Benfiquista e engenheiro enviou carta a filiar-se na JS e agora é líder

15-05-2017
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Ivan Gonçalves é, aos 29 anos, o secretário-geral da jota dos socialistas. Em casa sempre simpatizou com o PS e tem pena de que não haja educação para a política nas escolas

Filho de pais simpatizantes socialistas, Ivan Gonçalves foi o primeiro da família a fazer-se militante no PS. Desde cedo, tinha o bichinho da política e, aos 20 anos, enviou uma carta para se inscrever numa jota. Destinatária: a Juventude Socialista. Nove anos depois, o jovem de Almada, que nasceu a 3 de junho de 1987, chega à liderança da organização de juventude onde "não conhecia ninguém".

Ivan é licenciado em Ciências da Engenharia, pelo Instituto Superior Técnico, em Lisboa, onde presidiu a associação de estudantes. Deputado eleito por Setúbal, em outubro de 2015, deixou em pousio um estágio na EDP, como técnico superior de gestão de processos. "Trabalhava na direção de organização e de-senvolvimento, uma área da gestão industrial" - e foi por aí que acabou por ir guiando a sua formação.

O gosto pela política nasceu em casa, a vontade da gestão desenvolveu-se na universidade. "Desde muito pequeno sempre tive simpatia pelo PS. Em casa, os meus pais eram simpatizantes do PS, não eram militantes. Não tenho nenhum militante do PS na minha família." Antes do 25 de Abril, o pai "ainda andou envolvido em movimentos mais extremistas, como era próprio da época".

Em casa, recorda-se de que se era contra o governo de Cavaco Silva. Depois, lembra-se "vagamente da eleição de António Vitorino", nas europeias de 1994, e lembra-se "bem da eleição do engenheiro António Guterres para primeiro-ministro" já em 1995. Afinal, "foi um momento de viragem no país, e lembro-me de isso ser festejado lá em casa".

A partir do seu lugar, Ivan Gonçalves faz o salto para o líder político que é hoje. "Sempre gostei de política, foi um tema que sempre se discutiu em casa, e tenho pena que não se discuta nas escolas." Nas últimas semanas, na campanha que fez para secretário-geral da JS, o deputado regista que, ao falar com muitos militantes da JS, notou "uma falha": "Há muito pouca educação política nas escolas."

No Técnico, não foi só a política que foi importante. Quando escreveu para a JS a filiar-se "não conhecia ninguém" na organização. "Não conhecia nenhum militante da JS, depois vim a saber que existiam mais na minha faculdade e vim a fazer bons amigos da JS no Técnico." E hoje muitos dos seus melhores amigos estão na JS.

"Quando tinha 22/23 anos, fui presidente da Associação de Estudantes do Técnico, que é, além de uma grande escola política - e tem uma grande tradição política -, uma grande empresa, digamos assim, é uma associação de estudantes que tem 16 funcionários efetivos, 30 prestadores de serviços."

O seu estudo foi outro. "Durante aquele ano, deixei praticamente de ser estudante, porque a equipa não era profissional, era de dirigentes associativos voluntários. Eu tinha de lidar com uma série de questões com as quais nunca tinha tido contacto", recorda. "Com a gestão de uma associação, de uma organização que tinha um orçamento anual de um milhão de euros, que tinha obrigações laborais com os funcionários, tínhamos reuniões com os sindicatos, com quem fazíamos a negociação do acordo coletivo de trabalho." "Foi provavelmente até hoje a experiência mais enriquecedora que tive num curto espaço de tempo", apressa-se a dizer. "Aprendi mesmo muito sobre a forma como gerir as organizações e as pessoas. Foi uma experiência que me marcou para a vida."

Não foi a um segundo mandato ("talvez tivesse sido melhor presidente nesse segundo mandato"), como não repetirá um mandato na JS. Não é futurologia, é das regras: Ivan tem 29 anos, o seu mandato de dois anos, iniciado a 18 de dezembro, terminará já para lá da idade permitida para uma candidatura, que é os 30.

Almadense, os pais são de Almada, foi aí que fez a sua militância, sem sentir muito o facto de se achar que são terras do PCP. O PS ganha aí nas eleições legislativas, argumenta, "há muitos anos", perdendo nas autárquicas essa maioria para a coligação de comunistas e ecologistas. "Respeito muito o PCP, como se organiza e a sua história." A sua militância nunca se fez "contra", apesar das diferenças: "A forma como vejo o mundo, como vejo a sociedade não é igual à que o PCP defende, as ideias não são as mesmas, mas a minha militância nunca teve qualquer obstáculo por estar numa terra comunista, nem nunca foi contra."

Em tempos de geringonça, uma solução engenhosa parlamentar que vai garantindo a governação socialista, o deputado do PS aponta para um facto que pode ajudar a "suavizar" as críticas entre uns e outros. "Nenhum partido abdicou daquilo que é a sua matriz ideológica", diz.

Ivan recusa que as jotas sejam uma coisa má, como tantos lhes apontam. "É uma ideia errada, as juventudes partidárias são parecidas aos partidos, com as virtudes e os defeitos que os partidos têm." Mas depois olha para as coisas a partir do seu percurso. "Confesso que encontrei muito mais coisas boas, muito mais gente bem-intencionada, que faz militância porque verdadeiramente acredita naquilo que faz, do que o contrário", recordando que também há muitos "esforços pessoais" de quem se mete nestas coisas da política. Também reconhece que se "não fosse militante" de um partido, "não conseguiria ser deputado" como foi aos 28 anos, mas isso tem que ver com a forma "como o nosso sistema está organizado". Em 40 anos de democracia, "basta olhar para a forma como os partidos se conseguem renovar e as juventudes partidárias são uma importante fonte de quadros", aponta.

As jotas são escolas de quadros e de causas fraturantes: "Há questões de minorias que queremos ver resolvidas porque não ficamos satisfeitos com situações de injustiça. Não é por sermos jovens e rebeldes que afirmamos essas causas", justifica Ivan, defendendo a importância da legislação: "Os avanços legislativos também contribuem para mudar algumas mentalidades."

Ivan não vê necessidade de confrontar a liderança do seu governo, como no passado aconteceu. "O nosso primeiro-ministro é uma pessoa bastante progressista e que entende bem algumas das questões" colocadas na mesa pela JS, diz com a cautela de quem chegou agora a secretário-geral. Mas avisa: "Não somos acríticos, somos solidários com o PS quando concordamos, mas quando não concordamos também o dizemos."

É benfiquista, gosta muito de desporto - foi atleta federado em andebol e futebol no Almada Atlético Clube -, mas também de cinema e de ler, embora agora quase não consiga fazer nem uma coisa nem outra. "Gostava de ficar um mês em casa a ver filmes e ler livros porque nos últimos tempos tem sido muito intenso." Sem tempo, leia-se. A leitura quase fica reservada para a atividade parlamentar, mas há pouco tempo aproveitou uma escala demorada num aeroporto para ler O Triunfo dos Porcos, de George Orwell. A política entranha-se em Ivan, está visto.

Ivan Gonçalves é, aos 29 anos, o secretário-geral da jota dos socialistas. Em casa sempre simpatizou com o PS e tem pena de que não haja educação para a política nas escolas

Filho de pais simpatizantes socialistas, Ivan Gonçalves foi o primeiro da família a fazer-se militante no PS. Desde cedo, tinha o bichinho da política e, aos 20 anos, enviou uma carta para se inscrever numa jota. Destinatária: a Juventude Socialista. Nove anos depois, o jovem de Almada, que nasceu a 3 de junho de 1987, chega à liderança da organização de juventude onde "não conhecia ninguém".

Ivan é licenciado em Ciências da Engenharia, pelo Instituto Superior Técnico, em Lisboa, onde presidiu a associação de estudantes. Deputado eleito por Setúbal, em outubro de 2015, deixou em pousio um estágio na EDP, como técnico superior de gestão de processos. "Trabalhava na direção de organização e de-senvolvimento, uma área da gestão industrial" - e foi por aí que acabou por ir guiando a sua formação.

O gosto pela política nasceu em casa, a vontade da gestão desenvolveu-se na universidade. "Desde muito pequeno sempre tive simpatia pelo PS. Em casa, os meus pais eram simpatizantes do PS, não eram militantes. Não tenho nenhum militante do PS na minha família." Antes do 25 de Abril, o pai "ainda andou envolvido em movimentos mais extremistas, como era próprio da época".

Em casa, recorda-se de que se era contra o governo de Cavaco Silva. Depois, lembra-se "vagamente da eleição de António Vitorino", nas europeias de 1994, e lembra-se "bem da eleição do engenheiro António Guterres para primeiro-ministro" já em 1995. Afinal, "foi um momento de viragem no país, e lembro-me de isso ser festejado lá em casa".

A partir do seu lugar, Ivan Gonçalves faz o salto para o líder político que é hoje. "Sempre gostei de política, foi um tema que sempre se discutiu em casa, e tenho pena que não se discuta nas escolas." Nas últimas semanas, na campanha que fez para secretário-geral da JS, o deputado regista que, ao falar com muitos militantes da JS, notou "uma falha": "Há muito pouca educação política nas escolas."

No Técnico, não foi só a política que foi importante. Quando escreveu para a JS a filiar-se "não conhecia ninguém" na organização. "Não conhecia nenhum militante da JS, depois vim a saber que existiam mais na minha faculdade e vim a fazer bons amigos da JS no Técnico." E hoje muitos dos seus melhores amigos estão na JS.

"Quando tinha 22/23 anos, fui presidente da Associação de Estudantes do Técnico, que é, além de uma grande escola política - e tem uma grande tradição política -, uma grande empresa, digamos assim, é uma associação de estudantes que tem 16 funcionários efetivos, 30 prestadores de serviços."

O seu estudo foi outro. "Durante aquele ano, deixei praticamente de ser estudante, porque a equipa não era profissional, era de dirigentes associativos voluntários. Eu tinha de lidar com uma série de questões com as quais nunca tinha tido contacto", recorda. "Com a gestão de uma associação, de uma organização que tinha um orçamento anual de um milhão de euros, que tinha obrigações laborais com os funcionários, tínhamos reuniões com os sindicatos, com quem fazíamos a negociação do acordo coletivo de trabalho." "Foi provavelmente até hoje a experiência mais enriquecedora que tive num curto espaço de tempo", apressa-se a dizer. "Aprendi mesmo muito sobre a forma como gerir as organizações e as pessoas. Foi uma experiência que me marcou para a vida."

Não foi a um segundo mandato ("talvez tivesse sido melhor presidente nesse segundo mandato"), como não repetirá um mandato na JS. Não é futurologia, é das regras: Ivan tem 29 anos, o seu mandato de dois anos, iniciado a 18 de dezembro, terminará já para lá da idade permitida para uma candidatura, que é os 30.

Almadense, os pais são de Almada, foi aí que fez a sua militância, sem sentir muito o facto de se achar que são terras do PCP. O PS ganha aí nas eleições legislativas, argumenta, "há muitos anos", perdendo nas autárquicas essa maioria para a coligação de comunistas e ecologistas. "Respeito muito o PCP, como se organiza e a sua história." A sua militância nunca se fez "contra", apesar das diferenças: "A forma como vejo o mundo, como vejo a sociedade não é igual à que o PCP defende, as ideias não são as mesmas, mas a minha militância nunca teve qualquer obstáculo por estar numa terra comunista, nem nunca foi contra."

Em tempos de geringonça, uma solução engenhosa parlamentar que vai garantindo a governação socialista, o deputado do PS aponta para um facto que pode ajudar a "suavizar" as críticas entre uns e outros. "Nenhum partido abdicou daquilo que é a sua matriz ideológica", diz.

Ivan recusa que as jotas sejam uma coisa má, como tantos lhes apontam. "É uma ideia errada, as juventudes partidárias são parecidas aos partidos, com as virtudes e os defeitos que os partidos têm." Mas depois olha para as coisas a partir do seu percurso. "Confesso que encontrei muito mais coisas boas, muito mais gente bem-intencionada, que faz militância porque verdadeiramente acredita naquilo que faz, do que o contrário", recordando que também há muitos "esforços pessoais" de quem se mete nestas coisas da política. Também reconhece que se "não fosse militante" de um partido, "não conseguiria ser deputado" como foi aos 28 anos, mas isso tem que ver com a forma "como o nosso sistema está organizado". Em 40 anos de democracia, "basta olhar para a forma como os partidos se conseguem renovar e as juventudes partidárias são uma importante fonte de quadros", aponta.

As jotas são escolas de quadros e de causas fraturantes: "Há questões de minorias que queremos ver resolvidas porque não ficamos satisfeitos com situações de injustiça. Não é por sermos jovens e rebeldes que afirmamos essas causas", justifica Ivan, defendendo a importância da legislação: "Os avanços legislativos também contribuem para mudar algumas mentalidades."

Ivan não vê necessidade de confrontar a liderança do seu governo, como no passado aconteceu. "O nosso primeiro-ministro é uma pessoa bastante progressista e que entende bem algumas das questões" colocadas na mesa pela JS, diz com a cautela de quem chegou agora a secretário-geral. Mas avisa: "Não somos acríticos, somos solidários com o PS quando concordamos, mas quando não concordamos também o dizemos."

É benfiquista, gosta muito de desporto - foi atleta federado em andebol e futebol no Almada Atlético Clube -, mas também de cinema e de ler, embora agora quase não consiga fazer nem uma coisa nem outra. "Gostava de ficar um mês em casa a ver filmes e ler livros porque nos últimos tempos tem sido muito intenso." Sem tempo, leia-se. A leitura quase fica reservada para a atividade parlamentar, mas há pouco tempo aproveitou uma escala demorada num aeroporto para ler O Triunfo dos Porcos, de George Orwell. A política entranha-se em Ivan, está visto.

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