Marinha Grande. O dia em que o Bloco de Esquerda derrotou a CDU

11-10-2019
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A Marinha já não é o que era. O velho bastião comunista - que ainda é o palco escolhido para as grandes iniciativas da CDU, a coligação PCP/PEV - mostrou-se ontem ao país como mais um degrau a descer, na escadaria eleitoral.

| foto Henriques da Cunha / Global Imagens | foto Henriques da Cunha / Global Imagens | foto Henriques da Cunha / Global Imagens

Os resultados só surpreenderam quem não conhece a realidade local. "Para nós foi perfeitamente natural. Essa ideia de que o Partido Comunista lidera na Marinha Grande já não corresponde à verdade. Até porque hoje vota-se mais nas pessoas do que nos partidos", diz ao DN Carla Silva, enquanto tira duas bicas ao balcão da cafetaria Hello Darling, na proximidade da Câmara Municipal. Por ali passa muita discussão política, já se vê. E passa a realidade: desde os anos 90, quando o PS ganhou pela primeira vez a Câmara que sempre fora do PCP, no pós 25 de abril, que os comunistas foram perdendo terreno. Ainda voltaram a liderar a autarquia, em 2005 (numa vitória que soube a desforra para Barros Duarte, pois que perdera a Câmara para o PS em 1993), mas não passou desse mandato.

E no que toca a Legislativas, há muito que o PCP começara a perder terreno. De resto, é preciso recuar quase 30 anos para lhe encontrar uma vitória, sendo que o último deputado eleito por Leiria foi José Augusto Esteves, em 1987. De modo que foi igualmente sem surpresa que ontem se confirmou o adeus de Heloísa Apolónia ao Parlamento. A coligação apostara na candidata dos Verdes para o distrito de Leiria, tendo presente todo este histórico. E foi na Marinha Grande que a CDU reuniu (como sempre) para acompanhar a noite eleitoral. Mas nem sinais da candidata, que provavelmente já antevia este desfecho. Quem deu a cara foi Sérgio Leandro, o mandatário distrital. Contactado esta manhã pelo DN, remeteu para o final do dia uma reação da CDU.

Na Marinha Grande o Bloco de Esquerda teve melhores resultados que a CDU, destronando o partido que já ali foi líder de votação e poder © Henriques da Cunha / Global Imagens

O sentimento "anti-comuna"

A Marinha Grande amanheceu como de costume, nesta segunda-feira: o único concelho do distrito de Leiria que cresce em população nos últimos anos, emprego para (quase) todos, uma média salarial mais elevada. Mas as mudanças não ocorrem só nos gráficos eleitorais. Rendida aos moldes (o tempo do vidro ficou lá atrás), a cidade é a face mais visível de um território onde mais eleitores inscritos não significa mais votantes. Aliás, também aqui a abstenção ganhou muito terreno. Há quatro anos votaram quase 57% dos eleitores, desta vez apenas 53%, a acompanhar a média distrital e nacional. Há dez anos, o concelho ainda era o orgulho dos votantes, com uma taxa de abstenção residual.

Dulce Carmo queria "que tivesse ganho outro". © Henriques da Cunha / Global Imagens

Emanuel Marques, 40 anos, também leu os resultados com naturalidade. "Há muita gente aqui que é anti-comuna. E com o passar dos anos os resultados foram mostrando isso". Dulce Carmo atravessa a rua dos Bombeiros com passo certo, nos seus 71 anos. Mora na Marinha há mais de 45, e por isso assistiu a todo o descarrilamento do PCP nas eleições. No seu caso, também não lhe agradou a vitória socialista, pois que esperava "que mudasse para outro". Mas o PS não tem parado de crescer por ali, desde há 20 anos. "Só hoje de manhã é que vi os resultados da Marinha, e quando vi que a CDU tinha ficado em 4º lugar...admirei-me, pensei que ainda tinha mais votos". Só que não. Contados os boletins, comunistas e verdes alcançam pouco mais de 13% dos votos, contra 14% do Bloco de Esquerda. Traduzindo as percentagens em número de votos, a diferença não é muita. E ambos perdem, afinal, embora o trambolhão seja maior para a CDU: 2536 votos na coligação, 2616 no BE. A primeira perde cerca de 600 votos desde 2015, o segundo perde 279. Mas passa a terceira força política.

"Há muita gente aqui que é anti-comuna. E com o passar dos anos os resultados foram mostrando isso"

Telma Gaspar é um dos rostos do partido na Marinha Grande, e ocupava o 10º lugar na lista de Leiria. Prefere não embandeirar em arco com a ultrapassagem do BE à CDU, "até porque é um partido que tem muitas lutas em comum connosco", como diz ao DN. Mas acredita que os resultados ficam a dever-se "ao trabalho de dois eleitos locais, por todo o concelho: Nuno Machado, na Assembleia Municipal, e Sesinando Araújo, na assembleia de freguesia da Marinha Grande".

"Os jovens estão a mudar a esquerda em todo o país, e isso nota-se aqui na Marinha Grande também", acrescenta esta auxiliar numa escola da cidade. No distrito, o BE conseguiu manter um deputado na Assembleia da República. É Ricardo Vicente, um engenheiro agrónomo que se tornou conhecido em movimentos como os Precários Inflexíveis ou Peniche Livre de Petróleo. Os restantes 9 são repartidos entre quatro para o PS (Raul Castro, Elza Pais, António Sales e João Paulo Pedrosa) e cinco para o PSD - que apesar de perder votos ainda é o partido mais votado: Margarida Balseiro Lopes, Hugo Oliveira, Pedro Roque, Olga Silvestre e João Marques - ex-presidente da Câmara de Pedrógão Grande, que perdeu as eleições para Valdemar Alves, nas últimas autárquicas. De resto, foi também a Pedrógão (e ao PSD) que o Chega foi buscar o cabeça de lista pelo distrito, Luís Paulo Fernandes, representante de uma associação de carrosséis e outras diversões. Dos 1780 votantes, apenas 48 o escolheram.

A Marinha já não é o que era. O velho bastião comunista - que ainda é o palco escolhido para as grandes iniciativas da CDU, a coligação PCP/PEV - mostrou-se ontem ao país como mais um degrau a descer, na escadaria eleitoral.

| foto Henriques da Cunha / Global Imagens | foto Henriques da Cunha / Global Imagens | foto Henriques da Cunha / Global Imagens

Os resultados só surpreenderam quem não conhece a realidade local. "Para nós foi perfeitamente natural. Essa ideia de que o Partido Comunista lidera na Marinha Grande já não corresponde à verdade. Até porque hoje vota-se mais nas pessoas do que nos partidos", diz ao DN Carla Silva, enquanto tira duas bicas ao balcão da cafetaria Hello Darling, na proximidade da Câmara Municipal. Por ali passa muita discussão política, já se vê. E passa a realidade: desde os anos 90, quando o PS ganhou pela primeira vez a Câmara que sempre fora do PCP, no pós 25 de abril, que os comunistas foram perdendo terreno. Ainda voltaram a liderar a autarquia, em 2005 (numa vitória que soube a desforra para Barros Duarte, pois que perdera a Câmara para o PS em 1993), mas não passou desse mandato.

E no que toca a Legislativas, há muito que o PCP começara a perder terreno. De resto, é preciso recuar quase 30 anos para lhe encontrar uma vitória, sendo que o último deputado eleito por Leiria foi José Augusto Esteves, em 1987. De modo que foi igualmente sem surpresa que ontem se confirmou o adeus de Heloísa Apolónia ao Parlamento. A coligação apostara na candidata dos Verdes para o distrito de Leiria, tendo presente todo este histórico. E foi na Marinha Grande que a CDU reuniu (como sempre) para acompanhar a noite eleitoral. Mas nem sinais da candidata, que provavelmente já antevia este desfecho. Quem deu a cara foi Sérgio Leandro, o mandatário distrital. Contactado esta manhã pelo DN, remeteu para o final do dia uma reação da CDU.

Na Marinha Grande o Bloco de Esquerda teve melhores resultados que a CDU, destronando o partido que já ali foi líder de votação e poder © Henriques da Cunha / Global Imagens

O sentimento "anti-comuna"

A Marinha Grande amanheceu como de costume, nesta segunda-feira: o único concelho do distrito de Leiria que cresce em população nos últimos anos, emprego para (quase) todos, uma média salarial mais elevada. Mas as mudanças não ocorrem só nos gráficos eleitorais. Rendida aos moldes (o tempo do vidro ficou lá atrás), a cidade é a face mais visível de um território onde mais eleitores inscritos não significa mais votantes. Aliás, também aqui a abstenção ganhou muito terreno. Há quatro anos votaram quase 57% dos eleitores, desta vez apenas 53%, a acompanhar a média distrital e nacional. Há dez anos, o concelho ainda era o orgulho dos votantes, com uma taxa de abstenção residual.

Dulce Carmo queria "que tivesse ganho outro". © Henriques da Cunha / Global Imagens

Emanuel Marques, 40 anos, também leu os resultados com naturalidade. "Há muita gente aqui que é anti-comuna. E com o passar dos anos os resultados foram mostrando isso". Dulce Carmo atravessa a rua dos Bombeiros com passo certo, nos seus 71 anos. Mora na Marinha há mais de 45, e por isso assistiu a todo o descarrilamento do PCP nas eleições. No seu caso, também não lhe agradou a vitória socialista, pois que esperava "que mudasse para outro". Mas o PS não tem parado de crescer por ali, desde há 20 anos. "Só hoje de manhã é que vi os resultados da Marinha, e quando vi que a CDU tinha ficado em 4º lugar...admirei-me, pensei que ainda tinha mais votos". Só que não. Contados os boletins, comunistas e verdes alcançam pouco mais de 13% dos votos, contra 14% do Bloco de Esquerda. Traduzindo as percentagens em número de votos, a diferença não é muita. E ambos perdem, afinal, embora o trambolhão seja maior para a CDU: 2536 votos na coligação, 2616 no BE. A primeira perde cerca de 600 votos desde 2015, o segundo perde 279. Mas passa a terceira força política.

"Há muita gente aqui que é anti-comuna. E com o passar dos anos os resultados foram mostrando isso"

Telma Gaspar é um dos rostos do partido na Marinha Grande, e ocupava o 10º lugar na lista de Leiria. Prefere não embandeirar em arco com a ultrapassagem do BE à CDU, "até porque é um partido que tem muitas lutas em comum connosco", como diz ao DN. Mas acredita que os resultados ficam a dever-se "ao trabalho de dois eleitos locais, por todo o concelho: Nuno Machado, na Assembleia Municipal, e Sesinando Araújo, na assembleia de freguesia da Marinha Grande".

"Os jovens estão a mudar a esquerda em todo o país, e isso nota-se aqui na Marinha Grande também", acrescenta esta auxiliar numa escola da cidade. No distrito, o BE conseguiu manter um deputado na Assembleia da República. É Ricardo Vicente, um engenheiro agrónomo que se tornou conhecido em movimentos como os Precários Inflexíveis ou Peniche Livre de Petróleo. Os restantes 9 são repartidos entre quatro para o PS (Raul Castro, Elza Pais, António Sales e João Paulo Pedrosa) e cinco para o PSD - que apesar de perder votos ainda é o partido mais votado: Margarida Balseiro Lopes, Hugo Oliveira, Pedro Roque, Olga Silvestre e João Marques - ex-presidente da Câmara de Pedrógão Grande, que perdeu as eleições para Valdemar Alves, nas últimas autárquicas. De resto, foi também a Pedrógão (e ao PSD) que o Chega foi buscar o cabeça de lista pelo distrito, Luís Paulo Fernandes, representante de uma associação de carrosséis e outras diversões. Dos 1780 votantes, apenas 48 o escolheram.

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