“Rui Rio andou um bocado perdido, mas tem feito pela vida”

24-07-2019
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Marco António Costa, presidente da comissão parlamentar de Defesa Nacional e ex-vice-presidente do PSD, acredita que o partido pode vencer as eleições europeias e afasta a hipótese de uma crise interna se perder as eleições. Acusa o PS de iludir os portugueses e admite que ficaria satisfeito com o regresso de Passos Coelho à política ativa. Recusa uma coligação com os socialistas e garante que Rui Rio já percebeu que não tem condições para se voltar a aproximar de António Costa. Como presidente da comissão parlamentar de Defesa Nacional lamenta que o Governo tenha trado com “displicência” o roubo das armas em Tancos e alerta que as Forças Armadas estão com problemas “gravíssimos”.

Esta campanha tem sido dominada pelas questões nacionais. É natural que seja assim ou devíamos estar a falar dos problemas europeus?

Isto é o resultado de mais uma estratégia manhosa do dr. António Costa. Está a aproveitar a campanha para descolar da coligação que teve durante quatro anos. Parece que o PS, o Bloco de Esquerda e o PCP não foram aliados estratégicos durante quatro anos. O_PS quer apresentar-se como um partido moderado e de centro.

É por isso que o primeiro-ministro está muito presente na campanha?

A presença permanente de António Costa diminui o candidato Pedro Marques, mas enobrece o nosso cabeça-de-lista. Aquilo a que estamos a assistir foi minuciosamente pensado para fazer a separação entre o passado de quatro anos de coligação em convivência com o BE e o PCP e a tentativa de criar a ideia de que o PS_é um partido moderado que nada tem a ver com os comunistas o os bloquistas. O dr. António Costa está num processo de divórcio, aparente, com o Bloco de Esquerda e o PCP depois de ter vivido em comunhão com esses partidos.

O_PS virou à esquerda por causa dos acordos que fez com o PCP e o BE?

Nos últimos quatro anos, o PS teve um conjunto de dirigentes com uma estratégia de viragem à esquerda. Nos últimos meses, o dr. António Costa arrumou no Governo o porta-voz do PS [João Galamba] que hoje é secretário de Estado da Energia e colocou numa pasta menos visível aquele que era no Governo o porta-voz desta ala mais radical, o Pedro Nuno Santos. Isto para que António Costa possa agora aparecer como alguém que supostamente simboliza uma moderação que nunca teve. O episódio dos professores é algo pensado desta estratégia manhosa de se querer posicionar eleitoralmente.

A direita não lhe facilitou a vida?

A direita pode ser acusada de alguma ingenuidade política, mas o episódio só acontece porque António Costa permitiu que o PS votasse contra o travão orçamental que estava na proposta do PSD. O_PS foi acima de tudo um partido enganador. Garantiu que era possível conciliar uma devolução acelerada de rendimentos com a satisfação generalizada das expectativas da Administração Pública e do setor privado, mas isto tem um preço. A devolução de rendimentos tem levado à maior carga fiscal de todos os tempos. Ao mesmo tempo que temos a maior carga fiscal de todos os tempos temos o menor investimento de sempre. Mário Centeno vai ficar para a história como aquele que mais cativou e veto de gaveta deu a investimentos que eram estrategicamente importantes para o futuro do país. E, portanto, foi um Governo enganador. Enganou os seus parceiros de esquerda e enganou as pessoas que acreditavam que o PS era um partido moderado.

António Costa já garantiu que a geringonça é para continuar e que não são desejáveis coligações com a direita...

Ao longo dos últimos dois anos cresceu esta ideia de que o PCP e o Bloco fazem oposição ao Governo da parte da manhã e da parte da tarde apoiam o mesmo Governo.

As eleições podem funcionar como uma espécie de referendo ao Governo ou não devem ser encaradas dessa forma?

Será um erro se for feita uma avaliação de que isto é um referendo ao Governo. O que está a ser avaliado é uma outra coisa completamente distinta. É muito relevante para o futuro do país termos representantes no Parlamento Europeu que sejam capazes de fazer valer a sua voz. O eurodeputado José Manuel Fernandes, que é o terceiro da lista do PSD, foi considerado um dos eurodeputados mais influentes. O eurodeputado Paulo Rangel é vice-presidente do PPE. Tem uma importância europeia na condução dos destinos das matérias que se prendem com o Partido Popular Europeu. Não tenho dúvidas que todos os candidatos, tendo pontos de vista diferentes, querem defender o interesse nacional. Temos personalidades na lista do PSD que são altamente promissoras.

Está à espera que o PSD tenha um bom resultado no dia 26...

Acredito que o PSD pode ter um excelente resultado contra todas as previsões que inicialmente existiam. Espero que o CDS também tenha um bom resultado. Gostava que Pedro Mota Soares fosse eleito. Trabalhei com ele durante três anos no Governo e sei que é um homem fortemente empenhado no bem-estar social dos portugueses e na defesa do interesse nacional. Defendo o meu partido, mas não tenho uma cegueira político-partidária e reconheço que há outros partidos em que também existem pessoas capazes e competentes.

Está a gostar da campanha?

Não. A campanha está distorcida, porque se estão a debater mais as questões nacionais do que as questões europeias. Isso pode ser muito perigoso para a Europa. A Europa começa a caminhar para fenómenos de radicalismos e extremismos. Isto também resulta da incapacidade dos políticos, no plano interno, saberem trazer o debate sobre as questões europeias para o quotidiano dos cidadãos.

Este tipo de campanha nas feiras, a distribuir canetas e brindes, ainda faz sentido?

Não. Não faz sentido nenhum. Conduzi algumas campanhas e acho que as pessoas hoje querem coisas mais serenas. Querem mais esclarecimento. Ouvi nesta campanha críticas à falta de rua, à falta de ida aos mercados... Esses desafios vinham da imprensa, nomeadamente para o candidato Pedro Marques. A própria imprensa testa as competências do candidato por ele estar mais à vontade na peixaria ou por estar menos à vontade na feira e isso não ajuda ao esclarecimento dos portugueses.

Um mau resultado nestas europeias poderá provocar instabilidade interna no PSD?

É um assunto que já não existe, mas o resultado tem um efeito anímico. Em 2014, António Costa disse que a vitória do PS era poucochinho e isso induziu um efeito mobilizador do nosso lado e um efeito derrotista do lado do PS.

As últimas eleições europeias provocaram uma mudança de liderança no PS.

Havia uma intenção oculta, uma estratégia manhosa do dr. António Costa, mais uma vez, para tentar chegar à liderança. Isto da estratégia manhosa tem vários episódios.

Não pode acontecer a mesma coisa

no PSD?

No PSD o efeito relativamente à liderança será nulo, mas quanto melhor for o resultado mais contribuirá para a mobilização do nosso eleitorado.

Acredita que o PSD pode vencer

as legislativas?

Acredito que é possível. Rui Rio não produz muito ruído, mas procura falar quando tem de ser ouvido e tem conseguido ser ouvido em momentos-chave da vida política.

Nos primeiros tempos não fez uma avaliação positiva de Rui Rio...

Ele andou um bocado perdido nos primeiros tempos. Eu disse numa entrevista que ele tinha de fazer pela vida e acho que ele tem feito pela vida. Tem havido uma maior articulação entre as diferentes estruturas do país. Não está a fazer uma corrida de 100 metros, mas está a fazer uma corrida de fundo que terá a meta nas eleições legislativas.

Se não vencer as legislativas dificilmente poderá continuar.

Não lhe sei responder a isso. É muito cedo. O_PSD e o PS são partidos com natural vocação para o poder. Quando um líder não vence há sempre uma certa contestação interna. É muito cedo para falar sobre isso

Já há, pelo menos, um candidato que quer disputar a liderança com Rui Rio.

Não sei se há um, dois ou três...

Luís Montenegro deixou claro que queria disputar a liderança com Rui Rio...

Aquilo que vi foi o Luís Montenegro a assumir uma postura de resguardo. Participou com grande sentido de responsabilidade na campanha das europeias. O partido está suficientemente unido para se apresentar às próximas legislativas de forma combativa.

Passos Coelho também entrou na campanha. Julga que ele um dia vai regressar à política ativa?

Ele fará aquilo que a sua consciência ditar. Acho que o nosso país não pode dispensar pessoas com a competência, a integridade e com sentido de patriotismo que tem Passos Coelho. Ele governou o país num dos momentos mais difíceis da nossa história. Teve sempre uma atitude de grande frontalidade e seriedade na governação. Explicou em cada momento aos portugueses as dificuldades que o país tinha de enfrentar e nunca se escondeu atrás de ninguém. E em momentos históricos recusou-se a virar as costas ao país.

Está a falar da demissão de Paulo Portas?

A seguir a esse episódio a coesão do governo aumentou. A verdade é que se pegou num país completamente falido e em 2015 deixamos um país a recuperar economicamente. Os factos são históricos. É tão histórico que recuperamos um país que estava financeiramente e socialmente destroçado como é histórico que a seguir houve uma maioria de esquerda e respeitamos isso. Só ficamos preocupados porque o país perdeu uma oportunidade e os portugueses vão pagar isso mais à frente, infelizmente, nomeadamente com serviços públicos mais degradados...

Aquela ideia de que o diabo vinha aí não era assim tão irrealista?

Essa expressão tem de ser enquadrada no momento em que aconteceu. Isso foi na primavera de 2016 em que houve um certo descontrole orçamental. Até que vieram as previsões de primavera da União Europeia que diziam de forma clara que se a execução orçamental se mantivesse no mesmo ritmo que tinha tido nos primeiros meses do ano o resultado final seria um descontrole orçamental. Quem viu o diabo foi o ministro Centeno que passou a usar o veto de gaveta e a cativação como o exorcismo contra o diabo.

O que é que o PSD teria feito diferente se continuasse no Governo?

Teria mantido uma aposta no investimento público e continuaria a devolver rendimentos. Teria evitado o aumento excessivo da carga fiscal. A carga fiscal aumentou e aquilo que era suposto era reduzir.

Mas o Governo acabou com o enorme aumento de impostos de Vítor Gaspar:

O que deu com uma mão tirou com a outra. Os impostos indiretos compensaram tudo aquilo que foi devolvido nos impostos diretos.

Mas o PSD também teria apostado em equilibrar as contas públicas...

Com certeza, mas teria, se calhar, tido uma intervenção maior no âmbito do défice estrutural. Esse está a agravar-se e é um problema sério, porque quer dizer que a semente do diabo continua nas contas públicas portuguesas. É sabido que o PS durante estes anos fugiu a assumir qualquer reforma, porque isso implicaria desagradar a alguém.

Santana Lopes e algumas pessoas de direita defendem uma coligação pré-eleitoral entre os partidos de direita nas eleições legislativas. Faria sentido ponderar esta hipótese?

O_PSD deve apresentar-se sozinho às eleições. É fundamental que haja essa clarificação política. Tem havido um abuso nesta ideia de colar o PSD à direita. O_PSD não é um partido de direita. É um partido social-democrata e os partidos sociais-democratas forma sempre partidos de centro. Obviamente que os partidos que estão à nossa direita sentem-se mais próximos de nós do que do Partido Socialista. Parece-me também natural que o PSD e o Partido Socialista não queiram perder a sua autonomia estratégica e evitem fazer um Bloco Central. Uma coligação pré-eleitoral e o Bloco Central são dois cenários que considero indesejáveis.

Rui Rio não afastou a hipótese de uma coligação com o PS.

Julgo que Rui Rio já percebeu que não tem condições para fazer uma coligação com António Costa. Parece-me claro.

Como vê o aparecimento de um novo partido criado por um ex-líder do PSD?

Santana Lopes é um social-democrata e há de voltar ao PSD. É natural que as pessoas, numa determinada fase da vida, tenham estas tentações de criar um partido para tentar transformar a sociedade através de outros projetos políticos. É evidente que as pessoas sentem que a Aliança é um partido que não é genuinamente novo. Tem muitas pessoas que deixaram o PSD e acho que, mais tarde ou mais cedo, essas pessoas regressarão se assim o entenderem. A nossa obrigação é estarmos de braços abertos a recebermos todos aqueles que quiserem regressar.

Santana Lopes seria bem recebido se entendesse voltar?

Foi um ex-líder do partido, ex-primeiro-ministro... É uma figura incontornável da nossa história.

Não acredita que os novos partidos possam ter um bom resultado?

É possível. É possível haver um voto imprevisto. O_PAN pode crescer. O deputado do PAN partido tem tido um papel moderado e está atento a alguns nichos eleitorais. Acredito que o PAN vai crescer e que existe espaço para o Basta!. O desgaste da classe política e das instituições levará sempre algumas pessoas a votarem nestes partidos

Acredita que André Ventura pode ser eleito?

Admito que ele possa ser eleito. O_André Ventura é uma pessoa com valor. Fez uma carreira a pulso e é uma pessoa arguta e inteligente. Tentar desvalorizá-lo é uma tolice, porque ele está a desempenhar um papel.

Qual é a sua opinião sobre a forma como o Presidente da República tem desempenhado o cargo?

Vejo na sua ação muitos méritos, mas também vejo algumas coisas que não apoio ou, pelo menos, não me revejo nelas. Mas a verdade é que tem sido um tampão eficiente ao populismo. Esta agenda frenética que ele tem e esta proximidade permanente que ele tem com a sociedade portuguesa é levada a um extremo, mas a verdade é que tem sido um tampão eficiente ao crescimento do populismo em Portugal. A história vai reconhecer isso. Veja o que está a acontecer em Espanha. Cá, felizmente, como eu dizia, ainda são projetos de nicho.

Quais são os aspetos que lhe desagradam na atuação do Presidente?

Gostava que ele fosse mais recatado em determinados momentos, mas isso é a minha visão. Mas não tenho dúvidas de que tem tido uma atuação positiva para o interesse nacional.

É presidente da Comissão Parlamentar de Defesa Nacional. Com aquilo que já sabemos sobre o furto e o aparecimento das armas de Tancos que ilações podemos tirar?

Queria falar como cidadão, porque acho que as consequências políticas teriam sido mais elevadas num país com uma democracia mais exigente. O assunto foi tratado com displicência nos primeiros tempos. Estou a falar de displicência politica do governo. O primeiro-ministro e o ministro da Defesa vieram dizer que tinham sido recuperadas todas as armas e a seguir soube-se que faltavam armas. Ou foram enganados e têm de demitir quem os enganou dada a gravidade da situação ou não foram enganados e estavam a tentar enganar os portugueses. Lidou-se com isto com uma certa superficialidade. Não consigo conceber que tendo sido roubadas as armas e tendo sido informado o Governo que teria havido um furto de armas que ninguém se tivesse lembrado de avisar a Secretária-Geral do Sistema de Segurança Interna [Helena Fazenda], que coordena a unidade antiterrorista, e o secretário-geral do Sistema de Informações da República [Júlio Pereira], que coordena os serviços secretas. Um e outro souberam do furto 24 horas depois pela comunicação social. Se isto acontecesse em Inglaterra o governo caía. Há aqui uma falha institucional.

Até que ponto é que este episódio beliscou a imagem das Forças Armadas?

Os portugueses tem de ter confiança nas Forças Armadas. As nossas Forças Armadas foram sujeitas, ao longo das últimas décadas, a uma forte transformação organizativa e a uma forte redução de condições de funcionamento. Apesar disso, nós não vemos os militares a queixarem-se e a protestarem. Têm uma capacidade de resiliência e um apego ao interesse público inigualável. Digo isto com conhecimento de causa, porque é o que sinto todos os dias no contacto que tenho com a estrutura militar. Os portugueses têm de valorizar as suas Forças Armadas.

Mas este furto revela a fragilidade das Forças Armadas...

Nós hoje vivemos dois problemas gravíssimos nas nossas Forças Armadas. O primeiro é uma falta de efetivos muito grande. O atual governo tomou algumas iniciativas no sentido de cativar os jovens. A falta de efetivos é brutal. Há um afastamento da sociedade e dos jovens relativamente às Forças Armadas que é assustador. Por outro lado, há a necessidade de reforçar os recursos em matérias que são essenciais para a segurança nacional. As FA são um instrumento de politica externa importantíssimo.

O regresso do Serviço Militar Obrigatório seria uma solução?

Seria um passo demasiado grande, mas é verdade que em França essa discussão está a ser travada e na Suécia já foi tomada essa decisão. França viveu uma situação de grande insegurança interna por causa do terrorismo e as FA ganharam uma expressão e um simbolismo maior. As nossas Forças Armadas merecem ser prestigiadas e têm nas suas fileiras homens e mulheres de grande qualidade. Isso tem de ser respeitado e tem de ser valorizado.

As repostas de António Costa à Comissão Parlamentar de Inquérito sobre Tancos serão importantes para perceber os contornos deste caso?

As respostas do primeiro-ministro são vitais. Todas as questões que foram feitas ao primeiro-ministro são fundamentais. O caminho já é muito estreito.

Marco António Costa, presidente da comissão parlamentar de Defesa Nacional e ex-vice-presidente do PSD, acredita que o partido pode vencer as eleições europeias e afasta a hipótese de uma crise interna se perder as eleições. Acusa o PS de iludir os portugueses e admite que ficaria satisfeito com o regresso de Passos Coelho à política ativa. Recusa uma coligação com os socialistas e garante que Rui Rio já percebeu que não tem condições para se voltar a aproximar de António Costa. Como presidente da comissão parlamentar de Defesa Nacional lamenta que o Governo tenha trado com “displicência” o roubo das armas em Tancos e alerta que as Forças Armadas estão com problemas “gravíssimos”.

Esta campanha tem sido dominada pelas questões nacionais. É natural que seja assim ou devíamos estar a falar dos problemas europeus?

Isto é o resultado de mais uma estratégia manhosa do dr. António Costa. Está a aproveitar a campanha para descolar da coligação que teve durante quatro anos. Parece que o PS, o Bloco de Esquerda e o PCP não foram aliados estratégicos durante quatro anos. O_PS quer apresentar-se como um partido moderado e de centro.

É por isso que o primeiro-ministro está muito presente na campanha?

A presença permanente de António Costa diminui o candidato Pedro Marques, mas enobrece o nosso cabeça-de-lista. Aquilo a que estamos a assistir foi minuciosamente pensado para fazer a separação entre o passado de quatro anos de coligação em convivência com o BE e o PCP e a tentativa de criar a ideia de que o PS_é um partido moderado que nada tem a ver com os comunistas o os bloquistas. O dr. António Costa está num processo de divórcio, aparente, com o Bloco de Esquerda e o PCP depois de ter vivido em comunhão com esses partidos.

O_PS virou à esquerda por causa dos acordos que fez com o PCP e o BE?

Nos últimos quatro anos, o PS teve um conjunto de dirigentes com uma estratégia de viragem à esquerda. Nos últimos meses, o dr. António Costa arrumou no Governo o porta-voz do PS [João Galamba] que hoje é secretário de Estado da Energia e colocou numa pasta menos visível aquele que era no Governo o porta-voz desta ala mais radical, o Pedro Nuno Santos. Isto para que António Costa possa agora aparecer como alguém que supostamente simboliza uma moderação que nunca teve. O episódio dos professores é algo pensado desta estratégia manhosa de se querer posicionar eleitoralmente.

A direita não lhe facilitou a vida?

A direita pode ser acusada de alguma ingenuidade política, mas o episódio só acontece porque António Costa permitiu que o PS votasse contra o travão orçamental que estava na proposta do PSD. O_PS foi acima de tudo um partido enganador. Garantiu que era possível conciliar uma devolução acelerada de rendimentos com a satisfação generalizada das expectativas da Administração Pública e do setor privado, mas isto tem um preço. A devolução de rendimentos tem levado à maior carga fiscal de todos os tempos. Ao mesmo tempo que temos a maior carga fiscal de todos os tempos temos o menor investimento de sempre. Mário Centeno vai ficar para a história como aquele que mais cativou e veto de gaveta deu a investimentos que eram estrategicamente importantes para o futuro do país. E, portanto, foi um Governo enganador. Enganou os seus parceiros de esquerda e enganou as pessoas que acreditavam que o PS era um partido moderado.

António Costa já garantiu que a geringonça é para continuar e que não são desejáveis coligações com a direita...

Ao longo dos últimos dois anos cresceu esta ideia de que o PCP e o Bloco fazem oposição ao Governo da parte da manhã e da parte da tarde apoiam o mesmo Governo.

As eleições podem funcionar como uma espécie de referendo ao Governo ou não devem ser encaradas dessa forma?

Será um erro se for feita uma avaliação de que isto é um referendo ao Governo. O que está a ser avaliado é uma outra coisa completamente distinta. É muito relevante para o futuro do país termos representantes no Parlamento Europeu que sejam capazes de fazer valer a sua voz. O eurodeputado José Manuel Fernandes, que é o terceiro da lista do PSD, foi considerado um dos eurodeputados mais influentes. O eurodeputado Paulo Rangel é vice-presidente do PPE. Tem uma importância europeia na condução dos destinos das matérias que se prendem com o Partido Popular Europeu. Não tenho dúvidas que todos os candidatos, tendo pontos de vista diferentes, querem defender o interesse nacional. Temos personalidades na lista do PSD que são altamente promissoras.

Está à espera que o PSD tenha um bom resultado no dia 26...

Acredito que o PSD pode ter um excelente resultado contra todas as previsões que inicialmente existiam. Espero que o CDS também tenha um bom resultado. Gostava que Pedro Mota Soares fosse eleito. Trabalhei com ele durante três anos no Governo e sei que é um homem fortemente empenhado no bem-estar social dos portugueses e na defesa do interesse nacional. Defendo o meu partido, mas não tenho uma cegueira político-partidária e reconheço que há outros partidos em que também existem pessoas capazes e competentes.

Está a gostar da campanha?

Não. A campanha está distorcida, porque se estão a debater mais as questões nacionais do que as questões europeias. Isso pode ser muito perigoso para a Europa. A Europa começa a caminhar para fenómenos de radicalismos e extremismos. Isto também resulta da incapacidade dos políticos, no plano interno, saberem trazer o debate sobre as questões europeias para o quotidiano dos cidadãos.

Este tipo de campanha nas feiras, a distribuir canetas e brindes, ainda faz sentido?

Não. Não faz sentido nenhum. Conduzi algumas campanhas e acho que as pessoas hoje querem coisas mais serenas. Querem mais esclarecimento. Ouvi nesta campanha críticas à falta de rua, à falta de ida aos mercados... Esses desafios vinham da imprensa, nomeadamente para o candidato Pedro Marques. A própria imprensa testa as competências do candidato por ele estar mais à vontade na peixaria ou por estar menos à vontade na feira e isso não ajuda ao esclarecimento dos portugueses.

Um mau resultado nestas europeias poderá provocar instabilidade interna no PSD?

É um assunto que já não existe, mas o resultado tem um efeito anímico. Em 2014, António Costa disse que a vitória do PS era poucochinho e isso induziu um efeito mobilizador do nosso lado e um efeito derrotista do lado do PS.

As últimas eleições europeias provocaram uma mudança de liderança no PS.

Havia uma intenção oculta, uma estratégia manhosa do dr. António Costa, mais uma vez, para tentar chegar à liderança. Isto da estratégia manhosa tem vários episódios.

Não pode acontecer a mesma coisa

no PSD?

No PSD o efeito relativamente à liderança será nulo, mas quanto melhor for o resultado mais contribuirá para a mobilização do nosso eleitorado.

Acredita que o PSD pode vencer

as legislativas?

Acredito que é possível. Rui Rio não produz muito ruído, mas procura falar quando tem de ser ouvido e tem conseguido ser ouvido em momentos-chave da vida política.

Nos primeiros tempos não fez uma avaliação positiva de Rui Rio...

Ele andou um bocado perdido nos primeiros tempos. Eu disse numa entrevista que ele tinha de fazer pela vida e acho que ele tem feito pela vida. Tem havido uma maior articulação entre as diferentes estruturas do país. Não está a fazer uma corrida de 100 metros, mas está a fazer uma corrida de fundo que terá a meta nas eleições legislativas.

Se não vencer as legislativas dificilmente poderá continuar.

Não lhe sei responder a isso. É muito cedo. O_PSD e o PS são partidos com natural vocação para o poder. Quando um líder não vence há sempre uma certa contestação interna. É muito cedo para falar sobre isso

Já há, pelo menos, um candidato que quer disputar a liderança com Rui Rio.

Não sei se há um, dois ou três...

Luís Montenegro deixou claro que queria disputar a liderança com Rui Rio...

Aquilo que vi foi o Luís Montenegro a assumir uma postura de resguardo. Participou com grande sentido de responsabilidade na campanha das europeias. O partido está suficientemente unido para se apresentar às próximas legislativas de forma combativa.

Passos Coelho também entrou na campanha. Julga que ele um dia vai regressar à política ativa?

Ele fará aquilo que a sua consciência ditar. Acho que o nosso país não pode dispensar pessoas com a competência, a integridade e com sentido de patriotismo que tem Passos Coelho. Ele governou o país num dos momentos mais difíceis da nossa história. Teve sempre uma atitude de grande frontalidade e seriedade na governação. Explicou em cada momento aos portugueses as dificuldades que o país tinha de enfrentar e nunca se escondeu atrás de ninguém. E em momentos históricos recusou-se a virar as costas ao país.

Está a falar da demissão de Paulo Portas?

A seguir a esse episódio a coesão do governo aumentou. A verdade é que se pegou num país completamente falido e em 2015 deixamos um país a recuperar economicamente. Os factos são históricos. É tão histórico que recuperamos um país que estava financeiramente e socialmente destroçado como é histórico que a seguir houve uma maioria de esquerda e respeitamos isso. Só ficamos preocupados porque o país perdeu uma oportunidade e os portugueses vão pagar isso mais à frente, infelizmente, nomeadamente com serviços públicos mais degradados...

Aquela ideia de que o diabo vinha aí não era assim tão irrealista?

Essa expressão tem de ser enquadrada no momento em que aconteceu. Isso foi na primavera de 2016 em que houve um certo descontrole orçamental. Até que vieram as previsões de primavera da União Europeia que diziam de forma clara que se a execução orçamental se mantivesse no mesmo ritmo que tinha tido nos primeiros meses do ano o resultado final seria um descontrole orçamental. Quem viu o diabo foi o ministro Centeno que passou a usar o veto de gaveta e a cativação como o exorcismo contra o diabo.

O que é que o PSD teria feito diferente se continuasse no Governo?

Teria mantido uma aposta no investimento público e continuaria a devolver rendimentos. Teria evitado o aumento excessivo da carga fiscal. A carga fiscal aumentou e aquilo que era suposto era reduzir.

Mas o Governo acabou com o enorme aumento de impostos de Vítor Gaspar:

O que deu com uma mão tirou com a outra. Os impostos indiretos compensaram tudo aquilo que foi devolvido nos impostos diretos.

Mas o PSD também teria apostado em equilibrar as contas públicas...

Com certeza, mas teria, se calhar, tido uma intervenção maior no âmbito do défice estrutural. Esse está a agravar-se e é um problema sério, porque quer dizer que a semente do diabo continua nas contas públicas portuguesas. É sabido que o PS durante estes anos fugiu a assumir qualquer reforma, porque isso implicaria desagradar a alguém.

Santana Lopes e algumas pessoas de direita defendem uma coligação pré-eleitoral entre os partidos de direita nas eleições legislativas. Faria sentido ponderar esta hipótese?

O_PSD deve apresentar-se sozinho às eleições. É fundamental que haja essa clarificação política. Tem havido um abuso nesta ideia de colar o PSD à direita. O_PSD não é um partido de direita. É um partido social-democrata e os partidos sociais-democratas forma sempre partidos de centro. Obviamente que os partidos que estão à nossa direita sentem-se mais próximos de nós do que do Partido Socialista. Parece-me também natural que o PSD e o Partido Socialista não queiram perder a sua autonomia estratégica e evitem fazer um Bloco Central. Uma coligação pré-eleitoral e o Bloco Central são dois cenários que considero indesejáveis.

Rui Rio não afastou a hipótese de uma coligação com o PS.

Julgo que Rui Rio já percebeu que não tem condições para fazer uma coligação com António Costa. Parece-me claro.

Como vê o aparecimento de um novo partido criado por um ex-líder do PSD?

Santana Lopes é um social-democrata e há de voltar ao PSD. É natural que as pessoas, numa determinada fase da vida, tenham estas tentações de criar um partido para tentar transformar a sociedade através de outros projetos políticos. É evidente que as pessoas sentem que a Aliança é um partido que não é genuinamente novo. Tem muitas pessoas que deixaram o PSD e acho que, mais tarde ou mais cedo, essas pessoas regressarão se assim o entenderem. A nossa obrigação é estarmos de braços abertos a recebermos todos aqueles que quiserem regressar.

Santana Lopes seria bem recebido se entendesse voltar?

Foi um ex-líder do partido, ex-primeiro-ministro... É uma figura incontornável da nossa história.

Não acredita que os novos partidos possam ter um bom resultado?

É possível. É possível haver um voto imprevisto. O_PAN pode crescer. O deputado do PAN partido tem tido um papel moderado e está atento a alguns nichos eleitorais. Acredito que o PAN vai crescer e que existe espaço para o Basta!. O desgaste da classe política e das instituições levará sempre algumas pessoas a votarem nestes partidos

Acredita que André Ventura pode ser eleito?

Admito que ele possa ser eleito. O_André Ventura é uma pessoa com valor. Fez uma carreira a pulso e é uma pessoa arguta e inteligente. Tentar desvalorizá-lo é uma tolice, porque ele está a desempenhar um papel.

Qual é a sua opinião sobre a forma como o Presidente da República tem desempenhado o cargo?

Vejo na sua ação muitos méritos, mas também vejo algumas coisas que não apoio ou, pelo menos, não me revejo nelas. Mas a verdade é que tem sido um tampão eficiente ao populismo. Esta agenda frenética que ele tem e esta proximidade permanente que ele tem com a sociedade portuguesa é levada a um extremo, mas a verdade é que tem sido um tampão eficiente ao crescimento do populismo em Portugal. A história vai reconhecer isso. Veja o que está a acontecer em Espanha. Cá, felizmente, como eu dizia, ainda são projetos de nicho.

Quais são os aspetos que lhe desagradam na atuação do Presidente?

Gostava que ele fosse mais recatado em determinados momentos, mas isso é a minha visão. Mas não tenho dúvidas de que tem tido uma atuação positiva para o interesse nacional.

É presidente da Comissão Parlamentar de Defesa Nacional. Com aquilo que já sabemos sobre o furto e o aparecimento das armas de Tancos que ilações podemos tirar?

Queria falar como cidadão, porque acho que as consequências políticas teriam sido mais elevadas num país com uma democracia mais exigente. O assunto foi tratado com displicência nos primeiros tempos. Estou a falar de displicência politica do governo. O primeiro-ministro e o ministro da Defesa vieram dizer que tinham sido recuperadas todas as armas e a seguir soube-se que faltavam armas. Ou foram enganados e têm de demitir quem os enganou dada a gravidade da situação ou não foram enganados e estavam a tentar enganar os portugueses. Lidou-se com isto com uma certa superficialidade. Não consigo conceber que tendo sido roubadas as armas e tendo sido informado o Governo que teria havido um furto de armas que ninguém se tivesse lembrado de avisar a Secretária-Geral do Sistema de Segurança Interna [Helena Fazenda], que coordena a unidade antiterrorista, e o secretário-geral do Sistema de Informações da República [Júlio Pereira], que coordena os serviços secretas. Um e outro souberam do furto 24 horas depois pela comunicação social. Se isto acontecesse em Inglaterra o governo caía. Há aqui uma falha institucional.

Até que ponto é que este episódio beliscou a imagem das Forças Armadas?

Os portugueses tem de ter confiança nas Forças Armadas. As nossas Forças Armadas foram sujeitas, ao longo das últimas décadas, a uma forte transformação organizativa e a uma forte redução de condições de funcionamento. Apesar disso, nós não vemos os militares a queixarem-se e a protestarem. Têm uma capacidade de resiliência e um apego ao interesse público inigualável. Digo isto com conhecimento de causa, porque é o que sinto todos os dias no contacto que tenho com a estrutura militar. Os portugueses têm de valorizar as suas Forças Armadas.

Mas este furto revela a fragilidade das Forças Armadas...

Nós hoje vivemos dois problemas gravíssimos nas nossas Forças Armadas. O primeiro é uma falta de efetivos muito grande. O atual governo tomou algumas iniciativas no sentido de cativar os jovens. A falta de efetivos é brutal. Há um afastamento da sociedade e dos jovens relativamente às Forças Armadas que é assustador. Por outro lado, há a necessidade de reforçar os recursos em matérias que são essenciais para a segurança nacional. As FA são um instrumento de politica externa importantíssimo.

O regresso do Serviço Militar Obrigatório seria uma solução?

Seria um passo demasiado grande, mas é verdade que em França essa discussão está a ser travada e na Suécia já foi tomada essa decisão. França viveu uma situação de grande insegurança interna por causa do terrorismo e as FA ganharam uma expressão e um simbolismo maior. As nossas Forças Armadas merecem ser prestigiadas e têm nas suas fileiras homens e mulheres de grande qualidade. Isso tem de ser respeitado e tem de ser valorizado.

As repostas de António Costa à Comissão Parlamentar de Inquérito sobre Tancos serão importantes para perceber os contornos deste caso?

As respostas do primeiro-ministro são vitais. Todas as questões que foram feitas ao primeiro-ministro são fundamentais. O caminho já é muito estreito.

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