A reforma que Rio quer fazer em segredo e que o Expresso revelou

28-12-2018
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PSD mexe na composição de conselhos superiores, reduz custas e quer remuneração variável dos magistrados

FOTO ANTÓNIO PEDRO SANTOS/LUSA

SD entregou aos restantes partidos uma proposta para um pacto de reforma da Justiça, com o pedido de que todos mantivessem em absoluto sigilo o conteúdo da iniciativa. Rui Rio entregou, em papel, uma única cópia do documento, insistindo para que não houvesse fugas de informação sobre as 51 páginas, a que o Expresso teve acesso.

A iniciativa de Rio foi considerada “estranha” por diversos responsáveis dos partidos abordados, com quem o Expresso falou sob condição de anonimato. Ninguém quis fazer a desfeita de recusar à partida a iniciativa, mas tudo é considerado “insólito”. Pela exigência de secretismo, pela metodologia proposta (um grupo de peritos indicados pelos partidos, que elaborariam um acordo técnico), por prever que o Presidente da República patrocinasse esse pacto a que o PSD chama “Compromisso para a Justiça” (Marcelo também recebeu uma cópia), por partir do pressuposto de que os partidos devessem chegar a acordo sobre a reforma da Justiça “despindo-se de conceitos e pré-conceitos ideológico-partidários”, como se lê na nota justificativa do documento.

IDEIAS CONCRETAS... E PRINCÍPIOS VAGOS

O texto entregue por Rio aos líderes partidários — à exceção de Jerónimo de Sousa, por dificuldade de agenda, e foi Fernando Negrão quem falou com o seu homólogo, João Oliveira — mistura ideias concretas, algumas originais, com princípios vagos e propostas de temas a debater em que o PSD não revela a sua posição.

Os sociais-democratas mostram um pensamento bastante arrumado sobre a arquitetura dos órgãos de governo das magistraturas. Metade do documento é sobre isso: recomposição dos Conselhos Superiores, limitação de mandatos, alteração dos sistemas de inspeções, planos de contingência para recuperação de atrasos... E há diversas outras propostas concretas, embora a precisar de pormenor (ver caixa), como a redução de custas ou a alteração do sistema remuneratório dos juízes e magistrados do Ministério Público. Neste caso, a ideia do PSD é introduzir na remuneração uma componente variável que “premeie” (ou não) os indicadores qualitativos e quantitativos do trabalho do magistrado. A introdução de critérios qualitativos de avaliação é defendida em diversas frentes, num documento em que são feitas muitas propostas de auditorias, inventários, levantamentos e estudos.

A par de ideias concretas, também as há bastante vagas — enunciação de princípios ou objetivos, sem explicação de como fazê-lo. Um exemplo salta à vista: o PSD considera, sobre o cargo de procurador-geral da República, que deverá ser “definitivamente clarificado” o número de mandatos e a possibilidade (ou não) de renovação — mas não apresenta a sua resposta à questão.

Uma ausência de posição contraditória com o facto de, nos diversos conselhos superiores, o PSD tomar posição sobre a limitação de mandatos em relação a outros cargos. Por exemplo, os membros eleitos do Conselho Superior de Magistratura devem seguir a regra de dois mandatos consecutivos, renovável por um mandato no período subsequente; os juízes devem manter-se com mandato de três anos, renovável uma só vez. Já os membros designados do Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais devem fazer um mandato, renovável uma vez. Para os membros do Conselho Superior do Ministério Público, a proposta é de apenas dois mandatos consecutivos — mas para o PGR, que preside ao CSMP, o PSD nada diz.

Há outras questões importantes que o documento do PSD levanta, mas sem definir uma posição. Por exemplo, a possibilidade de criação de um Supremo Tribunal único ou um Conselho Superior de Magistratura unificado (juntando jurisdição comum e jurisdição administrativa e fiscal). “Nada impede que o debate se realize”, diz o PSD, mas “com enormes cautelas”... Parece ser uma ideia que o PSD não apadrinha, mas não fica claro no documento. Há mais: o PSD quer para o Centro de Estudos Judiciários um “plano” para acelerar a formação de mais juízes e mais magistrados do MP. Mas não explica: diz apenas que deve ser o Conselho Superior, o Ministério da Justiça e o CEJ a fazê-lo. O mapa judiciário deve ser objeto de “análise”. O documento não avança com qualquer análise, apesar de Mónica Quintela, porta-voz do PSD para a Justiça já ter afirmado ao Expresso que defendia a reversão do encerramento de alguns tribunais.

O próprio PSD assume, na nota justificativa, que os “concretos modos” de implementação destas “opções de base” se situam “a outro nível”. No final da nota justificativa, o “compromisso” inclui uma data por preencher, e espaço para assinaturas dos vários partidos signatários. Só faltam mesmo essas assinaturas.

ALGUMAS PROPOSTAS

REMUNERAÇÃO DE JUÍZES E MAGISTRADOS

Componente de remuneração variável em função de indicadores quantitativos e qualitativos sobre o trabalho desempenhado.

REDUÇÃO DOS CUSTOS DA JUSTIÇA

Redução das custas judiciais, e valores diferentes de acordo com os rendimentos dos cidadãos (e não apenas conforme o valor da causa). Possibilidade de pagamento faseado da taxa de justiça.

PRAZOS MAIS CURTOS

Fixação de prazos perentórios para a prática judiciária de atos, com consequências disciplinares ou de avaliação em caso de incumprimento injustificado (não diz que prazos).

COMPOSIÇÃO DOS CONSELHOS SUPERIORES

Garantir nos Conselhos Superiores uma maioria de cidadãos não ligados à carreira, ao sistema judiciário ou a profissões jurídicas.

MAIS PESO DO PR

O Presidente deve nomear mais vogais dos diversos conselhos superiores: três no CS de Magistratura e no CS dos Tribunais Administrativos e Fiscais, e dois no CS do Ministério Público (aqui, apenas 8 membros indicados pelo MP).

FIM DOS PROCURADORES DISTRITAIS PSD

defende que sejam extintos — o PGR articula-se com os 23 magistrados do MP coordenadores das comarcas.

DEPOIMENTOS GRAVADOS

Na fase de inquérito a regra é gravação áudio/vídeo, sem os depoimentos serem datilografados.

MAIS ESPECIALIZAÇÃO

Maior especialização dos juízes e magistrados, mais secções especializadas do MP, equipas de técnicos especializados.

PSD coloca pressão sobre liberdade de imprensa

Rio propõe mais medidas de combate à violação do segredo de justiça e também o reforço do direito ao “bom nome”

As críticas à comunicação social são uma constante na carreira política de Rui Rio e, a partir de certa altura, a preocupação com a violação do segredo de Justiça também entrou no repertório de assuntos que o ex-autarca nunca perde uma oportunidade de abordar. E ambas acabam por estar presentes, embora de forma lateral ou pouco aprofundada, no “Compromisso com a Justiça” que o líder social-democrata quer que os restantes partidos assinem com o PSD.

Na parte da proposta de reforma da Justiça dedicada a “outras alterações pontuais à legislação penal”, o PSD aponta para o problema, “reconhecido por todos”, da violação do segredo de Justiça. Que chegou, defende o PSD, a um ponto “insustentável”, com a “inevitável” degradação da imagem da Justiça. Contra isso, o PSD propõe que, embora mantendo o princípio da publicidade no processo penal, seja reponderada a proteção desse valor jurídico, “equacionando-se medidas de combate à violação do segredo de Justiça”.

Que medidas em concreto? Que tipo de “reponderação”? O documento não esclarece. Embora a violação do segredo de Justiça seja um dos temas mais recorrentes das intervenções de Rui Rio sobre Justiça (e que justificou reiteradas críticas ao mandato da anterior procuradora-geral da República), o assunto é despachado em pouco mais de cinco linhas, sem qualquer proposta concreta.

Adiante, no documento, é lançada outra questão, numa alínea com uma linha e meia: reforço da tutela de valores pessoais — “designadamente” do direito ao “bom nome, honra e consideração”. Sem enquadramento, sem mais explicações, e mais uma vez sem mais pormenor sobre propostas concretas.

SEGREDO É PARA “DEZ MILHÕES”

Embora nada as relacione no documento do PSD, as duas questões estão relacionadas e vão dar a outro tema caro a Rui Rio: a comunicação social e a liberdade de imprensa. Que, quer através de uma proposta quer através da outra, acabam por ficar limitadas ou, pelo menos, sob pressão. Rio nunca escondeu o seu objetivo: punir qualquer violação do segredo de Justiça, venha de onde vier, sem contemplações para jornalistas. “É para cumprir, e por 10 milhões de portugueses”, disse numa entrevista ao “Sol”. E já várias vezes defendeu punições exemplares para os crimes de imprensa, e até processos mais rápidos para esses casos.

Foi a porta-voz do PSD para a Justiça, Mónica Quintela, quem, em entrevista ao Expresso, em julho, relacionou a questão da violação do segredo de Justiça com a necessidade do reforço dos direitos de personalidade, correlacionando ambas com a comunicação social e o direito à liberdade de imprensa. É fácil de perceber: por um lado, a violação do segredo de Justiça é referida quando existe a divulgação dessas informações na comunicação social; por outro, muitas das queixas por abuso de liberdade de imprensa invocam a necessidade de defender o “bom nome, honra e consideração”, que os queixosos consideram ter sido prejudicados com a divulgação de informações sob segredo.

Na entrevista ao Expresso, Mónica Quintela revelou que o PSD iria propor medidas para o reforço do segredo de Justiça (sem desvendar quais). “Todos sabemos que existem violações do segredo de Justiça e conseguimos identificar de onde é que elas existem. A questão é: sem que esteja de forma alguma em causa a liberdade de imprensa, de expressão e de informação, que é fundamental, tem de haver se calhar um reforço da tutela dos direitos de personalidade”, defendeu a advogada, pois “todos temos direito ao nosso bom nome.”

Questionada sobre se isso significa punições agravadas para violação do segredo de Justiça, disse que “não, de maneira nenhuma”. E pôs assim a questão: “Quando um processo é trazido à praça pública há dois direitos preponderantes — o direito à informação e o contradireito, que é o direito ao bom nome e à presunção de inocência. Há interesses conflituantes. Tem de se perceber qual o entendimento que em termos de uma reforma global venha a ser perfilado.” Apesar da insistência do Expresso para perceber de que forma o PSD conseguiria a quadratura do círculo, Quintela refugiou-se no facto de ainda não ter “uma proposta em concreto”. “A seu tempo essa proposta será trabalhada”, garantiu.

Artigo publicado na edição do EXPRESSO de 13 de outubro de 2018

PSD mexe na composição de conselhos superiores, reduz custas e quer remuneração variável dos magistrados

FOTO ANTÓNIO PEDRO SANTOS/LUSA

SD entregou aos restantes partidos uma proposta para um pacto de reforma da Justiça, com o pedido de que todos mantivessem em absoluto sigilo o conteúdo da iniciativa. Rui Rio entregou, em papel, uma única cópia do documento, insistindo para que não houvesse fugas de informação sobre as 51 páginas, a que o Expresso teve acesso.

A iniciativa de Rio foi considerada “estranha” por diversos responsáveis dos partidos abordados, com quem o Expresso falou sob condição de anonimato. Ninguém quis fazer a desfeita de recusar à partida a iniciativa, mas tudo é considerado “insólito”. Pela exigência de secretismo, pela metodologia proposta (um grupo de peritos indicados pelos partidos, que elaborariam um acordo técnico), por prever que o Presidente da República patrocinasse esse pacto a que o PSD chama “Compromisso para a Justiça” (Marcelo também recebeu uma cópia), por partir do pressuposto de que os partidos devessem chegar a acordo sobre a reforma da Justiça “despindo-se de conceitos e pré-conceitos ideológico-partidários”, como se lê na nota justificativa do documento.

IDEIAS CONCRETAS... E PRINCÍPIOS VAGOS

O texto entregue por Rio aos líderes partidários — à exceção de Jerónimo de Sousa, por dificuldade de agenda, e foi Fernando Negrão quem falou com o seu homólogo, João Oliveira — mistura ideias concretas, algumas originais, com princípios vagos e propostas de temas a debater em que o PSD não revela a sua posição.

Os sociais-democratas mostram um pensamento bastante arrumado sobre a arquitetura dos órgãos de governo das magistraturas. Metade do documento é sobre isso: recomposição dos Conselhos Superiores, limitação de mandatos, alteração dos sistemas de inspeções, planos de contingência para recuperação de atrasos... E há diversas outras propostas concretas, embora a precisar de pormenor (ver caixa), como a redução de custas ou a alteração do sistema remuneratório dos juízes e magistrados do Ministério Público. Neste caso, a ideia do PSD é introduzir na remuneração uma componente variável que “premeie” (ou não) os indicadores qualitativos e quantitativos do trabalho do magistrado. A introdução de critérios qualitativos de avaliação é defendida em diversas frentes, num documento em que são feitas muitas propostas de auditorias, inventários, levantamentos e estudos.

A par de ideias concretas, também as há bastante vagas — enunciação de princípios ou objetivos, sem explicação de como fazê-lo. Um exemplo salta à vista: o PSD considera, sobre o cargo de procurador-geral da República, que deverá ser “definitivamente clarificado” o número de mandatos e a possibilidade (ou não) de renovação — mas não apresenta a sua resposta à questão.

Uma ausência de posição contraditória com o facto de, nos diversos conselhos superiores, o PSD tomar posição sobre a limitação de mandatos em relação a outros cargos. Por exemplo, os membros eleitos do Conselho Superior de Magistratura devem seguir a regra de dois mandatos consecutivos, renovável por um mandato no período subsequente; os juízes devem manter-se com mandato de três anos, renovável uma só vez. Já os membros designados do Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais devem fazer um mandato, renovável uma vez. Para os membros do Conselho Superior do Ministério Público, a proposta é de apenas dois mandatos consecutivos — mas para o PGR, que preside ao CSMP, o PSD nada diz.

Há outras questões importantes que o documento do PSD levanta, mas sem definir uma posição. Por exemplo, a possibilidade de criação de um Supremo Tribunal único ou um Conselho Superior de Magistratura unificado (juntando jurisdição comum e jurisdição administrativa e fiscal). “Nada impede que o debate se realize”, diz o PSD, mas “com enormes cautelas”... Parece ser uma ideia que o PSD não apadrinha, mas não fica claro no documento. Há mais: o PSD quer para o Centro de Estudos Judiciários um “plano” para acelerar a formação de mais juízes e mais magistrados do MP. Mas não explica: diz apenas que deve ser o Conselho Superior, o Ministério da Justiça e o CEJ a fazê-lo. O mapa judiciário deve ser objeto de “análise”. O documento não avança com qualquer análise, apesar de Mónica Quintela, porta-voz do PSD para a Justiça já ter afirmado ao Expresso que defendia a reversão do encerramento de alguns tribunais.

O próprio PSD assume, na nota justificativa, que os “concretos modos” de implementação destas “opções de base” se situam “a outro nível”. No final da nota justificativa, o “compromisso” inclui uma data por preencher, e espaço para assinaturas dos vários partidos signatários. Só faltam mesmo essas assinaturas.

ALGUMAS PROPOSTAS

REMUNERAÇÃO DE JUÍZES E MAGISTRADOS

Componente de remuneração variável em função de indicadores quantitativos e qualitativos sobre o trabalho desempenhado.

REDUÇÃO DOS CUSTOS DA JUSTIÇA

Redução das custas judiciais, e valores diferentes de acordo com os rendimentos dos cidadãos (e não apenas conforme o valor da causa). Possibilidade de pagamento faseado da taxa de justiça.

PRAZOS MAIS CURTOS

Fixação de prazos perentórios para a prática judiciária de atos, com consequências disciplinares ou de avaliação em caso de incumprimento injustificado (não diz que prazos).

COMPOSIÇÃO DOS CONSELHOS SUPERIORES

Garantir nos Conselhos Superiores uma maioria de cidadãos não ligados à carreira, ao sistema judiciário ou a profissões jurídicas.

MAIS PESO DO PR

O Presidente deve nomear mais vogais dos diversos conselhos superiores: três no CS de Magistratura e no CS dos Tribunais Administrativos e Fiscais, e dois no CS do Ministério Público (aqui, apenas 8 membros indicados pelo MP).

FIM DOS PROCURADORES DISTRITAIS PSD

defende que sejam extintos — o PGR articula-se com os 23 magistrados do MP coordenadores das comarcas.

DEPOIMENTOS GRAVADOS

Na fase de inquérito a regra é gravação áudio/vídeo, sem os depoimentos serem datilografados.

MAIS ESPECIALIZAÇÃO

Maior especialização dos juízes e magistrados, mais secções especializadas do MP, equipas de técnicos especializados.

PSD coloca pressão sobre liberdade de imprensa

Rio propõe mais medidas de combate à violação do segredo de justiça e também o reforço do direito ao “bom nome”

As críticas à comunicação social são uma constante na carreira política de Rui Rio e, a partir de certa altura, a preocupação com a violação do segredo de Justiça também entrou no repertório de assuntos que o ex-autarca nunca perde uma oportunidade de abordar. E ambas acabam por estar presentes, embora de forma lateral ou pouco aprofundada, no “Compromisso com a Justiça” que o líder social-democrata quer que os restantes partidos assinem com o PSD.

Na parte da proposta de reforma da Justiça dedicada a “outras alterações pontuais à legislação penal”, o PSD aponta para o problema, “reconhecido por todos”, da violação do segredo de Justiça. Que chegou, defende o PSD, a um ponto “insustentável”, com a “inevitável” degradação da imagem da Justiça. Contra isso, o PSD propõe que, embora mantendo o princípio da publicidade no processo penal, seja reponderada a proteção desse valor jurídico, “equacionando-se medidas de combate à violação do segredo de Justiça”.

Que medidas em concreto? Que tipo de “reponderação”? O documento não esclarece. Embora a violação do segredo de Justiça seja um dos temas mais recorrentes das intervenções de Rui Rio sobre Justiça (e que justificou reiteradas críticas ao mandato da anterior procuradora-geral da República), o assunto é despachado em pouco mais de cinco linhas, sem qualquer proposta concreta.

Adiante, no documento, é lançada outra questão, numa alínea com uma linha e meia: reforço da tutela de valores pessoais — “designadamente” do direito ao “bom nome, honra e consideração”. Sem enquadramento, sem mais explicações, e mais uma vez sem mais pormenor sobre propostas concretas.

SEGREDO É PARA “DEZ MILHÕES”

Embora nada as relacione no documento do PSD, as duas questões estão relacionadas e vão dar a outro tema caro a Rui Rio: a comunicação social e a liberdade de imprensa. Que, quer através de uma proposta quer através da outra, acabam por ficar limitadas ou, pelo menos, sob pressão. Rio nunca escondeu o seu objetivo: punir qualquer violação do segredo de Justiça, venha de onde vier, sem contemplações para jornalistas. “É para cumprir, e por 10 milhões de portugueses”, disse numa entrevista ao “Sol”. E já várias vezes defendeu punições exemplares para os crimes de imprensa, e até processos mais rápidos para esses casos.

Foi a porta-voz do PSD para a Justiça, Mónica Quintela, quem, em entrevista ao Expresso, em julho, relacionou a questão da violação do segredo de Justiça com a necessidade do reforço dos direitos de personalidade, correlacionando ambas com a comunicação social e o direito à liberdade de imprensa. É fácil de perceber: por um lado, a violação do segredo de Justiça é referida quando existe a divulgação dessas informações na comunicação social; por outro, muitas das queixas por abuso de liberdade de imprensa invocam a necessidade de defender o “bom nome, honra e consideração”, que os queixosos consideram ter sido prejudicados com a divulgação de informações sob segredo.

Na entrevista ao Expresso, Mónica Quintela revelou que o PSD iria propor medidas para o reforço do segredo de Justiça (sem desvendar quais). “Todos sabemos que existem violações do segredo de Justiça e conseguimos identificar de onde é que elas existem. A questão é: sem que esteja de forma alguma em causa a liberdade de imprensa, de expressão e de informação, que é fundamental, tem de haver se calhar um reforço da tutela dos direitos de personalidade”, defendeu a advogada, pois “todos temos direito ao nosso bom nome.”

Questionada sobre se isso significa punições agravadas para violação do segredo de Justiça, disse que “não, de maneira nenhuma”. E pôs assim a questão: “Quando um processo é trazido à praça pública há dois direitos preponderantes — o direito à informação e o contradireito, que é o direito ao bom nome e à presunção de inocência. Há interesses conflituantes. Tem de se perceber qual o entendimento que em termos de uma reforma global venha a ser perfilado.” Apesar da insistência do Expresso para perceber de que forma o PSD conseguiria a quadratura do círculo, Quintela refugiou-se no facto de ainda não ter “uma proposta em concreto”. “A seu tempo essa proposta será trabalhada”, garantiu.

Artigo publicado na edição do EXPRESSO de 13 de outubro de 2018

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