Joacine, Beatriz, Romualda e as mulheres afrodescendentes no Parlamento

14-10-2019
marcar artigo

Anda por ai uma grande controvérsia sobre o regozijo generalizado em relação à eleição de três mulheres afrodescendentes para o Parlamento: Joacine Katar Moreira, cabeça de lista do Livre por Lisboa, Beatriz Gomes Dias, nº3 do BE e Romualda Fernandes nº19 do PS. Afinal, contestam os criticos, não há qualquer carácter inédito nesta eleição pois já vários deputados afrodescendentes passaram pelo parlamento português em diferentes legislaturas, ao longo das últimas décadas, nomeadamente durante o período do Estado Novo e época colonial. Chapeau. Somos realmente exímios no que toca a matérias de representatividade e inclusão. Esta discussão é a meu ver totalmente besides the point e mais uma tentativa camuflada de desviar as atenções do que de facto importa.

Independentemente da anterior presença de alguns (muito poucos, contam-se pelos dedos das mãos) negros ou afrodescendentes no Parlamento, o que é de facto inédito e inovador nesta eleição, vai muito além da cor da pele das recém-eleitas deputadas – é o que estas mulheres representam e simbolizam numa sociedade que tem pecado por ser demasiado fechada, homogénea e avessa à diferença com tendência a favorecer sempre o mesmo tipo de pessoas, inseridas em círculos restritos, sejam eles partidários ou não, e com os quais, convenhamos, tem sido muito difícil de romper.

O fator inédito destas eleições é o que traz estas mulheres – sobretudo a Joacine e a Beatriz pelo que sei – ao Parlamento e de onde vêm: do movimento anti-racista, da luta pela ocupação de espaço e pela visibilidade de determinadas comunidades que, apesar de representarem uma percentagem significativa da população, vivem nas franjas da sociedade e se sentem invisíveis, esquecidas e sistematicamente abafadas pelo status quo. Elas dão-lhes voz. Independentemente do seu posicionamento ideológico, e do partido que representam, têm esse mérito, pois foi esse movimento que colocou o tema na ordem do dia e na agenda política. São conhecidas não necessariamente pela sua atividade na política, ou militância partidária, mas pelas causas que defendem e o papel que desempenharam na sociedade civil e notoriedade que, entretanto, conquistaram.

E, corrijam-me se estou errada, mas não deveria ser essa a vocação do nosso Parlamento? Representar e dar voz aos vários segmentos da nossa população, dar visibilidade aos vários combates que partem da sociedade civil, ao invés de premiar, eleição após eleição, pessoas cuja principal atividade, contra todas as regras da ‘meritocracia’, é ascenderem no aparelho partidário? Recorde-se aliás outros exemplos, com as devidas diferenças, nomeadamente no Partido Democrata nos EUA: a eleição de Alexandria Ocasio Cortez, de Ilhan Olmar e de Rashida Tlaib para a Câmara dos Representantes Norte-Americano em 2018.

Mas tal como não entendo essa tentativa sistemática de desvalorizar e diminuir o fator disruptivo desta eleição, por parte de elementos da direita, também não entendo, a exaltação excessiva e inflamada com o facto de serem três mulheres ‘de esquerda’ ou as múltiplas referências que tenho visto ao ‘combate ao fascismo’ e à associação da luta anti-racista aos ‘valores de esquerda’. Anti-racismo e socialismo, lamento, não são indissociáveis, nem se relacionam entre si. Já anti-racismo e democracia e igualdade sim. Não me lembro de regimes marxista-leninistas, ou maoístas, defenderem a inclusão e visibilidade de minorias ou o combate ao racismo. Nenhum partido do arco da governação em Portugal é xenófobo ou fascista e, independentemente do destaque e prioridade que dão à luta anti-racista, todos têm o combate à discriminação inscrito nos seus programas eleitorais.

Há com certeza muitos afrodescendentes, ou grupos minoritários, que não se reveem numa agenda política e ideológica de esquerda nem, que eu saiba, têm um pensamento único sobre os destinos do país.

Ou seja, se por um lado considero importante colocar na agenda o tema do racismo estrutural, da inclusão e das desigualdades étnico-raciais, rejeito absolutamente as tentativas sistemáticas de elementos da esquerda e da direita de tornar esta questão numa arma de combate contra o adversário político, num tema ‘fraturante’ e polarizador entre a alegada ‘esquerda radical’ e a alegada ‘direita reacionária’.

Precisamos de coesão social e não de divisão e delimitação de fronteiras artificiais que colocam a esquerda do lado bom e a direita do lado mau. Precisamos de vozes ponderadas e de bom senso e não de pessoas que colocam a ideologia acima da causa. Precisamos de criar espaço em todo o espectro politico e partidário para que haja uma efetiva representatividade e diversidade, étnico-racial e ideológica, no Parlamento. E nada disto acontece a menos que os partidos políticos comecem a compreender que o eleitorado negro importa, que as suas causas importam e merecem resposta, e que urge priorizar campanhas e estratégias proativas que cheguem a este e outros segmentos marginalizados da população.

Anda por ai uma grande controvérsia sobre o regozijo generalizado em relação à eleição de três mulheres afrodescendentes para o Parlamento: Joacine Katar Moreira, cabeça de lista do Livre por Lisboa, Beatriz Gomes Dias, nº3 do BE e Romualda Fernandes nº19 do PS. Afinal, contestam os criticos, não há qualquer carácter inédito nesta eleição pois já vários deputados afrodescendentes passaram pelo parlamento português em diferentes legislaturas, ao longo das últimas décadas, nomeadamente durante o período do Estado Novo e época colonial. Chapeau. Somos realmente exímios no que toca a matérias de representatividade e inclusão. Esta discussão é a meu ver totalmente besides the point e mais uma tentativa camuflada de desviar as atenções do que de facto importa.

Independentemente da anterior presença de alguns (muito poucos, contam-se pelos dedos das mãos) negros ou afrodescendentes no Parlamento, o que é de facto inédito e inovador nesta eleição, vai muito além da cor da pele das recém-eleitas deputadas – é o que estas mulheres representam e simbolizam numa sociedade que tem pecado por ser demasiado fechada, homogénea e avessa à diferença com tendência a favorecer sempre o mesmo tipo de pessoas, inseridas em círculos restritos, sejam eles partidários ou não, e com os quais, convenhamos, tem sido muito difícil de romper.

O fator inédito destas eleições é o que traz estas mulheres – sobretudo a Joacine e a Beatriz pelo que sei – ao Parlamento e de onde vêm: do movimento anti-racista, da luta pela ocupação de espaço e pela visibilidade de determinadas comunidades que, apesar de representarem uma percentagem significativa da população, vivem nas franjas da sociedade e se sentem invisíveis, esquecidas e sistematicamente abafadas pelo status quo. Elas dão-lhes voz. Independentemente do seu posicionamento ideológico, e do partido que representam, têm esse mérito, pois foi esse movimento que colocou o tema na ordem do dia e na agenda política. São conhecidas não necessariamente pela sua atividade na política, ou militância partidária, mas pelas causas que defendem e o papel que desempenharam na sociedade civil e notoriedade que, entretanto, conquistaram.

E, corrijam-me se estou errada, mas não deveria ser essa a vocação do nosso Parlamento? Representar e dar voz aos vários segmentos da nossa população, dar visibilidade aos vários combates que partem da sociedade civil, ao invés de premiar, eleição após eleição, pessoas cuja principal atividade, contra todas as regras da ‘meritocracia’, é ascenderem no aparelho partidário? Recorde-se aliás outros exemplos, com as devidas diferenças, nomeadamente no Partido Democrata nos EUA: a eleição de Alexandria Ocasio Cortez, de Ilhan Olmar e de Rashida Tlaib para a Câmara dos Representantes Norte-Americano em 2018.

Mas tal como não entendo essa tentativa sistemática de desvalorizar e diminuir o fator disruptivo desta eleição, por parte de elementos da direita, também não entendo, a exaltação excessiva e inflamada com o facto de serem três mulheres ‘de esquerda’ ou as múltiplas referências que tenho visto ao ‘combate ao fascismo’ e à associação da luta anti-racista aos ‘valores de esquerda’. Anti-racismo e socialismo, lamento, não são indissociáveis, nem se relacionam entre si. Já anti-racismo e democracia e igualdade sim. Não me lembro de regimes marxista-leninistas, ou maoístas, defenderem a inclusão e visibilidade de minorias ou o combate ao racismo. Nenhum partido do arco da governação em Portugal é xenófobo ou fascista e, independentemente do destaque e prioridade que dão à luta anti-racista, todos têm o combate à discriminação inscrito nos seus programas eleitorais.

Há com certeza muitos afrodescendentes, ou grupos minoritários, que não se reveem numa agenda política e ideológica de esquerda nem, que eu saiba, têm um pensamento único sobre os destinos do país.

Ou seja, se por um lado considero importante colocar na agenda o tema do racismo estrutural, da inclusão e das desigualdades étnico-raciais, rejeito absolutamente as tentativas sistemáticas de elementos da esquerda e da direita de tornar esta questão numa arma de combate contra o adversário político, num tema ‘fraturante’ e polarizador entre a alegada ‘esquerda radical’ e a alegada ‘direita reacionária’.

Precisamos de coesão social e não de divisão e delimitação de fronteiras artificiais que colocam a esquerda do lado bom e a direita do lado mau. Precisamos de vozes ponderadas e de bom senso e não de pessoas que colocam a ideologia acima da causa. Precisamos de criar espaço em todo o espectro politico e partidário para que haja uma efetiva representatividade e diversidade, étnico-racial e ideológica, no Parlamento. E nada disto acontece a menos que os partidos políticos comecem a compreender que o eleitorado negro importa, que as suas causas importam e merecem resposta, e que urge priorizar campanhas e estratégias proativas que cheguem a este e outros segmentos marginalizados da população.

marcar artigo