O que o BE quer em seis notas

26-06-2016
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Seis notas sobre o que saiu da Convenção do Bloco de Esquerda:

Geringonça é “cooperação conflitual”

A grande definição da atual relação do BE com o partido do Governo foi feita pelo histórico Camilo Mortágua que pediu a que todos estejam preparados para “a prática da cooperação conflitual”. A geringonça, disse, é “uma coisa pouco sólida, que necessita paixão, dedicação e empenho”.

“Cooperação conflitual” é a negociação permanente, a pressão, a reinvindicação junto do PS. “O BE nasceu para esticar a corda”, segundo João Teixeira Lopes. O BE é “uma garantia”, sublinhou o senador Francisco Louçã. Não se importam com a ideia que se criou que o BE tem um cronómetro que está a contar e que vai decidir quando é que o acordo PS-BE rebenta.

Os críticos da atual direção foram ao palco dizer mesmo que “não é uma questão de se [o acordo quebra], é uma questão de quando”. As palavras não incomodam Catarina Martins - ajudam à pressão sobre o PS.

“A força mais forte do Governo”

É o objetivo assumido por Catarina Martins e por toda a direção. Nos dois dias de trabalhos, ficou claro como BE se posiciona: com mais votos o partido poderá no futuro forçar uma maioria a dar mais prioridade ao investimento público e à criação de emprego. Com os olhos postos ao mesmo tempo em Espanha que hoje vai a eleições, o BE ambiciona ultrapassar o PS? Sim. Por isso, Jorge Costa também fez questão de deixar claro que o BE “sabe para onde vai”: “Não somos o CDS do PS”. “Claro que queremos ser Governo e ser poder. Querer ser poder é quer ser povo”, concretizou Catarina Martins.

Sobre o PCP, outra das 'pernas' da geringonça, nem uma palavra. O BE ficou à frente do partido de Jerónimo de Sousa em outubro (teve 10,19% contra os 8,25% do PCP) e já nem olha por cima do ombro para ver quem vem atrás.

“Não desistimos da Europa”

O BE rejeita esta Europa mas não desiste da Europa. No rescaldo do Brexit, Catarina Martins começou com cautelas. “Este não é o momento dos países saltarem com cartadas de referendos”, mas de “pôr em cima da mesa alternativas pensadas”, avisou logo à entrada do pavilhão do Casal Vistoso, em Lisboa, onde decorreu a X Convenção. No encerramento, a líder acabou por acenar com um pedido de referendo se a Comissão Europeia insistir em aplicar sanções a Portugal por défice excessivo em 2015. Referendo a quê? Várias figuras do BE defendem uma consulta sobre os tratados e não uma pergunta igual à dos britânicos.

A Europa foi o tema central, aliás, de distância do BE em relação ao PS. Se dúvidas houvesse, José Manuel Pureza tratou de pôr em pratos limpos. “Disse há dias António Costa que é cada vez mais difícil ser socialista sem ser crítico da União Europeia. Tem plena razão. Mas isso é pouco. É mesmo o mínimo dos mínimos”, atirou. “Está na hora de dizer, com toda a clareza, que só se pode ser socialista contra a City e contra Frankfurt, contra Cameron e contra Hollande, contra Merkel e contra Dijsselbloem. (...) Não se pode ser socialista senão recusando aquilo em que União Europeia se tornou”.

Para Catarina Martins, “a UE está a ser uma mentira e um nivelamento por baixo. Mas se está em crise, vamos à luta”. Por sinal, a Europa foi também tema central do Congresso do PS que se realizou em junho e aí (ainda longe do Brexit) tinha ficado evidente o desconforto de uma parte dos socialistas com a construção europeia.

Que Orçamento vem aí?

Aumento das pensões acima da inflação, mais escalões de IRS, cortes nas rendas da energia, poupanças nas PPP da saúde (e nos cheques cirurgia e serviços convencionados), aumento das indemnizações por despedimento, reforço da contratação coletiva. Todas estas propostas foram enunciadas no palco da Convenção. Algumas das ideias estão já a ser negociadas com o PS no âmbito dos grupos de trabalho que estão formados e cujas primeiras conclusões serão divulgadas em julho. E derivam todas do que ficou por escrito no acordo PS-BE.

Mas isto tudo depende também de outro objetivo: a reestruturação da dívida que permitirá libertar mais recursos. Segundo a direção do BE, “contra aumentos do IRS e IVA”, só existe uma saída: “atacar o abuso da dívida”.

Os subscritores de uma das moções alternativas a Catarina Martins bem que questionaram: “A direção atual é bem capaz de já estar a negociar com o PS o próximo Orçamento. E se as pressões europeias resultarem em mais austeridade?”. No encerramento, Catarina Martins reforçou a necessidade de mexer nos encargos com a dívida como forma de libertar o país. BE não desarma.

Estratégia das autárquicas

A moção A, de Catarina Martins, defende preferencialmente listas próprias nas próximas eleições autárquicas que vão decorrer no outono de 2017, admite coligações onde já existem (caso da Madeira), apoiar listas de cidadãos (caso de Coimbra) e geringonças pós-eleitorais. Os críticos pediram mais explicações, mas as autárquicas (o partido não detém a presidência de nenhum executivo municipal) não ocuparam grande parte das discussões. Como nota lateral, serviu para a única referência de Catarina a Jerónimo de Sousa: “Como disse Jerónimo de Sousa com graça e como António Costa também repetiu com graça, nas autárquicas não há pacto nem agressão” entre PS, PCP e BE. A direção garante que não “fugirá a nenhuma responsabilidade em nenhum sítio do país” e que haverá uma nova geração nas autarquias. Sobre Lisboa, nem uma palavra.

Entre os subscritores da moção de Catarina Martins ainda houve uma tentaiva de permitir alianças pré-eleitorais. Sem indicações dos parceiros, era uma proposta à medida de entendimentos com o PS. Mas a adenda, feita no sábado, acabaria por ser retirada pelos seus autores na manhã de domingo, antes da votação.

Consagração da líder única

Foi a Convenção de consagração de Catarina Martins como a líder única do BE, pondo fim a um período de coordenação conjunta e colocando-a no mesmo patamar ocupado pelo histórico Francisco Louçã. A sua moção de estratégia conseguiu 83% dos votos e a sala aplaudiu entusiasticamente o seu discurso. Inicia-se uma nova fase na vida do BE e as próximas eleições legislativas vão ser o teste decisivo sobre esse difícil equilíbrio entre estar fora do Governo e negociar algumas medidas do mesmo Governo.

Seis notas sobre o que saiu da Convenção do Bloco de Esquerda:

Geringonça é “cooperação conflitual”

A grande definição da atual relação do BE com o partido do Governo foi feita pelo histórico Camilo Mortágua que pediu a que todos estejam preparados para “a prática da cooperação conflitual”. A geringonça, disse, é “uma coisa pouco sólida, que necessita paixão, dedicação e empenho”.

“Cooperação conflitual” é a negociação permanente, a pressão, a reinvindicação junto do PS. “O BE nasceu para esticar a corda”, segundo João Teixeira Lopes. O BE é “uma garantia”, sublinhou o senador Francisco Louçã. Não se importam com a ideia que se criou que o BE tem um cronómetro que está a contar e que vai decidir quando é que o acordo PS-BE rebenta.

Os críticos da atual direção foram ao palco dizer mesmo que “não é uma questão de se [o acordo quebra], é uma questão de quando”. As palavras não incomodam Catarina Martins - ajudam à pressão sobre o PS.

“A força mais forte do Governo”

É o objetivo assumido por Catarina Martins e por toda a direção. Nos dois dias de trabalhos, ficou claro como BE se posiciona: com mais votos o partido poderá no futuro forçar uma maioria a dar mais prioridade ao investimento público e à criação de emprego. Com os olhos postos ao mesmo tempo em Espanha que hoje vai a eleições, o BE ambiciona ultrapassar o PS? Sim. Por isso, Jorge Costa também fez questão de deixar claro que o BE “sabe para onde vai”: “Não somos o CDS do PS”. “Claro que queremos ser Governo e ser poder. Querer ser poder é quer ser povo”, concretizou Catarina Martins.

Sobre o PCP, outra das 'pernas' da geringonça, nem uma palavra. O BE ficou à frente do partido de Jerónimo de Sousa em outubro (teve 10,19% contra os 8,25% do PCP) e já nem olha por cima do ombro para ver quem vem atrás.

“Não desistimos da Europa”

O BE rejeita esta Europa mas não desiste da Europa. No rescaldo do Brexit, Catarina Martins começou com cautelas. “Este não é o momento dos países saltarem com cartadas de referendos”, mas de “pôr em cima da mesa alternativas pensadas”, avisou logo à entrada do pavilhão do Casal Vistoso, em Lisboa, onde decorreu a X Convenção. No encerramento, a líder acabou por acenar com um pedido de referendo se a Comissão Europeia insistir em aplicar sanções a Portugal por défice excessivo em 2015. Referendo a quê? Várias figuras do BE defendem uma consulta sobre os tratados e não uma pergunta igual à dos britânicos.

A Europa foi o tema central, aliás, de distância do BE em relação ao PS. Se dúvidas houvesse, José Manuel Pureza tratou de pôr em pratos limpos. “Disse há dias António Costa que é cada vez mais difícil ser socialista sem ser crítico da União Europeia. Tem plena razão. Mas isso é pouco. É mesmo o mínimo dos mínimos”, atirou. “Está na hora de dizer, com toda a clareza, que só se pode ser socialista contra a City e contra Frankfurt, contra Cameron e contra Hollande, contra Merkel e contra Dijsselbloem. (...) Não se pode ser socialista senão recusando aquilo em que União Europeia se tornou”.

Para Catarina Martins, “a UE está a ser uma mentira e um nivelamento por baixo. Mas se está em crise, vamos à luta”. Por sinal, a Europa foi também tema central do Congresso do PS que se realizou em junho e aí (ainda longe do Brexit) tinha ficado evidente o desconforto de uma parte dos socialistas com a construção europeia.

Que Orçamento vem aí?

Aumento das pensões acima da inflação, mais escalões de IRS, cortes nas rendas da energia, poupanças nas PPP da saúde (e nos cheques cirurgia e serviços convencionados), aumento das indemnizações por despedimento, reforço da contratação coletiva. Todas estas propostas foram enunciadas no palco da Convenção. Algumas das ideias estão já a ser negociadas com o PS no âmbito dos grupos de trabalho que estão formados e cujas primeiras conclusões serão divulgadas em julho. E derivam todas do que ficou por escrito no acordo PS-BE.

Mas isto tudo depende também de outro objetivo: a reestruturação da dívida que permitirá libertar mais recursos. Segundo a direção do BE, “contra aumentos do IRS e IVA”, só existe uma saída: “atacar o abuso da dívida”.

Os subscritores de uma das moções alternativas a Catarina Martins bem que questionaram: “A direção atual é bem capaz de já estar a negociar com o PS o próximo Orçamento. E se as pressões europeias resultarem em mais austeridade?”. No encerramento, Catarina Martins reforçou a necessidade de mexer nos encargos com a dívida como forma de libertar o país. BE não desarma.

Estratégia das autárquicas

A moção A, de Catarina Martins, defende preferencialmente listas próprias nas próximas eleições autárquicas que vão decorrer no outono de 2017, admite coligações onde já existem (caso da Madeira), apoiar listas de cidadãos (caso de Coimbra) e geringonças pós-eleitorais. Os críticos pediram mais explicações, mas as autárquicas (o partido não detém a presidência de nenhum executivo municipal) não ocuparam grande parte das discussões. Como nota lateral, serviu para a única referência de Catarina a Jerónimo de Sousa: “Como disse Jerónimo de Sousa com graça e como António Costa também repetiu com graça, nas autárquicas não há pacto nem agressão” entre PS, PCP e BE. A direção garante que não “fugirá a nenhuma responsabilidade em nenhum sítio do país” e que haverá uma nova geração nas autarquias. Sobre Lisboa, nem uma palavra.

Entre os subscritores da moção de Catarina Martins ainda houve uma tentaiva de permitir alianças pré-eleitorais. Sem indicações dos parceiros, era uma proposta à medida de entendimentos com o PS. Mas a adenda, feita no sábado, acabaria por ser retirada pelos seus autores na manhã de domingo, antes da votação.

Consagração da líder única

Foi a Convenção de consagração de Catarina Martins como a líder única do BE, pondo fim a um período de coordenação conjunta e colocando-a no mesmo patamar ocupado pelo histórico Francisco Louçã. A sua moção de estratégia conseguiu 83% dos votos e a sala aplaudiu entusiasticamente o seu discurso. Inicia-se uma nova fase na vida do BE e as próximas eleições legislativas vão ser o teste decisivo sobre esse difícil equilíbrio entre estar fora do Governo e negociar algumas medidas do mesmo Governo.

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