Filipe Lobo d'Ávila, o crítico que renunciou ao Parlamento

05-04-2020
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O setor privado deve concorrer com o público na Saúde?

O sector privado deve coabitar com o público saudavelmente. É a complementaridade que defendo. É assim em muitos países europeus. Em boa verdade, tal já acontece em parte no SNS quando recorre a cuidados no sector privado, complementando as suas carências e ineficiências ou canalizando determinado tipo de prestação de cuidados para o próprio privado. Cerca de 40% dos atos clínicos efetuados em Portugal são-no nessas instituições e o número de hospitais privados já supera a centena.

O Estado deve certificar-se que os cidadãos têm cuidados de saúde adequados, acessíveis e que o Sistema esteja também vocacionado para a prevenção em saúde. A forma como estes cuidados são fornecidos deve resultar duma complementaridade entre o SNS e os prestadores privados, mesmo em salutar concorrência, segundo critérios transparentes e de boa gestão do dinheiro público.

Mas é também verdade que o Estado não se pode furtar a prestar um serviço de qualidade pelo facto de haver um sector privado forte. Não temos qualquer complexo ideológico com as parcerias público-privadas, defendendo a manutenção das que são avaliadas positivamente e replicando o modelo onde se revele a opção estratégica mais acertada.

O SNS é das maiores conquistas da sociedade portuguesa. Hoje, em contraste, e inexplicavelmente, quando se adivinha um excedente orçamental, temos a pior saúde desde o 25 de Abril. O nosso foco será sempre a qualidade e optimização do serviço prestado.

O horário de 40 horas na Saúde deve ser reposto?

A verdade é que nem todos os profissionais de saúde foram abrangidos pela redução para as 35h, o que leva a situações anómalas de encontrarmos ainda hoje profissionais de saúde sujeitos a um regime de 35h e outros que, com as mesmas funções, a trabalhar nos mesmos locais, estão ainda abrangidos pelo regime das 40h, o que para além de injusto é incompreensível do ponto de vista da gestão dos recursos humanos e da gestão da sua motivação.

Naturalmente, seria desejável que existissem as condições necessárias para que todos os profissionais de saúde pudessem permanecer nas 35h mas para isso é preciso assumir a prioridade da saúde e é necessário acautelar essa prioridade através dos recursos financeiros necessários, designadamente no pagamento das horas extraordinárias necessárias à manutenção dos níveis de serviço. Como todos sabemos, as 40h resultaram de um período de enorme restrição que, segundo nos dizem os socialistas, já ficou ultrapassado. O que não faz sentido é ter profissionais de saúde a desempenhar as mesmas funções, muitas vezes nas mesmas unidades de saúde, com condições horárias diferentes. Sobre isto não se vê ninguém dizer rigorosamente nada.

Os alunos devem poder pagar pelas vagas nas universidades? Ou é no numerus clausus que se deve mexer?

Discordo profundamente do pagamento por vagas na universidade pública. O CDS não pode defender o primado do mérito num dia e o do dinheiro no dia seguinte. Discordei publicamente quando o CDS introduziu esta ideia, e comigo o CDS defenderá sempre o mérito e a igualdade oportunidades. A questão do numerus clausus deverá ser dinâmica, mais flexível e em função do mercado de trabalho e das necessidades do país, mas terá de ser sempre clara, perceptível e justa. Este é um critério de justiça social dos serviços do Estado e uma garantia de qualidade da universidade pública.

Concorda com o cheque-ensino?

As famílias devem ter a liberdade de escolher o Projeto Educativo da escola que pretendem para os seus filhos. Este princípio pressupõe que a família tem primazia em relação ao Estado na escolha da escola a frequentar pelos seus filhos. Não é o Estado que impõe. É a família que escolhe.

E com este pressuposto deve ser constituída uma rede de oferta pública de ensino, com os estabelecimentos escolares públicos e privados que queiram fazer parte desta rede.

E as famílias devem optar. Este é o princípio do cheque-ensino.

A educação tem um custo e as famílias devem escolher a escola para que o Estado transfira o valor desse custo, calculado em função do ano de escolaridade e igual em todos os estabelecimentos de ensino na rede de oferta pública de ensino. O cheque-educação é o aperfeiçoamento dos contratos simples existentes, mas muito limitados na sua liberdade de escolha.

Concorda com o plafonamento para as pensões?

Nada fazer não é opção. O sistema de pensões tem que ser pensado e o plafonamento deve ser posto em cima da mesa. Já há estudos conhecidos que apontam inclusivamente para a ruptura do sistema de segurança social em 2037, isto se nada for feito.

Acredito no plafonamento do sistema de pensões da Segurança Social. Em traços gerais, este plafonamento funcionaria como um sistema misto entre os sectores público e privado, incutindo uma maior responsabilidade nos contribuintes que, assim, poderiam escolher (e escolher é a palavra-chave) que sistema preferem para fazer os seus descontos e desta forma precaver os seus rendimentos no momento da sua aposentação: descontar para um sistema de pensões público integralmente; ou para um sistema em que parte dos seus descontos seriam para o sistema público e outra parte para um sistema privado à escolha do cidadão. Uma parte da pensão seria sempre garantida pelo sistema público. O plafonamento pode evitar o pagamento, pelo sistema público, de pensões muito elevadas e permite a liberdade de escolha ao cidadão, sem o obrigar. E manteria muito mais estável e previsível o pagamento das pensões de reforma.

Nada fazer em matéria de sustentabilidade do sistema é que não é aceitável. Não podemos conviver pacificamente com a ideia de que o sistema de pensões não conseguirá pagar pensões num prazo de 20 anos.

O serviço militar obrigatório deve regressar?

Não. A questão não se coloca, parece-me. Há que encontrar fórmulas que incentivem a entrada de mais efetivos nas forças armadas, fórmulas que consigam manter esses mesmos efectivos nas forças armadas, mas não me parece que o SMO seja a solução.

Há um problema de ideologia de género nas escolas?

Há um problema sério de controlo ideológico do ensino e a ideologia de género é parte desse problema. A esquerda, muito influenciada pela extrema-esquerda e por correntes de pensamento internacionais militantes do chamado politicamente correcto, envolveu-se numa cruzada de formatação do pensamento através da escola. A questão da ideologia de género, pelo ridículo e pelo choque aviltante que provoca em muitas circunstâncias, tal como a adulteração do ensino da história, são os pontos mais visíveis do processo de ideologização em curso. O Estado tem a obrigação de oferecer uma escola tão neutra quanto possível, deixando ao aluno e à família a possibilidade de individualização da formação cultural. O velho princípio de que a escola ensina e a família educa, continua, para mim, a fazer sentido.

A RTP deve ser privatizada?

Não. Este é um assunto que foi sujeito a uma larga discussão durante o último Governo PSD/CDS, com uma posição muito clara do CDS na defesa do serviço público de rádio e televisão. Vemos o serviço público como um activo estratégico na área da cultura, da ligação à diáspora, da soberania e até, em casos limite, da segurança pública e defesa nacional.

O sistema eleitoral deve ser revisto?

Eu tenho defendido que há várias reformas que o País precisa de enfrentar necessariamente para credibilizar o sistema, credibilizar a Política e credibilizar os políticos, tão desacreditados como estão hoje. A reforma do sistema eleitoral é um desses aspectos, onde há um défice gritante de proporcionalidade. Não faz sentido que alguém que não tenha uma maioria de votos possa andar perto de uma maioria de mandatos, como não faz sentido que um Partido necessite de mais de 60.000 votos para eleger um deputado e outros consigam eleger esses mesmo deputados com 18.000 votos. Mais, do meu ponto de vista, não faz qualquer sentido existirem zonas do País onde o voto verdadeiramente não conte, dado o número reduzido de deputados que se elege em função do número de habitantes. Se não se repensar tudo isto o afastamento e o descrédito só terá tendência a aumentar.

De que reformas estruturais precisa o país?

O País precisa de reformas estruturas tão diversificadas como a reforma do Estado e do mapa administrativo, afastando o Estado centralista e omnipresente, aproximando a administração das populações, ganhando eficácia e corrigindo assimetrias. A reforma da Justiça, assumindo-se a prioridade do combate à morosidade, através da revisão do modelo de governança dos Tribunais, da desjudicialização e dos meios alternativos. Entre 2017 e 2018, a duração média dos processos cíveis situava-se entre os 31 e os 37 meses, a duração média dos processos penais entre 6 a 8 meses e a duração média dos processos laborais entre os 7 e os 10 meses. Acresce ainda que a duração média dos processos executivos era de 50 meses em 2017, isto é, mais de quatro anos. Não é aceitável num Estado que se diz de Direito. A reforma da Segurança Social, assumindo-se preocupações sociais irrenunciáveis, quer quanto à retoma da convergência das pensões mais baixas como na afirmação de um plano nacional de combate ao isolamento, ao abandono e à insegurança. A sustentabilidade do sistema de pensões, sabendo que a ruptura está já anunciada por alguns para 2037. Um sistema de saúde verdadeiramente universal e de qualidade, onde a voracidade das cativações impede a prestação de cuidados de saúde com dignidade e rapidez. O rigor e a exigência na Educação, onde a liberdade de escolha deve andar a par de uma maior autonomia pedagógica, financeira e de gestão de recursos humanos.

Há muito a fazer e o CDS deve ser um Partido útil ao País e às reformas que tardam.

Faz sentido regionalizar o país?

Eu estive no não à regionalização no referendo que se fez em Portugal em 1998. Fiz aliás parte de um grupo de jovens que teve o privilégio de trabalhar diretamente com o Prof. Ernani Lopes no Movimento do Não. Passaram mais de vinte anos e muitos dos problemas permanecem ainda sem resposta. Eu acho que faz sentido uma reforma administrativa que divida poder real e recursos efectivos pelas diferentes regiões, sem multiplicar estruturas de poder político. Chamemos-lhe regionalização administrativa, descentralização ou desconcentração de competências. Mas há que enfrentar o problema. Sou contra a regionalização política e contra a multiplicação de cargos políticos. Mas é também verdade que a gestão ultra-centralizada do Estado a partir de uma enorme e ineficiente máquina política e burocrática sediada em Lisboa, gerou um acumulado de injustiças e assimetrias territoriais. Aproximar a gestão do território, maximizando a utilização e criando uma distribuição mais equitativa dos recursos, desburocratizar o monstro central da administração do Estado, aproveitando estruturas politicas já existentes como, por exemplo, as Áreas Metropolitanas, as CCDR’s e as Comunidades Intermunicipais, parece-me um bom e sensato caminho a percorrer. Julgo aliás que esta questão não pode deixar ser tida num quadro de reforma do Estado, olhando-se para a administração central e para o mapa administrativo do País em termos de autarquias. O CDS é provavelmente o Partido mais descomprometido com a máquina do Estado e que em melhores condições pode estar para fomentar esse debate de reduzir estruturas, agências, institutos, direções-gerais, a par da discussão do mapa administrativo das autarquias.

Concorda com a delação premiada, ou colaboração premiada?

O CDS dos últimos anos já o veio defender. Não tenho discordâncias de fundo, acho apenas que o problema do combate à corrupção não é apenas um problema legislativo, é sobretudo um problema de meios de investigação e de articulação das diferentes entidades competentes. A ideia que tudo se resolve com mais legislação é um disparate. É evidente que o combate à corrupção deve ser feito ao nível da sensibilização (na escola, na administração pública e na sociedade em geral), da prevenção (melhor regulamentação do lobbyng, do registo de interesses os titulares de cargos públicos e da transparência de procedimentos na Administração) e ao nível da repressão (com o “estatuto do denunciante” — dando confidencialidade e proteção laboral a quem denuncia — e “o estatuto do arrependido”, de forma a que os arguidos dos casos de corrupção vejam a “censura penal atenuada” por colaborarem com a justiça). Seja como for, esta delação premiada deve ser rigorosamente regulamentada sob pena de se poder transformar num instrumento de normalização da figura do “bufo” e sob pena da solução jurídica ser constitucionalmente questionável.

A despenalização da eutanásia deve ser referendada?

Não sinto que esta seja uma questão urgente na nossa sociedade, a carecer de nova regulação. A questão da eutanásia é das questões sociais mais sérias que o legislador pode enfrentar. Se analisarmos a última campanha eleitoral, os compromissos assumidos e os resultados, facilmente chegaremos à conclusão que o actual Parlamento não tem legitimidade política para avançar com qualquer legislação neste sentido. Para além disso, caso se insista em legislar nesta área, há um precedente em Portugal que nos diz que as grandes questões que se prendem com a vida devem ser objecto de consulta popular, como foi o caso do aborto. Entendemos que não se deve referendar a vida mas, no limite dos limites, só será legitimo mexer nesta questão após um referendo que o legitime.

O casamento entre pessoas do mesmo sexo deve ser permitido?

O casamento entre pessoas do mesmo sexo já é permitido por lei. Na altura, votei contra, e voltaria hoje a votar, se se repetissem as circunstâncias. A tipificação legal de estruturas sociais diferentes deve ter designações diferentes; não se prende com o justo reconhecimento de direitos e deveres a diferentes opções de vida em comum. No dia de hoje, passado este tempo, havendo já muitas pessoas a viver esta realidade, não me parece sensato, justo ou humano uma reversão da circunstância actual, que implique indefinição, insegurança e discriminação, agora sim, para essas pessoas.

O aborto deve voltar a ser criminalizado?

Não. Não defendo a criminalização, no sentido em que a criminalização implica regra geral uma pena, um castigo social público e notório. A mulher que passa pelo drama do aborto já paga a sua pena com a violência do próprio acto; não encontro justiça ou humanidade em expor uma pessoa nesta circunstância, e não nos devemos colocar no papel de querer promover a humanidade através da desumanidade.

O aborto deve ser dissuadido eficazmente. Eu sei que há deputadas socialistas preocupadas com o CDS (o que não me preocupa e sinceramente até me parece um bom sinal) mas não tenho qualquer problema em assumir que continuo contra o aborto, não mudei de opinião, e acho que o CDS é e deve continuar a ser contra o aborto. É uma questão identitária que faz parte do nosso património. Julgo que a nossa ação política se deve centrar no reforço dos mecanismos de apoio e aconselhamento e nas políticas activas de promoção da vida.

Admite fazer acordos, pré ou pós eleitorais, com o Chega?

O CDS deve preocupar-se em recuperar a credibilidade e a confiança do seu eleitorado. Qualquer entendimento deve partir do pressuposto de coincidência de visões do país, do Estado, do papel das empresas. Hoje assistimos a um frentismo de esquerda que deve merecer um projeto alternativo no centro-direita que mobilize e que não seja um mero exercício aritmético. Se o PS fez acordos com comunistas e trotskistas, por que razão à direita têm de existir limitações? Mas o CDS deve preocupar-se consigo próprio e não deve querer copiar o Chega ou a Iniciativa Liberal.

O setor privado deve concorrer com o público na Saúde?

O sector privado deve coabitar com o público saudavelmente. É a complementaridade que defendo. É assim em muitos países europeus. Em boa verdade, tal já acontece em parte no SNS quando recorre a cuidados no sector privado, complementando as suas carências e ineficiências ou canalizando determinado tipo de prestação de cuidados para o próprio privado. Cerca de 40% dos atos clínicos efetuados em Portugal são-no nessas instituições e o número de hospitais privados já supera a centena.

O Estado deve certificar-se que os cidadãos têm cuidados de saúde adequados, acessíveis e que o Sistema esteja também vocacionado para a prevenção em saúde. A forma como estes cuidados são fornecidos deve resultar duma complementaridade entre o SNS e os prestadores privados, mesmo em salutar concorrência, segundo critérios transparentes e de boa gestão do dinheiro público.

Mas é também verdade que o Estado não se pode furtar a prestar um serviço de qualidade pelo facto de haver um sector privado forte. Não temos qualquer complexo ideológico com as parcerias público-privadas, defendendo a manutenção das que são avaliadas positivamente e replicando o modelo onde se revele a opção estratégica mais acertada.

O SNS é das maiores conquistas da sociedade portuguesa. Hoje, em contraste, e inexplicavelmente, quando se adivinha um excedente orçamental, temos a pior saúde desde o 25 de Abril. O nosso foco será sempre a qualidade e optimização do serviço prestado.

O horário de 40 horas na Saúde deve ser reposto?

A verdade é que nem todos os profissionais de saúde foram abrangidos pela redução para as 35h, o que leva a situações anómalas de encontrarmos ainda hoje profissionais de saúde sujeitos a um regime de 35h e outros que, com as mesmas funções, a trabalhar nos mesmos locais, estão ainda abrangidos pelo regime das 40h, o que para além de injusto é incompreensível do ponto de vista da gestão dos recursos humanos e da gestão da sua motivação.

Naturalmente, seria desejável que existissem as condições necessárias para que todos os profissionais de saúde pudessem permanecer nas 35h mas para isso é preciso assumir a prioridade da saúde e é necessário acautelar essa prioridade através dos recursos financeiros necessários, designadamente no pagamento das horas extraordinárias necessárias à manutenção dos níveis de serviço. Como todos sabemos, as 40h resultaram de um período de enorme restrição que, segundo nos dizem os socialistas, já ficou ultrapassado. O que não faz sentido é ter profissionais de saúde a desempenhar as mesmas funções, muitas vezes nas mesmas unidades de saúde, com condições horárias diferentes. Sobre isto não se vê ninguém dizer rigorosamente nada.

Os alunos devem poder pagar pelas vagas nas universidades? Ou é no numerus clausus que se deve mexer?

Discordo profundamente do pagamento por vagas na universidade pública. O CDS não pode defender o primado do mérito num dia e o do dinheiro no dia seguinte. Discordei publicamente quando o CDS introduziu esta ideia, e comigo o CDS defenderá sempre o mérito e a igualdade oportunidades. A questão do numerus clausus deverá ser dinâmica, mais flexível e em função do mercado de trabalho e das necessidades do país, mas terá de ser sempre clara, perceptível e justa. Este é um critério de justiça social dos serviços do Estado e uma garantia de qualidade da universidade pública.

Concorda com o cheque-ensino?

As famílias devem ter a liberdade de escolher o Projeto Educativo da escola que pretendem para os seus filhos. Este princípio pressupõe que a família tem primazia em relação ao Estado na escolha da escola a frequentar pelos seus filhos. Não é o Estado que impõe. É a família que escolhe.

E com este pressuposto deve ser constituída uma rede de oferta pública de ensino, com os estabelecimentos escolares públicos e privados que queiram fazer parte desta rede.

E as famílias devem optar. Este é o princípio do cheque-ensino.

A educação tem um custo e as famílias devem escolher a escola para que o Estado transfira o valor desse custo, calculado em função do ano de escolaridade e igual em todos os estabelecimentos de ensino na rede de oferta pública de ensino. O cheque-educação é o aperfeiçoamento dos contratos simples existentes, mas muito limitados na sua liberdade de escolha.

Concorda com o plafonamento para as pensões?

Nada fazer não é opção. O sistema de pensões tem que ser pensado e o plafonamento deve ser posto em cima da mesa. Já há estudos conhecidos que apontam inclusivamente para a ruptura do sistema de segurança social em 2037, isto se nada for feito.

Acredito no plafonamento do sistema de pensões da Segurança Social. Em traços gerais, este plafonamento funcionaria como um sistema misto entre os sectores público e privado, incutindo uma maior responsabilidade nos contribuintes que, assim, poderiam escolher (e escolher é a palavra-chave) que sistema preferem para fazer os seus descontos e desta forma precaver os seus rendimentos no momento da sua aposentação: descontar para um sistema de pensões público integralmente; ou para um sistema em que parte dos seus descontos seriam para o sistema público e outra parte para um sistema privado à escolha do cidadão. Uma parte da pensão seria sempre garantida pelo sistema público. O plafonamento pode evitar o pagamento, pelo sistema público, de pensões muito elevadas e permite a liberdade de escolha ao cidadão, sem o obrigar. E manteria muito mais estável e previsível o pagamento das pensões de reforma.

Nada fazer em matéria de sustentabilidade do sistema é que não é aceitável. Não podemos conviver pacificamente com a ideia de que o sistema de pensões não conseguirá pagar pensões num prazo de 20 anos.

O serviço militar obrigatório deve regressar?

Não. A questão não se coloca, parece-me. Há que encontrar fórmulas que incentivem a entrada de mais efetivos nas forças armadas, fórmulas que consigam manter esses mesmos efectivos nas forças armadas, mas não me parece que o SMO seja a solução.

Há um problema de ideologia de género nas escolas?

Há um problema sério de controlo ideológico do ensino e a ideologia de género é parte desse problema. A esquerda, muito influenciada pela extrema-esquerda e por correntes de pensamento internacionais militantes do chamado politicamente correcto, envolveu-se numa cruzada de formatação do pensamento através da escola. A questão da ideologia de género, pelo ridículo e pelo choque aviltante que provoca em muitas circunstâncias, tal como a adulteração do ensino da história, são os pontos mais visíveis do processo de ideologização em curso. O Estado tem a obrigação de oferecer uma escola tão neutra quanto possível, deixando ao aluno e à família a possibilidade de individualização da formação cultural. O velho princípio de que a escola ensina e a família educa, continua, para mim, a fazer sentido.

A RTP deve ser privatizada?

Não. Este é um assunto que foi sujeito a uma larga discussão durante o último Governo PSD/CDS, com uma posição muito clara do CDS na defesa do serviço público de rádio e televisão. Vemos o serviço público como um activo estratégico na área da cultura, da ligação à diáspora, da soberania e até, em casos limite, da segurança pública e defesa nacional.

O sistema eleitoral deve ser revisto?

Eu tenho defendido que há várias reformas que o País precisa de enfrentar necessariamente para credibilizar o sistema, credibilizar a Política e credibilizar os políticos, tão desacreditados como estão hoje. A reforma do sistema eleitoral é um desses aspectos, onde há um défice gritante de proporcionalidade. Não faz sentido que alguém que não tenha uma maioria de votos possa andar perto de uma maioria de mandatos, como não faz sentido que um Partido necessite de mais de 60.000 votos para eleger um deputado e outros consigam eleger esses mesmo deputados com 18.000 votos. Mais, do meu ponto de vista, não faz qualquer sentido existirem zonas do País onde o voto verdadeiramente não conte, dado o número reduzido de deputados que se elege em função do número de habitantes. Se não se repensar tudo isto o afastamento e o descrédito só terá tendência a aumentar.

De que reformas estruturais precisa o país?

O País precisa de reformas estruturas tão diversificadas como a reforma do Estado e do mapa administrativo, afastando o Estado centralista e omnipresente, aproximando a administração das populações, ganhando eficácia e corrigindo assimetrias. A reforma da Justiça, assumindo-se a prioridade do combate à morosidade, através da revisão do modelo de governança dos Tribunais, da desjudicialização e dos meios alternativos. Entre 2017 e 2018, a duração média dos processos cíveis situava-se entre os 31 e os 37 meses, a duração média dos processos penais entre 6 a 8 meses e a duração média dos processos laborais entre os 7 e os 10 meses. Acresce ainda que a duração média dos processos executivos era de 50 meses em 2017, isto é, mais de quatro anos. Não é aceitável num Estado que se diz de Direito. A reforma da Segurança Social, assumindo-se preocupações sociais irrenunciáveis, quer quanto à retoma da convergência das pensões mais baixas como na afirmação de um plano nacional de combate ao isolamento, ao abandono e à insegurança. A sustentabilidade do sistema de pensões, sabendo que a ruptura está já anunciada por alguns para 2037. Um sistema de saúde verdadeiramente universal e de qualidade, onde a voracidade das cativações impede a prestação de cuidados de saúde com dignidade e rapidez. O rigor e a exigência na Educação, onde a liberdade de escolha deve andar a par de uma maior autonomia pedagógica, financeira e de gestão de recursos humanos.

Há muito a fazer e o CDS deve ser um Partido útil ao País e às reformas que tardam.

Faz sentido regionalizar o país?

Eu estive no não à regionalização no referendo que se fez em Portugal em 1998. Fiz aliás parte de um grupo de jovens que teve o privilégio de trabalhar diretamente com o Prof. Ernani Lopes no Movimento do Não. Passaram mais de vinte anos e muitos dos problemas permanecem ainda sem resposta. Eu acho que faz sentido uma reforma administrativa que divida poder real e recursos efectivos pelas diferentes regiões, sem multiplicar estruturas de poder político. Chamemos-lhe regionalização administrativa, descentralização ou desconcentração de competências. Mas há que enfrentar o problema. Sou contra a regionalização política e contra a multiplicação de cargos políticos. Mas é também verdade que a gestão ultra-centralizada do Estado a partir de uma enorme e ineficiente máquina política e burocrática sediada em Lisboa, gerou um acumulado de injustiças e assimetrias territoriais. Aproximar a gestão do território, maximizando a utilização e criando uma distribuição mais equitativa dos recursos, desburocratizar o monstro central da administração do Estado, aproveitando estruturas politicas já existentes como, por exemplo, as Áreas Metropolitanas, as CCDR’s e as Comunidades Intermunicipais, parece-me um bom e sensato caminho a percorrer. Julgo aliás que esta questão não pode deixar ser tida num quadro de reforma do Estado, olhando-se para a administração central e para o mapa administrativo do País em termos de autarquias. O CDS é provavelmente o Partido mais descomprometido com a máquina do Estado e que em melhores condições pode estar para fomentar esse debate de reduzir estruturas, agências, institutos, direções-gerais, a par da discussão do mapa administrativo das autarquias.

Concorda com a delação premiada, ou colaboração premiada?

O CDS dos últimos anos já o veio defender. Não tenho discordâncias de fundo, acho apenas que o problema do combate à corrupção não é apenas um problema legislativo, é sobretudo um problema de meios de investigação e de articulação das diferentes entidades competentes. A ideia que tudo se resolve com mais legislação é um disparate. É evidente que o combate à corrupção deve ser feito ao nível da sensibilização (na escola, na administração pública e na sociedade em geral), da prevenção (melhor regulamentação do lobbyng, do registo de interesses os titulares de cargos públicos e da transparência de procedimentos na Administração) e ao nível da repressão (com o “estatuto do denunciante” — dando confidencialidade e proteção laboral a quem denuncia — e “o estatuto do arrependido”, de forma a que os arguidos dos casos de corrupção vejam a “censura penal atenuada” por colaborarem com a justiça). Seja como for, esta delação premiada deve ser rigorosamente regulamentada sob pena de se poder transformar num instrumento de normalização da figura do “bufo” e sob pena da solução jurídica ser constitucionalmente questionável.

A despenalização da eutanásia deve ser referendada?

Não sinto que esta seja uma questão urgente na nossa sociedade, a carecer de nova regulação. A questão da eutanásia é das questões sociais mais sérias que o legislador pode enfrentar. Se analisarmos a última campanha eleitoral, os compromissos assumidos e os resultados, facilmente chegaremos à conclusão que o actual Parlamento não tem legitimidade política para avançar com qualquer legislação neste sentido. Para além disso, caso se insista em legislar nesta área, há um precedente em Portugal que nos diz que as grandes questões que se prendem com a vida devem ser objecto de consulta popular, como foi o caso do aborto. Entendemos que não se deve referendar a vida mas, no limite dos limites, só será legitimo mexer nesta questão após um referendo que o legitime.

O casamento entre pessoas do mesmo sexo deve ser permitido?

O casamento entre pessoas do mesmo sexo já é permitido por lei. Na altura, votei contra, e voltaria hoje a votar, se se repetissem as circunstâncias. A tipificação legal de estruturas sociais diferentes deve ter designações diferentes; não se prende com o justo reconhecimento de direitos e deveres a diferentes opções de vida em comum. No dia de hoje, passado este tempo, havendo já muitas pessoas a viver esta realidade, não me parece sensato, justo ou humano uma reversão da circunstância actual, que implique indefinição, insegurança e discriminação, agora sim, para essas pessoas.

O aborto deve voltar a ser criminalizado?

Não. Não defendo a criminalização, no sentido em que a criminalização implica regra geral uma pena, um castigo social público e notório. A mulher que passa pelo drama do aborto já paga a sua pena com a violência do próprio acto; não encontro justiça ou humanidade em expor uma pessoa nesta circunstância, e não nos devemos colocar no papel de querer promover a humanidade através da desumanidade.

O aborto deve ser dissuadido eficazmente. Eu sei que há deputadas socialistas preocupadas com o CDS (o que não me preocupa e sinceramente até me parece um bom sinal) mas não tenho qualquer problema em assumir que continuo contra o aborto, não mudei de opinião, e acho que o CDS é e deve continuar a ser contra o aborto. É uma questão identitária que faz parte do nosso património. Julgo que a nossa ação política se deve centrar no reforço dos mecanismos de apoio e aconselhamento e nas políticas activas de promoção da vida.

Admite fazer acordos, pré ou pós eleitorais, com o Chega?

O CDS deve preocupar-se em recuperar a credibilidade e a confiança do seu eleitorado. Qualquer entendimento deve partir do pressuposto de coincidência de visões do país, do Estado, do papel das empresas. Hoje assistimos a um frentismo de esquerda que deve merecer um projeto alternativo no centro-direita que mobilize e que não seja um mero exercício aritmético. Se o PS fez acordos com comunistas e trotskistas, por que razão à direita têm de existir limitações? Mas o CDS deve preocupar-se consigo próprio e não deve querer copiar o Chega ou a Iniciativa Liberal.

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