Cromos da Bola: Patrocinadores Jeitosos

26-07-2018
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Estávamos em 1989. Xavier e Resende saíam de Riade a pensar em altos voos, antes de se despenharem pelos precipícios da desilusão. Miguel Veloso aprendia o B-A-BA das madeixas, enquanto o seu pai treinava penalties contra um boneco do Van Breukelen durante serões a fio. E pelos nossos relvados, camisolas aparentemente simples cobriam-se de patrocínios que revelar-se-iam históricos. Eis uma pequena amostra.Apenas um nome era capaz de tornar o habitualmente sorumbático Isaías numa espécie de criança sorridente. Esse nome era “Teresinha”.Teresinha foi como ficou conhecida a mais apaixonante sapataria de todos os tempos. E Teresinha tinha outra irmã, Beleza de seu nome, também ela uma sapataria, também ela uma aficionada pelo futebol do Porto. Porém, duas irmãs, duas paixões: enquanto que Teresinha perdera-se de amores pelo xadrez do Bessa, Beleza grudava-se como uma lapa aos bancos de suplentes das Antas.Ah, Teresinha, Teresinha; quantos boavisteiros trajaram com o teu nome cravado a letras vermelhas no seu torso musculado… De Hubart a Phil Walker, quem ficou indiferente ao charme discreto da mais famosa Teresa do futebol nacional?É justo reconhecer: o nosso imaginário futebolístico está marcado a tinta permanente por esta Teresinha. Quantos de nós, ao observar as bravas vestes quadriculadas, não quisemos conhecer-te de perto, entrar dentro de ti, tactear o teu couro e apreciar o conforto de um 42 biqueira larga? Todos nós, Teresinha. Também queríamos sentir a nossa peúga acariciada por ti e sermos Nelsons Bertolazzis por um dia.Anos mais tarde, Teresinha revelou-se finalmente aos nossos olhos, sob a forma de menina da TV Cabo. Não nos desiludiste, Teresinha – não eras nenhuma bota da tropa, mas o sapatinho de Cinderela que humedecia os nossos sonhos.A casualidade assaz natural de N’Dinga, espantado com o insólito objecto que lhe espetaram diante dele (“É só uma máquina fotográfica, N’Dinga”), apenas encontra contraste no vigor com que Tensai foi estampado na alva e engelhada camisola vimaranense.Para dizer a verdade, a Le Coq Sportif apenas queria equipar o conjunto de trolhas que iria fazer umas obras na mansão do seu presidente. Vai daí, compraram cerca de duas dúzias de t-shirts brancas XL na Feira de Espinho por uma verdadeira pechincha. Só então é que veio a ideia de fazer um equipamento desportivo a partir das t-shirts, depois do sindicato dos trolhas ter rotulado o equipamento proposto de “indigno para toda a classe profissional”.A direcção do Vitória ainda hesitou – “Eh pá, com aquelas golas em plenos anos 80 vamo-nos fartar de ser gozados, até perante o Fafe” – mas quando a Tensai lhes apresentou a sua proposta de patrocínio não restaram dúvidas: “Sim senhor, aquilo é que é pujança na ocupação do espaço; quase que já parece um equipamento de futebol a sério”.Apesar do ar confuso de N’Dinga, tal opção fazia sentido: um equipamento rudimentar com um patrocínio ligado à tecnologia. Até era um avanço no sentido da modernidade. Antes de Tensai tinha sido o Atum General. Dizem que uma lata de atum vazia pagava o próprio equipamento da Le Coq Sportif.Este breve lamiré despede-se não com um exemplar, mas toda uma equipa. É o mínimo que se podia fazer. Falamos do saudoso Beira-Mar, que regressara ao convívio da elite. Ou melhor, alguns chamar-lhe-iam Beira-Mar, mas os mais atentos designavam este brioso colectivo de “Exército das Telhas Campos”.As Telhas Campos eram a verdadeira razão de ser destes guerreiros, tal o peso do seu prestígio. Todo o plantel treinava-se afincadamente durante a semana apenas para chegar ao Domingo e passear com altivez o nome das valentes Telhas Campos pelas quatro linhas deste rectângulo à beira-mar plantado. É possível vislumbrarmos o orgulho indisfarçável de mitos vivos como Dinis, Abdel-Ghany, Alain e Bugre, bem como a alegria transbordante de personagens como Paulo Campos, Costeado, Paquito e João Gouveia. O guarda-redes Miguel era naturalmente o mais triste por não ter direito àquele pedaço sagrado de tecido publicitário.Todo o plantel uniu-se em nome deste ideal: evocavam o nome das Telhas Campos nas alturas más, glorificavam em êxtase a qualidade incomparável do material argiloso nas alturas boas e nunca deixaram que qualquer cerâmica espanhola denegrisse o seu bom-nome. Por exemplo, Dinis nunca foi capaz de partir uma Telha Campos que fosse na cabeça de Paquito – utilizava antes material em borracha impermeável, que até podia ser reutilizado em outras agressões semelhantes ou então para o telhado da sua garagem.Há quem diga simplesmente que os tipos não batiam bem da telha, mas isso já não é para aqui chamado.Agradecimento ao blogue Glórias do Passado pelo magnífico arquivo fotográfico.


Estávamos em 1989. Xavier e Resende saíam de Riade a pensar em altos voos, antes de se despenharem pelos precipícios da desilusão. Miguel Veloso aprendia o B-A-BA das madeixas, enquanto o seu pai treinava penalties contra um boneco do Van Breukelen durante serões a fio. E pelos nossos relvados, camisolas aparentemente simples cobriam-se de patrocínios que revelar-se-iam históricos. Eis uma pequena amostra.Apenas um nome era capaz de tornar o habitualmente sorumbático Isaías numa espécie de criança sorridente. Esse nome era “Teresinha”.Teresinha foi como ficou conhecida a mais apaixonante sapataria de todos os tempos. E Teresinha tinha outra irmã, Beleza de seu nome, também ela uma sapataria, também ela uma aficionada pelo futebol do Porto. Porém, duas irmãs, duas paixões: enquanto que Teresinha perdera-se de amores pelo xadrez do Bessa, Beleza grudava-se como uma lapa aos bancos de suplentes das Antas.Ah, Teresinha, Teresinha; quantos boavisteiros trajaram com o teu nome cravado a letras vermelhas no seu torso musculado… De Hubart a Phil Walker, quem ficou indiferente ao charme discreto da mais famosa Teresa do futebol nacional?É justo reconhecer: o nosso imaginário futebolístico está marcado a tinta permanente por esta Teresinha. Quantos de nós, ao observar as bravas vestes quadriculadas, não quisemos conhecer-te de perto, entrar dentro de ti, tactear o teu couro e apreciar o conforto de um 42 biqueira larga? Todos nós, Teresinha. Também queríamos sentir a nossa peúga acariciada por ti e sermos Nelsons Bertolazzis por um dia.Anos mais tarde, Teresinha revelou-se finalmente aos nossos olhos, sob a forma de menina da TV Cabo. Não nos desiludiste, Teresinha – não eras nenhuma bota da tropa, mas o sapatinho de Cinderela que humedecia os nossos sonhos.A casualidade assaz natural de N’Dinga, espantado com o insólito objecto que lhe espetaram diante dele (“É só uma máquina fotográfica, N’Dinga”), apenas encontra contraste no vigor com que Tensai foi estampado na alva e engelhada camisola vimaranense.Para dizer a verdade, a Le Coq Sportif apenas queria equipar o conjunto de trolhas que iria fazer umas obras na mansão do seu presidente. Vai daí, compraram cerca de duas dúzias de t-shirts brancas XL na Feira de Espinho por uma verdadeira pechincha. Só então é que veio a ideia de fazer um equipamento desportivo a partir das t-shirts, depois do sindicato dos trolhas ter rotulado o equipamento proposto de “indigno para toda a classe profissional”.A direcção do Vitória ainda hesitou – “Eh pá, com aquelas golas em plenos anos 80 vamo-nos fartar de ser gozados, até perante o Fafe” – mas quando a Tensai lhes apresentou a sua proposta de patrocínio não restaram dúvidas: “Sim senhor, aquilo é que é pujança na ocupação do espaço; quase que já parece um equipamento de futebol a sério”.Apesar do ar confuso de N’Dinga, tal opção fazia sentido: um equipamento rudimentar com um patrocínio ligado à tecnologia. Até era um avanço no sentido da modernidade. Antes de Tensai tinha sido o Atum General. Dizem que uma lata de atum vazia pagava o próprio equipamento da Le Coq Sportif.Este breve lamiré despede-se não com um exemplar, mas toda uma equipa. É o mínimo que se podia fazer. Falamos do saudoso Beira-Mar, que regressara ao convívio da elite. Ou melhor, alguns chamar-lhe-iam Beira-Mar, mas os mais atentos designavam este brioso colectivo de “Exército das Telhas Campos”.As Telhas Campos eram a verdadeira razão de ser destes guerreiros, tal o peso do seu prestígio. Todo o plantel treinava-se afincadamente durante a semana apenas para chegar ao Domingo e passear com altivez o nome das valentes Telhas Campos pelas quatro linhas deste rectângulo à beira-mar plantado. É possível vislumbrarmos o orgulho indisfarçável de mitos vivos como Dinis, Abdel-Ghany, Alain e Bugre, bem como a alegria transbordante de personagens como Paulo Campos, Costeado, Paquito e João Gouveia. O guarda-redes Miguel era naturalmente o mais triste por não ter direito àquele pedaço sagrado de tecido publicitário.Todo o plantel uniu-se em nome deste ideal: evocavam o nome das Telhas Campos nas alturas más, glorificavam em êxtase a qualidade incomparável do material argiloso nas alturas boas e nunca deixaram que qualquer cerâmica espanhola denegrisse o seu bom-nome. Por exemplo, Dinis nunca foi capaz de partir uma Telha Campos que fosse na cabeça de Paquito – utilizava antes material em borracha impermeável, que até podia ser reutilizado em outras agressões semelhantes ou então para o telhado da sua garagem.Há quem diga simplesmente que os tipos não batiam bem da telha, mas isso já não é para aqui chamado.Agradecimento ao blogue Glórias do Passado pelo magnífico arquivo fotográfico.

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