Em dia de boas notícias das sondagens e de Sócrates, Costa ganhou asas

31-08-2019
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Quando a trupe da Juventude Socialista posicionada em frente ao palco da rentrée do PS gritou "E salta, Costa, e salta, Costa", Costa não se limitou a saltitar nas pontinhas dos pés como se vê muitas vezes - saltou mesmo, de braços abertos como se batesse asas. Não levantou voo, mas foi para um lado e para outro do palco, até acabar, sempre aos saltos, entre os braços de Paulo Cafôfo, o candidato do PS à presidência do governo madeirense, e de Olavo Câmara, o líder da JS regional, que é tão conhecido por essa razão, como por ser filho do líder do PS regional, e também por ser o número 2 na lista de candidatos do PS-Madeira nas legislativas de outubro.

Pode ter sido o bom comício do PS em Machico que deu asas ao secretário-geral do PS. Este sábado à tarde os socialistas fizeram um comício vistoso, com muitas bandeiras e slogans gritados pela jota - deve resultar nas imagens de televisão. Mas quem lá foi viu que estava bastante menos gente do que parece na TV e do que os socialistas esperavam.

Casa cheia... de truques

O PS madeirense falava em cinco mil pessoas, mas era fácil de ver que nem metade desse número ali estava. Aliás, se aparecessem as tais cinco mil pessoas, não haveria onde arrumá-las - o PS não só escolheu uma praceta pequena (quando tinha ao lado um espaço bastante maior), como recorreu a todos os truques conhecidos para criar a ilusão de casa cheia: um palco avançado, e barraquinhas de comes-e-bebes de ambos os lados, para afunilar o espaço e encher mesmo com pouca gente. Nos poucos metros entre o palco e o palanque das câmaras de TV estava concentrada a maioria dos espectadores, com muitas bandeiras, e ficava garantida a imagem de "festa rija", como se diz na ilha.

Qualquer político experimentado conhece estes truques, e só se deixa enganar quem quer. Do cimo do palco, Costa sabia mais do que aquilo que se vê no boneco televisivo. Apesar dos apertos com que foi recebido; apesar dos abraços, dos beijos e das selfies que foi repetindo na caminhada até ao palco; apesar da simpatia com que percorreu as barraquinhas provando bolos e licores, e fazendo brindes com Cafofo e os dirigentes do PS regional (parecia uma versão soft da Festa do Chāo da Lagoa do PSD); apesar da quantidade de vezes que ouviu apoiantes do PS madeirense dizer "Desta vez é que é", Costa sabe que, ao contrário do que se perspetiva nas legislativas de 6 de outubro, as eleições regionais de 22 de setembro estão longe de ser favas contadas. Cada vez mais longe, aliás.

Se, no início do ano, tudo parecia bem encaminhado para que o PS pudesse, pela primeira vez, vencer na Madeira, a sorte parece ter mudado - a vitória esmagadora do PSD na região nas eleições europeias (doze pontos de vantagem sobre o PS, numa eleição em que o PSD foi cilindrado a nível nacional) sinalizou essa mudança. Os estudos de opinião (tanto os que foram publicados como os que foram encomendados apenas para uso dos partidos) dizem o mesmo: na melhor das hipóteses, o PS poderá tirar a maioria absoluta ao PSD e tentar fazer uma geringonça regional para chegar ao poder.

Quando a JS lançou outra palavra de ordem - "Costa, amigo, a Madeira está contigo" -, ouviu como resposta "Madeirenses amigos, o Costa está convosco". Não rima, mas deve ser verdade, porque só a necessidade de puxar pela candidatura socialista para as regionais justifica a decisão inédita do PS fazer a rentrée nacional na ilha que é governada pelo PSD há 43 anos.

Sondagem? Sócrates? Sem comentários...

Se, na região autónoma, as notícias são de incerteza, na corrida para as legislativas são bastante mais positivas. Este sábado, uma sondagem publicada no Jornal de Notícias colocou o PS na maioria absoluta, com quase 44% e mais do dobro das intenções de voto do PSD. Os dirigentes partidários da oposição que comentaram a sondagem puseram os seus resultados em causa; Costa simplesmente não precisou de a comentar.

Ainda sobre boas notícias da imprensa desta manhã: no Expresso, José Sócrates assina um texto de opinião em que ataca António Costa. Mais uma vez, Costa recusou-se a comentar. A regra parece ser que as boas notícias existem por si, e não precisam de se estragar com comentários. E poucas notícias serão melhores para Costa do que Sócrates, o ex-PM socialista suspeito de corrupção, a cavar o fosso em relação ao atual secretário-geral do PS.

Foram, provavelmente, essas as notícias que deram mesmo asas a António Costa este sábado no palco de Machico. E ainda mais uma, essa sim, destacada pelo próprio líder socialista: na sexta-feira, pela primeira vez, a taxa de juro da República Portuguesa estava abaixo da taxa de juro da Espanha. Numa campanha em que as "contas certas" e a "boa governação" são dois dos eixos centrais do discurso, estas são as notícias que a Costa convém comentar.

Complemento-creche de 60 euros

Num discurso de meia hora, António Costa limitou-se a repetir o argumentário que há de ser o seu guião até às legislativas: as contas certas, a boa governação, a aposta em políticas que ajudam a combater as alterações climáticas, o combate à pobreza e às desigualdades, a promessa de melhorar os serviços públicos. A ausência de novidades é transformada em virtude numa frase que sintetiza a mensagem eleitoral de Costa: "o PS precisa de mais força para fazer ainda mais e melhor". A continuidade é todo um programa.

Registe-se, no entanto, um anúncio: já se sabia que uma das promessas do PS nas políticas de incentivo à natalidade é a criação de um complemento-creche, integrado no abono de família, este sábado Costa revelou o seu valor: 60 euros por mês. Segundo o programa eleitoral socialista, trata-se de "um valor garantido e universal integrado no abono de família, apoiando em particular a comparticipação no preço [da creche] a partir do segundo filho". Para além deste medida, Costa destacou o novo modelo de deduções no IRS das despesas com os filhos, que passam a aumentar segundo o número de filhos.

Ao falar das políticas de combate às desigualdades, embora sem apresentar novas medidas, Costa não fugiu a uma das polémicas que animaram o verão: a questão do uso das casas de banho das escolas por parte das crianças e jovens transgénero. O secretário-geral do PS defendeu as políticas do governo de combate a todo o tipo de discriminação e desigualdades, independentemente da quantidade de pessoas que sejam vítima de algum tipo de tratamento discriminatório. E insistiu que "duas centenas de crianças que são transgénero têm todo o direito a ser tratadas com dignidade".

Os madeirenses nem têm tradição de ser muito progressistas nas questões ditas fraturantes, mas os que estavam no comício aplaudiram a declaração de Costa.

"Solta-te, liberta-te", cantou depois, no mesmo palco, o artista convidado para animar as hostes antes e a seguir aos discursos políticos. Também cantou "O Conquistador". Dedicou a música dos Da Vinci a Paulo Cafôfo, que, segundo o cantor, vai "conquistar a Madeira". Teve o cuidado de não a dedicar a António Costa - soaria a coisa colonialista...

Quando a trupe da Juventude Socialista posicionada em frente ao palco da rentrée do PS gritou "E salta, Costa, e salta, Costa", Costa não se limitou a saltitar nas pontinhas dos pés como se vê muitas vezes - saltou mesmo, de braços abertos como se batesse asas. Não levantou voo, mas foi para um lado e para outro do palco, até acabar, sempre aos saltos, entre os braços de Paulo Cafôfo, o candidato do PS à presidência do governo madeirense, e de Olavo Câmara, o líder da JS regional, que é tão conhecido por essa razão, como por ser filho do líder do PS regional, e também por ser o número 2 na lista de candidatos do PS-Madeira nas legislativas de outubro.

Pode ter sido o bom comício do PS em Machico que deu asas ao secretário-geral do PS. Este sábado à tarde os socialistas fizeram um comício vistoso, com muitas bandeiras e slogans gritados pela jota - deve resultar nas imagens de televisão. Mas quem lá foi viu que estava bastante menos gente do que parece na TV e do que os socialistas esperavam.

Casa cheia... de truques

O PS madeirense falava em cinco mil pessoas, mas era fácil de ver que nem metade desse número ali estava. Aliás, se aparecessem as tais cinco mil pessoas, não haveria onde arrumá-las - o PS não só escolheu uma praceta pequena (quando tinha ao lado um espaço bastante maior), como recorreu a todos os truques conhecidos para criar a ilusão de casa cheia: um palco avançado, e barraquinhas de comes-e-bebes de ambos os lados, para afunilar o espaço e encher mesmo com pouca gente. Nos poucos metros entre o palco e o palanque das câmaras de TV estava concentrada a maioria dos espectadores, com muitas bandeiras, e ficava garantida a imagem de "festa rija", como se diz na ilha.

Qualquer político experimentado conhece estes truques, e só se deixa enganar quem quer. Do cimo do palco, Costa sabia mais do que aquilo que se vê no boneco televisivo. Apesar dos apertos com que foi recebido; apesar dos abraços, dos beijos e das selfies que foi repetindo na caminhada até ao palco; apesar da simpatia com que percorreu as barraquinhas provando bolos e licores, e fazendo brindes com Cafofo e os dirigentes do PS regional (parecia uma versão soft da Festa do Chāo da Lagoa do PSD); apesar da quantidade de vezes que ouviu apoiantes do PS madeirense dizer "Desta vez é que é", Costa sabe que, ao contrário do que se perspetiva nas legislativas de 6 de outubro, as eleições regionais de 22 de setembro estão longe de ser favas contadas. Cada vez mais longe, aliás.

Se, no início do ano, tudo parecia bem encaminhado para que o PS pudesse, pela primeira vez, vencer na Madeira, a sorte parece ter mudado - a vitória esmagadora do PSD na região nas eleições europeias (doze pontos de vantagem sobre o PS, numa eleição em que o PSD foi cilindrado a nível nacional) sinalizou essa mudança. Os estudos de opinião (tanto os que foram publicados como os que foram encomendados apenas para uso dos partidos) dizem o mesmo: na melhor das hipóteses, o PS poderá tirar a maioria absoluta ao PSD e tentar fazer uma geringonça regional para chegar ao poder.

Quando a JS lançou outra palavra de ordem - "Costa, amigo, a Madeira está contigo" -, ouviu como resposta "Madeirenses amigos, o Costa está convosco". Não rima, mas deve ser verdade, porque só a necessidade de puxar pela candidatura socialista para as regionais justifica a decisão inédita do PS fazer a rentrée nacional na ilha que é governada pelo PSD há 43 anos.

Sondagem? Sócrates? Sem comentários...

Se, na região autónoma, as notícias são de incerteza, na corrida para as legislativas são bastante mais positivas. Este sábado, uma sondagem publicada no Jornal de Notícias colocou o PS na maioria absoluta, com quase 44% e mais do dobro das intenções de voto do PSD. Os dirigentes partidários da oposição que comentaram a sondagem puseram os seus resultados em causa; Costa simplesmente não precisou de a comentar.

Ainda sobre boas notícias da imprensa desta manhã: no Expresso, José Sócrates assina um texto de opinião em que ataca António Costa. Mais uma vez, Costa recusou-se a comentar. A regra parece ser que as boas notícias existem por si, e não precisam de se estragar com comentários. E poucas notícias serão melhores para Costa do que Sócrates, o ex-PM socialista suspeito de corrupção, a cavar o fosso em relação ao atual secretário-geral do PS.

Foram, provavelmente, essas as notícias que deram mesmo asas a António Costa este sábado no palco de Machico. E ainda mais uma, essa sim, destacada pelo próprio líder socialista: na sexta-feira, pela primeira vez, a taxa de juro da República Portuguesa estava abaixo da taxa de juro da Espanha. Numa campanha em que as "contas certas" e a "boa governação" são dois dos eixos centrais do discurso, estas são as notícias que a Costa convém comentar.

Complemento-creche de 60 euros

Num discurso de meia hora, António Costa limitou-se a repetir o argumentário que há de ser o seu guião até às legislativas: as contas certas, a boa governação, a aposta em políticas que ajudam a combater as alterações climáticas, o combate à pobreza e às desigualdades, a promessa de melhorar os serviços públicos. A ausência de novidades é transformada em virtude numa frase que sintetiza a mensagem eleitoral de Costa: "o PS precisa de mais força para fazer ainda mais e melhor". A continuidade é todo um programa.

Registe-se, no entanto, um anúncio: já se sabia que uma das promessas do PS nas políticas de incentivo à natalidade é a criação de um complemento-creche, integrado no abono de família, este sábado Costa revelou o seu valor: 60 euros por mês. Segundo o programa eleitoral socialista, trata-se de "um valor garantido e universal integrado no abono de família, apoiando em particular a comparticipação no preço [da creche] a partir do segundo filho". Para além deste medida, Costa destacou o novo modelo de deduções no IRS das despesas com os filhos, que passam a aumentar segundo o número de filhos.

Ao falar das políticas de combate às desigualdades, embora sem apresentar novas medidas, Costa não fugiu a uma das polémicas que animaram o verão: a questão do uso das casas de banho das escolas por parte das crianças e jovens transgénero. O secretário-geral do PS defendeu as políticas do governo de combate a todo o tipo de discriminação e desigualdades, independentemente da quantidade de pessoas que sejam vítima de algum tipo de tratamento discriminatório. E insistiu que "duas centenas de crianças que são transgénero têm todo o direito a ser tratadas com dignidade".

Os madeirenses nem têm tradição de ser muito progressistas nas questões ditas fraturantes, mas os que estavam no comício aplaudiram a declaração de Costa.

"Solta-te, liberta-te", cantou depois, no mesmo palco, o artista convidado para animar as hostes antes e a seguir aos discursos políticos. Também cantou "O Conquistador". Dedicou a música dos Da Vinci a Paulo Cafôfo, que, segundo o cantor, vai "conquistar a Madeira". Teve o cuidado de não a dedicar a António Costa - soaria a coisa colonialista...

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