Deputados e distritais contra Rio

12-10-2018
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A desunida união do PSD. Foi assim que este semanário descreveu a sexta-feira que abriu o congresso do PSD do fim-de-semana passado. Uma de...

A desunida união do PSD. Foi assim que este semanário descreveu a sexta-feira que abriu o congresso do PSD do fim-de-semana passado. Uma desunida união. 
Volvida uma semana, essa desunião não unificou. Antes pelo contrário. O congresso abriu feridas e rompeu promessas; Elina Fraga causou surpresa e apreensão como nova vice-presidente do partido; e Fernando Negrão, indicado por Rio para líder parlamentar, não foi além dos 39,7% de votos favoráveis dos deputados do PSD na Assembleia da República.
Se o congresso simulou união, o Parlamento destapou-lhe a capa. Se Santana Lopes reuniu os ‘passistas’ durante as diretas, estes não o acompanharam depois de aceitar o convite de Rui Rio para acordo entre ambos.
Com Santana a encabeçar a lista ‘oficial’ de Rio ao Conselho Nacional, levando consigo Paulo Rangel e o ex-secretário-geral de Passos Coelho, José Matos Rosa, a tão badalada união consumou-se. Ou, pelo menos, pareceu consumar-se.
A verdade, todavia, é que não foi bem assim. Numa lista que procurou uma unidade quase total no partido, a procura dessa união acabou a desunir. 
Para o acordo entre Rio e Santana vingar, tanto um como o outro viram-se obrigados a abdicar de vários nomes que os haviam apoiado durante a corrida interna. 
Santana manteve os autarcas que foram protagonistas na elaboração do seu programa, como aliás o SOL já pré-anunciara: Paulo Cunha, Telmo Faria e Silvério Regalado. 
Rio puxou o eurodeputado Paulo Rangel para número 2 – que serviu de pressão perfeita às hesitações de Santana, na medida em que encabeçaria a lista caso este saltasse à última da hora, o que esteve para acontecer. 
Mesmo depois de os dois candidatos à sucessão de Passos Coelho terem entrado quase de mão dada no congresso, as negociações – protagonizadas pelos diretores de campanha Salvador Malheiro e João Montenegro – duraram até de madrugada. Só às quatro da manhã houve «fumo branco», como o coordenador da volta nacional de Rio, Bruno Coimbra, revelou nas redes sociais. 
A história repete-se?         
O trabalho, contudo, não deu fruto total. Apesar do apoio oficial de Rio, o rosto conciliador de Santana e a presença simbólica de Rangel e Matos Rosa, a lista apoiada pela nova direção ao Conselho Nacional – a maior e mais regular reunião dos sociais-democratas – falhou em atingir a maioria absoluta. 
As listas de Carlos Eduardo Reis, que passou de terceira lista mais votada no último congresso para segunda lista mais votada ao mesmo órgão, e de Bruno Vitorino, a fechar o pódio, deram dores de cabeça aos pretensos unificadores. 
Reis, que esteve com Santana durante as diretas e já fora seu porta-voz da juventude em 2008, consolidou a equipa que apresentara em Espinho, há dois anos. 
Vitorino, da distrital de Setúbal, contou com a proximidade do ex-líder da JSD Pedro Duarte e com a solidariedade de Pedro Alves, presidente da distrital de Viseu que apoiou Rui Rio mas acabou proscrito dos órgãos nacionais após a vitória do ex-presidente da Câmara do Porto. 
Os esquecidos
Pedro Alves, todavia, não foi o único ‘rioísta’ de peso a ser esquecido depois do ‘rioísmo’ triunfar nas urnas laranjas. Se Viseu sai manifestamente subrepresentado neste novo PSD – e isso foi notado –, há mais nomes que não foram em qualquer uma das listas apresentadas no congresso na antiga FIL. 
Ricardo Baptista Leite, deputado que fez aprovar a sua moção sobre a legalização da canábis no fim-de-semana passado, foi retirado à última da hora de vogal da Comissão Política Nacional – e nem uma vice-presidência do grupo parlamentar conseguiu. Teve, e a maioria não pode dizer o mesmo, direito a prémio de consolação: o também médico será o coordenador do PSD na Comissão Parlamentar de Saúde.
Cristóvão Norte, que ganhou notoriedade no rescaldo da vitória de Rui Rio por ter contribuído para o sucesso do nortenho no Algarve, foi outro dos nomes ausentes destas contas, um tanto ingratas para alguns. Virgílio Macedo e José Silvano têm de igual modo razões para se sentirem preteridos. 
O rioísmo, é certo, não começou a quebrar aí. Já com a surdez de Rui Rio às preferências dos deputados seus apoiantes para a liderança parlamentar despontaram várias tensões. 
Os parlamentares rioístas, que prefereriam Marques Guedes até ele se afastar do assunto, e depois pediram Luís Campos Ferreira até entenderem que Rio já havia escolhido, não ficaram exatamente felizes com a eleição de Fernando Negrão – e ainda menos com o seu primeiro discurso enquanto líder parlamentar. Vários dos que apoiaram Rio nas diretas não votaram na direção de bancada de Negrão e a reacção deste ao sucedido, com acusações de falta de ética, caiu mal nos corredores de São Bento. 
A deputada Clara Marques Mendes foi das raras exceções a defender o que o ex-ministro dissera após ser eleito com somente 39% da votação. O deputado Sérgio Azevedo, por outro lado, criticou o argumento de Negrão, que somou os votos em branco aos favoráveis para alegar maioria.
Um PSD anti-PSD?
Pode uma mulher que processou um Governo do seu partido ser vice-presidente desse partido? Parece que sim. Elina Fraga, ex-bastária da Ordem dos Advogados, provou-o. Apesar dos apupos durante a sua tomada de posse, procurou afirmar-se, dando duas entrevistas que visavam explicar que a auditoria à sua gestão enquanto bastonária – que está no Ministério Público desde o verão passado – não colocavam em causa as suas recentes funções políticas. 
Fraga assumiu que voltaria a processar o Executivo de Passos Coelho, dizendo que também esperava que o seu sucessor na Ordem dos Advogados processasse o primeiro-ministro atual se ele «matasse alguém» ou criasse «campos de concentração». Mais tarde, admitira que a comparação fora «extremada». 
Castro Almeida, que é agora vice-presidente do PSD a seu lado, fazia parte desse Governo alvo de críticas constantes de Elina Fraga. Isabel Meirelles, outra das novas vices do PSD, aprovou o pedido da auditoria a Fraga enquanto membro, em janeiro de 2017, do Conselho Geral da Ordem. 
Fraga, que declarou esta semana que o atual Governo lhe «repugna por ser de esquerda» é agora também vice-presidente do PSD ao lado de um homem que se diz «de esquerda»: Salvador Malheiro, já mencionado diretor de campanha de Rui Rio.
As reuniões na São Caetano serão, portanto, animadas. 
Artigo publicado na edição do SOL de 24 de fevereiro de 2018

by Sebastião Bugalho via Jornal i

A desunida união do PSD. Foi assim que este semanário descreveu a sexta-feira que abriu o congresso do PSD do fim-de-semana passado. Uma de...

A desunida união do PSD. Foi assim que este semanário descreveu a sexta-feira que abriu o congresso do PSD do fim-de-semana passado. Uma desunida união. 
Volvida uma semana, essa desunião não unificou. Antes pelo contrário. O congresso abriu feridas e rompeu promessas; Elina Fraga causou surpresa e apreensão como nova vice-presidente do partido; e Fernando Negrão, indicado por Rio para líder parlamentar, não foi além dos 39,7% de votos favoráveis dos deputados do PSD na Assembleia da República.
Se o congresso simulou união, o Parlamento destapou-lhe a capa. Se Santana Lopes reuniu os ‘passistas’ durante as diretas, estes não o acompanharam depois de aceitar o convite de Rui Rio para acordo entre ambos.
Com Santana a encabeçar a lista ‘oficial’ de Rio ao Conselho Nacional, levando consigo Paulo Rangel e o ex-secretário-geral de Passos Coelho, José Matos Rosa, a tão badalada união consumou-se. Ou, pelo menos, pareceu consumar-se.
A verdade, todavia, é que não foi bem assim. Numa lista que procurou uma unidade quase total no partido, a procura dessa união acabou a desunir. 
Para o acordo entre Rio e Santana vingar, tanto um como o outro viram-se obrigados a abdicar de vários nomes que os haviam apoiado durante a corrida interna. 
Santana manteve os autarcas que foram protagonistas na elaboração do seu programa, como aliás o SOL já pré-anunciara: Paulo Cunha, Telmo Faria e Silvério Regalado. 
Rio puxou o eurodeputado Paulo Rangel para número 2 – que serviu de pressão perfeita às hesitações de Santana, na medida em que encabeçaria a lista caso este saltasse à última da hora, o que esteve para acontecer. 
Mesmo depois de os dois candidatos à sucessão de Passos Coelho terem entrado quase de mão dada no congresso, as negociações – protagonizadas pelos diretores de campanha Salvador Malheiro e João Montenegro – duraram até de madrugada. Só às quatro da manhã houve «fumo branco», como o coordenador da volta nacional de Rio, Bruno Coimbra, revelou nas redes sociais. 
A história repete-se?         
O trabalho, contudo, não deu fruto total. Apesar do apoio oficial de Rio, o rosto conciliador de Santana e a presença simbólica de Rangel e Matos Rosa, a lista apoiada pela nova direção ao Conselho Nacional – a maior e mais regular reunião dos sociais-democratas – falhou em atingir a maioria absoluta. 
As listas de Carlos Eduardo Reis, que passou de terceira lista mais votada no último congresso para segunda lista mais votada ao mesmo órgão, e de Bruno Vitorino, a fechar o pódio, deram dores de cabeça aos pretensos unificadores. 
Reis, que esteve com Santana durante as diretas e já fora seu porta-voz da juventude em 2008, consolidou a equipa que apresentara em Espinho, há dois anos. 
Vitorino, da distrital de Setúbal, contou com a proximidade do ex-líder da JSD Pedro Duarte e com a solidariedade de Pedro Alves, presidente da distrital de Viseu que apoiou Rui Rio mas acabou proscrito dos órgãos nacionais após a vitória do ex-presidente da Câmara do Porto. 
Os esquecidos
Pedro Alves, todavia, não foi o único ‘rioísta’ de peso a ser esquecido depois do ‘rioísmo’ triunfar nas urnas laranjas. Se Viseu sai manifestamente subrepresentado neste novo PSD – e isso foi notado –, há mais nomes que não foram em qualquer uma das listas apresentadas no congresso na antiga FIL. 
Ricardo Baptista Leite, deputado que fez aprovar a sua moção sobre a legalização da canábis no fim-de-semana passado, foi retirado à última da hora de vogal da Comissão Política Nacional – e nem uma vice-presidência do grupo parlamentar conseguiu. Teve, e a maioria não pode dizer o mesmo, direito a prémio de consolação: o também médico será o coordenador do PSD na Comissão Parlamentar de Saúde.
Cristóvão Norte, que ganhou notoriedade no rescaldo da vitória de Rui Rio por ter contribuído para o sucesso do nortenho no Algarve, foi outro dos nomes ausentes destas contas, um tanto ingratas para alguns. Virgílio Macedo e José Silvano têm de igual modo razões para se sentirem preteridos. 
O rioísmo, é certo, não começou a quebrar aí. Já com a surdez de Rui Rio às preferências dos deputados seus apoiantes para a liderança parlamentar despontaram várias tensões. 
Os parlamentares rioístas, que prefereriam Marques Guedes até ele se afastar do assunto, e depois pediram Luís Campos Ferreira até entenderem que Rio já havia escolhido, não ficaram exatamente felizes com a eleição de Fernando Negrão – e ainda menos com o seu primeiro discurso enquanto líder parlamentar. Vários dos que apoiaram Rio nas diretas não votaram na direção de bancada de Negrão e a reacção deste ao sucedido, com acusações de falta de ética, caiu mal nos corredores de São Bento. 
A deputada Clara Marques Mendes foi das raras exceções a defender o que o ex-ministro dissera após ser eleito com somente 39% da votação. O deputado Sérgio Azevedo, por outro lado, criticou o argumento de Negrão, que somou os votos em branco aos favoráveis para alegar maioria.
Um PSD anti-PSD?
Pode uma mulher que processou um Governo do seu partido ser vice-presidente desse partido? Parece que sim. Elina Fraga, ex-bastária da Ordem dos Advogados, provou-o. Apesar dos apupos durante a sua tomada de posse, procurou afirmar-se, dando duas entrevistas que visavam explicar que a auditoria à sua gestão enquanto bastonária – que está no Ministério Público desde o verão passado – não colocavam em causa as suas recentes funções políticas. 
Fraga assumiu que voltaria a processar o Executivo de Passos Coelho, dizendo que também esperava que o seu sucessor na Ordem dos Advogados processasse o primeiro-ministro atual se ele «matasse alguém» ou criasse «campos de concentração». Mais tarde, admitira que a comparação fora «extremada». 
Castro Almeida, que é agora vice-presidente do PSD a seu lado, fazia parte desse Governo alvo de críticas constantes de Elina Fraga. Isabel Meirelles, outra das novas vices do PSD, aprovou o pedido da auditoria a Fraga enquanto membro, em janeiro de 2017, do Conselho Geral da Ordem. 
Fraga, que declarou esta semana que o atual Governo lhe «repugna por ser de esquerda» é agora também vice-presidente do PSD ao lado de um homem que se diz «de esquerda»: Salvador Malheiro, já mencionado diretor de campanha de Rui Rio.
As reuniões na São Caetano serão, portanto, animadas. 
Artigo publicado na edição do SOL de 24 de fevereiro de 2018

by Sebastião Bugalho via Jornal i

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