Números torturados desertam da oposição

08-10-2019
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O cenário macroeconómico proposto pela oposição e as suas projeções são “materialmente impossíveis”. São “promessas vãs”. Falta explicar como vão conseguir “mais crescimento, mais receita e mais despesa”. Faltam 3,9 milhões. Mesmo com um crescimento “irrealista” a “receita está sobrevalorizada em 2.000 milhões “. É o regresso “aos retificativos, aos défices excessivos (…) e consequentemente à instabilidade das políticas económicas”. Quem disse, em conferência de Imprensa, tudo isto? Não. Não foi Maria Luís Albuquerque, há quatro anos. Foi Mário Centeno, na segunda-feira.

Custa a crer. O mundo parece de pernas para o ar. Percebe-se que, depois da crise, os portugueses tenham ficado vacinados contra qualquer desmando orçamental. Pelos vistos, agora, adoramos contas certas. Temos horror a um eventual regresso à bancarrota. Ainda bem! Mas isso não pode justificar tudo. Sobretudo não pode justificar que se tente desviar as atenções dos casos de campanha “das golas” a “Tancos”, reduzindo tudo a uma guerra de números mais ou menos torturados.

Com fama de gastadores e despesistas e a braços com uma das maiores dívidas da Europa que teima em não descer, a verdade é que nos últimos tempos vivemos obcecados por contas certas. Quem sabe se essa foi também a chave do segredo de 48 anos de subdesenvolvimento económico. Acumulámos ouro, gastámos pouco e poupámos muito. Há coisas que mudam e outras que não. Agora, poupamos menos de 5 por cento do rendimento disponível, mas voltámos a querer “viver (apenas) com aquilo que temos”, como aconselhava Mário Soares.

É mesmo sintomático que Catarina Martins queira ser a campeã das contas certas e se apresente como a melhor dona-de-casa entre partidos, porque, como fez questão de acentuar, a boa gestão começa na economia doméstico-partidária. E é curioso ver Pedro Nuno Santos, que ganhou notoriedade por defender a necessidade de falar grosso em Bruxelas, declarando que não se pagaria a dívida só para ver as “pernas a tremer” dos banqueiros alemães, seja agora um dos que mais satisfação mostra pelo cumprimento integral dos compromissos assumidos.

Maria Luís antecipou, em 2015, a tese do “vem aí o diabo”, com a ameaça de “um despesismo socialista” que não constava das contas de Centeno - e a verdade é que Passos Coelho ganhou as eleições. Ele, que chefiou o Governo do “colossal aumento de impostos” e dos cortes de salários e pensões, acabou vencedor das últimas eleições. Não bastou. O PS fez governo e mostrou que havia contas certas também do outro lado, mesmo com o Bloco e com o PC sempre prontos a abrir os cordões à bolsa. Agora, a história repete-se: a maior carga fiscal de sempre exibe-se, de novo, como um resultado memorável, a que as revisões estatísticas do INE vêm puxar ainda mais o lustro.

Mesmo assim, pergunta-se: o que leva um académico como Centeno, presidente do Eurogrupo e a dias da apresentação do Orçamento, a deslocar-se ao Rato para, três meses depois de conhecido o cenário macroeconómico social-democrata, vir em conferência de imprensa destruí-lo em público, usando o mesmo tipo de rigor político da sua antiga adversária?

Conclusão óbvia: vale tudo para desviar as atenções dos “casos” que ameaçam a campanha e podem impedir a confortável maioria absoluta. Das “golas” a “Tancos”. É por isso urgente para os socialistas retomar a novela levezinha, iniciada no debate das rádios, “O meu Centeno é melhor que o teu”.

O segundo episódio não chegou a ir para o ar. O PSD desafiou Centeno a discutir o realismo das contas de Rio com o seu potencial ministro das finanças: Miranda Sarmento. Não obteve resposta.

Nada de anormal. Um ministro ocupado governa, não perde tempo a debater cenários de campanhas. Mas, ontem, surgiu o ministro-militante e o golpe baixo: o Centeno de Costa mostrou-se disponível a debater com “qualquer candidato a deputado” embora soubesse bem que no PSD o Sarmento-Centeno é que escolheu não se candidatar, para se preparar para “as provas de agregação”. Mesmo assim, ouvimo-lo já à noite, na SIC, a explicar serenamente o seu cenário e a passar a pasta do debate ao professor Álvaro Almeida, que, durante anos, os nossos ouvintes ouviram no programa "Conversas Cruzadas", ao domingo, e que é coautor do programa. Esperemos, agora, a resposta do ministro ao mesmo desafio.

Seja como for, uma coisa é certa: ninguém seguirá um debate tão técnico. Só a academia perceberá como foram torturados os números para confessarem a mais recente tese socialista: afinal, não há alternativa. Isto dito por um economista (alguém que se dedica ao estudo das melhores escolhas disponíveis) e foi vítima há meia dúzia de anos da mesma insinuação, é tão irónico que é quase insultuoso.

Vale a pena, aliás, ouvir as explicações de Manuela Ferreira Leite, antiliberal e PSD de sempre, quer sobre o Programa Socialista de 2015 quer sobre a proposta social-democrata atual. Há sempre alternativas.

O cenário macroeconómico proposto pela oposição e as suas projeções são “materialmente impossíveis”. São “promessas vãs”. Falta explicar como vão conseguir “mais crescimento, mais receita e mais despesa”. Faltam 3,9 milhões. Mesmo com um crescimento “irrealista” a “receita está sobrevalorizada em 2.000 milhões “. É o regresso “aos retificativos, aos défices excessivos (…) e consequentemente à instabilidade das políticas económicas”. Quem disse, em conferência de Imprensa, tudo isto? Não. Não foi Maria Luís Albuquerque, há quatro anos. Foi Mário Centeno, na segunda-feira.

Custa a crer. O mundo parece de pernas para o ar. Percebe-se que, depois da crise, os portugueses tenham ficado vacinados contra qualquer desmando orçamental. Pelos vistos, agora, adoramos contas certas. Temos horror a um eventual regresso à bancarrota. Ainda bem! Mas isso não pode justificar tudo. Sobretudo não pode justificar que se tente desviar as atenções dos casos de campanha “das golas” a “Tancos”, reduzindo tudo a uma guerra de números mais ou menos torturados.

Com fama de gastadores e despesistas e a braços com uma das maiores dívidas da Europa que teima em não descer, a verdade é que nos últimos tempos vivemos obcecados por contas certas. Quem sabe se essa foi também a chave do segredo de 48 anos de subdesenvolvimento económico. Acumulámos ouro, gastámos pouco e poupámos muito. Há coisas que mudam e outras que não. Agora, poupamos menos de 5 por cento do rendimento disponível, mas voltámos a querer “viver (apenas) com aquilo que temos”, como aconselhava Mário Soares.

É mesmo sintomático que Catarina Martins queira ser a campeã das contas certas e se apresente como a melhor dona-de-casa entre partidos, porque, como fez questão de acentuar, a boa gestão começa na economia doméstico-partidária. E é curioso ver Pedro Nuno Santos, que ganhou notoriedade por defender a necessidade de falar grosso em Bruxelas, declarando que não se pagaria a dívida só para ver as “pernas a tremer” dos banqueiros alemães, seja agora um dos que mais satisfação mostra pelo cumprimento integral dos compromissos assumidos.

Maria Luís antecipou, em 2015, a tese do “vem aí o diabo”, com a ameaça de “um despesismo socialista” que não constava das contas de Centeno - e a verdade é que Passos Coelho ganhou as eleições. Ele, que chefiou o Governo do “colossal aumento de impostos” e dos cortes de salários e pensões, acabou vencedor das últimas eleições. Não bastou. O PS fez governo e mostrou que havia contas certas também do outro lado, mesmo com o Bloco e com o PC sempre prontos a abrir os cordões à bolsa. Agora, a história repete-se: a maior carga fiscal de sempre exibe-se, de novo, como um resultado memorável, a que as revisões estatísticas do INE vêm puxar ainda mais o lustro.

Mesmo assim, pergunta-se: o que leva um académico como Centeno, presidente do Eurogrupo e a dias da apresentação do Orçamento, a deslocar-se ao Rato para, três meses depois de conhecido o cenário macroeconómico social-democrata, vir em conferência de imprensa destruí-lo em público, usando o mesmo tipo de rigor político da sua antiga adversária?

Conclusão óbvia: vale tudo para desviar as atenções dos “casos” que ameaçam a campanha e podem impedir a confortável maioria absoluta. Das “golas” a “Tancos”. É por isso urgente para os socialistas retomar a novela levezinha, iniciada no debate das rádios, “O meu Centeno é melhor que o teu”.

O segundo episódio não chegou a ir para o ar. O PSD desafiou Centeno a discutir o realismo das contas de Rio com o seu potencial ministro das finanças: Miranda Sarmento. Não obteve resposta.

Nada de anormal. Um ministro ocupado governa, não perde tempo a debater cenários de campanhas. Mas, ontem, surgiu o ministro-militante e o golpe baixo: o Centeno de Costa mostrou-se disponível a debater com “qualquer candidato a deputado” embora soubesse bem que no PSD o Sarmento-Centeno é que escolheu não se candidatar, para se preparar para “as provas de agregação”. Mesmo assim, ouvimo-lo já à noite, na SIC, a explicar serenamente o seu cenário e a passar a pasta do debate ao professor Álvaro Almeida, que, durante anos, os nossos ouvintes ouviram no programa "Conversas Cruzadas", ao domingo, e que é coautor do programa. Esperemos, agora, a resposta do ministro ao mesmo desafio.

Seja como for, uma coisa é certa: ninguém seguirá um debate tão técnico. Só a academia perceberá como foram torturados os números para confessarem a mais recente tese socialista: afinal, não há alternativa. Isto dito por um economista (alguém que se dedica ao estudo das melhores escolhas disponíveis) e foi vítima há meia dúzia de anos da mesma insinuação, é tão irónico que é quase insultuoso.

Vale a pena, aliás, ouvir as explicações de Manuela Ferreira Leite, antiliberal e PSD de sempre, quer sobre o Programa Socialista de 2015 quer sobre a proposta social-democrata atual. Há sempre alternativas.

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