coriscos: Vende-se Rivoli

20-07-2018
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O delay prova que evitei tocar no assunto, mas o assunto é demasiado bom (ou sexy, como diria Pires de Lima) para não ser tocado. Anteontem, Dia Mundial do Teatro, saiu no caderno de classificados do JN o seguinte anúncio, emoldurado - e não terá sido por acaso - a cor de laranja: TEATROExcelente localização, no centro do Porto, auditório com capacidade para 800 pessoas, mais pequeno auditório, restaurante/bar, sala de ensaios, zona administrativa, amplas áreas para congressos, conferências, casamentos, baptizados e eventos promocionais. Vende-se ou cede-se exploração a privados. URGENTE.Contacto: Câmara Municipal do Porto - 222 097 000O anúncio, como se depreende, é uma piada - e nem sequer se pode dizer que seja de mau gosto. Eu, pelo menos, ri-me bastante. (Claro que não descarto a possibilidade de o defeito poder ser do meu mau gosto...) E o teatro, como se depreenderá também, é o Teatro Rivoli, alvo de esvaziamento gradual por parte da Câmara Municipal do Porto e, por isso mesmo, centro de polémica na última reunião camarária.A meio da tarde, Rui Rio, que entretanto terá sido apanhado de surpresa com o sucedido, destilou no seu meio de eleição privado - o site autárquico -, toda a sua fúria em cima do dito jornal. Um jornal que, "mais uma vez contribuiu para a publicação de uma mentira, enganando os seus leitores"; um jornal que "publicou um anúncio que não é politicamente inócuo"; um jornal que ousou "dar amplo espaço noticioso ao debate sobre o Rivoli que teve lugar na última reunião do executivo". Por tudo isto, Rui Rio decidiu fazer descer a sua sábia e justa mão sobre o jornal como um pai sobre um filho que falta a escola para ficar a brincar no recreio. O castigo vem anunciado no site: "A Câmara Municipal do Porto decidiu mover uma acção judicial contra o jornal e apresentar uma participação-crime contra o seu director, Leite Pereira, enquanto responsável máximo pela publicação em causa."Ora, a reacção quase-quase fez com que, por uma vez, tivesse que vergar-me, rendida, diante da inteligência do senhor presidente da Câmara. E isto não é ironia. Ele que andava cheio de vontade de processar o JN; ele que passou meses a publicar diariamente a sua desilusão com as notícias publicadas no jornal e que infelizmente (para ele) nunca conseguiu desmentir; ele que acha que o jornal não o entende e descontextualiza as suas sempre doseadas afirmações; ele que até impôs um travão aos desbocados dos seus vereadores (o 25 de Abril não é como o sol, não nasce para todos) encontrou finalmente um não-assunto para se colocar na poltrona onde se sente melhor: a de vítima. Uff! Estava a ver que não!Só é pena que Rui Rio, que já provou não perceber nada de jornalismo (valor-notícia; fontes, regras deontológicas, etc e tal) venha agora provar também que não percebe nada do complexo funcionamento de uma máquina como é a de um jornal. Seja a de que jornal for. E a manifestação pública da sua ignorância (por cortesia, não falarei do seu bom-senso) retira imediatamente esse apreço que quase-quase ganhei por ele. Convenhamos, um homem que consegue sempre moldar as histórias por forma a ganharem o formato que mais lhe convém merece sempre algum respeito. Nem que seja o simples respeito pela ginástica mental. Mas quando um autarca chega ao ponto de induzir os munícipes a pensar que o anúncio foi de autoria do jornal, quem é que engana quem, afinal?A verdade é que mal estariam os jornais deste país se cada director tivesse que verificar cada anúncio do caderno de classificados. E no JN são algumas centenas. Quando muito, Rui Rio poderia lamentar a negligência do departamento comercial por não ter verificado a autoria do anúncio (a quem poderia agora imputar responsabilidades) e exigir um desmentido no dia seguinte. Se, por hipótese, um funcionário da autarquia, sei lá, um cantoneiro (nem sei se ainda existem, mas é um exemplo) me insultar na rua deverei processar o presidente da Câmara? Em última instância, seguindo a sua linha de raciocínio, é ele o responsável, não é?No meio disto tudo fiquei com uma dúvida. Será que nesses múltiplos telefonemas de "pessoas iludidas" e interessadas em comprar o Teatro Rivoli estaria alguma instituição espanhola? Se sim, é bem provável que tudo isto não tenha passado de uma jogada do Governo de José Sócrates. P.S.: Para que conste, o JN publicou uma nota, digna, no dia seguinte à publicação do anúncio, ou seja, ontem.Nota da Direcção ComercialFoi publicado ontem, no caderno de Classificados, um anúncio com o título "Teatro" que poderá ter levado os leitores a pensar que um qualquer teatro municipal da cidade se encontrava à venda, uma vez que tinha como contacto a Câmara Municipal do Porto. Este anúncio foi recebido no balcão-sede, no dia 24 de março, tendo sido pago em numerário, e sem que tivessem sido tomadas as devidas precauções na identificação do anunciante. A Direcção Comercial do JN lamenta o sucedido.


O delay prova que evitei tocar no assunto, mas o assunto é demasiado bom (ou sexy, como diria Pires de Lima) para não ser tocado. Anteontem, Dia Mundial do Teatro, saiu no caderno de classificados do JN o seguinte anúncio, emoldurado - e não terá sido por acaso - a cor de laranja: TEATROExcelente localização, no centro do Porto, auditório com capacidade para 800 pessoas, mais pequeno auditório, restaurante/bar, sala de ensaios, zona administrativa, amplas áreas para congressos, conferências, casamentos, baptizados e eventos promocionais. Vende-se ou cede-se exploração a privados. URGENTE.Contacto: Câmara Municipal do Porto - 222 097 000O anúncio, como se depreende, é uma piada - e nem sequer se pode dizer que seja de mau gosto. Eu, pelo menos, ri-me bastante. (Claro que não descarto a possibilidade de o defeito poder ser do meu mau gosto...) E o teatro, como se depreenderá também, é o Teatro Rivoli, alvo de esvaziamento gradual por parte da Câmara Municipal do Porto e, por isso mesmo, centro de polémica na última reunião camarária.A meio da tarde, Rui Rio, que entretanto terá sido apanhado de surpresa com o sucedido, destilou no seu meio de eleição privado - o site autárquico -, toda a sua fúria em cima do dito jornal. Um jornal que, "mais uma vez contribuiu para a publicação de uma mentira, enganando os seus leitores"; um jornal que "publicou um anúncio que não é politicamente inócuo"; um jornal que ousou "dar amplo espaço noticioso ao debate sobre o Rivoli que teve lugar na última reunião do executivo". Por tudo isto, Rui Rio decidiu fazer descer a sua sábia e justa mão sobre o jornal como um pai sobre um filho que falta a escola para ficar a brincar no recreio. O castigo vem anunciado no site: "A Câmara Municipal do Porto decidiu mover uma acção judicial contra o jornal e apresentar uma participação-crime contra o seu director, Leite Pereira, enquanto responsável máximo pela publicação em causa."Ora, a reacção quase-quase fez com que, por uma vez, tivesse que vergar-me, rendida, diante da inteligência do senhor presidente da Câmara. E isto não é ironia. Ele que andava cheio de vontade de processar o JN; ele que passou meses a publicar diariamente a sua desilusão com as notícias publicadas no jornal e que infelizmente (para ele) nunca conseguiu desmentir; ele que acha que o jornal não o entende e descontextualiza as suas sempre doseadas afirmações; ele que até impôs um travão aos desbocados dos seus vereadores (o 25 de Abril não é como o sol, não nasce para todos) encontrou finalmente um não-assunto para se colocar na poltrona onde se sente melhor: a de vítima. Uff! Estava a ver que não!Só é pena que Rui Rio, que já provou não perceber nada de jornalismo (valor-notícia; fontes, regras deontológicas, etc e tal) venha agora provar também que não percebe nada do complexo funcionamento de uma máquina como é a de um jornal. Seja a de que jornal for. E a manifestação pública da sua ignorância (por cortesia, não falarei do seu bom-senso) retira imediatamente esse apreço que quase-quase ganhei por ele. Convenhamos, um homem que consegue sempre moldar as histórias por forma a ganharem o formato que mais lhe convém merece sempre algum respeito. Nem que seja o simples respeito pela ginástica mental. Mas quando um autarca chega ao ponto de induzir os munícipes a pensar que o anúncio foi de autoria do jornal, quem é que engana quem, afinal?A verdade é que mal estariam os jornais deste país se cada director tivesse que verificar cada anúncio do caderno de classificados. E no JN são algumas centenas. Quando muito, Rui Rio poderia lamentar a negligência do departamento comercial por não ter verificado a autoria do anúncio (a quem poderia agora imputar responsabilidades) e exigir um desmentido no dia seguinte. Se, por hipótese, um funcionário da autarquia, sei lá, um cantoneiro (nem sei se ainda existem, mas é um exemplo) me insultar na rua deverei processar o presidente da Câmara? Em última instância, seguindo a sua linha de raciocínio, é ele o responsável, não é?No meio disto tudo fiquei com uma dúvida. Será que nesses múltiplos telefonemas de "pessoas iludidas" e interessadas em comprar o Teatro Rivoli estaria alguma instituição espanhola? Se sim, é bem provável que tudo isto não tenha passado de uma jogada do Governo de José Sócrates. P.S.: Para que conste, o JN publicou uma nota, digna, no dia seguinte à publicação do anúncio, ou seja, ontem.Nota da Direcção ComercialFoi publicado ontem, no caderno de Classificados, um anúncio com o título "Teatro" que poderá ter levado os leitores a pensar que um qualquer teatro municipal da cidade se encontrava à venda, uma vez que tinha como contacto a Câmara Municipal do Porto. Este anúncio foi recebido no balcão-sede, no dia 24 de março, tendo sido pago em numerário, e sem que tivessem sido tomadas as devidas precauções na identificação do anunciante. A Direcção Comercial do JN lamenta o sucedido.

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