Do PNR ao PSD. As “sensibilidades” políticas dos dirigentes do Chega

29-11-2019
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O Chega “ainda está a estruturar-se, é uma caixa meio-vazia”. Dentro do partido, contudo, é possível distinguir “duas sensibilidades ideológicas", aponta Riccardo Marchi, investigador do Centro de Estudos Internacionais do Instituto Universitário de Lisboa (CEI-IUL). Há elementos na estrutura do partido de André Ventura com uma agenda nacionalista e conservadora, que vieram do CDS, do Nova Democracia (PND) ou ao Partido Nacional Renovador (PNR), e outros com posições mais moderadas. Alguns são desconhecidos, outros fazem eco com o passado político de Portugal, nota o especialista e autor do livro “As Direitas na Democracia Portuguesa”. O caso dos três vice-presidentes do Chega: um passou pelo CDS e a Nova Democracia (PND), partido fundado por Manuel Monteiro; outro é ex-conselheiro nacional do PSD (e está a ser acusado de ter forjado assinaturas no registo do partido); e um terceiro é o presidente do Sindicato do Pessoal Técnico da PSP. Um segundo exemplo: um dos principais responsáveis pela recolha de assinaturas para a legalização do partido (que em março abandonou o Chega) foi candidato autárquico em 2017 pelo PNR. Como um polvo, a estrutura dirigente do Chega tem múltiplos tentáculos - muitos dos quais provenientes de outras forças políticas. O partido alberga hoje “tudo e nada”. “Até agora o André Ventura mostrou uma grande capacidade de conseguir dialogar todas as direitas inorgânicas: nacionalista, conservadora, anti-sistema, defensora de um regime de lei e ordem”, nota Marchi, um dos principais especialistas no país na história da extrema-direita. André Ventura nega que seja difícil gerir todas as diferentes correntes ideológicas que pulsam no partido. “No Chega temos militantes e dirigentes que vieram de todo o espectro político, até do PS e do PCP. Naturalmente que a proveniência do PSD é do CDS será maior, visto estarem mais próximos ideologicamente do espaço político que ocupamos. Não é difícil fazer esta harmonização porque há um ponto comum a todos: o enorme desalento e frustração com o sistema atual. O Chega é essencialmente um partido anti-sistema”, diz, ao Expresso. Segundo Riccardo Marchi, Ventura é, sem dúvida, o timoneiro do partido. E tem características que o distinguem da clássica extrema-direita. “É muito flexível, nada ortodoxo, capaz de moldar a sua posição, conforme o que tem mais tração na sociedade civil. E é muito mais pragmático que a extrema-direita tradicional portuguesa”, frisa. Isto, todavia, não quer dizer que o deputado seja imune ou impermeável às forças dentro do partido.

Foto Ana Baião

Os homens de Manuel Monteiro Diogo Pacheco de Amorim, 70 anos, é um dos três vice-presidentes do Chega e antigo braço direito de Manuel Monteiro no Nova Democracia (PND). Passou pelo CDS e outros movimentos conservadores. No círculo interno do Chega, é visto como o ideólogo do partido. Autor do programa político do Chega, Pacheco de Amorim foi acusado de plagiar (copiar de forma integral várias páginas) o programa que escreveu, no início da década, também para o PND. De acordo com Marchi, Pacheco de Amorim tem um “percurso político muito singular.” Passou por várias forças políticas nacionalistas. Após o 25 de abril, fez parte de movimentos estudantis integracionistas que contestavam a descolonização. Em fuga do COPCON, esteve exilado em Madrid um ano e alguns meses. Há quem lhe atribua algumas das ideias que já passaram pela boca de Ventura - como a redução do número de deputados - e as posições económicas do Chega. Depois, na equipa de vogais do Chega, há ainda um segundo nome associado ao PND e a Manuel Monteiro: Salvador Posser de Andrade. O empresário fez parte da equipa do ex-líder do CDS quando concorreu à liderança da Câmara Municipal de Lisboa.

O vice que veio do PSD Nuno Afonso, também vice-presidente do Chega, é ex-conselheiro nacional do PSD. À imagem de André Ventura, candidato autárquico pelo PSD em Loures em 2017, derivou dos social-democratas para outra força política mais à direita. É hoje o chefe de gabinete do líder do Chega. O nome do antigo social-democrata desde o final da última semana tem estado no centro de uma polémica. Dois militantes destacados do Chega - Jorge Castela e Pedro Perestrello - abandonaram o partido em março, deixando denúncias de ilegalidades que estão a ser investigadas pelo Ministério Público. Nuno Afonso é acusado de ter forjado milhares de assinaturas e de as ter escondido de outros elementos do Chega, durante a recolha para legalização do partido. “Entre nós, ninguém nunca acreditou que o responsável por organizar e contar as assinaturas não tenha reparado que existem 300 páginas todas com a mesma caneta, a mesma letra e assinaturas todas parecidas”, afirmou Pedro Perestrello, em declarações à revista "Sábado", na semana passada. Em março deste ano, o Chega entregou 8312 assinaturas, 1813 das quais não foram validadas pelo Tribunal Constitucional, o que obrigou a estrutura do então movimento a entregar mais 2223 nos dez dias seguintes. Dessas, foram detetadas irregularidades em 826 assinaturas novamente. Questionado pelo Expresso se o Chega estaria a tomar alguma diligência devido às acusações lançadas por Jorge Castela e Pedro Perestrello, André Ventura não respondeu. Disse apenas: “Todos os subscritores acompanharam o processo de recolha de assinaturas. Mantenho total confiança no meu chefe de gabinete e tenho a certeza que nunca estaria envolvido em nenhuma falsificação.”

TIAGO MIRANDA

O Chega “ainda está a estruturar-se, é uma caixa meio-vazia”. Dentro do partido, contudo, é possível distinguir “duas sensibilidades ideológicas", aponta Riccardo Marchi, investigador do Centro de Estudos Internacionais do Instituto Universitário de Lisboa (CEI-IUL). Há elementos na estrutura do partido de André Ventura com uma agenda nacionalista e conservadora, que vieram do CDS, do Nova Democracia (PND) ou ao Partido Nacional Renovador (PNR), e outros com posições mais moderadas. Alguns são desconhecidos, outros fazem eco com o passado político de Portugal, nota o especialista e autor do livro “As Direitas na Democracia Portuguesa”. O caso dos três vice-presidentes do Chega: um passou pelo CDS e a Nova Democracia (PND), partido fundado por Manuel Monteiro; outro é ex-conselheiro nacional do PSD (e está a ser acusado de ter forjado assinaturas no registo do partido); e um terceiro é o presidente do Sindicato do Pessoal Técnico da PSP. Um segundo exemplo: um dos principais responsáveis pela recolha de assinaturas para a legalização do partido (que em março abandonou o Chega) foi candidato autárquico em 2017 pelo PNR. Como um polvo, a estrutura dirigente do Chega tem múltiplos tentáculos - muitos dos quais provenientes de outras forças políticas. O partido alberga hoje “tudo e nada”. “Até agora o André Ventura mostrou uma grande capacidade de conseguir dialogar todas as direitas inorgânicas: nacionalista, conservadora, anti-sistema, defensora de um regime de lei e ordem”, nota Marchi, um dos principais especialistas no país na história da extrema-direita. André Ventura nega que seja difícil gerir todas as diferentes correntes ideológicas que pulsam no partido. “No Chega temos militantes e dirigentes que vieram de todo o espectro político, até do PS e do PCP. Naturalmente que a proveniência do PSD é do CDS será maior, visto estarem mais próximos ideologicamente do espaço político que ocupamos. Não é difícil fazer esta harmonização porque há um ponto comum a todos: o enorme desalento e frustração com o sistema atual. O Chega é essencialmente um partido anti-sistema”, diz, ao Expresso. Segundo Riccardo Marchi, Ventura é, sem dúvida, o timoneiro do partido. E tem características que o distinguem da clássica extrema-direita. “É muito flexível, nada ortodoxo, capaz de moldar a sua posição, conforme o que tem mais tração na sociedade civil. E é muito mais pragmático que a extrema-direita tradicional portuguesa”, frisa. Isto, todavia, não quer dizer que o deputado seja imune ou impermeável às forças dentro do partido.

Foto Ana Baião

Os homens de Manuel Monteiro Diogo Pacheco de Amorim, 70 anos, é um dos três vice-presidentes do Chega e antigo braço direito de Manuel Monteiro no Nova Democracia (PND). Passou pelo CDS e outros movimentos conservadores. No círculo interno do Chega, é visto como o ideólogo do partido. Autor do programa político do Chega, Pacheco de Amorim foi acusado de plagiar (copiar de forma integral várias páginas) o programa que escreveu, no início da década, também para o PND. De acordo com Marchi, Pacheco de Amorim tem um “percurso político muito singular.” Passou por várias forças políticas nacionalistas. Após o 25 de abril, fez parte de movimentos estudantis integracionistas que contestavam a descolonização. Em fuga do COPCON, esteve exilado em Madrid um ano e alguns meses. Há quem lhe atribua algumas das ideias que já passaram pela boca de Ventura - como a redução do número de deputados - e as posições económicas do Chega. Depois, na equipa de vogais do Chega, há ainda um segundo nome associado ao PND e a Manuel Monteiro: Salvador Posser de Andrade. O empresário fez parte da equipa do ex-líder do CDS quando concorreu à liderança da Câmara Municipal de Lisboa.

O vice que veio do PSD Nuno Afonso, também vice-presidente do Chega, é ex-conselheiro nacional do PSD. À imagem de André Ventura, candidato autárquico pelo PSD em Loures em 2017, derivou dos social-democratas para outra força política mais à direita. É hoje o chefe de gabinete do líder do Chega. O nome do antigo social-democrata desde o final da última semana tem estado no centro de uma polémica. Dois militantes destacados do Chega - Jorge Castela e Pedro Perestrello - abandonaram o partido em março, deixando denúncias de ilegalidades que estão a ser investigadas pelo Ministério Público. Nuno Afonso é acusado de ter forjado milhares de assinaturas e de as ter escondido de outros elementos do Chega, durante a recolha para legalização do partido. “Entre nós, ninguém nunca acreditou que o responsável por organizar e contar as assinaturas não tenha reparado que existem 300 páginas todas com a mesma caneta, a mesma letra e assinaturas todas parecidas”, afirmou Pedro Perestrello, em declarações à revista "Sábado", na semana passada. Em março deste ano, o Chega entregou 8312 assinaturas, 1813 das quais não foram validadas pelo Tribunal Constitucional, o que obrigou a estrutura do então movimento a entregar mais 2223 nos dez dias seguintes. Dessas, foram detetadas irregularidades em 826 assinaturas novamente. Questionado pelo Expresso se o Chega estaria a tomar alguma diligência devido às acusações lançadas por Jorge Castela e Pedro Perestrello, André Ventura não respondeu. Disse apenas: “Todos os subscritores acompanharam o processo de recolha de assinaturas. Mantenho total confiança no meu chefe de gabinete e tenho a certeza que nunca estaria envolvido em nenhuma falsificação.”

TIAGO MIRANDA

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