Estava escrito nas estrelas que Centeno teria de se assumir como rosto de uma Europa longe dos seus povos, das dinâmicas existentes no espaço europeu e da envolvente internacional
A realidade mediática e a digital são sempre capazes de nos surpreender, mesmo no tradicional epicentro da silly season. Não sei se será mais estúpida a época ou aqueles que rasgam as vestes para tecer considerações que se destinam apenas a preencher os egos frustrados, a fazer prova de vida de um certo perfil de intervenção pública ou a exercitar a falta de memórias de verões passados. A todos importa saber que os portugueses sabem muito bem onde estiveram nos verões passados.
Vem isto a propósito da comoção de alguns em relação à alocução de Mário Centeno, presidente do Eurogrupo, sobre o fim do programa de ajustamento económico da Grécia. Não percebo a comoção.
Se o PCP e o BE podem baixar as guardas de intervenção perante as ações e omissões da solução de governo que apoiam, ao ponto de não colocarem em cima da mesa as posições que defendem pelo território nem serem coerentes com as intransigências do passado.
Se o estado deplorável de algumas funções e serviços do Estado, no limiar da agonia, não suscita nenhum incómodo relevante em muitos socialistas, ao invés das inventivas do passado e das exigências que se faziam.
Se continuamos a ter uma dócil cobertura e debate das questões que são pulverizadas na comunicação e no debate público, sucedendo-se as situações, os casos e os escândalos, sem que existam responsáveis.
Se o Presidente da República continua a colocar a chancela no essencial das soluções.
Se tudo isto vai acontecendo, por que razão Mário Centeno, eurocrata, deveria ser diferente do tabelião das finanças que vai gerindo o erário público num compromisso de cumprimento formal de objetivos nacionais e internacionais, de cativações e garrotes, e num exercício que deixa de fora um bafiento cheiro a austeridade recriada, por vezes, com o mesmo tom de irresponsabilidade política?
O Centeno da Europa é o de sempre. Aliás, é mais o de sempre do que os extemporâneos indignados ou pseudoindignados que, em estágio para a assunção de responsabilidades governativas, não hesitaram na transmutação do seu perfil de ADN político.
O Centeno é o de sempre, o que reverteu, reinventou a austeridade e bloqueia muitas das soluções congeminadas e reivindicadas que não são comportáveis. É o que dá rosto a um caminho que sabe não ser sustentável, no tempo e na ampliação de soluções de despesa. Como dizia alguém com relevância, “se começamos a pensar como a direita, governamos como a direita”. Centeno foi coerente; os outros, quase todos, não. Despertaram do longo sono de Belas Adormecidas da realidade nacional, dos silêncios comprometidos com as ambições de poder, daquelas em que os fins dizem justificar todos os meios.
Estava escrito nas estrelas que Centeno teria de se assumir como rosto de uma Europa longe dos seus povos, das dinâmicas existentes no espaço europeu e da envolvente internacional.
Já todos o sabiam quando foi indigitado para o Eurogrupo, perante o aplauso de alguns dos críticos de agora. Pobre gente que nada deve à gelatina: são tão instantâneos a formar como a desformar. Estranha forma de vida, a desta gente da sobrevivência política.
O drama da Europa e dos Centenos que a povoam é oscilarem entre não terem noção das realidades dos diversos povos do seu território e não terem capacidade para agir com prontidão, visão e em tempo útil. São gente poucochinha mas, agora, o pouco é quase sempre muito. além das comoções, mais ou menos ensaiadas. Centeno estará entregue às regras do jogo: em Portugal, dita as regras do Orçamento e da sua execução; no Eurogrupo, ditam-lhe as regras. E há quem goste e quem só agora tenha descoberto que sempre seria assim.
Nota final Nada como sair do território nacional para compreender a pequenez de muitos, a necessidade de irmos mais longe na nossa afirmação e o enorme potencial da rede de embaixadores que são as comunidades portuguesas espalhadas pelo mundo.
Escreve à quinta-feira
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Estava escrito nas estrelas que Centeno teria de se assumir como rosto de uma Europa longe dos seus povos, das dinâmicas existentes no espaço europeu e da envolvente internacional
A realidade mediática e a digital são sempre capazes de nos surpreender, mesmo no tradicional epicentro da silly season. Não sei se será mais estúpida a época ou aqueles que rasgam as vestes para tecer considerações que se destinam apenas a preencher os egos frustrados, a fazer prova de vida de um certo perfil de intervenção pública ou a exercitar a falta de memórias de verões passados. A todos importa saber que os portugueses sabem muito bem onde estiveram nos verões passados.
Vem isto a propósito da comoção de alguns em relação à alocução de Mário Centeno, presidente do Eurogrupo, sobre o fim do programa de ajustamento económico da Grécia. Não percebo a comoção.
Se o PCP e o BE podem baixar as guardas de intervenção perante as ações e omissões da solução de governo que apoiam, ao ponto de não colocarem em cima da mesa as posições que defendem pelo território nem serem coerentes com as intransigências do passado.
Se o estado deplorável de algumas funções e serviços do Estado, no limiar da agonia, não suscita nenhum incómodo relevante em muitos socialistas, ao invés das inventivas do passado e das exigências que se faziam.
Se continuamos a ter uma dócil cobertura e debate das questões que são pulverizadas na comunicação e no debate público, sucedendo-se as situações, os casos e os escândalos, sem que existam responsáveis.
Se o Presidente da República continua a colocar a chancela no essencial das soluções.
Se tudo isto vai acontecendo, por que razão Mário Centeno, eurocrata, deveria ser diferente do tabelião das finanças que vai gerindo o erário público num compromisso de cumprimento formal de objetivos nacionais e internacionais, de cativações e garrotes, e num exercício que deixa de fora um bafiento cheiro a austeridade recriada, por vezes, com o mesmo tom de irresponsabilidade política?
O Centeno da Europa é o de sempre. Aliás, é mais o de sempre do que os extemporâneos indignados ou pseudoindignados que, em estágio para a assunção de responsabilidades governativas, não hesitaram na transmutação do seu perfil de ADN político.
O Centeno é o de sempre, o que reverteu, reinventou a austeridade e bloqueia muitas das soluções congeminadas e reivindicadas que não são comportáveis. É o que dá rosto a um caminho que sabe não ser sustentável, no tempo e na ampliação de soluções de despesa. Como dizia alguém com relevância, “se começamos a pensar como a direita, governamos como a direita”. Centeno foi coerente; os outros, quase todos, não. Despertaram do longo sono de Belas Adormecidas da realidade nacional, dos silêncios comprometidos com as ambições de poder, daquelas em que os fins dizem justificar todos os meios.
Estava escrito nas estrelas que Centeno teria de se assumir como rosto de uma Europa longe dos seus povos, das dinâmicas existentes no espaço europeu e da envolvente internacional.
Já todos o sabiam quando foi indigitado para o Eurogrupo, perante o aplauso de alguns dos críticos de agora. Pobre gente que nada deve à gelatina: são tão instantâneos a formar como a desformar. Estranha forma de vida, a desta gente da sobrevivência política.
O drama da Europa e dos Centenos que a povoam é oscilarem entre não terem noção das realidades dos diversos povos do seu território e não terem capacidade para agir com prontidão, visão e em tempo útil. São gente poucochinha mas, agora, o pouco é quase sempre muito. além das comoções, mais ou menos ensaiadas. Centeno estará entregue às regras do jogo: em Portugal, dita as regras do Orçamento e da sua execução; no Eurogrupo, ditam-lhe as regras. E há quem goste e quem só agora tenha descoberto que sempre seria assim.
Nota final Nada como sair do território nacional para compreender a pequenez de muitos, a necessidade de irmos mais longe na nossa afirmação e o enorme potencial da rede de embaixadores que são as comunidades portuguesas espalhadas pelo mundo.
Escreve à quinta-feira