SNS. Morte de doente no Algarve leva a revisão de regras dos hospitais

13-05-2019
marcar artigo

As regras de articulação entre os hospitais do Serviço Nacional de Saúde vão ser revistas depois do caso de um doente que morreu em Portimão após esperar mais de um mês pelo resultado de uma análise enviada para o IPO de Lisboa. A garantia é dada ao SOL pelo Ministério da Saúde.

O caso foi noticiado esta semana pelo Correio da Manhã. António Marques, de 61 anos, morreu a 27 de março, sem chegar a iniciar o tratamento oncológico. O doente era acompanhado no Hospital de Portimão desde dezembro de 2018, tendo sido recolhida uma amostra para biopsia a 8 de janeiro. Os médicos entenderam pedir uma análise a um marcador genético ao IPO de Lisboa, que permite despistar um tumor específico do pulmão que tem disponível medicação mais dirigida. O pedido da análise EGFR foi feito a Lisboa no dia 23 de janeiro, mas o IPO de Lisboa devolveu o exame, alegando estar em falta o termo de responsabilidade. O exame voltaria a ser enviado pelo Centro Hospitalar Universitário do Algarve no dia 19 de fevereiro, tendo o resultado chegado a Portimão a 28 de fevereiro.

Questionado pelo SOL, o Centro Hospitalar Universitário do Algarve não esclareceu por que motivo passou quase um mês entre o primeiro e o segundo envio nem por que motivo o pedido não foi feito da primeira vez com o termo de responsabilidade, como está previsto nos encaminhamentos entre hospitais. O documento garante a responsabilidade financeira do hospital de origem. O Hospital diz apenas que «em nenhum momento o Conselho de Administração do Centro Hospitalar Universitário do Algarve indeferiu o pedido de envio do respetivo exame para o IPO de Lisboa». O Correio da Manhã adianta que, tal como este, há registo de pelo menos cinco casos de exames adiados no Hospital de Portimão, denúncia que também foi feita pelo deputado social-democrata Cristóvão Norte. De acordo com o Centro Hospitalar do Algarve, não há, à data, pedidos pendentes. Não foram confirmados mais casos.

Burocracia ou falta de articulação?

O caso gerou preocupação, com a Ordem dos Médicos a considerar que «o desinvestimento leva a que as pessoas tentem poupar tudo e mais alguma coisa – os tratamentos ou exames mais caros, muitas vezes, são protelados», disse, à Renascença, o bastonário Miguel Guimarães. Se a unidade algarvia não se pronunciou sobre constrangimentos financeiros, o presidente do IPO de Lisboa é perentório: «Isto não é uma questão de dinheiro», disse esta semana ao jornal i João Oliveira, revelando que a análise em causa custa menos de 200 euros. Também ao i, o médico responsável pelo Laboratório de Anatomia Patológica do IPO de Lisboa explicou que o termo de responsabilidade é obrigatório nos pedidos externos dirigidos ao hospital mas por razões de segurança clínica. «É uma garantia de que a amostra pertence a um determinado doente», esclareceu José Cabeçadas, explicando que a falta de procedimentos padronizados nos hospitais justifica o pedido. «Vivemos aterrorizados com a troca de resultados e os dados disponíveis na requisição clínica muitas vezes não permitem a identificação inequívoca. Os procedimentos têm de ser seguidos.» Como o i noticiou, foi possível comprovar que muitas vezes as requisições são manuscritas e não contêm informação que permita identificar o doente ou o seu estado clínico. O termo de responsabilidade permite a identificação e a regra no IPO é recusar a receção de amostras que não sejam acompanhadas deste documento, que também não dispõe de regras padronizadas no SNS. «Não fazemos retenções de resultados por não haver toda a documentação, devolvemos a amostra ao hospital para que possa ser dado seguimento ao caso», disse ainda João Oliveira.

O SOL apurou que esta não é a regra em todos os hospitais. Os procedimentos instituídos no IPO do Lisboa não contemplam também o registo das amostras que são devolvidas sem análise por não estarem em conformidade, o que não permite saber quantos casos destes ocorrem, um procedimento que a unidade admitiu poder vir a ser revisto na sequência deste caso. As atuais regras nos hospitais também não preveem articulação nestes casos, por exemplo para verificar o que aconteceu a casos devolvidos.

Confrontado com a disparidade de procedimentos e o que será feito para garantir que não há doentes esquecidos no sistema, o Ministério indica que «desde logo ficou claro que há disponibilidade das unidades para aperfeiçoar os procedimentos de articulação, estando em curso reuniões destes hospitais com o Ministério da Saúde». Foram abertas averiguações internas nos dois hospitais. A tutela revelou ainda que «apesar de haver um Manual de Boas Práticas (MBP) Laboratoriais de Anatomia Patológica, publicado em Diário da República, estão a ser desenvolvidas medidas para melhorar a articulação dos serviços, nomeadamente o estabelecimento de protocolos que garantam o diagnóstico atempado dos doentes».

Regulador abre processo

Questionada pelo SOL sobre se já tinha havido queixas relacionadas com burocracia na articulação entre hospitais, a Entidade Reguladora da Saúde revelou que desde 1 de janeiro a 30 de abril deste ano deram entrada 435 reclamações relacionadas com cuidados de saúde e segurança do doente, com o subtema ‘integração e continuidade dos cuidados’.

Destes, 54 (12%) foram objeto de investigação aprofundada. A ERS adianta que foi aberto um processo de avaliação para investigação do caso do Algarve, «bem como para aferir dos protocolos de articulação (subjacentes à emissão de termos de responsabilidade) entre CHUA e o IPO de Lisboa». O regulador da Saúde adianta que antes deste caso já tinham sido abertos dois processos por «evidência de constrangimentos na tempestividade da prestação de cuidados de saúde decorrentes da má articulação entre serviços, designadamente relacionados com exames de patologia oncológica».

As regras de articulação entre os hospitais do Serviço Nacional de Saúde vão ser revistas depois do caso de um doente que morreu em Portimão após esperar mais de um mês pelo resultado de uma análise enviada para o IPO de Lisboa. A garantia é dada ao SOL pelo Ministério da Saúde.

O caso foi noticiado esta semana pelo Correio da Manhã. António Marques, de 61 anos, morreu a 27 de março, sem chegar a iniciar o tratamento oncológico. O doente era acompanhado no Hospital de Portimão desde dezembro de 2018, tendo sido recolhida uma amostra para biopsia a 8 de janeiro. Os médicos entenderam pedir uma análise a um marcador genético ao IPO de Lisboa, que permite despistar um tumor específico do pulmão que tem disponível medicação mais dirigida. O pedido da análise EGFR foi feito a Lisboa no dia 23 de janeiro, mas o IPO de Lisboa devolveu o exame, alegando estar em falta o termo de responsabilidade. O exame voltaria a ser enviado pelo Centro Hospitalar Universitário do Algarve no dia 19 de fevereiro, tendo o resultado chegado a Portimão a 28 de fevereiro.

Questionado pelo SOL, o Centro Hospitalar Universitário do Algarve não esclareceu por que motivo passou quase um mês entre o primeiro e o segundo envio nem por que motivo o pedido não foi feito da primeira vez com o termo de responsabilidade, como está previsto nos encaminhamentos entre hospitais. O documento garante a responsabilidade financeira do hospital de origem. O Hospital diz apenas que «em nenhum momento o Conselho de Administração do Centro Hospitalar Universitário do Algarve indeferiu o pedido de envio do respetivo exame para o IPO de Lisboa». O Correio da Manhã adianta que, tal como este, há registo de pelo menos cinco casos de exames adiados no Hospital de Portimão, denúncia que também foi feita pelo deputado social-democrata Cristóvão Norte. De acordo com o Centro Hospitalar do Algarve, não há, à data, pedidos pendentes. Não foram confirmados mais casos.

Burocracia ou falta de articulação?

O caso gerou preocupação, com a Ordem dos Médicos a considerar que «o desinvestimento leva a que as pessoas tentem poupar tudo e mais alguma coisa – os tratamentos ou exames mais caros, muitas vezes, são protelados», disse, à Renascença, o bastonário Miguel Guimarães. Se a unidade algarvia não se pronunciou sobre constrangimentos financeiros, o presidente do IPO de Lisboa é perentório: «Isto não é uma questão de dinheiro», disse esta semana ao jornal i João Oliveira, revelando que a análise em causa custa menos de 200 euros. Também ao i, o médico responsável pelo Laboratório de Anatomia Patológica do IPO de Lisboa explicou que o termo de responsabilidade é obrigatório nos pedidos externos dirigidos ao hospital mas por razões de segurança clínica. «É uma garantia de que a amostra pertence a um determinado doente», esclareceu José Cabeçadas, explicando que a falta de procedimentos padronizados nos hospitais justifica o pedido. «Vivemos aterrorizados com a troca de resultados e os dados disponíveis na requisição clínica muitas vezes não permitem a identificação inequívoca. Os procedimentos têm de ser seguidos.» Como o i noticiou, foi possível comprovar que muitas vezes as requisições são manuscritas e não contêm informação que permita identificar o doente ou o seu estado clínico. O termo de responsabilidade permite a identificação e a regra no IPO é recusar a receção de amostras que não sejam acompanhadas deste documento, que também não dispõe de regras padronizadas no SNS. «Não fazemos retenções de resultados por não haver toda a documentação, devolvemos a amostra ao hospital para que possa ser dado seguimento ao caso», disse ainda João Oliveira.

O SOL apurou que esta não é a regra em todos os hospitais. Os procedimentos instituídos no IPO do Lisboa não contemplam também o registo das amostras que são devolvidas sem análise por não estarem em conformidade, o que não permite saber quantos casos destes ocorrem, um procedimento que a unidade admitiu poder vir a ser revisto na sequência deste caso. As atuais regras nos hospitais também não preveem articulação nestes casos, por exemplo para verificar o que aconteceu a casos devolvidos.

Confrontado com a disparidade de procedimentos e o que será feito para garantir que não há doentes esquecidos no sistema, o Ministério indica que «desde logo ficou claro que há disponibilidade das unidades para aperfeiçoar os procedimentos de articulação, estando em curso reuniões destes hospitais com o Ministério da Saúde». Foram abertas averiguações internas nos dois hospitais. A tutela revelou ainda que «apesar de haver um Manual de Boas Práticas (MBP) Laboratoriais de Anatomia Patológica, publicado em Diário da República, estão a ser desenvolvidas medidas para melhorar a articulação dos serviços, nomeadamente o estabelecimento de protocolos que garantam o diagnóstico atempado dos doentes».

Regulador abre processo

Questionada pelo SOL sobre se já tinha havido queixas relacionadas com burocracia na articulação entre hospitais, a Entidade Reguladora da Saúde revelou que desde 1 de janeiro a 30 de abril deste ano deram entrada 435 reclamações relacionadas com cuidados de saúde e segurança do doente, com o subtema ‘integração e continuidade dos cuidados’.

Destes, 54 (12%) foram objeto de investigação aprofundada. A ERS adianta que foi aberto um processo de avaliação para investigação do caso do Algarve, «bem como para aferir dos protocolos de articulação (subjacentes à emissão de termos de responsabilidade) entre CHUA e o IPO de Lisboa». O regulador da Saúde adianta que antes deste caso já tinham sido abertos dois processos por «evidência de constrangimentos na tempestividade da prestação de cuidados de saúde decorrentes da má articulação entre serviços, designadamente relacionados com exames de patologia oncológica».

marcar artigo