornal que o que o Governo procurava era a busca do confronto pelo
confronto, mas agora, que negociámos, que acordámos, considera que são recuos,
cedências! Afinal, onde é que o PS fica? Queixou-se do défice da concertação,
agora queixa-se de que são um excesso os seus resultados!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Quanto às questões que me colocou relativas às baixas, ao absentismo, penso
que este é um aspecto que nos deve unir a todos, em nome da justiça, em nome da
responsabilidade, em nome do progresso. Certamente que não é por passar de
quatro para cinco, ou de oito para dez, novamente, que estão em causa os
fundamentos desta reforma laboral. Sabe isso perfeitamente!

O Sr. Rui Cunha (PS): - Foi o que sempre dissemos!

O Orador: - Então, estamos de acordo!
Mas ouviu-me dizer que o combate ao absentismo era fundamental, não me ouviu
dizer que esta norma era fundamental para combater o absentismo! Isso é uma
coisa completamente diferente.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Quanto aos contratos a termo, nós não temos nenhuma obsessão; nós firmámos
um compromisso, um compromisso com parceiros responsáveis, em nome de valores
que podem unir-nos. Estas medidas não se trataram de operações de cosmética. Aliás,
a expressão "operações de cosmética" tem sido a bandeira das críticas
da CGTP a este compromisso tripartido. Mais uma vez, parece-nos que PS está
claramente a tender para o campo em que também a CGTP se move nesta matéria,
que não é o da cultura da negociação, que sempre disseram defender, mas o da
cultura da pura confrontação.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª
Deputada Ana Manso.

A Sr.ª Ana Manso (PSD): - Antes de mais, Sr. Ministro, quero felicitar V.
Ex.ª pela coragem política e espírito reformador, muito especialmente pelo
excelente trabalho que fez em sede de concertação social. V. Ex.ª, Sr.
Ministro, provou que a concertação e a justiça social não são monopólio da
esquerda.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - A proposta de lei que hoje debatemos nesta Câmara é o resultado
de um longo processo negocial em que a cultura de concertação e de diálogo foi
praticada, e praticada mesmo para decidir e não, como era hábito, para só
adiar. Hoje debatemos uma proposta de lei que resulta de um processo
verdadeiramente participado, direi mesmo, como disse o Sr. Ministro, o mais
participado desde o 25 de Abril, nos espaços e tempos da comunicação social,
nos artigos de opinião, na informação televisiva, nos colóquios e debates
públicos, nas consultas e nas horas de concertação formal, quer do Governo,
quer da comissão parlamentar. Foi uma verdadeira maratona para uma verdadeira
reforma de fundo das leis laborais.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Por isso, hoje, mais ainda do que ontem, são justos e fazem
todo o sentido os reconhecimentos e os elogios dos mais variados quadrantes,
desde o Governador do Banco de Portugal, Dr. Victor Constâncio, que é
insuspeito, penso eu, para a bancada socialista, desde o Presidente do Conselho
Económico e Social, Prof. Silva Lopes, ao tão falado acordo tripartido
celebrado entre o Governo, a UGT e a CIP. São sinais claros, Sr. Ministro, de
que quando tudo muda à nossa volta nós também temos de mudar e não devemos
ficar agarrados a um passado de preconceitos ideológicos que em nada beneficia
os trabalhadores, porque em nada beneficia a economia e o desenvolvimento
social e a criação de novos empregos.
O pior é vermos dirigentes do maior partido da oposição, que tiveram grandes
responsabilidades nesta área, utilizarem o tempo de antena de uma central
sindical para apoiarem uma greve, dita geral, em vez de proporem uma mudança
que eles próprios deviam ter tido a coragem de realizar, evitando assim a
pesada herança e o marasmo em que nos deixaram.
Mas, Sr. Ministro, o esforço valeu a pena: com esta proposta de lei, Portugal
fica ao nível dos seus parceiros europeus, ganha competitividade e atrai
investimento. E fica também com um instrumento que lhe permite a revitalização
da contratação de trabalho, a flexibilização e a maior adaptabilidade das
relações de trabalho, o combate ao absentismo, no caminho claro do reforço dos
interesses dos trabalhadores, da segurança do emprego, do primado da qualidade
e do bem-estar das famílias. Este é, de facto, o verdadeiro alcance da proposta
de lei: reforçar os interesses dos trabalhadores e dos mais desfavorecidos e
dinamizar a economia portuguesa, proporcionando mais postos de trabalho.
Por isso, é com estranheza que continuamos a ver o maior partido da oposição,
inibido, tímido e hesitante, ficar de fora deste processo de mudança e
colocar-se ao lado do Partido Comunista e do Bloco de Esquerda no apoio à CGTP.
É precisamente sobre o equívoco dessa posição que gostaria de colocar a V.
Ex.ª, Sr. Ministro, algumas questões.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, o seu tempo esgotou-se. Tem de concluir.

A Oradora: - Vou já terminar, Sr. Presidente.
Sr. Ministro, em que medida esta proposta de lei do código do trabalho se
integra no modelo social e europeu? De que modo países como a Alemanha, a
França, a Inglaterra, os Estados Unidos da América evoluíram a nível da
contratação a termo, a nível do trabalho nocturno e da contratação colectiva?
A nível da protecção da família, e sabendo das verdadeiras preocupações de V.
Ex.ª, Sr. Ministro, em que medida esta proposta de lei traduz e reforça os
actuais direitos da família e nos aproxima, também nesta área, do modelo social
europeu?

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da
Segurança Social e do Trabalho.

O Sr. Ministro da Segurança Social e do Trabalho: - Sr. Presidente, desejo
começar por agradecer as palavras, o estímulo e o apoio da Sr.ª Deputada Ana
Manso, que para nós são importantes para continuarmos, com convicção, a
defender estas ideias.
Partindo do princípio de que o Governo não trabalha para a simpatia mas
trabalha para o progresso, é nesse sentido que nos movemos e é nesse sentido
que procurámos encontrar, através do Código do Trabalho, a expressão de uma
reforma laboral que nos aproximasse do modelo social europeu. É no modelo
social europeu, património importante da cultura ocidental e europeia, que
continuamos a apostar, não na americanização, como ouvi ao longo destes meses, crítica
essa certamente de quem não sabe como é que se separa e se distingue o mercado
americano de trabalho do mercado de trabalho europeu.
Evidentemente, como eu também disse na minha intervenção inicial, não se trata
de um pronto-a-vestir, trata-se de procurar adaptar o modelo laboral ao nosso
tecido económico, ao nosso tecido empresarial, ao estádio de desenvolvimento
das qualificações, a uma série de factores que, naturalmente, condicionam a
solução que deveremos ter em conta.
Em relação às perguntas que me colocou, designadamente as referentes ao
trabalho nocturno e à protecção à família, posso-lhe dizer que, mesmo assim,
Portugal fica aquém do que se passa noutros países. Por exemplo, em Inglaterra,
é considerado trabalho nocturno o efectuado entre as 11 horas da noite e as 6
horas da manhã; em Espanha, entre as 10 da noite e as 6 da manhã; na Alemanha,
entre as 11 da noite e as 5 da manhã. E podia citar mais casos. Apesar de tudo,
a nossa situação é de maior equilíbrio entre os diferentes factores em jogo e,
desse equilíbrio, creio, nasce uma solução boa para o País.
Quanto à protecção à família, creio que avançámos em aspectos importantes, não
só no aumento da licença de paternidade no caso da morte da mãe após o parto,
não só no aumento de seis para doze meses do período de trabalho a tempo
parcial para licença relativamente à assistência de filhos até seis anos de
idade, não só na consideração de faltas justificadas até quatro horas por cada
trimestre para os pais poderem ir à escola saber do aproveitamento escolar dos
seus filhos, como na protecção às grávidas e às puérperas, designadamente
alargando o período de interdição de trabalho extraordinário, de trabalho em
horas nocturnas ou em situações laborais mais agressivas.
Trata-se apenas de exemplos de que considerámos como um aspecto determinante do
desenvolvimento da nossa reforma laboral e social a conciliação entre a família
e o trabalho .

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado
Jerónimo de Sousa.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, gostaria de
começar por uma questão que considero central neste debate. É que houve da sua
parte, na sua intervenção, um tremendo e propositado equívoco sobre o que
estamos aqui a discutir: é na base da proposta de lei n.º 29/IX, partindo dos
direitos consagrados e garantidos actualmente no edifício jurídico-laboral, ou
estamos apenas a discutir um projecto ou um anteprojecto que, durante o seu
percurso, foi sofrendo evoluções, que não quero classificar? Naturalmente, se
fôssemos por esse caminho, que tentou induzir em erro esta Assembleia, nós
seríamos um pouco confrontados com aquela concepção, mais ou menos sádica ou
sinistra, que alguns têm ao dizerem que quando um automobilista atropela alguém
essa pessoa podia ter morrido, mas, afinal, quando muito, ficará com os braços
partidos! Creio que esta é uma questão central. E é por isso que o Sr. Ministro
não foi ao concreto, deu - passe o termo, e sem ofensa - umas "lambuzadelas"
naquilo que lhe parece ser agradável de ouvir.

Mas passemos, então, ao concreto: pode chamar-se código do trabalho a uma
tentativa de passagem de cheque em branco, já que há 40 matérias que vão
precisar de regulamentação posterior?!
Segunda questão: naturalmente, não quer só um cheque em branco, quer também um
cheque assinado por esta Assembleia! É ou não um facto que os contratos a prazo
passam de três para seis anos? É ou não um facto que o trabalho nocturno passa
das 8 para as 10 horas da noite, com todo o benefício que isto dá às empresas?
É ou não um facto que retoma a velha questão das pausas, procurando novamente
prejudicar os trabalhadores? É ou não um facto que, pela via da mobilidade
funcional e geográfica, se tenta transformar o trabalhador em "pau para
toda a obra", com a polivalência negativa que muitas empresas reivindicam?
E é ou não um facto que, com esta proposta de lei, se dá poder discricionário à
empresa para organizar e regulamentar o tempo de trabalho, que pode ir até 50
ou 60 horas/semanais?

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Exactamente!

O Orador: - Quanto aos direitos colectivos, é ou não verdade que este
Governo pretende, por exemplo, cortar em metade o crédito de horas às comissões
de trabalhadores? É ou não verdade que, pela chamada cláusula de paz social, a
que eu chamaria mais "paz de cemitério", através dos serviços mínimos
que tentam inculcar nos trabalhadores, o direito à greve fica de facto
mutilado? E é ou não verdade que, em relação a um direito fundamental, que é a
contratação colectiva, através de um miraculoso conceito de critérios de
aferição da representatividade, uma organização sindical de vão de escada,
representando 5% dos trabalhadores do sector, ou tendo 1500 associados, ou
sendo filiada num dos parceiros da concertação social, ou tendo uma situação
económica mais ou menos estável, pode liquidar e substituir contratos
colectivos que estão em vigor?

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se. Peço-lhe para
concluir.

O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente, dizendo o seguinte: creio que,
fugindo a estas questões concretas, o Sr. Ministro está a tentar induzir esta
Assembleia num erro.
Estamos a discutir uma questão muito séria! Não se trata nada de modernidade,
trata-se de retrocesso!
Sr. Ministro, já que não está cá o Sr. Primeiro-Ministro, lembro-o de que,
aquando da discussão do Programa do Governo, dizia que, para que as
multinacionais não fugissem do nosso país, era necessário rever e cortar
direitos dos trabalhadores. Afinal, estão a tentar cortar direitos, e as
multinacionais vão embora na mesma!

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da
Segurança Social e do Trabalho.

O Sr. Ministro da Segurança Social e do Trabalho: - Sr. Presidente, Sr.
Deputado Jerónimo de Sousa, agradeço-lhe as questões que colocou.
O Sr. Deputado referiu-se ao balanceamento entre modernidade e retrocesso. Tem
razão! No fundo, o que nos separa é o futuro e o passado, e os senhores
continuam a alimentar-se do passado.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - São maus os direitos existentes?!

O Orador: - Continuam a alimentar-se do passado, porque não conseguem
perceber que tudo mudou à nossa volta e que a situação geopolítica, económica e
social da Europa em 2003 não é a de 1975, de 1980 ou de 1990.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Portanto, tem de se cortar nos direitos!

O Orador: - Não, Sr. Deputado, é preciso adaptarmo-nos aos novos desafios,
como estão a fazer os países do antigo bloco comunista, que vão integrar a
União Europeia.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Com belos resultados!

O Orador: - Sr. Deputado, eu gostaria que verificasse a legislação da
Eslovénia, da Hungria, da República Checa, da Eslováquia, da Polónia e que,
depois, nos dissesse como é que conseguiria sobreviver fora desse contexto.

Protestos do PCP.

Afinal de contas, que soluções é que os senhores apresentam ao País?! Para
além dos habituais chavões, que soluções é que apresentam ao País? Digam-nos!
Fechavam as fronteiras?! Aumentavam os salários, sem aumentar a produtividade?!
Decretavam legislativamente a sobrevivência das empresas e a manutenção dos
postos de trabalho?! Preferem conviver com fingimento?! Preferem conviver com
uma realidade artificial e administrativa?! Ou, perante os desafios e as
dificuldades, enfrentá-los com mudanças, com sentido reformista e de
equilíbrio, que é o que pretendemos com este código do trabalho?

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Depois, o Sr. Deputado disse que laborávamos num equívoco.
Devolvo-lhe a crítica, Sr. Deputado, porque os senhores também laboram num
equívoco, que resulta sempre na seguinte reacção: o Partido Comunista Português
está sempre ao lado da contestação (e consequentes greves) quando se fala na
palavra "mudança".

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Para pior já basta assim!

O Orador: - É uma palavra de que os senhores não gostam.

Protestos do PCP.

Não gostam! Não sabem conviver com as palavras "mudança",
"renovação". Não sabem! Sentem-se mal!

Protestos do PCP.

E, ironia das ironias, os senhores apoiaram uma pseudo greve geral para
defender uma legislação, relativamente à qual também foi feita greve, com o
vosso apoio, em 1989.

De acordo com o código do trabalho, que vai ser revisto daqui a quatro anos,
certamente muitos de nós estarão aqui, ou noutro sítio, para, nessa altura,
verificar que os senhores estarão na primeira trincheira a defender este código
do trabalho, que agora tanto diabolizam!

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (Luís Marques Mendes): -
Exactamente! É sempre assim!

Protestos do PCP.

Sobre o código do trabalho, falou-se de uma regulamentação, referindo-se até
60 matérias… O Sr. Deputado foi mais comedido, pois já só falou em 40 matérias
que precisam de regulamentação - matérias em relação às quais, aliás, nos
comprometemos (e isto está, por exemplo, no comunicado da UGT) a discutir com
os parceiros sociais em concertação social, porque, para nós, isto é uma
prática, não é uma pura liturgia.
Sr. Deputado, não se esqueça que, com este código do trabalho, são revogados
mais de 70 diplomas - esta parte esqueceu-se de referir! E para regular as 40
matérias, que são artigos individuais, não é preciso 40, 70, 80 diplomas, como
aqui foi dito, bastam apenas 2 ou 3 diplomas!

Protestos do PCP.

Srs. Deputados, não se preocupem!

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, peço-lhe para concluir, pois o seu tempo
esgotou-se.

O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente.
Srs. Deputados, não se preocupem com a forma. Discutam a substância, com
argumentos sérios, com argumentos credíveis.

Vozes do PCP: - Isso fazemos nós!

O Orador: - Se assim for aqui estaremos para discutir as diferenças a que
todos temos direito.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Protestos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª
Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, o Sr. Ministro pode, ou
não, indignar-se com as perguntas, mas a verdade, incontornável, é que,
independentemente das palavras que utiliza, ou explica exactamente onde está a
modernidade que diz fazer parte da proposta de lei, onde está o humanismo, onde
estão os direitos, ou, manifestamente, não consegue explicá-la aos Deputados da
oposição - e não é com agressividade que o consegue - com as respostas que tem
dado e com as que tem omitido. Isto porque a questão é que temos uma lei injusta
e, sobretudo, uma modernidade feita com o desprezo pelos direitos das pessoas,
que são consideradas meras coisas, que se usam, que se mexem como peças de
xadrez e que são ignoradas, como se o trabalho fizesse esquecer a dimensão
social e ética.
Esta foi a sua escolha. É legítima! Não diga é que isto é uma visão humanizada.
Aliás, pergunto-lhe, Sr. Ministro, que visão humanizada é esta de uma sociedade
e de uma lei do trabalho que consegue fazer propostas que aumentam os horários
de trabalho, que alteram significativamente a vida das pessoas, que modificam
radicalmente a forma de organização familiar, que impõem, sem escolhas,
mobilidade e transferências de zonas de trabalho, que alteram e provocam uma
verdadeira desordem na vida familiar? Que humanidade é esta?! Que protecção é
que o Sr. Ministro pretende arrogar-se em relação à família, quando esta lei
penaliza claramente a protecção às crianças, a maternidade, a escolha de alguém
que queira ser mãe e que, pura e simplesmente, vai significar um recuo imenso
no papel das mulheres, que, no nosso País, é extremamente importante no mundo
laboral?!
Que modernidade é esta, Sr. Ministro, que retrocede, que limita a possibilidade
do direito à greve e que, de forma grosseira, cerceia e invade a privacidade
dos trabalhadores, a pretexto de esse ser o interesse das empresas, e fá-lo de
forma extremamente grave em relação às mulheres?! Que sentido de modernidade é
que existe quando se desregula aquilo que é elementar numa relação de trabalho,
que é a possibilidade de contratação colectiva?!
Sr. Ministro, que equidistância é a sua quando alguém faz batota e brinca ao
faz-de-conta, ignorando toda a evolução do direito do trabalho, a qual não pode
ignorar a imensa desigualdade das partes envolvidas?!
Não vale a pena o Sr. Ministro esconder que tomou o partido dos mais fortes; o
que importaria, além do mais (isto é uma evidência), é que não se fizesse de
conta que todos não entendemos que, em matéria laboral, entre empresários e
trabalhadores há uma imensa e abismal diferença, uma desigualdade de poder,
que, pura e simplesmente, de forma desumana, esta lei ignora!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da
Segurança Social e do Trabalho.

O Sr. Ministro da Segurança Social e do Trabalho: - Sr. Presidente, Sr.ª
Deputada Isabel Castro, em primeiro lugar, devo dizer que a ouvi com toda a
atenção, mas, certamente, não leu a proposta de lei, porque, se a tivesse lido,
não teria dito nada do que disse.

Vozes do PSD: - Exactamente!

O Orador: - Até parece que a sua ideologia é cada vez mais a demagogia!
Falou nas questões da maternidade, dos direitos de personalidade e de uma série
de coisas com os slogans habituais, de que tratamos as pessoas como peças de xadrez
- vejam bem, a UGT a considerar que, no compromisso tripartido, tratamos as
pessoas como peças de xadrez, por exemplo! Esta é a primeira constatação.
Recomendo à Sr.ª Deputada que, pelo menos, leia com mais atenção o que está
escrito na proposta de lei e não aquilo que gostaria de ver lá escrito.
Em segundo lugar, a Sr.ª Deputada também deve andar muito distraída. A Sr.ª
Deputada diz que eu tenho fugido aos debates… O Governo tem fugido aos
debates?! Na concertação social estivemos mais de 130 horas! O

Sr. Primeiro-Ministro foi a três reuniões! O Sr. Secretário de Estado esteve
presente em todas as reuniões! Eu estive presente na maior parte delas!
Participámos em 130 debates, com parceiros sociais, empresariais, sindicais,
universitários, da sociedade civil! Viemos a todas as solicitações deste
Parlamento.
Temos fugido ao debate?! A Sr.ª Deputada, de facto, além de não ter lido com
atenção a proposta de lei, anda bastante distraída!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado
Álvaro Castello-Branco.

O Sr. Álvaro Castello-Branco (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da
Segurança Social e do Trabalho, como todos bem sabemos, as convenções
colectivas são fonte de direito do trabalho, porque permitem a regulação de
normas jurídicas, e, apesar da sua origem convencional, elas operam como leis
em sentido material, o que é de extrema importância para efeitos de
incorporação nos contratos e de aplicação no tempo.
As convenções colectivas vigoram numa dinâmica partilhada entre trabalhadores e
empresas e devem ter, necessariamente, um horizonte temporal limitado, limite
este que se opera na actual lei pela substituição por outro instrumento de
regulação colectiva. Leva isto, actualmente, a situações de bloqueio, que, na
prática, se traduzem na impossibilidade de modificar determinadas disposições
já completamente obsoletas.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Era urgente, Sr. Ministro, modificar este sistema, permitindo
uma verdadeira revitalização e dinamização da contratação colectiva.
Neste sentido, Sr. Ministro, pergunto-lhe: prevê V. Ex.ª, e como, que esta
situação da contratação colectiva poderá evoluir com a entrada em vigor deste
novo código do trabalho?

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - O Sr. Ministro fez saber à Mesa que, por limitações de
tempo, responderá a blocos de três oradores.
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Drago.

A Sr.ª Ana Drago (BE): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, este debate tem de
facto demonstrado que quem quer que tenha entregue este projecto de proposta de
código do trabalho ao Governo encontrou no Sr. Ministro Bagão Félix o melhor
advogado.
Na verdade, o Sr. Ministro tem-se batido por esta proposta de lei, cuja origem
não sabemos exactamente qual é - e não vale a pena o Sr. Ministro tentar dizer
que foi o seu gabinete que elaborou esta proposta, porque mesmo os juristas que
concordam com a orientação política do Governo, até hoje, sempre disseram que
em 3 ou 4 meses não seria possível organizar uma proposta deste tipo e que ela
não nasceu da antiga Comissão de Análise e Sistematização da Legislação
Laboral. E, portanto, este é um dado assente.
E o Sr. Ministro tem, de facto, sido o melhor advogado, quase como um D.
Quixote, que batalha por esta orientação política, de precarizar a relação de
trabalho em Portugal. É verdade que está auxiliado pelo Sr. Secretário de
Estado que… Enfim, não vou comparar o Sr. Secretário de Estado com o Sancho
Pança, que acompanhava D. Quixote, porque o Sr. Secretário de Estado é
demasiado magro e nunca soube colocar as perguntas certas, que Sancho Pança
colocava, ao longo deste processo.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

Mas a verdade é que o Sr. Ministro era conhecido em Portugal como o D.
Quixote da defesa dos valores tradicionais da família.

Vozes do CDS-PP: - Olha quem fala de família!

A Oradora: - E, apesar do que disse hoje - e peço-lhe, por favor, que não
procure dizer que eu não li a proposta de lei, como tem, aliás, acusado o
Partido Ecologista "Os Verdes" e como acusou ontem o Partido
Socialista, aos microfones da TSF -, o Sr. Ministro tem de facto lutado contra
vários moinhos de vento,…

Protestos do PSD.

… mas, na realidade, este projecto de código do trabalho desprotege a
família. Este projecto de código é omisso no que toca aos subsídios que
permitem o gozo de licenças parentais e de licenças especiais para assistência
a filhos e adoptantes. Esta proposta de lei permite que os trabalhadores
trabalhem até 60 horas/semana, 12 horas/dia. Esta proposta de lei permite que a
contratação a prazo se estenda até seis anos e, no caso dos jovens à procura do
primeiro emprego, até sete anos e meio.
Como é que o Sr. Ministro consegue justificar isto como uma defesa da vida
pessoal e uma defesa dos valores da família?! Acho difícil! Aliás, devo
lembrar-lhe que a Comissão Nacional Justiça e Paz, da qual o senhor foi
Presidente, há poucos dias, afirmou que este projecto de código é imoral e
"um factor de agressão à própria família".

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - Não peço que justifique aquilo que é injustificável. Não peço
que me diga que este projecto defende a família e a vida pessoal quando sabemos
que não defende.
Mas o que gostava de lhe perguntar verdadeiramente, Sr. Ministro, é se V. Ex.ª
quer ficar para a História como o paladino de um modelo de sociedade assente
numa família desestruturada e em pais ausentes, como o governante que disse aos
jovens portugueses para desistirem da ideia de fazer planos para o futuro e de
constituir família,…

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Olha quem fala de família!

O Orador: - … porque os tempos não estão de feição.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado
Patinha Antão.

O Sr. Patinha Antão (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Segurança
Social e do Trabalho, a questão que gostava de lhe colocar é a colocada pelo
cidadão comum.
Já tivemos, ao longo deste debate, com registos humorísticos vários, diversos
estilos de discurso, entre os quais o da menina Cunegundes,…

Risos.

… mas, agora, examinando o problema do código do trabalho e das matérias
adjacentes aos olhos do cidadão comum, há uma matéria, Sr. Ministro, que ainda
não foi focada, que é a circunstância de o Governo ter anunciado, há meses, que
pretendia elaborar uma lei de bases da formação profissional.
Ora, aos olhos do cidadão comum, isto pareceu algo surpreendente, desnecessário
até, porque o cidadão comum, entre 1996 e 2001, ouviu dizer que estávamos a
preparar-nos para a Europa do conhecimento, que estávamos a viver uma paixão
pela educação e que estávamos a apostar todo o investimento na riqueza das
pessoas, na sua formação. E o resultado qual foi? O cidadão comum veio a saber,
através da OCDE, do Fundo Monetário Internacional, da União Europeia e do Banco
de Portugal que, afinal, houve rios de dinheiro gastos em formação profissional
e nada aconteceu, porque Portugal continuava na cauda da Europa e, sobretudo,
os trabalhadores mais idosos continuavam com taxas de analfabetismo de 9%, com
problemas graves de iliteracia. Afinal, a formação profissional não foi para
esses trabalhadores. E para os jovens? Para estes ainda houve alguma, mas,
mesmo assim, foi pouca. E o cidadão comum começou a perguntar: mas, afinal, o
que é que fizeram os outros países neste período? Como é que estamos na
comparação com os países europeus, para valores médios e para valores de
excelência? Estávamos na cauda da Europa.
Por isso, o cidadão comum, Sr. Ministro, percebeu a urgência de uma lei de
bases da formação profissional. Era necessário resolver um problema que o
governo anterior tinha descurado. Mas o governo anterior tem nomes. O
ex-Primeiro-Ministro que deixou o governo e os seus Ministros do Trabalho, que
têm assento aqui na primeira fila - os Srs. Deputados Eduardo Ferro Rodrigues e
Paulo Pedroso -, foram os autores da formação profissional que o País teve até
agora.
O cidadão comum, Sr. Ministro, ouviu também o seguinte: o modelo económico está
esgotado: existem salários baixos… É necessário com urgência suprir isto. Ora,
aos olhos do cidadão comum parecia que a formação profissional seria a arma por
excelência para fazer isso. O cidadão comum percebeu hoje que a formação
profissional feita por VV. Ex.as foi um desastre, um fracasso - e isto foi dito
por todas as instituições internacionais -, e também percebeu que o novo
Governo tem de fazer o que os governos do PS não fizeram muito mais depressa e
com muito mais eficácia.
Outra coisa que o cidadão comum vai perceber é que o código do trabalho, na sua
vertente de modernidade e nas suas mudanças, vai ter um contributo
importantíssimo para estimular o espírito empreendedor e de inovação e vai
perceber que isto é essencial para ganhar um resultado maior com a formação
profissional.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, peço-lhe que termine, pois já esgotou o
tempo.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Sr. Ministro, a formação profissional e o código do trabalho vão andar
paredes-meias para termos, efectivamente, um futuro.
É sabido que, no compromisso com os parceiros sociais, o desenvolvimento das
intenções do Governo, já anunciadas no código do trabalho, foi uma pedra
fulcral para o compromisso, por isso pergunto-lhe: os parceiros sociais
sentiram a responsabilidade e a urgência de suprir a falta do anterior governo
nesta matéria? E, se assim foi, gostaria que nos dissesse e desenvolvesse quais
são os elementos desse compromisso que, efectivamente, permitem que deixemos o
passado onde está, que é um passado que não nos entusiasma,…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, tem de concluir.

O Orador: - … e entremos em sede do futuro com responsabilidade e com uma
nova visão da concertação social.

O Sr. Paulo Pedroso (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Foi por ter sido membro do governo!

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Paulo Pedroso (PS): - Sr. Presidente, fui pessoalmente visado como
culpado de uma suposta omissão, que pode ser facilmente corrigida, repondo a
verdade dos factos.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Paulo Pedroso - desculpe-me -, acha que
isso é um motivo…

O Sr. Paulo Pedroso (PS): - Sr. Presidente, é para exercer o direito
regimental da defesa da honra e consideração.

O Sr. Presidente: - … de agravo?

O Sr. Paulo Pedroso (PS): - Acho, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Se acha, dou-lhe a palavra, mas peço-lhe que seja breve.

O Sr. Paulo Pedroso (PS): - Sr. Presidente, serei muito breve.
Quero dizer ao Sr. Deputado Patinha Antão que, em 17 anos, desde a nossa adesão
à União Europeia, a pasta da formação profissional foi gerida durante 11 anos
por pessoas do PSD ou do CDS-PP. O Sr. Deputado ignora, mas eu recordo-lhe que
durante 3 desses 11 anos esta pasta foi gerida pelo Sr. Ministro Bagão Félix.
Mas quero, sobretudo, prestar homenagem aos governantes do PSD, que, em 1990,
celebraram o primeiro acordo com todos os parceiros sociais - …

Aplausos de Deputados do PSD.

… era, aliás, Secretário de Estado o Dr. Bagão Félix -, porque desse acordo
resultou aquilo que o Sr. Deputado ignora que existe: a existência, em anexo,
de uma lei-quadro da formação profissional que ainda hoje está em vigor.
Portanto, Sr. Deputado, não há culpados de uma omissão em relação a uma lei que
existe e que nos empenharemos em revogar.

O Sr. Eduardo Ferro Rodrigues (PS): - Há omissão de conhecimento!

Vozes do PS: - Exactamente!

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Deputado
Patinha Antão. Peço-lhe também que seja breve.

O Sr. Patinha Antão (PSD): - Sr. Presidente, serei brevíssimo.
De facto, o Sr. Deputado Paulo Pedroso tem dificuldades em gerir com humildade
o resultado da vossa actividade.

Risos do PS.

VV. Ex.as não podem ignorar que, durante os seis anos em que estiveram no
governo, anunciaram ao País - lembro-me bem - que iriam fazer uma convergência
rápida para os níveis de qualificação profissional. Todo o País sabe! E sabe
qual é o resultado, Sr. Deputado? Efectivamente, tal como V. Ex.ª diz, é
necessária uma nova lei de bases da formação profissional…

O Sr. Paulo Pedroso (PS): - Ai agora já é nova!

O Orador: - … para fazer aquilo que é correcto, que é um programa eficaz e
urgente para dar a qualificação profissional que os trabalhadores portugueses
precisam para terem segurança no emprego e outro optimismo em relação ao futuro
e poderem, efectivamente, sentir que vale a pena ter um Governo que olha para
as preocupações essenciais dos trabalhadores e não um governo que, quando teve
dinheiros a rodo, fez aquilo que VV. Ex.as fizeram.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para responder aos pedidos de esclarecimento formulados
pelos Srs. Deputados Ana Drago, Álvaro Castello-Branco e Patinha Antão, tem a
palavra o Sr. Ministro da Segurança Social e do Trabalho, dispondo, para o
efeito, de 5 minutos.

O Sr. Ministro da Segurança Social e do Trabalho: - Sr. Presidente, Srs.
Deputados, muito obrigado pelas questões que me colocaram.
Permitam-me que comece por agradecer a recordatória do Sr. Deputado Paulo
Pedroso, pela qual, aliás, se verifica que eu, há 12 anos atrás, já era capaz
de, no governo, contribuir para a celebração de acordos com os parceiros
sociais.

O Sr. Paulo Pedroso (PS): - É verdade!

O Orador: - Portanto, essa cultura de concertação é bem visível, faz parte
do meu ADN, faz parte do meu código genético.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Relativamente à pergunta do Sr. Deputado Álvaro Castello-Branco, creio que
um dos objectivos fundamentais do código do trabalho é revitalizar a
contratação colectiva. Não vou ter tempo para explicar o que está previsto, mas
posso dizer-lhe que é muito mais favorável do que, por exemplo, existe em
Espanha, na Alemanha ou na França.
Mas o que quisemos dizer com isto foram, sobretudo, duas coisas: primeiro, a
sede fundamental de formação da vontade das partes no mercado de trabalho deve
ser a contratação colectiva e não as normas do direito positivo; segundo, as
convenções colectivas são um elemento determinante para a adaptação às mudanças
que constantemente vão existir ao longo dos próximos tempos. E, às vezes,
custa-me ver criticado este objectivo e os meios encontrados, quando, por
exemplo, durante os últimos seis anos, o Partido Socialista conviveu
alegremente com o bloqueio, a "eutanásia", da contratação colectiva.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Quanto às questões da Sr.ª Deputada Ana Drago, não sei se a sua
vasta experiência no domínio do trabalho nas empresas…

Risos.

… lhe permite falar com tanta certeza, saber tudo, sobre aquilo que é a
realidade empresarial e do mercado de trabalho. Mas, dando de barato isso,
creio que a uma coisa a Sr.ª Deputada, de facto, não estava habituada e não
esperava: depois de anos de letargia, não esperava que o Governo trabalhasse
tão bem e depressa. Não estava habituada!

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Pois não!

O Orador: - Mas, de facto, trabalhamos muito. Tem de acompanhar o nosso
ritmo, Sr.ª Deputada! Tem de acompanhar o nosso ritmo.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - No que se refere aos valores tradicionais da família, a Sr.ª
Deputada falou, por exemplo, em subsídios parentais. Ó Sr.ª Deputada, mais uma
vez, pela enésima vez, aqui digo que o código do trabalho não tem toda a
legislação. Essa é legislação que está vertida na área da segurança social e
que não foi modificada. O código do trabalho não é o código prestacional da
segurança social.

Vozes do CDS-PP: - Pois não!

O Orador: - Finalmente, cita a Comissão Nacional Justiça e Paz, mas não
citou a nota da Conferência Episcopal Portuguesa. Mas sobre isto gostava de
dizer-lhe duas coisas, Sr.ª Deputada, e até agradeço que me tenha feito a pergunta:
primeiro, não foi a Comissão Nacional Justiça e Paz que disse que ela era
imoral, foi um membro da actual

Comissão Nacional Justiça e Paz, que, por acaso, é simpatizante do Bloco de
Esquerda, o Prof. Doutor José Manuel Pureza - aliás, creio que candidato à
Assembleia Municipal de Coimbra pelo Bloco de Esquerda.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

E, curiosamente, deixe-me dizer-lhe, o Prof. Doutor Pureza foi meu vogal na
Comissão Nacional Justiça e Paz, a que presidi durante três anos, sem nunca ter
dito que estava na presença de uma pessoa tão diabolizada, que só faz coisas e
leis imorais.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Ora aí está!

O Orador: - Mas fique descansada, Sr.ª Deputada, porque, hoje mesmo, recebi
do Sr. Presidente da Comissão Nacional Justiça e Paz um pedido de desculpas,
dizendo que não há terrenos de afrontamento, que isto tem a ver com uma
situação que, de facto, não aconteceu porque ele nunca disse isso.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Muito bem! E agora?!

O Orador: - Se quiser, posso dar-lhe uma cópia desta carta, porque não me
foi pedido segredo nem confidencialidade, que está assinada pelo actual
presidente da Comissão Justiça e Paz, Professor Doutor Armando Sales Luís.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Está assinada!

O Orador: - Relativamente à lei-quadro da formação profissional, gostava de
dizer-lhe que está praticamente pronta. Algumas disposições já foram inseridas
no código do trabalho, algumas até transcrevendo acordos celebrados pelo
anterior governo nesta matéria, para fique como letra de lei e para que o seu
cumprimento seja absolutamente decisivo.
Mas queremos avançar mais, queremos, sobretudo, avançar em três aspectos, e com
isto termino: primeiro, uma aproximação e um reforço da formação profissional
no próprio sistema de ensino, que é fundamental para o País; segundo,
dignificar e aumentar o valor social e de mérito da formação certificada; e,
terceiro, apostar sobretudo na formação de quadros intermédios, que é onde o País
tem mais défice e onde se travam elementos fundamentais para a modernização,
agilização e desenvolvimento do tecido empresarial português.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar
a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, a interpelação é a propósito
de um incidente que agora foi suscitado pelo Sr. Ministro, e creio que é
rigorosa e importante.

O Sr. Presidente: - Mas, Sr. Deputado, a figura regimental indicada não será
um protesto?

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, é uma precisão, nos termos em
que já ocorreu e que até mereceu, depois, esclarecimentos por parte do Sr.
Ministro, e serei muito breve.
O Sr. Ministro invocou a condição de ex-candidato autárquico de uma figura que
faz parte da Comissão Nacional Justiça e Paz para caracterizar o seu ponto de
vista. Essa atitude é inaceitável…

Protestos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Isso não é uma interpelação!

O Orador: - … face à própria Comissão Nacional Justiça e Paz, visto que o
ponto de vista político de qualquer dos seus membros não é o que determina a
sua escolha, eles têm, naturalmente, toda a liberdade de expressão. Portanto,
tentar catalogar ou definir pontos de vista para os desqualificar é uma atitude
que só fica mal ao Sr. Ministro.

Vozes do BE e de Deputados do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, pretende usar da palavra, utilizando a
mesma figura regimental, para encerrarmos rapidamente este pequeno incidente?

O Sr. Ministro da Segurança Social e do Trabalho: - Sr. Presidente, de
facto, creio que não disse qualquer mentira.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Exactamente!

O Orador: - Foi uma mera coincidência. Limitei-me a uma mera coincidência.
Mas referi-o apenas e pela circunstância de a Sr.ª Deputada Ana Drago ter
falado da posição da lei moral como posição da Comissão Nacional Justiça e Paz.
E, de facto, não é uma posição da Comissão, é uma posição individual, e à
revelia da própria Comissão, de um membro da Comissão Nacional Justiça e Paz,…

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - … que, por acaso e por coincidência, é simpatizante…

Vozes do PSD: - Exactamente!

O Orador: - … e creio que apoiante, público e expresso,…

Protestos do BE.

Vozes do CDS-PP: - Foi candidato à assembleia municipal pelo BE!

O Orador: - … da sua própria formação política.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Protestos do BE.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado
Artur Penedos.

O Sr. Artur Penedos (PS): - Sr. Presidente, o Sr. Ministro da Segurança
Social e do Trabalho, na sua intervenção, começou por nos falar do anteprojecto
do código do trabalho, relativamente ao qual, eu diria, que configura uma
estratégia em que, de alguma forma, o Governo tentou lançar a "bomba
atómica" para a sociedade portuguesa, e, após a discussão que foi
desenvolvendo, apresentou, mais tarde, na Assembleia da República, uma proposta
de lei que configura um "míssil" de grande potência que destruirá
certamente muitas das expectativas dos mais desprotegidos, daqueles que mais
dificuldades têm no dia-a-dia para enfrentar a prepotência e outros malefícios
da nossa sociedade.
Mas o Sr. Ministro também nos falou da bondade desta proposta de lei. Vale a
pena situarmo-nos: estamos a falar da proposta de lei que o Sr. Ministro, o
Governo a que o senhor pertence, apresentou nesta Assembleia, e não noutra
coisa. E, nesta medida, quando ainda há pouco eram desferidos, com justiça,
muitos ataques sobre a proposta de lei em discussão, relativamente às questões
da maternidade, no que toca, por exemplo, às grávidas e a outras situações,
eles são justificados. O Sr. Ministro sabe, perfeitamente, que é verdade que
esta proposta de lei conduz a que situações de despedimento de grávidas, que
hoje são consideradas ilegais, sejam consideradas completamente diferentes.
Dir-me-á: nós vamos mudar isso! Não me importa, neste momento, aquilo que vão
mudar ou deixam de mudar; o que me importa é a intenção que este Governo tinha,
relativamente a uma determinada matéria, em alterar, de uma determinada forma,
a legislação laboral, em Portugal.
Aqueles que hoje ouviram, pela primeira vez, o Sr. Ministro falar ficarão,
eventualmente, surpreendidos e dirão: "afinal, isto até não é tão mau; até
é bom", porquanto toda a construção do discurso vai no sentido de mostrar
o contrário daquilo que temos em presença.
O Sr. Ministro disse ainda que tudo foi tratado ao nível da concertação social,
onde houve grande discussão. Bom, nós não ouvimos todos os parceiros sociais,
nesta Assembleia, e todos eles disseram: não houve negociação alguma!

Vozes do PSD: - Não é verdade!

O Orador: - Não houve negociação alguma!

Vozes do PSD: - Não é verdade!

O Orador: - Não houve concertação!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, peço-lhe que conclua, pois já não dispõe
de tempo.

O Orador: - Vou já terminar, Sr. Presidente.
Não houve concertação, foi o que foi dito aqui pelos parceiros sociais, por
todos - nenhum deles assumiu que tinha havido qualquer concertação.

Vozes do PSD: - Não é verdade!

O Orador: - É a sua verdade!

Uma voz do PSD: - Eu estava lá!

O Orador: - Andou distraído, certamente.
Sr. Ministro, no meio de tudo isto, e porque o tempo não me permite mais,
pergunto: com estes comportamentos, pretende o Governo, em matéria de
constitucionalidade ou inconstitucionalidade das normas, designadamente, no
despedimento, na greve e em outros direitos, alterar o seu comportamento?
Pretende o Governo, com esta proposta de lei, que viola claramente esses
preceitos, vir a fazer aquilo que, de alguma maneira, já se percebeu que vai
fazer, que é "lançar o barro à parede para ver se pega, se cola" -
deixe-me usar esta expressão - e tentar criar condições para a
inconstitucionalidade manifesta das normas, como já ocorreu noutras alturas,
por parte deste Governo, designadamente no Orçamento, em relação à função
pública?

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o tempo esgotou-se. Queira concluir, por
favor.

O Orador: - Por último, diga-me, Sr. Ministro: pretende V. Ex.ª assumir o
papel…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, tem de concluir mesmo. Peço-lhe que o
faça, pois já o meu terceiro apelo. Não me obrigue a carregar no famoso botão!

O Orador: - Termino imediatamente, Sr. Presidente.
Pretende o Sr. Ministro assumir o papel de herói dos poderosos e de vilão dos
mais desprotegidos?

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado
João Pinho de Almeida.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da
Segurança Social e do Trabalho, apesar de, se calhar, ter mais idade para isso,
não vou aqui falar de "heróis" nem de "vilãos". Vou falar
de uma faixa etária que, entendo, tem de ter espaço na discussão deste código
do trabalho - é um código do trabalho e não um pacote laboral, esta é a primeira
razão por que quero saudar o Sr. Ministro. É um código do trabalho que
introduz, de facto, inovação, uma sistematização, que, para nós, é positiva. E
é bom que também aqui, na Assembleia da República, nos preocupemos em
clarificar a linguagem que usamos, e chamemos as coisas pelos nomes: estamos a
discutir um código do trabalho.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - E devo dizer-lhe, Sr. Ministro, que, em pouco tempo, é a
terceira vez que vem à Assembleia da República apresentar propostas, que são
bastantes positivas, no âmbito da juventude. E, não sendo esta uma área
directamente relacionada com a juventude, é bom sabermos que há, neste Governo,
uma preocupação, que é transversal a todas as iniciativas legislativas, de
promover políticas favoráveis à juventude. Foi o caso do rendimento social de
inserção; foi o caso da liberdade de escolha, bastante importante no caso da
segurança social, pois permite aos mais jovens,…

Protestos do PS.

… ao contrário do que disse a Sr.ª Deputada Ana Drago, terem liberdade para
preverem e programarem o seu futuro;…

Protestos do PS e do BE.

… e, agora, é o caso de uma legislação inovadora, de um caminho reformista,…

Protestos do PS.

… no sentido da flexibilização da legislação laboral, da competitividade e
de tornarmos o nosso País muito mais competitivo, ao nível europeu e ao nível
mundial.

Protestos do PS, do PC e do BE.

Eu, ao representar aqui, nesta Assembleia, a juventude popular, represento
vários tipos de jovens: jovens estudantes, jovens desempregados, jovens
empregados e jovens empreendedores, jovens empresários, e todos eles têm os
mesmos direitos!

Vozes do CDS-PP e do PSD: - Muito bem!

O Orador: - São jovens, são cidadãos portugueses, todos têm os mesmos
direitos: os estudantes, porque querem um dia ser trabalhadores; os
desempregados, porque um dia querem ter um emprego; os que já estão empregados,
porque querem ter uma carreira produtiva e subir nessa mesma carreira; e os
empresários, jovens empreendedores, porque querem, neste País, ter espaço para
desenvolver os seus projectos, as suas empresas e também eles querem ter
hipótese de se tornarem competitivos.
É esta a visão que temos da questão laboral. Não é uma visão maniqueísta, não é
a visão da luta de classes - esta não é certamente uma visão do nosso tempo; e,
obviamente, vemos de uma forma quase caricatural - e já foram referidas as
caricaturas neste debate - aquelas tentativas de bloqueio da sociedade a que
alguns apelidam de greve geral. São coisas que, para nós, não fazem qualquer
sentido. Queremos ter espaço! Queremos ter tempo para conseguir produzir!
Queremos ter espaço e tempo para que os jovens portugueses não lutem de
manifestação em manifestação mas para terem o seu emprego! Queremos que os
jovens portugueses lutem para ter o seu lugar, para ter as suas empresas! E
também não é mau que os jovens portugueses queiram ter as suas empresas - é
bom!

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

Vozes do PSD: - Exactamente!

O Orador: - É bom que jovens portugueses tenham as suas empresas, porque,
assim, vai haver emprego para muitos jovens portugueses. É neste sentido que
entendemos que é feita esta reforma da legislação laboral. Assim, pergunto ao
Sr. Ministro, concretamente: no sentido da promoção, do direito que a juventude
tem à iniciativa e também ao trabalho, de que medidas nesta área é que, neste
código do trabalho, a juventude beneficia exactamente?

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado
Pedro Roque.

O Sr. Pedro Roque (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Segurança Social
e do Trabalho, independentemente de toda esta polémica, que perpassou ao longo
destes meses, acerca da proposta de código do trabalho, numa coisa parece
estarmos de acordo: a estagnação dos mecanismos de contratação colectiva.
A acreditar no destaque que hoje vem no Público, para além das divergências,
que todos lemos, no Secretariado Nacional do PS sobre esta matéria, apenas
foram firmados, em 2001, 17 contratos colectivos de trabalho - uma espécie de
corolário de uma redução sistemática do número destes instrumentos ao longo de
vários e sucessivos anos.
Pelo contrário, na maioria dos países da União Europeia, as relações de
trabalho são reguladas sobretudo por este tipo de instrumentos, nos quais, é
bom relembrar, as partes, livremente e de boa fé, acordam um vasto conjunto de
matérias para o período de vigência do contrato colectivo de trabalho e não
meras actualizações salariais, como acontece entre nós, por via da actual
legislação. Refira-se aliás, que a legislação actual instiga claramente ao
imobilismo, agravado pela ausência de arbitragem obrigatória - este é um
mecanismo essencial de desbloqueio da negociação, esgotadas que estejam a
moderação e a conciliação.
Parece-nos, assim, óbvio que, ao contrário da propaganda de uma certa esquerda,
a proposta de código do trabalho não só não mata mas, pelo contrário, reanima a
contratação colectiva.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Assim, Sr. Ministro, a minha pergunta é clara e concisa: de que
modo o código do trabalho permitirá revitalizar a contratação colectiva,
tornando-a, finalmente também em Portugal, um mecanismo eficaz de regulação das
relações laborais, tal como é usual nos países da União Europeia?

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da
Segurança Social e do Trabalho.

O Sr. Ministro da Segurança Social e do Trabalho: - Sr. Presidente, começo
pelas questões colocadas pelos Srs. Deputados João Pinho de Almeida e Pedro
Roque.
De facto, este é um código que procura ser amigo do investimento, amigo do
emprego, e, portanto, potenciador de novas oportunidades, de empresários com
militância de risco e responsabilidade social e dos jovens, que são sempre
enaltecidos nos discursos mas, às vezes, esquecidos na prática política.

Vozes do CDS-PP e do PSD: - Muito bem!

O Orador: - É também em nome deles, é contra a cobardia geracional que
fizemos e propomos ao Parlamento esta reforma. Não queremos pôr a cabeça
debaixo da areia; não queremos conviver com arcaísmos ou visões ultrapassadas e
definitivamente fora do contexto em que nos movemos no mundo e em Portugal.

Protestos do PS.

Por isso, os jovens têm aqui um elemento de esperança, de confiança no seu
futuro,…

Vozes do PS: - Têm!…

O Orador: - … seja, naturalmente, como empresários ou como trabalhadores.
Relativamente às questões de contratação colectiva, permitam-me só uma nota,
dada a escassez de tempo de que disponho e por já há pouco ter, de algum modo,
respondido.
Srs. Deputados, os nossos propósitos, em matéria de contratação colectiva, não
são os de nos substituirmos às partes mas, sim, os de reforçar e robustecer o
trabalho das partes. Por isso, a intervenção administrativa, a intervenção
política, é feita só numa última etapa, depois de falhar a mediação, a
conciliação, a arbitragem voluntária - e só é feita com determinados parâmetros
para a arbitragem obrigatória -, e, aliás, os seus prazos são bem mais longos
do que os que estão vertidos nas propostas de alteração, que conheci, do
Partido Socialista. O que significa que o tal vazio, de que somos acusados
nesta matéria, não vai acontecer, mas, se acontecesse, aconteceria certamente
mais explosivamente e mais depressa do que está vertido nas propostas do
Partido Socialista.

Vozes do CDS-PP e do PSD: - Muito bem!

Vozes do PS: - Não é verdade!

O Orador: - Quanto às questões colocadas pelo Sr. Deputado Artur Penedos…
Sr. Deputado, vamos, de uma vez por todas, perceber qual é a posição do Partido
Socialista.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Tentar!

O Orador: - O código do trabalho é um "míssil" de grande potência,
ou é, como disse o Sr. Deputado Rui Cunha, um "nado-morto"?

Vozes do CDS-PP: - Exactamente!

O Orador: - Estão do lado do autismo negocial da CGTP, ou estão do lado das
convicções negociais moderadas da UGT?

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Esse é o dilema!

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Exactamente!

O Orador: - Estão do lado do "morto", ou seja da legislação cujo
prazo de viabilidade e utilidade já acabou, ou estão do lado de uma legislação
viva, actuante, moderna, eficaz e com sentido de futuro? Estão do lado da greve
geral, embora com falsas partidas, ou estão do lado da concertação, embora em
maratona ou em estafeta pesada?

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Muito bem!

O Sr. Artur Penedos (PS): - Estamos a favor da greve e dos direitos dos
trabalhadores!

O Orador: - Curiosamente, o Partido Socialista tem uma contradição
permanente: o Sr. Deputado Rui Cunha diz que o que apresentamos aqui é um
"nado-morto" e, ao mesmo tempo, outros Deputados do Partido
Socialista, utilizando, aliás, a linguagem da CGTP, dizem que é uma operação de
pura cosmética, um compromisso tripartido. Em que é que ficamos?! Se é uma
operação de pura cosmética, não se trata de "nado-morto"; se se trata
de "nado-morto", não é uma operação de pura cosmética! Entendam-se,
Srs. Deputados! Entendam-se, no Partido Socialista!

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Exactamente!

O Orador: - De facto, relativamente às questões que me colocou, o que fez
foi processos de intenção.
Sobre as grávidas, disse que não houve qualquer negociação. Ó Sr. Deputado, o
que é preciso dizer mais para provar que houve uma profunda negociação, uma
profunda concertação. Pensa que tudo isto caiu do céu?!

O Sr. Artur Penedos (PS): - É evidente que sim!

O Orador: - Pensa que estivemos a falar de aspectos culturais, de moda, de
ópera, nas 130 horas de concertação social?!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Isso era antigamente!

O Orador: - Pensa que nós fazemos o diálogo pelo diálogo, para adormecermos
todos, embalados por ele, sem qualquer resultado definitivo e final?!
Gostava de lhe dizer, Sr. Deputado, que considero isso muito curioso, vindo do
Partido Socialista, que é o especialista na técnica legislativa do
faz-de-conta,…

O Sr. Patinha Antão (PSD): - Exactamente!

O Orador: - … do empata, sempre com comissões e grupos de trabalho,…

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Isso é verdade!

O Orador: - … que é especialista em abortar iniciativas legislativas que
causem a mínima contestação.

O Sr. Artur Penedos (PS): - Essa agora!

O Orador: - Como eu disse há pouco, este Governo não governa para a
simpatia, governa para a utopia do progresso e do futuro de Portugal.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Protestos do PS.

Termino com as acusações de inconstitucionalidade, porque, segundo o Sr.
Deputado, este diploma viola claramente alguns preceitos constitucionais.
Eu sempre disse que esta reforma laboral - e disse-o para os dois extremos das
críticas - teve como método a concertação e como limite a Constituição da
República Portuguesa.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Jorge Strecht (PS): - É falso!

O Orador: - E ontem, perante alguns jornalistas que me questionaram, no
sentido de que há uma, duas ou três normas que podem suscitar dúvidas de
inconstitucionalidade, disse que nós não temos dúvidas de constitucionalidade.
O que fizemos foi consultar mais de 10 conceituados constitucionalistas e a
esmagadora maioria…

O Sr. Artur Penedos (PS): - Está a dizer mal! Disse "vamos
testar"!

O Orador: - Teve acesso a esses pareceres, Sr. Deputado!

Protestos do Deputado do PS Artur Penedos.

O Sr. António Pinheiro Torres (PSD): - Já estão na Comissão!

O Orador: - Estão na Comissão, Sr. Deputado!

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Vieram ontem!

O Orador: - E esses constitucionalistas pronunciaram-se, esmagadoramente,
pela sua constitucionalidade, tendo havido uma minoria que suscitou algumas
dúvidas. Certamente, há órgãos, na democracia portuguesa, para avaliar da
bondade das várias teses em confronto. Agora, nós não temos dúvidas, porque…

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, esgotou-se o tempo de que dispunha.

O Orador: - Vou já terminar, Sr. Presidente.
Como estava a dizer, nós não temos dúvidas, porque propusemos essas normas,
mantivemo-las depois da concertação social e continuamos completamente
confiantes de que são indiscutivelmente constitucionais,…

Protestos do PS.

… como, repito, a grande maioria dos constitucionalistas consultados
entendeu. Aqui não há maniqueísmo constitucionalista, não há os bons e os maus
constitucionalistas; há a maioria dos constitucionalistas que dizem que é
constitucional e uma pequena minoria que suscita dúvidas.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Protestos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo
Pedroso.

O Sr. Paulo Pedroso (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs.
Membros do Governo: O que nos traz hoje aqui é da maior importância:
condicionará o modo como serão geridas mais de 600 000 empresas, influenciará a
vida de mais de 5 milhões de trabalhadores, e não apenas no trabalho mas também
em termos familiares e pessoais.
Estamos a falar de direito do trabalho, um instrumento libertador do tipo de
relação cruel que a literatura do século XIX tão bem e tão dramaticamente
retratou, o qual nasceu e deve continuar a ser uma garantia de que, nas
sociedades em que queremos viver, não há dois mundos: um, fora do trabalho,
feito de democracia, liberdade, responsabilidade e cidadania; outro, na
empresa, de hierarquia, submissão, insegurança, sacrifício da vida pessoal e familiar,
privação da intimidade, restrição do direito de expressão.
Acredito, genuinamente, que ninguém neste Parlamento quer que essa cisão
ocorra, mas, para que assim não seja, o direito do trabalho tem de ser adequado
e eficaz. E a primeira condição de eficácia é o cumprimento da lei.

Aplausos do PS.

Para a efectividade das normas legais acontecer concorrem quatro factores
essenciais: que elas sejam compreensíveis, não contraditórias e acessíveis; que
empresários e dirigentes empresariais tenham uma cultura de respeito pelo
ordenamento jurídico vigente; que trabalhadores possam organizar-se
colectivamente e ter representantes legítimos com influência real na definição
das normas e na sua aplicação; e que os mecanismos de dissuasão, inspecção e
repressão, nomeadamente por parte do Estado, sejam eficazes.
Neste contexto, o imperativo de sistematização legal recolhe hoje um largo
consenso entre especialistas e operadores do sistema de relações de trabalho. A
este respeito, nem a proposta do Governo é pioneira, nem o Governo se revelou,
sequer, um bom gestor do património que recebeu.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Nascida de uma iniciativa de concertação social, uma comissão de
juristas - professores, advogados, magistrados, gestores - entregou a sua proposta
final de sistematização a este Governo, após dois anos de trabalho e dois meses
depois de o Governo tomar posse.
Com base nesse trabalho, teria sido garantida uma transição tranquila da
complexidade existente para uma boa sistematização, que daria a todos a
segurança do ponto de partida, que identificaria com rigor a relação entre as
normas até agora em vigor e as que constariam da sistematização e que
libertaria as nossas energias para a discussão aprofundada das mudanças
necessárias.
Se tal caminho não tivesse sido afastado liminarmente pelo actual Governo,
estaríamos hoje a discutir uma reforma da legislação laboral centrada nos
problemas do presente e do futuro e não a fazer a revisão de contas, olhando
para o trabalho e para a política do passado.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Mas a sede de um pequeno lugar na História das relações de
trabalho impediu o Governo de ver suficientemente longe para perceber isso. Ao
invés, apresentou um anteprojecto de autores cujo nome continua a ser ocultado da
opinião pública, cujos objectivos não discutiu com ninguém, um anteprojecto de
tal modo "desaparafusado" que o próprio Secretário de Estado do
Trabalho dele disse, 12 dias depois de, pela primeira vez, ter visto a luz, que
se tivesse de o preparar de novo, naquele momento, já lhe "… teria
apertado alguns parafusos" (in Público, 31 de Julho de 2002).

Aplausos do PS.

Esses autores quiseram colocar as suas vírgulas na História, refrasear
conceitos, alterar a sequência de normas que se interrelacionam, mesmo onde não
há inovação jurídica.
Em consequência, se este projecto prosseguir o seu caminho, passarão anos,
correrão rios de tinta e dinheiro e prosseguirá a violação das normas, até que,
mesmo as que já existem, voltem a ter interpretações seguras.
O preço desta teima, inútil e sem justificação, será, pois, pago em morosidade
e insegurança acrescidas da justiça, o que, neste caso, significa também a
penalização da parte fragilizada no contrato.
Isto é, não se tem agora o ganho de simplificação que se podia ter tido e que
estava tecnicamente disponível através de uma sistematização que o Governo não
usou por pura teimosia. E não é por lhe chamar código que a iniciativa do
Governo passa a ter as propriedades de um código. Não se sabe exactamente
quantos decretos implicará, mas sabe-se que o Dr. Jorge Leite veio à Comissão
dizer que implicará, pelo menos, 70 pontos de regulamentação. É a
"floresta" que regressa, Sr.as e Srs. Deputados!

O Sr. José Sócrates (PS): - Muito bem!

O Orador: - Afinal, não se simplifica! Dentro em pouco, teremos a mesma
quantidade de páginas vertidas em diplomas que apenas poderão ter, ao longo do
tempo, desenvolvimentos contraditórios, unicamente e só em novas bases.

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

O Orador: - Por que se terá perdido, então, no caminho a intenção de uma lei
unificadora, clara e sistematizadora, acessível aos seus destinatários? Por uma
simples razão: o atalho que o Governo seguiu não é o bom caminho.

O Sr. José Sócrates (PS): - Muito bem!

O Orador: - Mas é certo que a sistematização não deve esgotar a ambição da
reforma da legislação do trabalho.
Como é sabido, a matriz da nossa legislação laboral é ainda, nalguns domínios,
a que resultou de um regime politicamente autoritário, limitador dos direitos
dos cidadãos e da livre concorrência. Por isso, quando o Estado se quis parecer
com um Estado social recorreu a leis detalhadamente imperativas, usou e abusou
da regulamentação administrativa.
É verdade também que a nossa jovem democracia, da segunda metade dos anos 70, quando
se impôs a necessidade de compatibilizar, com urgência, a construção do Estado
de direito com o desenvolvimento da economia de mercado, recorreu, ela também,
a um conjunto extenso de normas para garantir direitos e prevenir, limitar ou
impedir abusos de posição de força.
Mas hoje vivemos numa democracia consolidada. O nosso problema é diferente, é
essencialmente de modulação desses direitos, de compatibilização entre
garantias e de flexibilidade entre esferas da vida dos trabalhadores.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - É necessário consagrar normas de adaptabilidade. Essas normas
são fundamentais em certos sectores e em certas empresas, sobretudo para dar às
pessoas possibilidade de resposta adequada ao imperativo de conciliarem a sua
vida pessoal, familiar e profissional, ao mesmo tempo que se asseguram às
empresas instrumentos eficientes de resposta às flutuações quantitativas e
qualitativas dos mercados em que concorrem.
Ora, também neste capítulo, a lógica desta proposta não é inovadora: os 81 artigos
- repito, 81 artigos - que ostenta sobre tempo de trabalho são a prova do seu
insucesso.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Neste, como noutros domínios da adaptabilidade, em vez de uma
lei que fixa limites fundamentais e deixa à negociação colectiva a margem para,
mediante negociação e acordo, empresários e associações empresariais,
trabalhadores e sindicatos acordarem entre si, com vantagens mútuas, a
adaptação dessas normas aos seus sectores e empresas, esta lei segue a lógica
dos anos 60 e 70:…

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

O Orador: - … quer regulamentar tudo, impor soluções de
"pronto-a-vestir", tamanho único, a uma economia e a uma sociedade
crescentemente diversificadas. E, do mesmo passo, cria outro problema.
Ouvi aqui o Sr. Ministro e as bancadas da maioria dizerem que se trata de um
estímulo à negociação colectiva. Respondo: se a lei tudo fixa, o que há para o
empregador ou a sua associação empresarial negociar com os trabalhadores e os
seus sindicatos?!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Como pode haver negociação colectiva eficaz se as matérias
relevantes estão amarradas pela lei?!

Aplausos do PS.

O Sr. José Sócrates (PS): - Isto é que dói!

O Orador: - Quanto mais a lei imperativa crescer, menos negociação colectiva
haverá. A proposta do Governo despreza a negociação colectiva, despreza que foi
a negociação colectiva, não obstante os problemas e bloqueios, a principal
fonte de inovação de direito do trabalho, entre nós, nos últimos 25 anos.
Nestas circunstâncias, a obsessão da lei pelo detalhe é um erro crasso de
concepção sistémica, mesmo quando consagre soluções substantivas que não sejam
necessariamente erradas.
O que agora ficar escrito estará dependente da flutuação de maiorias, não do
diálogo responsável entre empregadores e trabalhadores; dependerá das
legislaturas e não dos ciclos da economia;…

O Sr. Artur Penedos (PS): - Bem lembrado!

O Orador: - … dependerá das maiorias parlamentares e não dos dinamismos
sociais das pessoas e das empresas; tornará menos fácil a motivação para a
inovação por ambas as partes.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - As empresas ficarão mais rígidas, congeladas no articulado desta
lei, do que flexíveis e abertas à dinâmica do seu próprio ambiente competitivo.

Aplausos do PS.

Digo-vos, claramente, que a lógica de organização da lei deveria ter sido
outra. O que temos em mãos é uma proposta demasiado extensa, que se
multiplicará por muitos outros diplomas, que diminui a margem para a negociação
efectiva entre empregadores e trabalhadores. E fá-lo, por opção deliberada, por
duas vias: por um lado, como já disse, regulamentando, chegando ao ponto de
regulamentar, por exemplo, o número de horas que, em cada trimestre, um
trabalhador pode faltar justificadamente para se inteirar, junto da escola, da
situação educativa de filho menor, mas regulamentando também - pasme-se! - a
supressão do direito, que a lei vigente garante, de suspender a licença de
maternidade quando a saúde da mãe ou do filho obrigarem a um internamento
hospitalar.

O Sr. António Costa (PS): - É a protecção da família!

O Orador: - Sr. Ministro, estou convicto de que o País não precisa que o Sr.
Ministro transforme em letra de lei as suas opiniões sobre estas duas matérias.
E, no caso da segunda, espantar-me-ia que algum empresário lúcido admitisse,
sequer, a hipótese de a competitividade presente ou futura da sua empresa
depender de normas deste teor.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Até quero acreditar que os empresários terão, perante essa mãe,
a compreensão pelas realidades familiares que o Sr. Ministro está agora a
retirar da lei.

Aplausos do PS.

Mas a ideia geral da iniciativa do Governo erra ainda por seguir uma
orientação civilista que desvaloriza a especificidade do contrato de trabalho.
Ficciona uma igualdade inexistente entre empregador e trabalhador, permitindo
que o trabalhador, "livremente" - com todas as aspas -, abdique de
alguns direitos fundamentais, por exemplo, no que se refere à duração da sua
jornada de trabalho.
É socialmente mais justo, sem causar qualquer prejuízo à competitividade
empresarial, que estas e outras normas sejam passíveis de consideração, sim -
estamos de acordo que sejam passíveis dessa consideração -, mas no quadro
negocial, de modo a que empregadores e sindicatos possam, em menor desigualdade,
trocar argumentos, encontrar as soluções globalmente equilibradas e
colectivamente aplicáveis. Esta é a lógica que propomos, esta seria a lógica da
nossa lei!

Aplausos do PS.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Queria! Era mais uma promessa! Uma lei
virtual! Só a despesa é que seria real!

O Orador: - Dir-nos-ão alguns que o bloqueio ou as dificuldades de
negociação colectiva tornam difícil tal operação. Por isso mesmo, estamos de
acordo: impõe-se desbloquear a negociação colectiva, mas, de novo, importa
saber por que caminhos.
Se hoje há convenções desactualizadas, há longos anos sem alterações, o caminho
certo será o de permitir a uma das partes que a denuncie unilateralmente, sem
que daí decorram consequências para si própria, podendo, no limite, se o
ministro do trabalho da época resolver não intervir, ficar os trabalhadores
completamente a descoberto de qualquer convenção colectiva de que hoje
dispõem?!

O Sr. João Rebelo (CDS-PP): - Não é nada disso!

O Orador: - Deve depositar-se este poder nas mãos não digo deste Ministro
mas de qualquer ministro que, um dia, tenha esta pasta?! A nossa resposta é,
claramente, "não"!

Aplausos do PS.

Não será mais razoável, como propõe o PS, que haja a garantia de que, sempre
que uma parte avança para a caducidade, a outra tenha a segurança de que haverá
sempre uma regulamentação colectiva de trabalho, independente do governo da
época, se for essa a sua vontade, nem que seja, no limite, por força de uma
decisão arbitral?!
A proposta do Governo dá dois passos que, combinados, terão efeitos desastrosos
sobre a negociação colectiva: permite que a adaptabilidade resulte de uma
relação individual entre trabalhador e empregador, que deveria ser equacionada
apenas em negociação colectiva, e enfraquece a própria negociação por este mecanismo
de sobrevigência e caducidade de convenções, o qual não garante - sublinho, não
garante - que estará sempre em vigor uma convenção colectiva resultante de
negociação ou de decisão arbitral.
A proposta do Governo consegue a proeza difícil de ser, à vez, excessivamente
interventora e desregulamentadora, promovendo, por dois mecanismos opostos, a
individualização das relações de trabalho, que sempre foi adversária do direito
do trabalho, aliás, uma adversária secular.
É, pois, pelas suas opções de base, e não apenas por meia dúzia de normas mais
chocantes, que esta proposta deve ser abandonada por quem não quiser pôr a
autoridade do Estado ao serviço da americanização das relações de trabalho, da
individualização, do enfraquecimento dos mecanismos de representação dos
trabalhadores e da negociação colectiva nas empresas.
Evidentemente, para quem, hoje, é já vítima do incumprimento, ela não é
particularmente gravosa mas não lhes melhora a situação, ao mesmo tempo que é a
versão portuguesa daquilo a que Robert Castel chamou a "desestabilização
dos estabilizados".
É verdade que não lançará ao mar a História das relações de trabalho em
Portugal. Não tem essa gravidade e concedo, sem custo, que procura abordar
alguns dos mais sérios problemas do nosso mercado de trabalho, mas fá-lo de um
modo ardiloso e inaceitável.

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

O Orador: - O Governo apresentou um anteprojecto extremista, cheio de normas
que existiam para serem retiradas, um verdadeiro míssil que tinha de explodir
no ar.

Paulatinamente, foi retirando, uma a uma, as mais exageradas, reformulando
as mais contestadas. Paulatinamente, foi recuando. Mas, até à proposta que hoje
estamos a discutir, não recuou, não tinha recuado em nenhuma matéria
fundamental.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - O Sr. Deputado não sabe o que é a
concertação!

O Orador: - Só posteriormente surgiu o "nado-morto". Já depois da
proposta fechada e entregue nesta Assembleia da República, e sob a pressão
combinada da negociação e da contestação, vem o Governo prometer alterar 56 dos
artigos que, no entanto, este debate ainda se destina a discutir.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Que melhor prova podíamos recolher da precipitação e do
amadorismo legislativos?! Estamos, formalmente, a discutir muitas normas
propostas pelo Governo que já sabemos que ele abandonará logo que puder para,
pela mão providencial da sua maioria nesta Assembleia, corrigir o que deveria
ter corrigido em tempo útil.

O Sr. Artur Penedos (PS): - Muito bem!

O Orador: - Preferiu mostrar, primeiro, o seu desinteresse pela concertação,
limitando-se, ao longo de meses, àquilo a que os próprios parceiros, e não nós,
chamaram uma mera "auscultação" para, em seguida, vir mostrar o seu
desrespeito por este Parlamento, indo, finalmente, negociar a sério, fora de
horas e de calendário, em concertação social e em jeito de perversidade
neocorporativa, já depois de passado o momento em que deveria ter terminado
essa negociação, pelo facto de o assunto ter passado para a alçada parlamentar.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - E, recorde-se, foi por vontade exclusiva do Governo que a
presente proposta aqui entrou no momento que este escolheu e que ninguém lhe
impôs.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - E se não negociou antes, como o Sr. Ministro aqui recordou, não
foi por incapacidade. Concedo e, aliás, homenageio o Sr. Ministro por ter sido
parte negociadora do primeiro acordo celebrado em Portugal por todos os
parceiros sociais - uma matéria de que a maioria parece ter-se esquecido, pois
a concertação social, mesmo nos anos 90, era tradição do PSD; agora é que o PSD
pensa que é só fora de horas que ela pode surgir.

O Sr. Artur Penedos (PS): - Bem lembrado!

O Orador: - E invoca aqui um parceiro social como subscritor de um acordo -
cujas assinaturas não nos mostrou! -, subscritor, esse, que deixou claro, em
comunicado, que acha que há preceitos inconstitucionais nesta proposta, que
deixou claro, em comunicado, que ela não merece a sua concordância. E mais:
deixou claro, em comunicado, que irá, junto dos grupos parlamentares, pedir que
se empenhem para que ela seja alterada em vários preceitos.
De facto, este diploma, numa parte relevante das suas normas, já tem a sua
morte anunciada pelo seu próprio proponente.

O Sr. Jorge Strecht (PS): - Ainda bem!

O Orador: - Desde logo, desistindo de mexer nos fundamentos para a justa
causa de despedimento, matéria que sempre nos pareceu ter sido colocada na
discussão de forma gratuita e descentrada do que importa discutir.
Mas não percamos o nosso tempo com as normas que já não existem, muitas das
quais, estou convencido, nunca existiram e estiveram no papel apenas para o Sr.
Ministro vir aqui dizer hoje, benevolentemente, que, afinal, as retirava!
O verdadeiro teste à disposição da maioria para elaborar uma lei nova e melhor
está ainda por fazer.
Retiradas as provocações, corrigidos os disparates maiores, finalmente
incluídas questões como a higiene e segurança no trabalho e a formação
profissional, inicialmente negligenciadas e, a custo, incluídas após os avisos
do PS e dos parceiros sociais, o Governo retira-se de cena.
Concentremo-nos, então, agora, Srs. Deputados, na questão séria e profunda, que
é a de decidirmos que lei laboral o País terá. Estará a maioria efectivamente
disponível para continuar a missão de corrigir as propostas do Governo, de modo
a que os apelos à sua melhoria, que por todo o lado se ouvem, possam ser
traduzidos no articulado? Ou, a exemplo do que já aqui fez noutras ocasiões,
insistirá na posição de guardião intransigente do templo, ao ponto de negar a
evidência das inconstitucionalidades certas e insistir até na manutenção de
clamorosos erros?
Por enquanto, esta proposta é claramente inconstitucional. E dou dois exemplos,
apenas: é-o, pelo menos, no que respeita à possibilidade de oposição patronal à
reintegração de um trabalhador despedido ilicitamente; é-o, pelo menos, quando
se prevê a possibilidade de uma convenção colectiva limitar o exercício do
direito à greve que a nossa Constituição reconhece aos trabalhadores.
Mas há mais, como alguns constitucionalistas têm feito notar dentro e fora
desta Assembleia.
Por enquanto, esta proposta, precariza e individualiza as relações de trabalho.
Dizia-nos o Governo que o problema do mercado de trabalho residiria na extrema
rigidez do contrato de trabalho em matéria de despedimento e na pressão que tal
implicaria nos contratos a termo. Na sua própria análise - não na nossa! -, só
haveria ou que diminuir, o que seria errado, a rigidez do contrato de trabalho
ou que melhorar o combate ao uso ilegal das outras formas como compensação
"perversa" deste.

O Sr. José Magalhães (PS): - Claro!

O Orador: - Ora, o que aqui é proposto é um fosso ainda maior do que aquele
que existe.
Sem nenhuma explicação razoável, passa a ser possível estar-se em contrato a
prazo durante seis, em vez de três anos. Porquê?
Ainda sobre esta matéria, onde, hoje, o enunciado dos fundamentos para um
contrato a prazo é taxativo, passa a

estar um "nomeadamente" salvador, que abre a porta ao uso
indiscriminado e não fundamentado da figura. Porquê?

O Sr. Artur Penedos (PS): - Foi de propósito!

O Orador: - Além disso, onde a lei previa, e bem, um acréscimo mínimo por
trabalho nocturno, passaria a haver, se insistirem nesta formulação, valores de
salário diferentes para trabalhadores, ainda que da mesma categoria e da mesma
empresa, trabalhando lado a lado, segundo tenham começado a trabalhar em
horário nocturno antes ou depois de uma data que depende da entrada em vigor do
código. Porquê?

O Sr. Eduardo Ferro Rodrigues (PS): - Porque será?!…

O Orador: - Porquê, senhores, dar aos sindicatos o direito de restringir, em
convenção, o direito à greve que a nossa Constituição, e muito bem, estabelece
como um direito dos trabalhadores?

O Sr. Eduardo Ferro Rodrigues (PS): - Porque será?!…

O Orador: - Por enquanto, esta proposta esquece também que somos um País
onde muitas famílias são casais de trabalhadores e que tudo o que tem a ver com
a conciliação entre as necessidades da economia e a vida pessoal e familiar não
pode acontecer como se estivéssemos a falar ou de trabalhadores sem família ou
de famílias em que só um dos membros adultos trabalha.
Noutro capítulo, o das relações colectivas de trabalho, os diagnósticos
coincidem quanto a que o maior bloqueio é o que resulta da não negociação de
cláusulas de organização do trabalho e de adaptabilidade.
Ora, nesta matéria como noutras, desafio qualquer leitor atento do diploma a
encontrar nele factores relevantes de incentivo à negociação dessas cláusulas.
Pelo contrário, dada a latitude que é dada à gestão dessa matéria directamente
entre empregador e trabalhador, a negociação colectiva torna-se quase acessória
onde não houver uma enorme mobilização e vontade colectiva dos trabalhadores.
Esta proposta é adversária da negociação colectiva e inimiga do sindicalismo.

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

O Orador: - Como bem disse um dos juristas auscultados na Comissão, porá os
sindicatos a negociar em estado de necessidade, afasta-nos, mais ainda, de um
dos pilares do modelo social europeu e da tradição da Europa continental de
investimento na autonomia e na negociação colectiva, afasta-nos, ainda mais,
das leis continentais que investem na negociação colectiva e na autonomia para
a adaptabilidade e para facilitar a competitividade que esta lei, de facto, em
nada ajuda a que melhore. Mas, se não for esse o efeito pretendido, se tudo o
que disse corresponde a defeitos de redacção que podem ser corrigidos, então,
ainda vamos a tempo de o evitar, como propomos.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Nós, PS, entendemos que uma convenção colectiva de trabalho deve
ser celebrada por sindicatos, que pode, em certos casos, ser estendida a todos
os trabalhadores por decisão governamental, mas que nunca pode aplicar-se por
decisão individual de um trabalhador, encorajando-o a deixar de ser
sindicalizado ou a não se sindicalizar. E a maioria está disponível para se
juntar à nossa proposta?
Nós, PS, entendemos que só deve poder ser estendida a convenção colectiva
celebrada por organizações mais representativas. Ora, a proposta do Governo
permite que sindicatos ou associações patronais ultra-minoritários vejam
estendidos, por acto do Governo, os acordos que celebram. E a maioria está
disponível para se juntar a nós na defesa de convenções transparentes e
representativas?

O Sr. Eduardo Ferro Rodrigues (PS): - Muito bem!

O Orador: - Nós, PS, defendemos que os trabalhadores devem ser ouvidos
anualmente nas empresas de maior dimensão, sobre emprego, sobre formação
profissional, sobre higiene e segurança no trabalho, sobre tempo de trabalho,
sobre salários efectivos e protecção social complementar. E a maioria está
disponível para se juntar a nós nessa defesa?

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Nós, PS, defendemos que a adaptabilidade do horário de trabalho
é um assunto de empresa e não de um trabalhador individual. Por isso, apenas
deve existir como resultado de negociação colectiva, impedindo o abuso de
posição patronal e a imposição de sacrifícios à vida familiar sem uma
monitorização da sua necessidade por parte dos representantes legítimos dos
trabalhadores. E a maioria está disponível para defender esta garantia?
Sr.as e Srs. Deputados, a proposta de lei n.º 29/IX, que deu entrada na
Assembleia da República, já não existe no que se refere a boa parte das suas
normas. Não vale a pena que a maioria se atenha muito a ela. Da nossa parte,
merece uma simples e inequívoca reprovação.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - De recuo em recuo, o Governo demonstrou que não tem uma ideia
clara sobre o conteúdo a dar a uma reforma do mercado de trabalho que
consideramos necessária.
Já foi, por diversas vezes, buscar soluções jurídicas ao articulado da Comissão
presidida pelo Prof. Monteiro Fernandes, que tinha abandonado à partida. Mesmo
para quem o defenda, esta proposta já não é mais do que uma base de trabalho.
Não há por que defendê-la agora com fundamentalismo, quando o próprio Governo,
e bem, não o fez e não o faz. "Apertou porcas", "trocou
parafusos", "colocou e retirou pregos e cavilhas".
Em debate anterior, o Sr. Ministro disse aqui que desejava que o projecto fosse
melhor do que o anteprojecto e que a lei fosse melhor do que o projecto.
Aceitem, Srs. Deputados da maioria, o repto do Sr. Ministro.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Ajuízem com independência as propostas que vos vão ser
apresentadas. Nós queremos uma boa lei. Mas terá que ser muito diferente da
proposta que, hoje e aqui, os Srs. Deputados já começaram a abandonar, ainda
que estejam obrigados, compreende-se, a viabilizar.

A Constituição dá-nos a nós, Deputados, a competência de decidir sobre estas
matérias centrais para tantas empresas e tantos trabalhadores.
Aqui estaremos em defesa de uma boa lei, consciente do presente e virada para o
futuro.
Já se viu que o ponto de partida nem sequer para o Governo é muito relevante.
Se a maioria quiser, ainda pode ser muito relevante o ponto de chegada.

Aplausos do PS, de pé.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado
Telmo Correia.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.
Deputado Paulo Pedroso, como é hábito, ouvi-o com a maior atenção e até com
apreço, porque considero que fez um exercício da maior dificuldade: V. Ex.ª
assistiu ao jogo, viu exactamente o mesmo jogo que nós, percebeu que o
resultado que obtivemos foi uma vitória por 3-0 e entreteve-se na tribuna,
durante algum tempo, a explicar por que é que não era bem assim,…

O Sr. Eduardo Ferro Rodrigues (PS): - Essa agora!

O Orador: - … que, afinal, não era bem uma vitória, tentando desculpar-se
com o árbitro ou com outra coisa qualquer, numa tentativa de explicar que o
resultado a que se chegou não foi uma vitória indiscutível do Governo!
Sr. Deputado Paulo Pedroso, só para lhe dar um exemplo da sua extensa
intervenção - de resto, documentada e de quem tem conhecimento destas áreas -,
a certa altura, pareceu-me afadigar-se na demonstração de que, afinal, a
proposta não era simplificadora.

O Sr. José Sócrates (PS): - É isso mesmo!

O Orador: - A certa altura, V. Ex.ª embalou por aí. E eu devo dizer que
considero essa tese extraordinária, porque, tanto quanto sabemos, com este
código, teremos a revogação de, eventualmente, 70 diplomas, sendo 30 ou 40
essenciais. Ou seja, em vez dos 70 diplomas, passamos a ter um código e são
revistas leis importantes, como a Lei do Contrato de Trabalho, a Lei da Duração
do Trabalho, a Lei Sindical, a Lei das Associações Patronais, a "lei dos
três F" (Lei das Férias, Feriados e Faltas), enfim, todo um conjunto de
diplomas que nós, os que nos habituámos a lidar com estas matérias, conhecemos
e sabemos que foram feitos ao longo do tempo e com alterações sucessivas.
Portanto, repito, em vez dos 70 diplomas, passamos a ter 1 e V. Ex.ª consegue
dizer-nos que não há simplificação, que não há uma nova unidade e uma nova
coerência jurídica. Isto demonstra que o seu esforço, embora importante, é
quase um exercício impossível, Sr. Deputado Paulo Pedroso. Aliás, esforça-se
também em demonstrar-nos que, em matéria de contratação colectiva… No limite,
V. Ex.ª diz que não pode haver regulamentação, mas há -…

Vozes do PS: - Não há!

O Orador: - … e V. Ex.ª sabe-o! Há sempre uma solução final de arbitragem e
a designação final dessa arbitragem é feita, inclusivamente, pelo Conselho
Económico e Social. V. Ex.ª sabe isso tão bem como nós!

O Sr. António Costa (PS): - Essa é a nossa proposta!

O Orador: - Não! É a do Governo, como poderão verificar.
V. Ex.ª esforça-se, assim, para demonstrar o indemonstrável e só não responde
àquela que é para nós a questão essencial.
Começou o Secretário-Geral do Partido Socialista este debate dizendo que isto
era um míssil, que era um atentado, que era uma coisa perigosíssima, que era o
conflito pelo conflito, que era um excesso, que era uma coisa de grande perigo.
A seguir, V. Ex.ª diz que vamos de recuo em recuo, que o Governo foi recuando,
recuando…

O Sr. António Costa (PS): - Não, não!

O Orador: - Ora, se, primeiro, estava mal, supõe-se que, depois de todos
esses recuos, deveria de estar bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Telmo Correia, o tempo de que dispunha
esgotou-se.

O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente.
A conclusão lógica é essa! Ou seja, VV. Ex.as não responderam à questão de
saber por que razão criticaram a ausência de diálogo e de concertação e agora
criticam o resultado da concertação.
Esta foi a pergunta e a ela, até agora, não responderam, sendo que eu aprecio
alguns dos esforços que foram feitos e até o cumprimento a si pessoalmente, Sr.
Dr. Paulo Pedroso, pela sua participação no tempo de antena da CGTP, que, em
minha opinião, foi um contributo decisivo para que houvesse compromisso
tripartido!

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo
Pedroso. Dispõe de 3 minutos.

O Sr. Paulo Pedroso (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Telmo Correia, a
minha preocupação é a de que o saldo final deste processo não seja uma derrota
das relações de trabalho em Portugal.

O Sr. José Sócrates (PS): - Muito bem!

O Orador: - A minha intervenção está centrada nessa preocupação. E não precisamos
de mais recuos. Do que agora precisamos é de avanços, ou seja, que os senhores
avancem para a proposta que aqui devia estar e não está.

O Sr. António Costa (PS): - Exactamente!

O Orador: - Se o Sr. Deputado não compreende por que motivo esta matriz é
errada, vou tentar explicar em poucos segundos. É-o por uma razão simples: para
que a lei seja sistemática, transparente e eficaz deveria ser mais pequena,…

O Sr. José Sócrates (PS): - Muito bem!

O Orador: - … deveria ser clara quanto ao que fica para a negociação
colectiva e deveria confiar na responsabilidade dos parceiros.

Aplausos do PS.

Esta lei é excessivamente grande, esta lei é contra a autonomia da
negociação colectiva, esta lei mantém o governo, seja ele qual for, a procurar
comandar as relações de trabalho.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - É melhor do que a vossa, que era muito
pequena!

O Orador: - Para terminar, Sr. Deputado, parece-me que está mal informado
num ponto e se defende isso estamos muito bem, porque certamente irá apoiar as
propostas do PS.
A proposta do Governo deixa, em caso de caducidade, nas mãos de qualquer
governo, em qualquer conjuntura, a possibilidade de decidir se há ou não essa
arbitragem. Nós queremos que quem pede a caducidade se obrigue, logo ali,…

O Sr. António Costa (PS): - Claro!

O Orador: - … repito, logo ali, a que, se a contraparte avançar, haja essa
arbitragem.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Se o Sr. Deputado Telmo Correia está de acordo connosco, então,
junte-se a nós e já estará a dar, nesse avanço, um dos tais passos em direcção
ao bom caminho.

Aplausos do PS.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Isso consta da proposta de lei!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado
Manuel Dias Loureiro.

O Sr. Manuel Dias Loureiro (PSD): - Sr. Presidente, Sr.ª e Srs. Membros do
Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Há um provérbio de que gosto muito, que diz:
"Quando o vento sopra forte, alguns abrigam-se, outros constroem
moinhos".
Não há dúvida de que o vento sopra forte. Sopra forte no mundo e sopra forte em
Portugal.
No caso do nosso país, para não falar de outros aspectos, sopra forte nas
contas públicas, que só com enorme esforço estão a ser controladas;
Sopra forte no sobreendividamento das famílias, das empresas e do Estado;
Sopra forte na dimensão assustadora do nosso défice corrente que, na União
Europeia, só encontra paralelo na Itália do Sul e no Leste da Alemanha e que
está muito acima do défice de países que não têm, de momento, qualquer hipótese
de sonhar com níveis de vida desenvolvidos. Com uma enorme diferença: enquanto
o Norte de Itália e o Ocidente da Alemanha sempre hão-de pagar a factura dos
seus concidadãos do Sul e do Oeste, respectivamente, connosco não vai passar-se
nada de semelhante;
Sopra forte, para abreviar, quando temos de reconhecer - por mim, com tristeza
- que não fomos capazes de aproveitar conjunturas favoráveis que, servidas com
esforço próprio, estratégias correctas, sentido de inovação e de risco,
poderiam ter significado progresso consistente.

O Sr. Patinha Antão (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Há, por isso, uma questão que nos interpela a todos, que
interpela a nossa geração: vamos querer e ser capazes de, no mais curto espaço
de tempo, atingir, pelo menos, os níveis médios de desenvolvimento da União
Europeia, ou não?
Claro que é difícil, claro que o vento sopra forte. E nós, a geração que nós
somos, vamos abrigar-nos ou vamos construir moinhos? Vamos sucumbir ao medo,
acomodar-nos no "deixa andar", ou vamos ousar fazer?
Cada um dará a sua resposta.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados:
O debate que se trava hoje nesta Câmara e que se tem travado no País, ao longo
dos últimos meses, tem tudo a ver com isto.
Este debate provocado pela iniciativa do Governo tem, entre muitas, a vantagem
de separar as águas: de distinguir aqueles que querem ousar, que, perante as
dificuldades, não se dão por vencidos, os que não querem passar à história como
uma geração incapaz, e os outros, os que teimosamente se recusam a olhar de
frente a realidade, reféns de muitas cegueiras, que lhes não deixam ver nem o
futuro nem o abismo para onde caminham.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. José Sócrates (PS): - Nem a luz!

O Orador: - Felizmente para Portugal, a maioria e o Governo estão do lado
dos que fazem, dos que ousam e se não acomodam.

O Sr. António Costa (PS): - Aí é que está o erro!

O Orador: - Felizmente para Portugal, juntamente com a maioria e o Governo,
muitas forças sociais, empresariais e sindicais estão do lado dos que querem
prestar contas à história de cabeça erguida.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - O PSD, hoje pela minha voz, está aqui para dizer que é deste
lado que está. Que está, aliás, no lado onde sempre esteve: no lado onde mora o
inconformismo, onde mora a coragem, onde mora a mudança, onde mora a luta e o
esforço, onde mora a ousadia, a persistência e o sentido de risco.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

E por isso estamos aqui para apoiar esta reforma fundamental.
Para apoiar e felicitar o Governo pela iniciativa, sem dúvida, mas também, e em
primeiro lugar, para o felicitar pelo caminho escolhido.
Já direi como é importante esta reforma, mas deixem-me primeiro dizer do acerto
do método escolhido.
O Governo podia ter escolhido um método diferente de acção. Podia ter submetido
a esta Câmara um projecto de lei e contado com os votos da maioria, que o
apoia, para o aprovar. Sem mais. Faria mal!

Felizmente, o Governo escolheu colocar as suas ideias, com abertura de
espírito, à discussão das forças políticas, sociais e dos cidadãos em geral,
por um período de mais de 6 meses.
E, nesse longo espaço de tempo, dialogou, tentou convencer, ouviu, ajustou,
aqui e ali, as suas ideias às ideias de outros e lutou, serena mas tenazmente, contra
muita desinformação, sempre convicto de que mais importante que aprovar esta
lei era encontrar uma solução que, nesta matéria, mobilize para a acção
empregadores e empregados e o País de um modo geral.
Fez, por isso, muito bem o Governo!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Porque o que move a maioria e o Governo, Srs. Deputados, não é que Portugal
tenha mais uma lei publicada em letra de forma no Diário da República. Não! O
que a maioria e o Governo querem é que aconteça, no dia-a-dia da vida, um
conjunto de atitudes concretas, de factos novos que permitam prosperidade e
progresso para as empresas, para os trabalhadores, para as famílias, numa
palavra, para o País!
Este Governo nunca se proclamou o campeão do diálogo, mas, aí está, sem
proclamações grandiloquentes, levou a cabo um seriíssimo trabalho de diálogo,
direi melhor, de concentração que conduziu aos melhores resultados.
Também nisto os tempos mudaram.
Srs. Deputados e Srs. Deputados do Partido Socialista, diz o povo, e com razão,
que "num lado se põe o ramo e noutro se vende o vinho".
Felicito-o, Sr. Ministro do Trabalho, e, em si, felicito o Governo.
Congratulo-me, também, com o sentido de responsabilidade da CIP e da UGT. Por
um lado, porque, concomitantemente com o acordo que conseguiram, fizeram renascer
em Portugal um instrumento crítico do progresso que é a concertação social. E,
ainda, porque este acordo tripartido constitui para os portugueses um claro
sinal de ânimo e de confiança. No momento de desânimo e preocupações, em que
faz falta realizar tanta coisa difícil, os portugueses ficam a saber que,
juntamente com o Governo, há instituições responsáveis dispostas a juntar
esforços para tornar a vida melhor.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O PSD apoia
com entusiasmo esta proposta de lei.
E deixe-me dizer-lhe, Sr. Deputado Paulo Pedroso - que ouvi com muita atenção
-, que onde há intervenção humana, há sempre imperfeições. É da natureza das
coisas. O problema é saber se estamos, ou não, dispostos a mudar, a corrigir, a
aperfeiçoar. O problema é saber se estamos, ou não, dispostos a ousar fazer. E
o actual Governo, em todo este processo, deu prova cabal de que esteve sempre
disposto a melhorar, a aperfeiçoar. Sabe porquê? Por uma razão extremamente
simples: é que o Governo não quer uma lei, não quer um conjunto de páginas que
são artigos. O Governo quer um conjunto de normas que tenham eficácia,
aplicabilidade e que tenham resultados concretos. E, por isso, está sempre
disposto a mudar, a fazer melhor. Este é o espírito de quem esta na política
desta maneira!

O Sr. Paulo Pedroso (PS): - E vai continuar assim…

O Orador: - Sr. Deputado Paulo Pedroso, o senhor disse que o PS faria uma
lei diferente. E por que não o fez? Esteve seis anos no poder, por que não o
fez?!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Mas vou dizer-lhe por que não o fez! O PS não fez essa lei, não foi por ser
um partido perfeccionista, a quem a imperfeição causa horror e não pode correr
o risco de fazer coisas menos perfeitas. Não! Não foi por isso! Esse ainda
seria um sentido desculpável. O PS não fez essa lei, nem outras leis, pelas
piores razões em política: porque não tem coragem, porque teve medo de perder
votos! Foi por isso que não fez essa lei!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

E esse é o pior espírito, Sr. Deputado, com que se pode estar na política.
Nós apoiamos, de facto, esta proposta de lei. E tem fundadas razões o nosso
apoio.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Vocês não tinham ganho as eleições com esta
proposta de lei!

O Orador: - Numa palavra, podemos dizer que, tratando-se de uma mudança,
Portugal, modernizando-se, atento ao que se passa no mundo, muda de rumo em
matéria de relações de trabalho.
Não é, portanto, uma mudança no que é irrelevante ou acessório. Não é uma
mudança para, apenas, permitir ao Governo afirmar que, nesta matéria, cumpriu
uma promessa eleitoral. Não! Trata-se aqui de mudar no que é essencial e, por
isso, podemos dizer que Portugal muda de paradigma em matéria de relações de
trabalho.
Com vantagens para todos: para os empregadores, para os empregados, para as
empresas e para o País no seu conjunto.
Ganham os trabalhadores em múltiplos aspectos, porque, de facto, a lei é mais
justa para os trabalhadores.
Podia dar um conjunto de exemplos,…

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Até agora, nada disse sobre a proposta de
lei!

O Orador: - … mas vou dar três exemplos.
Pense-se, por exemplo, no regime do trabalho prestado a recibo verde; atente-se
na criminalização do trabalho de menores; repare-se no direito de reclamação de
créditos ao grupo a que a empresa pertence, uma novidade com um valor
inestimável para os trabalhadores que têm direitos de crédito.
Portugal, num estudo da OCDE, tem, até agora, a mais rígida legislação em
matéria de relações laborais.
Quem ganha com esse facto? Aparentemente, pensam alguns, os trabalhadores com
emprego. Puro engano. Na prática, todos perdem: perdem os donos do capital,
perdem as empresas, perde o País, perdem os que procuram emprego - o desemprego
jovem, em Portugal, é elevado e não baixo, como se pode pensar - e perdem
também os trabalhadores empregados.
Atente-se nisto: de que serve esta falsa protecção do emprego se ela prolonga a
vida de empresas obsoletas, para além do economicamente viável? Sim, de que
serve e a quem serve? A ninguém, seguramente.
A quem serve a rigidez que faz com que as empresas, não recrutando mais pessoal
quando precisam, recorram a trabalho extraordinário que aumenta custo e diminui
competitividade e coloca mais jovens que procuram emprego fora das empresas?
E quem pensa nos jovens - e tantos jovens qualificados à procura de emprego,
que a rigidez da lei coloca em fila de espera à porta das empresas?
E quem pensa nos desempregados que, por efeito da rigidez normativa, caem em
Portugal, quase fatalmente, em desemprego de longa duração?
Enfim, não quero ir mais longe. Neste aspecto, termino, dizendo que a
flexibilidade do novo sistema - seja geográfica, horária, funcional ou
contratual - é um passo de gigante no sentido da modernidade, que induzirá a
criação de emprego, fortalecerá as empresas e, portanto, será factor de mais
progresso e desenvolvimento.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - E será assim, porque o novo código representa, como devia, um
equilíbrio sensato entre direitos e obrigações de trabalhadores e direitos e
obrigações de titulares do capital e das empresas.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Falei do vento
que sopra e das duas atitudes que podemos tomar.
Não tenho dúvida de que os tempos são difíceis. Há, no entanto, um enorme
espaço para o optimismo, que é o espaço da vontade, da coragem e do querer.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - E estes, e só estes, são os ingredientes do sucesso.
Vamos ter um novo código do trabalho. Temos de evitar uma tentação: a de pensar
que ele é a panaceia para todos os velhos males e de que ele, por si só, tudo
resolverá.

Vozes do PS: - É isso mesmo!

O Orador: - Nada seria mais errado.
Portugal tem de vencer o problema difícil da produtividade, a que alguns chamam
mesmo o "calcanhar de Aquiles" da economia portuguesa.
A longo prazo, o crescimento do rendimento per capita em Portugal será
totalmente determinado pela evolução de produtividade.
Não tenho qualquer dúvida de que este novo paradigma nas relações de trabalho
vai influenciar de forma positiva a produtividade.
Este código, tendo a enorme vantagem de deixar à contratação colectiva um
vastíssimo campo de acção, atribui, por esse facto, uma enorme responsabilidade
económica - e também social - a empregadores e empregados e, nessa medida,
deixa nas mãos dos empresários e trabalhadores a possibilidade de maior sucesso
para as empresas.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Não duvido de que o factor crítico desse sucesso será a evolução
da produtividade.
Não é por acaso que, a propósito deste código, se falou tanto de produtividade.
É por isso que deixo aqui um alerta: é fundamental evitar a ilusão de que a
produtividade, e sobretudo a sua fraca evolução em Portugal, é culpa exclusiva
dos trabalhadores.
Seria uma ilusão muito perigosa. Se a produtividade evolui mal no nosso país,
não é porque os trabalhadores trabalhem pouco! Pelo contrário. Eu sou dos que
pensam que em Portugal o progresso que temos tido se deve ao muito trabalho dos
trabalhadores, só que muito pouco eficiente!

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - E de quem é a responsabilidade?! Das
empresas?! Da gestão?! Da organização?!

O Orador: - O Sr. Deputado tornou-se um Deputado nervoso. Não se antecipe.
Já digo de quem é a responsabilidade.
E, para mim, a principal culpa desta baixa eficiência não está nos
trabalhadores. Está, desde logo, na organização e gestão empresarial.
Sr.as e Srs. Deputados, não vale a pena fecharmos os olhos à realidade se
queremos vencer os ventos que sopram.
Em Portugal, há empresas de produtividade muito forte e muito competitivas.
Detidas por nacionais e detidas por estrangeiros. Há empresas inseridas em
grupos multinacionais em que a produtividade da empresa portuguesa é das mais
altas que os respectivos grupos têm no conjunto.

O Sr. Eduardo Ferro Rodrigues (PS): - Com as leis laborais que existem!

O Orador: - Poderia nomear muitas dessas empresas.
Por isso, é claro que a questão da organização e da gestão empresarial, que
naturalmente ganha novos instrumentos com este código, é na empresa a questão
crucial.
Só acredito numa empresa que é uma comunidade de interesses de empregadores e
empregados, onde, desde a base, se reconhece e se incentiva o trabalhador à
iniciativa e à criatividade.
O que a prática de vida me tem ensinado é que na empresa só há sucesso - e aí
há sucesso - quando existe uma organização que incute a todos o sentimento de
pertença a uma comunidade, que estimula a iniciativa e a criatividade, que
incentiva e premeia o mérito, e a todos dá - gestão e trabalhadores - o
sentimento de co-responsabilidade pelos resultados alcançados.

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

O Orador: - Mas se assim é, bem se compreende que nesta matéria a primeira
responsabilidade não cabe aos trabalhadores. Cabe, naturalmente, a quem pode
definir a organização, e essa é, obviamente, a gestão!
E, para que não haja outras ilusões, cabe dizer outras coisas. Repito: para que
não haja outras ilusões.
Os níveis de produtividade de que o País necessita de alcançar dependem em grande
medida de acções, de políticas, de estratégias, que não estão, de todo, nas
mãos dos trabalhadores.
Contas públicas saudáveis!
Que culpa cabe aos trabalhadores na política que deixou deteriorar até ao
desastre as contas públicas?

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - É melhor fazer, então, um "código
empresarial"!

O Orador: - E, no entanto, contas públicas saudáveis, num ambiente
macroeconómico saudável, influenciam decisivamente a produtividade de um país!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - E o destino do investimento no nosso país?
Que papel cabe aos trabalhadores na definição dos destinos do investimento
público e privado? Nenhum! E, no entanto, dos destinos do investimento depende
enormemente a produtividade.
Desde há muito, o investimento em Portugal tem sido dos mais elevados da Europa
em termos relativos. O problema é que o destino dos nossos investimentos - da
sua maior fatia - são as obras, os edifícios, as casas, as construções e, até,
as estradas!
O sector da construção civil tem, em Portugal, aproximadamente um peso próximo
do dobro da média da União Europeia.
A quem se atribuirão as culpas por estas reiteradas opções de investimento? Não
é, seguramente, aos trabalhadores. Quem fala em investimento, fala em perfil
produtivo.
Por que é que a elevação do perfil produtivo do nosso país praticamente
estagnou na última década?
Quem pode mencionar um investimento estruturante feito no nosso país que nos
tenha catapultado para outras plataformas de tecnologia, onde o valor
acrescentado é substancialmente maior?
Depois da entrada em Portugal do sector da tecnologia automóvel, onde estão
outros investimentos relevantes que nos tenham aberto novas portas
tecnológicas? Em lugar nenhum!
E, depois, constatamos, com tristeza, o ritmo de desaceleração do emprego de
base tecnológica em Portugal, comparado com a aceleração, nos mesmos domínios,
em países como a Irlanda e a Espanha, para não falar de outros.
E este factos têm a ver - têm tudo a ver - com produtividade e em todos eles
nenhuma responsabilidade cabe aos trabalhadores.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

O Orador: - E a educação e a formação? Onde tem estado um sistema educativo
que ensina a aprender e ensina, sobretudo, uma cultura de exigência e uma ética
de responsabilidade?
E a investigação e o desenvolvimento? Quanto gasta Portugal em I&D, em
percentagem do PIB, comparando com outros países europeus de dimensão
semelhante?

O Sr. José Sócrates (PS): - Pergunte ao Governo!

O Orador: - Srs. Deputados do Partido Socialista, deixem-me dizer-lhes o
seguinte aparte: tenho estado a ver com atenção os vossos acenos de cabeça.
Ainda não perceberam que estou a fazer críticas ferozes àquilo que fizeram
durante seis anos?!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Vozes do PS: - Não é verdade!

O Orador: - Tenham paciência, mas é a verdade!

Protestos do PS.

Os senhores reconhecem que isto é verdade e que tenho razão - por isso o
vosso aceno de cabeça. Só se esqueceram que a culpa é vossa!

Protestos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não entrem em diálogo. Deixem falar o
orador.

O Orador: - Como estava a dizer, e a investigação e o desenvolvimento?
Quanto gasta Portugal em I&D, em percentagem do PIB, comparando com outros
países europeus de dimensão semelhante?

O Sr. Paulo Pedroso (PS): - A política de I&D está a descer no nosso
país!

O Orador: - A Suécia, com uma população idêntica à de Portugal, é o país
mais inovador do mundo.
E o que temos feito, consistentemente, no domínio da fundamental valorização
dos produtos pela marca e pelo design?
E que políticas alimentaram, nos últimos anos, uma estratégia consistente de
investimento no aproveitamento das nossas condições naturais e na produção de
bens transaccionáveis?
E por onde tem andado a capacidade de Portugal na captação da IDE (Investimento
Directo Estrangeiro)?
E tudo isto, Sr.as e Srs. Deputados, tem tudo a ver com a produtividade
portuguesa.
E que relevância - falo de relevância económica - tem tido o facto de
pertencermos a uma comunidade de quase 200 milhões de pessoas que se exprimem
em português?
E por que nos temos queixado de ser um País periférico, em vez de, como fez,
por exemplo, a Irlanda, nos preocuparmos com estratégias que transformem a
nossa periferia em relação à Europa numa vantagem competitiva que nos coloque
numa nova e rentável centralidade? E Portugal tem todas as condições para isso:
no centro da Europa, por um lado, África, por outro, América do Norte e do Sul,
por outro. Por que não o fazemos?
E por que nos queixamos da invasão do nosso mercado por produtos espanhóis, em
vez de repararmos que entre Portugal e Espanha há uma via de sentido duplo e
que, portanto, as nossas estratégias empresariais têm, pelo menos, de ser
pensadas para o mercado de 50 milhões de pessoas, que é o mercado ibérico?
Por que é que a Espanha já vende por ano tanto a Portugal como vende à América
Latina?
Em que medida estamos nós, portugueses - sobretudo Governo, associações
empresariais e empresas -, a preparar-nos para tirar proveito deste enorme
mercado?
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Tudo o que
venho de dizer são outros tantos aspectos fortemente críticos da nossa
produtividade. E em todas as questões muitos serão os responsáveis, mas entre
eles não se contam os trabalhadores.

Pareceu-me, por isso, adequado que, no debate que conduzirá à aprovação do
novo código do trabalho, ficasse claro que nós, no PSD e na maioria, estamos
conscientes das responsabilidades que cabe a cada um: ao Estado, ao Governo, às
empresas e, também, aos trabalhadores. Mas nunca cairemos na tentação de passar
responsabilidades ou culpas a quem, de todo, as não tem.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - E, mais do que isso: no momento em que aprovamos uma reforma
estrutural de magna importância, quis deixar claro que para nós próprios
políticos, sobretudo para nós, maioria, quanto temos pela frente, em tantos
domínios, ainda para fazer.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O que nos
preocupa é que todos sejamos capazes de construir um País consistentemente
progressivo e solidário - solidário, porque, para nós, o crescimento só é
económico para ser social.
Sabemos que os tempos não são fáceis. Temos, no entanto, um espírito aberto à
mudança e à reforma e acreditamos que o trabalho e a inteligência são as fontes
mais consistentes do progresso dos povos.
Sabemos que os tempos não são fáceis e que à nossa volta há ventos que sopram
forte. Podemos procurar abrigos ou construir moinhos. É connosco, portugueses.
É só connosco!
Nós, na maioria e no PSD, como sempre, escolhemos construir moinhos!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o
Sr. Deputado Paulo Pedroso.

O Sr. Paulo Pedroso (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Manuel Dias Loureiro,
não seria necessário mais do que a sua intervenção para demonstrar que o Código
do Trabalho que aqui está a ser discutido é irrelevante para as questões da
produtividade e da competitividade em Portugal. O senhor demonstrou-o e
cumprimento-o por isso.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Deputado, pergunto-lhe: face ao seu diagnóstico, vai
viabilizar o conjunto de propostas do Partido Socialista relativamente à
competitividade? É porque são essas que vêm responder às suas preocupações e
não este Código.
Em segundo lugar, o Sr. Deputado fala em investigação científica e em educação.
Assim, pergunto-lhe se está ou não plenamente consciente de que são os
Orçamentos do Estado deste Governo que estão a fazer descer o investimento de
Portugal em investigação científica e em educação, invertendo uma curva que
durou seis anos.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Em terceiro lugar, disse o Sr. Deputado, com grande injustiça,
que não houve coragem para governar. Ora, a situação do País que herdámos em
1995 seguiu-se a oito anos de maioria absoluta do seu partido. A legislação do
trabalho que herdámos em 1995 seguiu-se a oito anos da vossa maioria absoluta!!
Quem fez a lei das 40 horas? Quem fez a primeira lei relativa à flexibilidade e
à polivalência no trabalho? Quem mexeu nos contratos a prazo? Quem fez a nova
fórmula de cálculo das pensões? Quem fez a co-incineração que os senhores
suspenderam sem a substituir por nada?

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Manuel Dias Loureiro, tem mais um pedido de
esclarecimento. Quer responder agora ou em conjunto?

O Sr. Manuel Dias Loureiro (PSD): - Respondo já, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Então, tem a palavra para o efeito.

O Sr. Manuel Dias Loureiro (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Paulo
Pedroso, não acredito no que diz. Não acredito que o senhor pense para si
próprio que esta proposta de lei não tem que ver com produtividade, porque, de
facto, tem!
Não temos tempo para debater agora o que já foi debatido e está claro, mas
dou-lhe um exemplo.
Sr. Deputado, não acredito que o senhor, que foi responsável pela pasta do
Trabalho, não saiba o que se passa hoje, por exemplo, em matéria de organização
do trabalho. Não acredito que não saiba o que são weekend only work rolling
two-shift e horas anuais de trabalho… Isto tem que ver com aquilo de que
falamos aqui. Nada disto é possível no âmbito das actuais leis. Tudo isto de
que falo equivale a outros tantos aspectos críticos em relação à produtividade.
Portanto, o senhor sabe perfeitamente que não acredita que este código não tem
muito a ver com produtividade. Aliás, no futuro, este código tem seguramente
muito a ver com empresas que sejam mais competitivas. É nesse sentido que apoio
esta proposta de lei.
No entanto, o que eu disse é diferente: eu disse que isto tem a ver com
produtividade, mas não tem tudo a ver com produtividade. Melhor: a
produtividade não depende só disto, depende de muitas mais coisas.
Fala em I & D. Ora, Sr. Deputado, não estou aqui para falar apenas no que
nós próprios fizemos ou no que os senhores fizeram nessa matéria, estou a dizer
que o País - e fiz uma comparação com a Suécia - tem de preocupar-se com esta
questão e investe pouco em I & D. Não estou sequer a dizer que isto depende
só de políticas públicas, digo que as empresas investem pouco em I & D.

O Sr. António Costa (PS): - É verdade!

O Orador: - Quer dizer, esta é uma questão nacional que envolve todos.

O Sr. António Costa (PS): - Exactamente!

O Orador: - O senhor não tem de estar aí a dizer, com grande euforia,
"não, agora". Não é assim. Esta é uma questão que o País tem de
resolver.
Sr. Deputado, o que me move não é vir aqui fazer um brilharete parlamentar,
pois já tenho muitos anos de política. O que me move é contribuir para que o
País e as empresas tenham condições para andar para a frente, o que me move é
que, como geração - que é também a sua,

embora seja mais novo do que eu -, possamos aparecer perante os nossos netos
de cabeça erguida pelo que fizemos. É isso que me move fortemente e que penso
que deve mover-nos a todos.
Em terceiro lugar, devo dizer-lhe que creio que o PS tem três dificuldades.
Digo-lhe isto sem qualquer acrimónia e com todo o respeito, pois tenho imenso
respeito por toda a gente e por todos os Deputados, por maioria de razão.

O Sr. José Sócrates (PS): - Vai dizer com acrimónia, vai!

O Orador: - Não! Verá que vou dizê-lo sem qualquer acrimónia, Sr. Deputado!
Como dizia, considero que o PS tem três dificuldades: por um lado, tem a
dificuldade de que, estando convencido de que esta lei é necessária - está
convencidíssimo; não acredito que, no PS, haja quem não pense que esta lei é
fundamental! -, apesar de tudo, pensa que "tem de estar contra",
pensa que nasceu para estar no contra. É que o PS tem um problema fatal, uma
marca indelével com que nasceu: mesmo quando está no poder, o PS é um partido
do reviralho e do contra... Os senhores nasceram assim e hão-de morrer assim.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. José Sócrates (PS): - Não resiste à politiquice!

O Sr. António Costa (PS): - É muito coimbrão!

O Orador: - Não sou coimbrão! Isto é bem verdade, Sr. Deputado! Aliás,
durante os seis anos que estiveram no poder, provaram-no bem!
A outra dificuldade que o PS tem é a de que não sabe como há-de
"coser" o seu próprio discurso com a atitude que a UGT teve nesta
matéria. É uma dificuldade vossa e não posso resolvê-la.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra a
Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, roubando 1 minuto ao 15 minutos
de que o PCP dispõe para discutir quase 700 artigos da proposta de lei, pediria
ao Sr. Deputado Manuel Dias Loureiro que resolvesse uma perplexidade que a sua
intervenção me suscitou.
Primeiro, pensava que a conclusão da sua intervenção seria a de que era preciso
um código de conduta empresarial.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Exactamente!

A Oradora: - Segundo, não explicou V. Ex.ª, na sua intervenção, afinal, por
que é que era necessário um código do trabalho. Assim, agradecia se pudesse explicar-me,
porque penso que muita gente ficou perplexa, já que o seu discurso é diferente
do do Sr. Ministro do Trabalho.

O Sr. António Costa (PS): - Isto é um elogio!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Dias
Loureiro que dispõe de 3 minutos.

O Sr. Manuel Dias Loureiro (PSD): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Odete
Santos, ainda bem que me faz essa pergunta porque estive para falar nisso na
minha intervenção e não o fiz por esquecimento.
Sabe, há um erro que está a ser cometido em relação a esta proposta de lei. É
que as pessoas pensam que este código é para os trabalhadores, mas não é. Este
é um Código para empregadores e para trabalhadores. Não ter percebido isso é
não ter percebido o essencial em relação a esta matéria.
Espero é que trabalhadores e empregadores, com as potencialidades que podem
retirar desta nova lei, consigam trazer mais sucesso para as empresas que, na
minha perspectiva, são aquelas de que falei, empresas que são entendidas como
eu próprio as vivo no dia-a-dia.
É que, sabe, Sr.ª Deputada, não estou aqui a falar de cor, estou a falar de
coisas com que lido no dia-a-dia, muitas horas por dia, e sei como é que isto
funciona.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Quanto ao que disse sobre os empresários, sim,
senhor!...

O Orador: - Portanto, Sr.ª Deputada, quero dizer-lhe que este é um Código
para os trabalhadores, que terão de respeitá-lo e do qual terão de valer-se
para valorizar o seu próprio trabalho dentro da empresa, e também para os
empregadores.
Se assim for, se uns e outros tirarem deste Código vantagens novas, por
exemplo, em termos de organização do trabalho, então, sim, penso que valeu a
pena, penso que alcançámos o que pretendíamos, isto é, trazer para as empresas
possibilidade de melhor trabalho, mais sucesso, mais desenvolvimento, mais
crescimento, para as empresas, as famílias e o País, pois é do que se trata.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado
Álvaro Castello-Branco.

O Sr. Álvaro Castello-Branco (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro do
Trabalho e da Segurança Social, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, Srs.
Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Desde há muito que a necessidade
de uma reforma da legislação laboral era sentida como imperativa pela sociedade
portuguesa ou, no mínimo, por uma larga maioria desta.
E isto porque a maior parte da legislação dispersa sobre esta matéria tem, em
média, mais de 15 anos. Traduz, pois, muita desta legislação um completo
desfasamento da realidade sócio-económica portuguesa e europeia.
É por demais evidente que as realidades actuais pouco, ou nada, têm a ver com
aquilo que se passava há 15, 20 ou 25 anos atrás.
Era necessário e premente agir.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Aliás, necessidade que o governo anterior, o governo socialista,
também sentiu quando, em Março do ano 2000, nomeou a chamada Comissão de
Análise e Sistematização da Legislação Laboral, que tinha como objectivo (e
cito) "a acessibilidade dos regimes legais, a necessidade de abrir espaços
à negociação colectiva e, ainda, o propósito de elevar o nível de adequação e
eficiência da legislação laboral (…)".

O Sr. Paulo Pedroso (PS): - Muito bem!

O Orador: - Todos sabemos que ao fim de dois anos - e isto são factos -, ou
seja, até à entrada em funções do actual Governo, esta Comissão limitou-se a
apresentar ao anterior governo, em Setembro de 2001, um número reduzido de
propostas de sistematização e absolutamente nenhuma proposta de alteração da
legislação laboral.
O governo socialista deu como assente a necessidade da reforma, mas não foi
capaz de fazê-la!
Diferentemente, este Governo, perante este imperativo, fez aquilo que se espera
de um governo: agir!

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - E fê-lo de uma forma que não posso deixar de realçar, de uma
forma que se consubstanciou num anteprojecto de código do trabalho que serviu
de documento de suporte, quer para uma ampla discussão pública quer como base
de trabalho ao nível da concertação social;
De uma forma que se traduziu em mais de 130 horas de reuniões à mesa dessa
mesma concertação social;
De uma forma que levou o Sr. Ministro Bagão Félix e o Sr. Secretário de Estado
do Trabalho a percorrerem o País de lés a lés, participando em mais de 120
debates e conferências;
De uma forma que levou o site do Ministério a ser visitado, nestes cerca de
seis meses desde a apresentação do anteprojecto, por mais de meio milhão de
pessoas, contribuindo com a sua opinião e as suas sugestões.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: A proposta de
lei que hoje apreciamos, na generalidade, é fruto de todo este amplo e exemplar
processo de discussão e debate.
Permita-me, pois, Sr. Ministro, em nome do CDS-PP, saudar o processo de diálogo
e abertura, com que V. Ex.ª conduziu toda esta tramitação da reforma da
legislação laboral: uma reforma que permite, finalmente, uma codificação,
obviando as enormes dificuldades de uma legislação até agora dispersa em cerca
de 120 diplomas; uma reforma que vem permitir a adaptação do regime de trabalho
à realidade do mundo laboral, conseguindo, assim, uma maior efectividade do
Direito do Trabalho, pois quanto mais próximo este estiver da realidade mais
garantias são asseguradas ao trabalhador.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Estamos perante uma proposta de lei que reforça a importância
dos direitos de personalidade, que não trata de maneira igual o que é
diferente, premiando a assiduidade e a competência, ou seja, aqueles que, efectivamente,
querem trabalhar.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Uma proposta de lei que acentua a protecção da maternidade e da paternidade,
valores que, incondicionalmente, devem ser protegidos; uma proposta de lei que
aposta no reforço da formação profissional, matéria fundamental para a tão
necessária qualificação.
Uma proposta de lei que acentua a preocupação com o cumprimento das normas de
higiene, saúde e segurança no local de trabalho.
Uma proposta de lei que promove a adaptabilidade e a flexibilidade da disciplina
laboral, nomeadamente, quanto à organização do tempo, espaço e funções
laborais, de modo a aumentar a competitividade da economia, das empresas e o
consequente crescimento do emprego.
Uma proposta de lei que introduz uma maior responsabilização das partes, quer
quanto ao cumprimento do contrato de trabalho quer quanto ao cumprimento da
regulamentação colectiva de trabalho, responsabilização que se traduz pelo
agravamento das sanções disciplinares e pelo aumento das coimas.
É, também, objectivo desta reforma o combate à situação de estagnação em que
vive a contratação colectiva, dinamizando-a, nomeadamente, através da limitação
temporal da sua vigência e da introdução de mecanismos condutores à sua
renegociação.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Esta revisão
da lei laboral tem a consequência de contribuir para um Portugal moderno e
aberto aos desafios da concorrência europeia.
Temos o desafio de adaptar a legislação laboral à realidade dos tempos actuais,
enfrentando as dificuldades estruturais de uma economia comum, colocando a
tónica sobre aspectos, como produtividade, qualidade no trabalho,
competitividade, estabilidade no emprego e, fundamentalmente, no combate ao
desemprego, sem dúvida um dos maiores problemas que enfrentam as novas
sociedades.
É inadiável aproximar o modelo social europeu dos parceiros comunitários,
adequando a legislação laboral às necessidades da nossa economia, criando as
condições para mais e melhor trabalho, mais e melhor produtividade, mais e
melhor investimento e, necessariamente, mais e melhor emprego.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Acresce que, hoje em dia, a questão laboral tem de ter uma visão
da empresa como um todo.
A legislação laboral não pode defender os patrões contra os trabalhadores ou os
trabalhadores contra os patrões, mas, sim, defender a empresa enquanto
comunidade de pessoas e de produção.
Os problemas dos patrões não são destacáveis dos problemas dos trabalhadores
nem os dos trabalhadores são separáveis dos dos patrões.
Sem empresas saudáveis e com lucros, não há trabalhadores com empregos
sustentáveis. Sem trabalhadores motivados e qualificados, não há empresa que
resista!

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados:
Há duas filosofias subjacentes à questão laboral. O modelo de inspiração
marxista, que entende a empresa como um palco privilegiado para o confronto e
conflito permanente, transportando para a empresa uma constante luta de
classes, quase que numa reminiscência histórica, lembrando o século XIX e os
tempos da Revolução Industrial.
Paralelamente a esta concepção, defendida por alguns, há uma filosofia que
assenta em princípios bem distintos e que entende a empresa como um todo,
enquanto comunidade de pessoas e produção, onde o seu interesse legítimo não
obsta a que haja interesses comuns entre os patrões e os trabalhadores. Esta
foi a concepção que triunfou. E esta vitória deve ser partilhada por todas as
correntes ideológicas que partilham princípios como o tripartismo e o da paz
social, do socialismo democrático, passando pela social-democracia, até à
democracia cristã.
Este acordo tripartido, entre entidades patronais, sindicatos e governo, é um
claro exemplo de triunfo desta concepção, onde se alcança a paz social, através
da concertação e do diálogo, permitindo, assim, uma tranquilidade maior nas
relações laborais.
Deste modo, o CDS saúda, uma vez mais, o Governo por este resultado, muito
significativo e de grande importância para este sector e que se traduz na plena
expressão do modelo que sempre defendemos.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada
Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Segurança Social
e do Trabalho, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Há várias
formas de estar no debate sem debater, mesmo falando. Foi o que aconteceu neste
debate com o Sr. Ministro da Segurança Social e do Trabalho, que a perguntas
muito concretas, colocadas, por exemplo, pelo meu camarada Jerónimo de Sousa,
disse nada; e, embora tivesse apelado ao debate da substância, sobre a
substância disse nada.
Esta proposta de lei apareceu, logo desde o início, sob o lema do combate aos
direitos dos trabalhadores - isso é inequívoco! E apareceram os trabalhadores -
e por isso eu disse que a intervenção do Sr. Deputado Manuel Dias Loureiro se
distanciava das várias afirmações que o Sr. Ministro do Trabalho tem feito -
como culpados da baixa produtividade e da baixa competitividade das empresas.
Isto foi o que resultou, logo ao princípio, das afirmações do Sr. Ministro do
Trabalho...

Vozes do PSD: - Não!...

A Oradora: - Foi, sim! E tanto que esta proposta de lei contém disposições
que vão baixar a produtividade. Como as vistas são, às vezes, muito curtas,
pensa-se que, barateando o custo do trabalho, pondo os trabalhadores com
horários desregulamentados, pondo-os a trabalhar de noite, sem o respectivo
pagamento do trabalho nocturno, se baixa o custo do trabalho e se aumenta a
produtividade. Mas é falso! É falso e há estudos, como, por exemplo, o da
Fundação Dublin, que fazem o retrato e tiram conclusões sobre o panorama geral
da situação dos trabalhadores na União Europeia, desde 1990 até ao ano de 2000,
estudos esses que revelam que a flexibilização e a desregulamentação têm
colocado os trabalhadores sob condições de trabalho terríveis, afectados por
graves doenças, de toda a espécie. Se lerem esse estudo, verificarão que está
lá tudo o que temos dito em defesa dos direitos dos trabalhadores.
Neste processo, os trabalhadores apareceram até injustiçados. É que haverá
maior insulto para um trabalhador do que ser apontado como fraudulento, de um
modo geral? O absentismo, que se apontou logo ao princípio, dava a ideia de que
as fraudes não eram situações excepcionais, que devem ser combatidas mas, sim,
habituais entre os trabalhadores.
E não ouvi falar aqui hoje na situação grave em que se encontram os
trabalhadores portugueses, apontada nesse estudo da Fundação Dublin, o qual
salienta que, em Portugal, a maior parte dos trabalhadores está ocupada naquilo
a que a Fundação chama de "trabalho servidão", trabalho não
qualificado. E há outros estudos sobre competitividade, a nível da União
Europeia, que também apontam, em relação a Portugal, a fraca qualificação dos
trabalhadores.
Em Portugal, a maioria dos trabalhadores não tem, de facto, um trabalho decente
e produtivo, como a OIT o define: um trabalho em condições de liberdade, de
equidade, de segurança e de dignidade.
E esta proposta de lei, visando a redução dos custos do factor trabalho (custo
que é o mais baixo da União Europeia), contribui ainda para uma maior
degradação das condições de vida dos trabalhadores!!
Acusamos esta proposta de lei, que constitui uma verdadeira hidra de várias
cabeças e que esconde ainda muitas outras, de ter no seu tronco uma matriz que
contraria o paradigma da nossa Constituição laboral.
A sua matriz é a de considerar que o trabalhador dispõe de liberdade contratual
quando celebra o contrato. Encontramos essa matriz em várias disposições,
nomeadamente naquelas em que se permite que um trabalhador possa celebrar um
contrato individual de trabalho com cláusulas mais desfavoráveis do que as
constantes dos instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho e da
própria lei (caso da mobilidade).
Encontramo-la emblematicamente nas disposições sobre direitos de personalidade,
em que houve o cuidado de proteger, em paralelo (como se estivessem em
igualdade) com os direitos dos trabalhadores, os direitos dos empregadores.
Acusamos esta hidra de trazer numa das suas cabeças uma ainda maior
precarização das relações laborais e uma precarização ainda maior no que toca
ao emprego jovem.
E não são as últimas negociações com dois parceiros sociais que vieram modificar
substancialmente este quadro. Essa última negociação, que pode ter um ou outro
ponto positivo, não altera o retrocesso social que resultará desta proposta de
lei. Nesse acordo, chega mesmo a fazer-se uma afirmação num número de um
artigo, que se reduz logo no número seguinte. É o que acontece com os contratos
a prazo que, afinal, não vão ficar em três anos mas, sim, em seis anos.
Acusamos esta hidra de várias cabeças de trazer numa delas uma maior
desregulamentação, já aqui referida, do horário de trabalho, havendo semanas em
que se trabalha 50 horas, 10 horas por dia, e permitindo-se que, por
contratação colectiva, se aumente os horários semanais para 60 horas, 12 horas
por dia, com um aceno amigável, claro, para a CIP!...
Acusamos a proposta de lei de contribuir também para a flexibilização, com a
alteração dos limites do trabalho nocturno, numa clara submissão dos
trabalhadores a uma organização de trabalho puramente ditada pelas regras do
mercado.
Acusamos esta proposta de lei de brandir, numa das suas cabeças, ferozes
ataques aos direitos conquistados pelos trabalhadores em contratação colectiva,
quando prevê a caducidade de convenções antes de serem substituídas por outras.

Acusamos a proposta de lei de enveredar, desta forma, pela individualização
das relações laborais, limitando o direito à contratação colectiva,
individualização que se reforça com o tal acordo relativamente ao artigo 15.º
do diploma preambular, já aqui referido pelo meu camarada Jerónimo de Sousa.
Acusamos esta proposta de lei, ainda quanto ao direito à contratação colectiva,
de violar a Convenção 98 da OIT ao prever, na forma por que o faz, a arbitragem
obrigatória.
Acusamos ainda esta hidra, que saiu à rua, com pompa e circunstância, mascarada
de código, de trazer numa das suas cabeças restrições inconstitucionais ao
direito à greve, na fixação de serviços máximos em vez de serviços mínimos,
violando a autonomia dos trabalhadores consagrada na Constituição, no próprio
regime de definição dos serviços mínimos, aniquilando o direito nas greves que
visem a satisfação de interesses meramente laborais.
Acusamos ainda esta hidra: de pôr em causa e violar o princípio constitucional
de proibição dos despedimentos sem justa causa, ao permitir, em certos casos, a
substituição da reintegração por indemnização; de permitir restrições a
direitos fundamentais dos cidadãos trabalhadores nas empresas, submetendo esses
direitos à definição pelo empregador do normal funcionamento da empresa; de
permitir a maior devassa da vida privada dos trabalhadores, admitindo que a
entidade patronal recolha informações sobre a gravidez de trabalhadora ou
candidata a emprego, sobre doenças genéticas, sobre os antecedentes biológicos
do trabalhador, sobre a sua origem ética ou racial, sobre orientação sexual; de
tornar impossível, com a flexibilização, a conciliação da vida familiar com a
vida profissional; de tornar possível a discriminação em razão do sexo, com o
conceito de retribuição.
Acusamos ainda a proposta de lei: de contribuir para a desqualificação do trabalho
com um novo regime de mobilidade funcional; de ser motor de degradação da vida
familiar, com a flexibilização e com a mobilidade.
Foram estas e outras acusações, que não cabem no tempo de que dispomos, que os
trabalhadores fizeram na greve geral. E a evolução do debate demonstrou que
vale a pena lutar e que a luta tem de prosseguir.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada
Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Membros do
Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Esta proposta de lei constitui uma das maiores
afrontas à Constituição da República Portuguesa e um verdadeiro retrocesso nos
direitos conquistados pelos cidadãos no que diz respeito à legislação laboral.
Da violação do princípio constitucional da segurança no emprego, com o
alargamento da contratação a termo, passando pela violação do princípio da
proibição dos despedimentos sem justa causa, com a não integração do
trabalhador em caso de despedimento declarado ilícito, até ao condicionamento
da acção dos representantes eleitos dos trabalhadores, até à restrição do
direito de contratação colectiva, até à restrição do direito à greve, entre
outros, o desrespeito pela Constituição é intolerável.
Esta proposta de lei, de revisão da legislação laboral, tem alguns objectivos
centrais que importa denunciar: trabalho como um custo a ser urgentemente
reduzido, à custa da precariedade, do desemprego, da debilidade dos sindicatos,
dos menores salários e da consequente curva descendente de condições de vida,
gerando e acentuando a insegurança no futuro da grande maioria das famílias.
Argumenta o Sr. Ministro que se trata de dar uma oportunidade aos jovens. Qual
é o jovem, Sr. Ministro, que quer a garantia de emprego precário? Qual é o
jovem que quer a perspectiva da insegurança no emprego? Qual é o jovem que
deseja uma vida de baixos salários? Qual é o jovem que pensa em ter uma casa,
ter autonomia, ter filhos e que não sabe se tem emprego, ou tendo-o não tem
garantia no seu emprego? Qual é o jovem que perspectiva com desejo uma vida de
ameaça a troco de emprego e de submissão total à vontade da empresa para
definição de horários, locais e condições de trabalho?
O Sr. Ministro não devia atrever-se a acenar a bandeira dos jovens, porque os
jovens de hoje, como os de ontem, como os de amanhã, querem ter segurança na
sua vida e os senhores negam-lhes isso, e, pior, retiram-lhes isso à força.
Num País onde os contratos a prazo já são superiores à média europeia, o
Governo pretende generalizá-los, intensificá-los, quando em diferentes estudos
realizados a estabilidade no emprego é revelada como o valor mais importante
associado ao trabalho.
Mas o grande pretexto do Governo para a apresentação desta proposta reside na
competitividade e na produtividade. Que ousadia, Sr. Ministro, considerar que
os trabalhadores são obstáculo ao sucesso das empresas! Que ousadia considerar
que os trabalhadores querem o fracasso da empresa! Atrever-se-á o Sr. Ministro
a negar que os trabalhadores lutam até ao limite pelo sucesso das suas
empresas, cujos empresários, tantas vezes, insistem na deslocalização das
mesmas por motivos sobejamente conhecidos e alheios à acção dos trabalhadores e
ao exercício dos seus direitos?!
Veja-se o caso da Clarks, em Castelo de Paiva. O ciclo vicioso em que os
senhores insistem em "mergulhar" é a grande causa de encerramento de
muitas empresas e, igualmente, de fracasso de uma política social necessária.
Baixos salários e precarização geram tendência para mudança de emprego e aumento
de níveis de rotatividade no emprego.
Este facto gera inexistência de formação profissional aos largos trabalhadores
contratados a termo e isso gera, também, mais baixas qualificações, menos know
how, o que, por sua vez, é causa de mais baixa capacidade de inovação das
empresas gerando, desta feita, mais baixo investimento.
Isto, confrontado com baixos preços, é o vosso contributo para o convite ao
encerramento ou à deslocalização das empresas.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Afinal, Sr. Ministro, as medidas que os senhores propõem poderão
mesmo é acentuar problemas de competitividade e de produtividade, não só pelo
ciclo vicioso focado, mas porque, simultaneamente, ignoram questões de
capacidade de gestão, de qualificação, de investigação, de novas formas de
produção, e por aí fora.
De facto, o Sr. Ministro nunca conseguiu explicar como é que há empresas em
Portugal que conseguem obter altos níveis de produtividade com a actual
legislação em vigor. É que o problema não reside onde o Sr. Ministro diz que
reside.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, esta proposta do Governo tem um objectivo
claro: fragilizar os direitos dos trabalhadores e as suas estruturas
representativas para dar toda a margem de manobra aos empresários.
As implicações desta proposta para a vida dos trabalhadores são dramáticas,
também no que respeita à compatibilização da vida familiar com a vida
profissional: numa semana podem trabalhar até às 50 ou 60 horas e até 10 ou 12
horas por dia, desregulando todos os mecanismos de apoio e de acompanhamento
familiar.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - O Governo quer o trabalhador ao serviço da empresa; o resto,
entenda-se também a família, vem por acréscimo. Que grande protecção às
famílias portuguesas, Sr. Ministro!
Mas para as mulheres propõem-se outras alternativas, também para
compatibilização da sua vida profissional com o trabalho doméstico e a vida
familiar: o trabalho a tempo parcial. Conhecem-se bem os efeitos desta
modalidade de trabalho noutros países, onde já está generalizado, nomeadamente
com a reduzidíssima ou mesmo impossível oportunidade de progressão na carreira
ou com os consequentes salários reduzidos, criando maior dependência económica
das mulheres.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - Esta é a vossa visão de família, visão retrógrada de homem como
ganha-pão da família e a mulher de regresso a casa, remetida ao espaço privado
e aos cuidados da família. Certamente, não se trata do respeito pela
Constituição da República Portuguesa mas, sim, de outra Constituição, a de
1933, que, no seu artigo 5.º, bem delineava, assim, o papel da mulher na
sociedade.
Como insustentável, Sr. Ministro, é aquilo que está previsto no artigo 16.º da
proposta de lei, que permite que a empresa averigúe sobre a gravidez ou a
potencial gravidez das trabalhadoras, permitindo que esta se intrometa de modo
inaceitável na vida privada dos trabalhadores, norma escandalosa num Estado
democrático.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, o seu tempo esgotou-se. Peço-lhe para
concluir.

A Oradora: - Sr. Presidente, termino dizendo: o Sr. Ministro acena a
bandeira da modernidade, mas modernizar não é fazer com que as pessoas sejam
travadas na sua acção pelo medo, que aceitem tudo, que se sujeitem a tudo no
trabalho pelo medo de perder o emprego. Isso foi próprio de tempos que já lá
vão!
O Sr. Ministro joga, nesta proposta, com a ainda maior força da parte mais
forte na relação de trabalho e com o medo da parte mais fraca, não joga com
regras de liberdade e de igualdade. Isso não é sinal de progresso, Sr.
Ministro, é exactamente o contrário.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Sónia Fertuzinhos.

A Sr.ª Sónia Fertuzinhos (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo,
Sr.as e Srs. Deputados: Em matéria de igualdade entre mulheres e homens e em
matéria de protecção da maternidade e da paternidade e da família, esta
proposta de código do trabalho envergonha o Governo e o País. E, muito especialmente,
deveria envergonhar o Ministro, que se proclama defensor das famílias e das
pessoas.

O Sr. Artur Penedos (PS): - É verdade!

A Oradora: - Da primeira à última versão desta proposta, o Governo foi
obrigado a reconhecer e a corrigir algumas das falhas mais básicas e
inaceitáveis em matéria de direitos da paternidade e da maternidade e de
igualdade de género.
No entanto, a proposta que hoje discutimos, mesmo tendo em conta essas
alterações, consegue ficar ainda aquém das normas actualmente em vigor na ordem
jurídica portuguesa, das directivas da União Europeia aplicáveis e de vários
acordos internacionais, aos quais Portugal se encontra vinculado.
Em matéria de igualdade de género, esta proposta do código do trabalho
apresenta três defeitos genéticos, absolutamente lamentáveis: a subordinação da
igualdade de género às outras igualdades e uma permanente confusão entre
igualdade e não discriminação; a omissão flagrante do chamado princípio de main
streaming, ou de transversalidade, e da sua concretização; a ausência da noção
e promoção da conciliação entre vida profissional e familiar para as mulheres e
para os homens, ainda que na versão final do Governo, que os grupos
parlamentares da maioria se encarregarão de apresentar como suas, possa haver a
introdução do princípio da conciliação relativamente ao tempo de trabalho.
Desenganem-se os que pensam que este assunto só diz respeito e só prejudica as
mulheres. Não é verdade, todos perdem: mulheres, homens, crianças!

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - Perdem as famílias e a sociedade, que se confronta com a
degradação da qualidade de vida e de direitos essenciais, fruto de uma
organização social que perde eficiência e produtividade porque não se organiza
em função da realização pessoal do género, ou seja, das mulheres e dos homens
que a compõem.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - Sr. Ministro, como é que fica, com esta proposta, a promoção da
igualdade de género? Onde é que fica o compromisso assumido no Programa do
Governo, nestas matérias?

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - Sr.as e Srs. Deputados: o Governo começou por ignorar completa
e despudoradamente a necessidade da conciliação entre a vida profissional e
familiar. Ora, a Constituição impõe a obrigatoriedade de se proceder à
organização do trabalho, e não apenas do tempo de trabalho, tendo em conta a
conciliação da vida profissional com a vida familiar.
Mas a conciliação não tem que ver apenas com o trabalho, sendo essencial a
promoção da partilha de responsabilidades. Se as mulheres são prejudicadas no
exercício dos seus direitos de participação na vida pública, os homens são
prejudicados no exercício dos seus direitos de participação na vida familiar.
Com esta proposta de código do trabalho há um desencorajamento claro ao
exercício dos direitos de paternidade. Vejamos três exemplos: a supressão do
direito à licença parental de 15 dias remunerada; a supressão da proibição de
transmissibilidade do direito à licença parental; o recuo do Governo quanto à
irrenunciabilidade da licença por paternidade de cinco dias.
Na verdade, o Governo deve ter-se esquecido do que aprovou, em Novembro de
2002, no Plano Nacional de Emprego que refere, na medida 18.5 do IV Pilar, a
obrigatoriedade do gozo da licença por paternidade de cinco dias. O PS
apresentará uma proposta, em sede de especialidade, que corrigirá este lapso do
Governo e a maioria terá uma oportunidade de votar a favor, numa atitude de
coerência com o referido Plano Nacional de Emprego.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Esta proposta do código
também contribui para a precarização da situação das mulheres no mercado de
trabalho. Por exemplo, não prevê a suspensão da licença por maternidade em
situação de internamento hospitalar. Atribui a isenção do trabalho suplementar
só às mães, sendo exemplo mais gritante a desprotecção das grávidas, puérperas
e lactantes, em caso de despedimento, tal como consta no artigo 50.º da
proposta do Governo.
Quanto é que o País ganha, Sr. Ministro, em produtividade, com este tipo de
medidas?

O Sr. António Costa (PS): - Zero!

A Oradora: - É assim que pensa incentivar o aumento da natalidade?
Finalmente, Sr. Ministro e Srs. Deputados, esta proposta de código do trabalho
nem sequer é coerente com o Programa do Governo em matéria de igualdade de
género, de apoio à família e de conciliação. E também consegue esquecer, de uma
penada, as boas intenções personalistas e de inovação apregoadas no preâmbulo
da proposta de lei.
Resumindo: esta proposta de lei viola a Constituição e o direito comunitário;
ofende direitos sociais e económicos dos portugueses; despreza a dimensão
integral dos seres humanos; prejudica gravemente as famílias - é que os
trabalhadores e as trabalhadoras têm família! -; agrava as condições que
contribuem para o declínio da natalidade dos portugueses e, em última análise,
põe em causa o desenvolvimento equilibrado da nossa sociedade. É por tudo isto
que o Grupo Parlamentar do PS não pode votar favoravelmente esta proposta de
lei.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Strecht.

O Sr. Jorge Strecht (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e
Srs. Deputados: Esta proposta, os senhores reconhecerão, o próprio Governo o
reconhece, é uma falácia! E é-o por uma razão simples: é que dizem que
negociaram outra proposta, já depois desta proposta ter entrado no Parlamento.
Se estivessem de boa-fé e quisessem, realmente, discutir com os outros grupos
parlamentares, teriam mandado dar entrada no Parlamento da tal proposta que
dizem estar concertada com um parceiro, que é a UGT.
Os senhores sabem muitíssimo bem que quem fez a afirmação mais dura contra esta
proposta foi o Secretário-Geral da UGT, que disse que ela era um ajuste de
contas com o 25 de Abril. Foi o Secretário-Geral da UGT que o disse, não foi o
da CGTP!
Mais: contra esta proposta concreta está a CGTP, a UGT e todos os demais
sindicatos deste País. Todos a repudiaram!
O que o Sr. Ministro aqui veio dizer foi que, depois da entrada desta proposta,
uma outra, que ignoramos, terá um eventual compromisso; mas mesmo essa outra,
de que deveriam ter dado entrada neste Parlamento e não deram - agiram
claramente com reserva mental -, repito, mesmo essa, suscita da parte da UGT os
reparos que já aqui foram lidos e deveriam ter sido ouvidos pelos Srs.
Deputados da maioria, dizendo que não obstante o recuo da proposta inicial do
Governo, mesmo assim, a proposta era globalmente negativa e não era aceite.
Portanto, é falso tudo o que aqui estiveram a dizer todo este tempo.
Mais: é pura perda para este Parlamento, porque, afinal, debateremos,
provavelmente, uma proposta que ignoramos. Deveriam, ao menos, ter tido a
coragem de retirar a proposta que entrou, avançando com a nova proposta, para
então a debatermos.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Os senhores tinham consciência plena que a primeira proposta
está eivada de várias inconstitucionalidades, mas não nó, vai contra a matriz
da Constituição no que toca às relações laborais.
Mais grave, ainda: os senhores sabem que esta é uma contra-reforma e não uma
reforma, pois sabem que a reforma, no plano laboral, tem sido, ao longo de
dezenas de anos, o acréscimo sucessivo dos direitos sociais conquistados
durante as vigências de tantos governos diferentes e sabem muito bem que para o
modelo social europeu contribuíram democratas-cristãos, verdadeiros
sociais-democratas e socialistas. Portanto, os senhores apelam ao voto nesta
proposta contra alguns de vocês próprios: os que se dizem
personalistas-cristãos, os que se dizem verdadeiros democratas-cristãos e os
que se dizem sociais-democratas votarão, silenciosa e cumplicemente, esta
proposta concreta que os senhores aqui apresentaram e não a outra, que não
conhecemos e não podemos debater.
Seria, aliás, absurdo que o PS votasse esta proposta, porque nem os senhores a
vão votar. Os senhores dizem que vão votar uma outra proposta que há-de vir, de
um compromisso tripartido.
Repito: por isto, esta proposta é uma falácia e, se mais que não houvesse,
merecia, evidentemente, a recusa da aprovação do Partido Socialista.
Portanto, se quiserem, retirem-na, apresentem a nova proposta que os senhores
dizem que têm, e, então, debateremos seriamente a vossa proposta.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não há mais oradores inscritos para o
debate.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Lino de Carvalho, pede a palavra para que
efeito?

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, pensávamos que havia mais
oradores inscritos e que o debate iria continuar. Em todo o caso, gostaríamos
de usar os 49 segundos de que ainda dispomos para uma segunda intervenção, que
será feita pelo Sr. Deputado Jerónimo de Sousa.

Risos.

O Sr. Presidente: - Nesse caso, para uma intervenção, tem a palavra o Sr.
Deputado Jerónimo de Sousa.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Sr. Presidente, aproveitando os 49 segundos
de que ainda disponho e as pequenas tolerâncias da sua disponibilidade
democrática, queria apenas tecer uma consideração final.
Este debate manteve um equívoco até ao fim. Tanto a bancada do PSD como o Sr.
Ministro do Trabalho não foram capazes de responder a uma questão colocada pelo
próprio Ministro do Trabalho. De facto, não fomos à substância, ficámos por
declarações mais ou menos bem intencionadas, e ficou aqui claramente
demonstrado - foi a demonstração mais clara que aqui surgiu disso, que
perpassou por momentos - que este Governo hostilizou quem usa os direitos, quem
os defende, exercendo-os, hostilizou o cidadão, o trabalhador que luta e que
conquistou esses mesmos direitos que os senhores querem pôr em causa.
Naturalmente, muita água vai correr sob as pontes, mas este Governo ficará, com
certeza, com o "ferrete" histórico de ser responsável pelo retrocesso
da legislação do trabalho, que constitui um avanço da civilização humana. Fica
esta marca, mas com certeza que, um dia, os trabalhadores haverão de recuperar
esses direitos agora ameaçados.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, nestes momentos finais de debate
"chovem" sempre as inscrições.
Também para uma intervenção, tem agora a palavra o Sr. Ministro da Segurança
Social e do Trabalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Quer falar sem ser questionado!

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - E não pode?!

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Tem receio das perguntas! Tem receio e quer
ser o último a falar!

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Ainda mais questionado do que
foi há bocado?!

O Sr. Ministro da Segurança Social e do Trabalho: - Sr. Presidente, Sr.as e
Srs. Deputados: Creio que o facto de o Governo ter apresentado esta proposta de
lei de código do trabalho, ao contrário do que os Srs. Deputados estão a
sugerir, significa que não temos absolutamente nenhum receio.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Mas esteve à espera que se esgotasse o tempo
de debate!

O Orador: - Sobretudo, temos a consciência de que é preciso mudar perante os
momentos históricos que o País atravessa.
Esta proposta de lei que acabou de ser discutida, na generalidade,
consubstancia uma importante reforma estrutural a que o Governo se propôs com
coragem, sentido de equilíbrio, justeza, inconformismo e espírito aberto.
Sabíamos de antemão das reacções e incompreensões que iríamos enfrentar e que,
aliás, ficaram hoje aqui bem evidenciadas com a posição tomada pelas oposições,
defensoras, em maior ou menor grau, do imobilismo, reveladoras da incapacidade
de ver que tudo mudou à nossa volta e imbuídas do carácter inquinado com que
perspectivam a ideia de empresa (a ideia de empresa que o Sr. Deputado Dias
Loureiro tão bem traduziu), ou ainda alimentadas pela serôdia saudade da luta
de classes, que já não é o que gostariam que continuasse a ser.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Perante a falta de argumentos para contrariar uma reforma
equilibrada, viraram-se para a tentação dos chavões de elevada usura e para os
espantalhos redutores e superficiais.
No essencial, perante reformas de fundo como esta, recriam os seus próprios
fantasmas. E não admira que tenham pesadelos, vendo neoliberalismo por todo o
lado, não resistindo à oca e ignorante comparação da americanização laboral, ou
ao cliché sempre imprescindível do economicismo, ou exprimindo ainda visões
mais delirantes, como sejam as acusações de ajuste de contas com o 25 de Abril
ou o regresso - pasme-se! - ao século XIX.

O Sr. Artur Penedos (PS): - Basta ouvir as suas declarações!

O Orador: - Nada disto vai acontecer, Srs. Deputados!
Portugal vai ter, certamente, uma legislação laboral que favorecerá a confiança
dos agentes investidores, a dignificação do trabalho e a defesa dos
trabalhadores. Não será uma legislação do "ou oito ou oitenta", do
"ou tudo ou nada", mas estamos absolutamente convictos de que é uma
reforma que nos coloca mais perto dos nossos parceiros e concorrentes, que
acaba com o pântano de leis fixistas, desajustadas e estáticas, que concilia
com justiça e sentido de eficácia os diversos e legítimos interesses em causa.

O Sr. António Costa (PS): - Os investidores têm dado sinais disso!…

O Orador: - Do Partido Socialista, cuja posição, aliás, não se percebeu
neste debate - uns chamaram-lhe "nado-morto", outros
"contra-reforma"; uns chamaram-lhe "míssil", outros
"operações de cosmética", enfim, não se chegou a perceber! - …

Protestos do PS.

… e, apesar de ter custado muito ao Partido Socialista aceitar o compromisso
firmado com os parceiros sociais (sei que é difícil, para vós,
"engolir" esse facto, sei que é bem difícil…

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Deve ser duro!

O Sr. Eduardo Ferro Rodrigues (PS): - Nós não "engolimos" nada!

O Orador: - … e bem gostariam que não tivesse havido esse acordo), apesar de
tudo, do Partido Socialista esperamos sentido de responsabilidade e
manifestação de saudável coerência, pois, como dizia na altura o então Ministro
Paulo Pedroso, em entrevista de 8 de Novembro de 2001 (não há muito tempo!),
"a questão da legislação do trabalho não deve ser uma questão de
bandeiras, deve ser uma questão concreta".

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - E acrescentava: "Acho que uma atitude de esquerda não se
mede na grandiosidade dos discursos, mede-se numa prática transformadora".

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Pelos vistos, não querem a prática transformadora!… E disse
ainda que o nosso Direito do Trabalho é bastante confuso.

O Sr. António Costa (PS): - E consegue ficar pior, o que é extraordinário!

O Orador: - Este código não é, Srs. Deputados, uma reforma contra ninguém;
antes é, em primeiro lugar, uma reforma por Portugal e pela superação de
factores estruturais causadores de pobreza relativa do nosso país; é uma reforma
ao mesmo tempo equilibrada e ousada, que atende à sua malha empresarial e à
condição de vida dos que trabalham, reforça o sentido de responsabilidade
pessoal e social dos empresários e dos trabalhadores e estimula as novas
gerações de empresários e os jovens para gerarem e partilharem mais riqueza num
eficiente e solidário mercado.
Quebra-se, Srs. Deputados, deste modo um "muro de Berlim" no
ordenamento juslaboral, ao mesmo que se proporcionam novas pontes para o
desenvolvimento sustentado da nossa economia. Esta reforma, ao contrário do que
aqui foi afirmado pelas oposições, vai nascer de boa saúde, não vai pedir
atestado médico para entrar de baixa ou num coma profundo, como aconteceu nos
seis anos de governação socialista.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Não precisou de cesariana, de uma qualquer operação cosmética,
de um qualquer livro, comissão ou grupo de trabalho para se concretizar
depressa e bem.

O Sr. António Costa (PS): - Mas olhe que fez mal!

O Orador: - Não foi precipitadamente abortada com medo de uma qualquer
pseudo-greve geral.
Ela está aí para dar início a uma nova fase no mercado de trabalho, para
erradicar a irresponsabilidade, a inércia, a indiferença, a acomodação
anestesiante; para construir a esperança da grande maioria dos portugueses
cansados da indecisão, do "deixa andar", da verbalização do conteúdo
e dos pseudo-visionários do passado.

O Sr. Patinha Antão (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Não confundimos os megafones e os holofotes das organizações ou
de grupos que "pavlovianamente" sempre contestam a mudança com a
opinião maioritária dos portugueses. O que os portugueses pensam disseram-no há
meses, nas urnas eleitorais.

O Sr. António Costa (PS): - O código do trabalho foi a votos?!

O Orador: - E com isso as bancadas da oposição não se conformam! É natural
que não se conformem, mas têm de aguentar, por respeito pelos valores
democráticos.
Foi em nome do povo português que o Governo apresentou esta proposta de lei. É
em seu nome que continuará a trabalhar, sem desfalecimento, por um Portugal
melhor, por um Portugal de esperança, de confiança e de futuro.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana
Drago.

A Sr.ª Ana Drago (BE): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Segurança Social e
do Trabalho, V. Ex.ª é, de facto, um homem extraordinário: honra o debate
democrático trazendo escrito à máquina o discurso de conclusões sobre o que foi
o debate ao longo desta tarde!

Aplausos do BE, do PS, do PCP e de Os Verdes.

É extraordinária a sua capacidade de previsão! Como são extraordinários os
argumentos que o Sr. Ministro usou hoje, argumentos que usou desde o início da
discussão da legislação do código do trabalho. De facto, o Sr. Ministro sempre
justificou a necessidade deste código do trabalho com os piores argumentos.
Durante meses, o Sr. Ministro insinuou que o problema dos trabalhadores
portugueses é o de trabalharem pouco, quando sabemos que, em média, os
trabalhadores portugueses trabalham mais do que os seus congéneres europeus,
pelo que não está aí o drama da produtividade.
Em segundo lugar, o Sr. Ministro sempre alegou que o problema da legislação
laboral portuguesa era o de ser demasiado rígida. Ora, o que as estatísticas
revelam - se o Sr. Ministro não sabia disso no início da discussão do código do
trabalho, agora já deveria saber - é que Portugal tem a força de trabalho mais
precarizada da Europa. Essa é que é a realidade!
O Sr. Ministro insinuou ainda que, no fundo, a legislação vigente sobre as
relações de trabalho era demasiado garantística, dava demasiados direitos,
quando sabemos que o drama do Direito do Trabalho na realidade portuguesa é o
da sua fraca aplicabilidade na prática. Eram estes os problemas a que uma
modernização da legislação do trabalho deveria ter respondido.

Esta tarde, bem como ao longo dos últimos meses, dissemos ao Sr. Ministro e
ao Sr. Secretário de Estado do Trabalho que esta proposta de código do trabalho
conduz à precarização das relações laborais, à desprotecção dos trabalhadores,
ao aniquilamento da negociação e da contratação colectiva e à desestruturação
da vida familiar e da vida privada dos trabalhadores portugueses. Mas o Sr.
Ministro - o Governo - não quis ouvir, "fez orelhas moucas"!
Era necessária uma proposta de código do trabalho que fosse capaz, de facto, de
modernizar as relações de trabalho em Portugal, nomeadamente, tal como referi
na minha intervenção anterior, através da fixação de um subsídio que permitisse
o gozo da licença parental e da licença especial de assistência a filhos e
adoptandos, situação que não está prevista na legislação actual. Essa, sim, é
que seria verdadeiramente uma medida de protecção à família.
Modernizar a legislação laboral, em Portugal, é permitir uma redução da
contratação a prazo, porque ela é totalmente desestruturadora das expectativas
de vida dos trabalhadores portugueses; modernizar a legislação do trabalho em
Portugal é estabelecer mecanismos que sejam capazes de dar efectividade à
igualdade e à não discriminação e não fazer afirmações genéricas, como as que
estão inscritas no código do trabalho; modernizar a legislação laboral em
Portugal seria nada mais, nada menos do que caminhar em direcção a uma redução
do horário de trabalho para 35 horas, porque isso, sim, é que dá qualidade de
vida e permite participação democrática, direito ao trabalho, direito à vida
familiar e direito ao lazer.
Ao fim de vários meses de discussão, ao fim de vários contraditórios de
opinião, depois de ouvirmos aqui e na comunicação social as opiniões, as críticas,
os erros que foram apontados a esta proposta de código do trabalho, o Sr.
Ministro apresentou ao País, há poucos dias, um acordo tripartido, assinado por
alguns parceiros socais. Porém, a única novidade de vulto que o Sr. Ministro
soube apresentar ao País, depois de todas as propostas e sugestões que lhe
foram feitas, foi a de introduzir a possibilidade de o Estado financiar as
associações sindicais e as associações patronais. Não percebemos, Sr. Ministro,
como é que esta medida vai ao encontro da competitividade e à produtividade da
economia portuguesa.
Mas, acima de tudo, hoje, o Sr. Ministro assumiu politicamente o seu projecto
de desprotecção aos trabalhadores e não soube responder que parceiro social
apresentou a proposta relativa a este financiamento do Estado nem, numa maré de
tempos de contenção, qual é o impacto orçamental de uma medida deste género.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Rui Cunha concorre ao Guinness da
intervenção parlamentar mais curta, candidatando-se a 12 segundos de
intervenção.
Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Rui Cunha (PS): - Sr. Presidente e Srs. Deputados: Queria apenas
manifestar todo o interesse do Partido Socialista em que as propostas
anunciadas pelo Governo na noite do passado dia 8 - em contraposição, aliás, às
promessas aqui feitas em sede de discussão da apresentação do Programa do
Governo, uma vez que o Sr. Primeiro-Ministro garantiu que o Parlamento seria
sempre o primeiro a receber as informações do Governo - sejam distribuídas
pelas várias bancadas o mais rapidamente possível, para que possamos, desde já
e com todo o interesse, começar a trabalhar na especialidade.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado
Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo,
Sr.as e Srs. Deputados: Hoje será uma data memorável…

Vozes do PS: - Histórica!…

O Orador: - … para a Assembleia da República e para o País.

Vozes do PCP: - Nomeadamente para os trabalhadores!

O Orador: - Já estamos habituados a que o Partido Socialista chegue
sistematicamente atrasado à História,…

Protestos do PS.

… tal como estamos habituados a que o Bloco de Esquerda e o PCP pensem que a
História parou!

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Quem pensa assim são os senhores!

O Orador: - Mas a realidade é outra.

Protestos do PCP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, peço-lhes um pouco de silêncio para
podermos ouvir o orador.

O Orador: - A posição do Governo e dos grupos parlamentares que integram a
maioria ficou muito clara através das intervenções do Sr. Ministro da Segurança
Social e do Trabalho e dos Srs. Deputado Álvaro Castello-Branco e Dias
Loureiro.
Temos a perfeita consciência de que os problemas do País e os problemas em que
se insere, em termos do tecido empresarial, a componente trabalho não
constituem as únicas chaves das questões da competitividade e da produtividade,
num mundo cada vez mais globalizado em que vivemos.
Mas também temos a consciência de que não era possível continuar com legislação
do regime corporativo, associada a soluções estatistas do PREC, para poder
assegurar a Portugal o desenvolvimento, a competitividade e a produtividade que
temos de dar à nossa economia.

Protestos do PS e do PCP.

E esta lei dá o sinal adequado a esse desiderato.
Os senhores têm a tendência para reivindicar para vós próprios o espírito de
diálogo e acusarem a maioria de autoritarismo. Realmente, temos uma diferença
em relação a VV. Ex.as…

O Sr. António Costa (PS): - Ainda bem!

O Orador: - … no que diz respeito ao diálogo: não o usamos como forma de
adiar, de protelar, de arrastar, usamo-lo como instrumento de decisão em
concertação social.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Usámo-lo com êxito e com sucesso neste acordo tripartido.

O Sr. Artur Penedos (PS): - É falso!

O Orador: - Em termos de relação Governo/oposição podia dizer que é com
satisfação que vejo esse passo negativo do Partido Socialista, mas em termos da
nossa democracia é doloroso. Em termos institucionais, é lamentável que, entre
a UGT e a CGTP, o Partido Socialista, nessa estratégia, tenha optado pela CGTP,
encostando-se ao Bloco de Esquerda e ao PCP.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Em termos institucionais, é lamentável que o maior partido da
oposição tenha optado por esta solução.
Bem sei que essa não era a posição unânime do Partido Socialista e vi a timidez
com que o Deputado José Sócrates fazia um simulacro de aplausos ao Deputado
Paulo Pedroso. Coitado, quase que não juntava as mãos quando, olhando para os
lados, via alguns entusiasmos relativamente ao aplauso da intervenção.

Protestos do PS.

Seguramente, o Deputado José Sócrates não ficou com as mãos a doer de
aplaudir o Deputado Paulo Pedroso, que parecia ser o único a querer viabilizar
esta lei.

Protestos do PS.

Isto é muito próprio do Partido Socialista. O Partido Socialista
ziguezagueava quando estava no governo e continua agora a ziguezaguear na
oposição. É um instinto que lhe ficou e do qual já não se consegue libertar em
nenhuma das posições, quer esteja no governo quer esteja na oposição.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, o caminho que o Governo
tomou, na discussão e na preparação desta lei, é um caminho que temos de
louvar. Como aqui já foi reconhecido, foram governos do PSD que deram passos
importantes na concertação social. Esta foi, com o devido respeito, uma das
poucas coisas acertadas que o Deputado Paulo Pedroso disse na sua intervenção.

Protestos do PS.

Foi na linha dessa preocupação que se escolheu este caminho da concertação
social, e com sucesso.
Queria, pois, em nome do Grupo Parlamentar do PSD, saudar o Sr. Ministro e o
Governo por esse caminho e por essa opção, porque demonstra ao País que a ideia
de diálogo do passado, que era a de enrolar, arrastar e atrasar, não é de
seguir. É possível e desejável fazê-lo, com êxito e com sucesso.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Ontem um jornalista dizia-me: "Os senhores vão discutir na
Assembleia da República a proposta de lei do código do trabalho e parece que
estão anunciadas, fora da Assembleia, uma séria de manifestações da CGTP, que
já anunciou mais greves e mais manifestações." Eu respondi-lhe que vivemos
em democracia e que em democracia há três coisas sagradas: a vontade popular
expressa nas urnas, a aprovação do Programa do Governo decorrente desse
resultado eleitoral e a execução desse Programa. Para além disso, há ainda
outra coisa sagrada em democracia: a liberdade de expressão e de manifestação
das pessoas e o direito à greve. Mas há uma hierarquia. Respeitamos essas
manifestações, mas não aceitamos nem deixaremos nunca que elas sejam um factor
que subverta este respeito pela vontade popular que é aqui respeitada nesta
instituição, e é nesse caminho que vamos prosseguir.
Sr. Ministro, bem-haja por mais este passo a favor de Portugal, em benefício do
nosso país, em benefício da modernização da nossa economia, em benefício dos
portugueses.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. António Costa (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. António Costa (PS): - Sr. Presidente, ainda não estou bem ambientado
com o novo Regimento, mas presumo que seja para defesa da consideração da
bancada.

O Sr. Presidente: - E qual é a razão do seu agravo, Sr. Deputado?

O Sr. António Costa (PS): - Foi uma indelicadeza e descortesia do Sr.
Deputado Guilherme Silva. Seria admissível a qualquer outro Sr. Deputado, mas
não pode ser admissível ao líder de uma bancada parlamentar a referência que
foi feita ao meu camarada José Sócrates.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. António Costa (PS): - Sr. Deputado Guilherme Silva, creio que não terá
dificuldade em reconhecer que as referências que fez ao Deputado José Sócrates
foi um excesso que manifestamente não é aceitável. É deselegante, é descortês e
não corresponde à verdade substancial daquilo que quis insinuar.
O Sr. Deputado Guilherme Silva anda há muitos anos na vida política e devia ter
a prudência de saber que nem tudo o que se lê nos jornais corresponde à
realidade. E, neste caso, não corresponde à realidade.
Lamento, sobretudo, que essa referência tenha sido feita no primeiro momento em
que o Deputado José Sócrates já não estava aqui sentado na primeira fila,
quando esteve largas horas, durante a tarde,…

Vozes do PSD: - Já cá está!

O Orador: - … e se retirou para as filas de trás, por razões normais de
rotação da primeira fila.
Sr. Deputado Guilherme Silva, o que é essencial em toda esta encenação à volta
deste debate e desta temática, e que devia ser tema de reflexão para a sua
bancada e para a maioria, é que o Governo, depois de apresentar a proposta de
lei na Assembleia da República, em vez de negociar com os grupos parlamentares
do Bloco de Esquerda, do PCP, do PS, do PSD e do CDS-PP, tenha tratado de fazer
a negociação que não tinha feito.

O Sr. José Magalhães (PS): - Exactamente!

O Orador: - E fecha o acordo, como o Sr. Deputado, o Sr. Presidente e o Sr.
Ministro dos Assuntos Parlamentares sabem (e este poderá explicar aos colegas
de Governo), no momento em que o Governo já não tem direito de iniciativa!
Portanto, o Governo não vai apresentar qualquer proposta de alteração à
proposta de lei. Quem o poderá fazer é o PSD e o CDS-PP, se estiverem
disponíveis para serem aqui a "correia de transmissão" de um acordo
que o Governo firmou, algures, numa noite, com dois parceiros sociais!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Ora, o que vamos votar amanhã é uma proposta de lei em relação à
qual os próprios Deputados que a vão votar favoravelmente já assumiram o compromisso
público de desfazer na especialidade.

O Sr. Jorge Strecht (PS): - Exactamente!

O Orador: - Este é o maior atestado de incompetência política que a maioria
pode passar ao Governo!
Como sabem, quando há situações destas, a decência e a boa prática parlamentar
mandam que o Governo substitua a sua proposta para debatermos aqui não uma
proposta de que ele próprio já desistiu, mas uma proposta que ele deseja nesse
momento, neste caso hoje - vai-se lá saber o que ele deseja para a semana…
Nós não temos a visão marialva da política de que os senhores gostam muito, ou
seja, de firmeza, de afirmação, de autoridade…, essa atitude marialva que vos
caracteriza na vida!

Risos do PS.

Nós não medimos a vida política por avanços e recuos, portanto não queremos
mais recuos. O que queremos é que os senhores e o Governo avancem, mas no bom
caminho. Aí terão sempre a nossa companhia. Se persistirem na asneira,
continuamos a desejar-vos boa-viagem, mas não contarão connosco nem com a nossa
companhia.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Deputado
Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Costa,
percebi a necessidade que V. Ex.ª teve de evocar a defesa da consideração para
justificar o injustificável.
Quero também deixar aqui uma nota. V. Ex.ª começou por dizer que ia defender a
honra do Deputado José Sócrates, o que significa que o Deputado José Sócrates é
a bancada do Partido Socialista. Espero que, sendo assim, para a próxima ele
tenha mais peso na defesa das suas posições dentro da bancada do Partido
Socialista.

Risos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. António Costa (PS): - A nossa solidariedade é total!

O Orador: - Em relação à afirmação de V. Ex.ª de que nem tudo o que os
jornais dizem é verdade - é certo quando vos convém, mas noutras matérias é ao
contrário - foi exactamente para testar a veracidade do que dizia o jornal que
estive atento às palmas do Deputado José Sócrates. Por isso, fiz a observação
que fiz. Tive um cuidado que os senhores não tiveram.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Em relação à questão de que não é o Governo que apresenta alterações, mas os
grupos parlamentares, vê-se mesmo que à falta de razões de fundo, à falta de
razões de substância política V. Ex.ª vai para a forma. Toda a gente sabe - e
V. Ex.ª tinha obrigação de saber -, e é com muito gosto que vamos subscrever as
propostas de alteração, que uma coisa é uma discussão na generalidade e outra é
uma discussão na especialidade. E se se dá esta circunstância de termos de acolher
o acordo feito é por uma boa razão, e a boa razão é a de que aceitámos de bom
grado prolongar este diálogo e esta discussão na concertação social. É tão
simples quanto isto! Beneficiou o País, e pelo País estamos dispostos a isso e
a muito mais.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Não havendo mais oradores inscritos nem tempo
disponível, está encerrado o debate, na generalidade, da proposta de lei n.º
29/IX.
Srs. Deputados, a Sr.ª Secretária vai dar conta de um diploma que deu entrada
na Mesa.

A Sr.ª Secretária (Isabel Gonçalves): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, deu
entrada na Mesa, e foi admitido, o projecto de lei n.º 201/IX - Designação de
titulares de cargos exteriores à Assembleia da República (PSD, PS, CDS-PP, PCP,
BE e Os Verdes), que baixou à 1.ª Comissão.

O Sr. Presidente: - Este diploma será objecto da agenda da reunião plenária
de amanhã, juntamente com o parecer da Comissão, e, conforme orientação da
Conferência de Líderes, votá-lo-emos na generalidade, na especialidade e em votação
final global, a fim de viabilizarmos algumas eleições de órgãos exteriores à
Assembleia que são da nossa responsabilidade.
Lembro a todos que amanhã também é dia de votações e que vamos fazer uma
segunda tentativa na utilização do sistema electrónico. Por favor, não se
esqueçam de trazer o respectivo cartão e não me obriguem a recorrer a meios
sobrenaturais para votarmos.
Srs. Deputados, a próxima reunião plenária terá, pois, lugar amanhã, pelas 15
horas, e terá como ordem do dia a

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