Segurança Social: que proposta é esta que une Rui Rio a Catarina Martins (mas que António Costa rejeita)?

07-10-2019
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“Como garantir que o nosso sistema de pensões tem viabilidade no futuro?” é uma pergunta que vem cavando profundas trincheiras ideológicas entre esquerda e direita, que durante anos se mantiveram divididos no diagnóstico quanto à (in)sustentabilidade da Segurança Social e desconfiados da bondade das fórmulas alheias. Contudo, as posições aparentemente irreconciliáveis entre os partidos estão a evoluir. De tal modo que, nos programas eleitorais para 2019, começam a desenhar-se alguns mínimos denominadores comuns que poderão ditar aproximações a prazo. Um dos pontos de contacto entre o PSD, o PCP e o BE é que a taxa social única (TSU) a cargo de empresas e trabalhadores deixe de incidir apenas sobre as remunerações, e passe a tributar também o valor acrescentado líquido (VAL) das empresas. Ou, dito de forma mais simples, que a Segurança Social não seja financiada quase exclusivamente pelos salários e passe também a onerar os lucros das empresas. A ideia está longe de ser nova (durante anos a CGTP defendeu-a solitariamente na concertação social), mas tem vindo a conquistar adeptos à medida que o fator trabalho perde peso na repartição dos rendimentos e, sobretudo, à medida que começa a temer-se que, com a crescente robotização e digitalização, a base sobre a qual assentam os descontos vá encolhendo, agravando ainda mais os défices projetados do sistema (ver gráficos).

Um estudo feito pelo economista Armindo Silva para uma ala dos patrões, a Confederação do Comércio e Serviços de Portugal (CCP), trouxe argumentos reforçados a esta tese, não sendo por isso de estranhar que uma medida tipicamente defendida pela esquerda mereça agora também apoio do PSD — embora com diferenças. Para comunistas e bloquistas, a taxa sobre o VAL é para acrescer à taxa social única, o que significa que os empregadores seriam chamados a fazer mais descontos. No caso do BE, trata-se de uma taxa de 0,75% que oneraria, “pelo menos numa primeira fase”, apenas as grandes empresas, deixando as pequenas e médias de fora, explica ao Expresso o deputado José Soeiro. Por uma razão simples: “É preciso que os ganhos da inovação tecnológica sejam não só da empresa mas revertam também para os trabalhadores e a sociedade”, diz o candidato pelo BE pelo círculo do Porto. Já os comunistas, que não estiveram disponíveis para falar ao Expresso, defenderam no passado que, chegados ao fim de cada ano, se calcule 10,5% sobre o VAL de cada empresa e que, caso este seja superior aos descontos tradicionais, este valor prevaleça. Rui Rio, concordando com o princípio, quer antes uma formulação muito próxima da já defendida na concertação social pelos empresários do Comércio e Serviços. Concedendo que “no atual contexto de crescente digitalização da economia é necessário e justo que essa riqueza também contribua para a proteção social”, António Tavares, porta-voz do partido para a área social, também salvaguarda que é preciso “manter os níveis de competitividade das empresas”. É por isso que a solução passa por uma recomposição dos descontos, onde a contribuição sobre o VAL seria “deduzida do montante das contribuições pagas sobre a massa salarial”, evitando-se a dupla tributação. De fora deste debate ficam, para já, o CDS/PP e o PS. Os democratas-cristãos comungam com os socialistas um programa muito enxuto na área social porque, diz Adolfo Mesquita Nunes ao Expresso, se optou por apenas incluir as propostas consideradas consensuais. Já o PS não esteve disponível para explicar as suas opções e omissões. Contudo, na última legislatura os socialistas não se mostraram grandes adeptos desta via, argumentando que o objetivo já está a ser conseguido através da consignação de parte da receita do IRC (embora a consignação mais não seja do que um desvio de receita do orçamento geral do Estado). ADEUS PLAFONAMENTO, OLÁ REFORÇO DE DESCONTOS Um segundo grupo de propostas onde há áreas de intersecção, agora entre os partidos de direita e o PS, é o do reforço da poupança para a reforma. No espaço de uma década o desenho do sistema de pensões foi sendo significativamente retocado, de tal modo que, em paralelo com as discussões sobre a sustentabilidade da Segurança Social, cresceu a preocupação com a adequação das pensões. Isto é, começou a discutir-se se, com todas as tesouradas a que foram sujeitas, as pensões que os portugueses terão no futuro lhes garantirão sustento e dignidade. E é neste contexto que tem ganho novo espaço no debate público a necessidade de reforçar o chamado segundo pilar da Segurança Social. No seu programa eleitoral, o CDS/PP começa por propor que todos os anos os cidadãos sejam informados sobre a pensão a que, em cada momento, têm direito. Espera-se que a transparência, aliada a uma maior consciência sobre a queda de rendimento que os espera no futuro, crie espaço para o que apelidam “suplementos para a reforma”. Inspirada nos modelos alemão e britânico, a ideia é que, quando assina um contrato, o trabalhador passe automaticamente a fazer um desconto adicional de 1% (ou mais) sobre o seu salário. Esse desconto é canalizado para uma conta individual e, embora seja facultativo e possa cessar em qualquer momento, acredita-se que o automatismo criará um ambiente mais convidativo ao reforço da poupança. O mesmo se aplica às empresas: embora não sejam obrigadas a gastar mais dinheiro com a proteção social dos empregados, teriam fortes incentivos fiscais e de contexto para passarem a fazê-lo. Para evitar que o debate se veja contaminado com as acusações habituais de que pretende entregar o dinheiro das reformas a fundos privados, o CDS/PP propõe que o sistema de capitalização seja gerido por entidades públicas. O objetivo é também defendido pelo PSD, mas por um caminho diferente: que, de futuro, as negociações salariais passem a incorporar uma parte de aumentos salariais e outra parte de complemento de pensão. Traduzido em miúdos: “Em vez de lutarem por um aumento de 5%, os sindicatos e empresas devem passar a negociar aumentos de 2,5% para salários e descontos de 2,5% para um complemento de reforma”, exemplifica António Tavares. Trocar rendimento atual por rendimento futuro é uma mudança radical, tal como é ambicioso querer que as empresas aceitem agravar a sua fatura. Mas António Tavares acredita que é possível. “Se queremos um país com um nível de desenvolvimento europeu, é um caminho que temos de fazer.” Aliás, “as associações empresariais estão a profissionalizar-se e os sindicatos também percebem que não vale a pena olhar só para a reivindicação imediata, mas também a médio e longo prazo”. PSD e CDS não esperam resistências a este tipo de iniciativas — “consensuais”, dizem — e, se o cardápio ficar por aqui, até é provável que se consigam avanços com o PS, que no programa também fala na necessidade de, em sede de negociação coletiva, fomentar este tipo de esquemas. Para já, nenhum partido de direita se aventura por caminhos mais polémicos, deixando de fora dos seus programas alusões ao famoso plafonamento das contribuições, que esteve muito em voga até à crise financeira. Mas isto não quer dizer que não voltem ao debate. Até porque, reconhece Adolfo Mesquita Nunes, coordenador das propostas do CDS/PP “o programa é apenas um primeiro passo e não esgota tudo o que pensamos”. O que acontece é que “a Segurança Social é de tão radical importância que só faz sentido avançar com propostas de reforma quando há consenso”. O resto fica para um debate alargado, se chegar a haver espaço para ele.

Luís Barra

PS não quer mexer nas pensões Depois de ter sido forçado pelos parceiros da ‘geringonça’ a fazer aumentos reais nas pensões e a aliviar penalizações a uma parte das reformas antecipadas, para a próxima legislatura, o plano do PS é ficar quieto. Se conseguirá cingir-se a um roteiro minimalista ou se voltará a ser empurrado para novos alívios depende da conjugação de forças que sair das eleições. Nos últimos anos, de forma paulatina, foram avançando medidas que não só obrigam os portugueses a trabalhar mais tempo como lhes baixam as pensões a que terão direito no futuro. Em vez dos melhores dez dos últimos 15 anos passou a ser considerada no cálculo da pensão toda a carreira contributiva, o que baixa o valor médio e pode ser um perigo especialmente para quem tem carreiras intermitentes. Antecipar a saída do mercado de trabalho vale pesadas penalizações, pela via do chamado fator de sustentabilidade, que todos os anos cresce ao ritmo da esperança média de vida. A idade legal de reforma subiu para os 66 anos e passou a avançar todos os anos indexada à esperança de vida, de tal modo que, hoje, Portugal é dos países mais restritivos nesta área (ver gráfico). É este mosaico de medidas que ajuda a explicar as projeções que amiúde lançam uma onda de pessimismo na opinião pública, ao mostrar que, no futuro, teremos de trabalhar até aos 68 anos de idade (ou mais) para conseguir assegurar uma pensão equivalente a 75% do vencimento. Sair do mercado de trabalho antes do tempo, por vontade própria ou porque se é forçado pelo empregador, significa ver a pensão cair a pique. E é esta trajetória pouco risonha que tanto o BE como o PCP contestam. Nos últimos quatro anos, os dois partidos conseguiram que o Governo acabasse com o corte do fator de sustentabilidade (nos 14,7%) para todos quantos aos 60 anos tenham pelo menos 40 anos de descontos e, apesar de terem arrancado estas cedências a um PS muito relutante, agora querem ir mais longe. O PCP, por exemplo, reclama que a idade legal de reforma volte a ser fixa e regresse aos 65 anos. Depois, tanto comunistas como bloquistas querem que o famoso fator de sustentabilidade, criado em 2007 pelo atual ministro Vieira da Silva, quando também foi titular da pasta, seja revogado, deixando de penalizar quem resolve antecipar a sua reforma. Os dois partidos querem prosseguir a trajetória de aumento real das pensões, como aconteceu nos últimos quatro anos. Os planos são ambiciosos e voltam a colidir com as intenções do PS, mas José Soeiro acredita que isso está longe de os condenar à partida: “Não é grande surpresa o facto de o PS não querer estas medidas.” Mas, tal como aconteceu na legislatura passada, “na próxima legislatura estas medidas dependerão muito mais da força relativa que a esquerda tenha do que da vontade do PS”, diz ao Expresso o deputado do BE. DIREITA ALINHADA COM O PS: PENSÕES NÃO SÃO PARA MEXER Se, porventura, o PS conseguir ir fazendo arranjos com os partidos à sua direita, António Costa, terá, então, aliados para contrariar as pretensões da esquerda. No programa eleitoral, os socialistas só se comprometem a atualizar as pensões de acordo com as regras em vigor (à inflação ou pouco mais) e a avançar com a reforma a tempo parcial, uma promessa que herda da última legislatura. O CDS/PP não tem propostas para esta área, uma ausência também notada no programa do PSD, e que é deliberada: “Numa sociedade em que estamos a envelhecer, é mais importante pensar nas formas como o Estado apoia o envelhecimento e a natalidade do que fazer exercícios que podem não ser necessários e podem ser desestabilizadores”, explica António Tavares, porta-voz de Rui Rio para a área social.

“Como garantir que o nosso sistema de pensões tem viabilidade no futuro?” é uma pergunta que vem cavando profundas trincheiras ideológicas entre esquerda e direita, que durante anos se mantiveram divididos no diagnóstico quanto à (in)sustentabilidade da Segurança Social e desconfiados da bondade das fórmulas alheias. Contudo, as posições aparentemente irreconciliáveis entre os partidos estão a evoluir. De tal modo que, nos programas eleitorais para 2019, começam a desenhar-se alguns mínimos denominadores comuns que poderão ditar aproximações a prazo. Um dos pontos de contacto entre o PSD, o PCP e o BE é que a taxa social única (TSU) a cargo de empresas e trabalhadores deixe de incidir apenas sobre as remunerações, e passe a tributar também o valor acrescentado líquido (VAL) das empresas. Ou, dito de forma mais simples, que a Segurança Social não seja financiada quase exclusivamente pelos salários e passe também a onerar os lucros das empresas. A ideia está longe de ser nova (durante anos a CGTP defendeu-a solitariamente na concertação social), mas tem vindo a conquistar adeptos à medida que o fator trabalho perde peso na repartição dos rendimentos e, sobretudo, à medida que começa a temer-se que, com a crescente robotização e digitalização, a base sobre a qual assentam os descontos vá encolhendo, agravando ainda mais os défices projetados do sistema (ver gráficos).

Um estudo feito pelo economista Armindo Silva para uma ala dos patrões, a Confederação do Comércio e Serviços de Portugal (CCP), trouxe argumentos reforçados a esta tese, não sendo por isso de estranhar que uma medida tipicamente defendida pela esquerda mereça agora também apoio do PSD — embora com diferenças. Para comunistas e bloquistas, a taxa sobre o VAL é para acrescer à taxa social única, o que significa que os empregadores seriam chamados a fazer mais descontos. No caso do BE, trata-se de uma taxa de 0,75% que oneraria, “pelo menos numa primeira fase”, apenas as grandes empresas, deixando as pequenas e médias de fora, explica ao Expresso o deputado José Soeiro. Por uma razão simples: “É preciso que os ganhos da inovação tecnológica sejam não só da empresa mas revertam também para os trabalhadores e a sociedade”, diz o candidato pelo BE pelo círculo do Porto. Já os comunistas, que não estiveram disponíveis para falar ao Expresso, defenderam no passado que, chegados ao fim de cada ano, se calcule 10,5% sobre o VAL de cada empresa e que, caso este seja superior aos descontos tradicionais, este valor prevaleça. Rui Rio, concordando com o princípio, quer antes uma formulação muito próxima da já defendida na concertação social pelos empresários do Comércio e Serviços. Concedendo que “no atual contexto de crescente digitalização da economia é necessário e justo que essa riqueza também contribua para a proteção social”, António Tavares, porta-voz do partido para a área social, também salvaguarda que é preciso “manter os níveis de competitividade das empresas”. É por isso que a solução passa por uma recomposição dos descontos, onde a contribuição sobre o VAL seria “deduzida do montante das contribuições pagas sobre a massa salarial”, evitando-se a dupla tributação. De fora deste debate ficam, para já, o CDS/PP e o PS. Os democratas-cristãos comungam com os socialistas um programa muito enxuto na área social porque, diz Adolfo Mesquita Nunes ao Expresso, se optou por apenas incluir as propostas consideradas consensuais. Já o PS não esteve disponível para explicar as suas opções e omissões. Contudo, na última legislatura os socialistas não se mostraram grandes adeptos desta via, argumentando que o objetivo já está a ser conseguido através da consignação de parte da receita do IRC (embora a consignação mais não seja do que um desvio de receita do orçamento geral do Estado). ADEUS PLAFONAMENTO, OLÁ REFORÇO DE DESCONTOS Um segundo grupo de propostas onde há áreas de intersecção, agora entre os partidos de direita e o PS, é o do reforço da poupança para a reforma. No espaço de uma década o desenho do sistema de pensões foi sendo significativamente retocado, de tal modo que, em paralelo com as discussões sobre a sustentabilidade da Segurança Social, cresceu a preocupação com a adequação das pensões. Isto é, começou a discutir-se se, com todas as tesouradas a que foram sujeitas, as pensões que os portugueses terão no futuro lhes garantirão sustento e dignidade. E é neste contexto que tem ganho novo espaço no debate público a necessidade de reforçar o chamado segundo pilar da Segurança Social. No seu programa eleitoral, o CDS/PP começa por propor que todos os anos os cidadãos sejam informados sobre a pensão a que, em cada momento, têm direito. Espera-se que a transparência, aliada a uma maior consciência sobre a queda de rendimento que os espera no futuro, crie espaço para o que apelidam “suplementos para a reforma”. Inspirada nos modelos alemão e britânico, a ideia é que, quando assina um contrato, o trabalhador passe automaticamente a fazer um desconto adicional de 1% (ou mais) sobre o seu salário. Esse desconto é canalizado para uma conta individual e, embora seja facultativo e possa cessar em qualquer momento, acredita-se que o automatismo criará um ambiente mais convidativo ao reforço da poupança. O mesmo se aplica às empresas: embora não sejam obrigadas a gastar mais dinheiro com a proteção social dos empregados, teriam fortes incentivos fiscais e de contexto para passarem a fazê-lo. Para evitar que o debate se veja contaminado com as acusações habituais de que pretende entregar o dinheiro das reformas a fundos privados, o CDS/PP propõe que o sistema de capitalização seja gerido por entidades públicas. O objetivo é também defendido pelo PSD, mas por um caminho diferente: que, de futuro, as negociações salariais passem a incorporar uma parte de aumentos salariais e outra parte de complemento de pensão. Traduzido em miúdos: “Em vez de lutarem por um aumento de 5%, os sindicatos e empresas devem passar a negociar aumentos de 2,5% para salários e descontos de 2,5% para um complemento de reforma”, exemplifica António Tavares. Trocar rendimento atual por rendimento futuro é uma mudança radical, tal como é ambicioso querer que as empresas aceitem agravar a sua fatura. Mas António Tavares acredita que é possível. “Se queremos um país com um nível de desenvolvimento europeu, é um caminho que temos de fazer.” Aliás, “as associações empresariais estão a profissionalizar-se e os sindicatos também percebem que não vale a pena olhar só para a reivindicação imediata, mas também a médio e longo prazo”. PSD e CDS não esperam resistências a este tipo de iniciativas — “consensuais”, dizem — e, se o cardápio ficar por aqui, até é provável que se consigam avanços com o PS, que no programa também fala na necessidade de, em sede de negociação coletiva, fomentar este tipo de esquemas. Para já, nenhum partido de direita se aventura por caminhos mais polémicos, deixando de fora dos seus programas alusões ao famoso plafonamento das contribuições, que esteve muito em voga até à crise financeira. Mas isto não quer dizer que não voltem ao debate. Até porque, reconhece Adolfo Mesquita Nunes, coordenador das propostas do CDS/PP “o programa é apenas um primeiro passo e não esgota tudo o que pensamos”. O que acontece é que “a Segurança Social é de tão radical importância que só faz sentido avançar com propostas de reforma quando há consenso”. O resto fica para um debate alargado, se chegar a haver espaço para ele.

Luís Barra

PS não quer mexer nas pensões Depois de ter sido forçado pelos parceiros da ‘geringonça’ a fazer aumentos reais nas pensões e a aliviar penalizações a uma parte das reformas antecipadas, para a próxima legislatura, o plano do PS é ficar quieto. Se conseguirá cingir-se a um roteiro minimalista ou se voltará a ser empurrado para novos alívios depende da conjugação de forças que sair das eleições. Nos últimos anos, de forma paulatina, foram avançando medidas que não só obrigam os portugueses a trabalhar mais tempo como lhes baixam as pensões a que terão direito no futuro. Em vez dos melhores dez dos últimos 15 anos passou a ser considerada no cálculo da pensão toda a carreira contributiva, o que baixa o valor médio e pode ser um perigo especialmente para quem tem carreiras intermitentes. Antecipar a saída do mercado de trabalho vale pesadas penalizações, pela via do chamado fator de sustentabilidade, que todos os anos cresce ao ritmo da esperança média de vida. A idade legal de reforma subiu para os 66 anos e passou a avançar todos os anos indexada à esperança de vida, de tal modo que, hoje, Portugal é dos países mais restritivos nesta área (ver gráfico). É este mosaico de medidas que ajuda a explicar as projeções que amiúde lançam uma onda de pessimismo na opinião pública, ao mostrar que, no futuro, teremos de trabalhar até aos 68 anos de idade (ou mais) para conseguir assegurar uma pensão equivalente a 75% do vencimento. Sair do mercado de trabalho antes do tempo, por vontade própria ou porque se é forçado pelo empregador, significa ver a pensão cair a pique. E é esta trajetória pouco risonha que tanto o BE como o PCP contestam. Nos últimos quatro anos, os dois partidos conseguiram que o Governo acabasse com o corte do fator de sustentabilidade (nos 14,7%) para todos quantos aos 60 anos tenham pelo menos 40 anos de descontos e, apesar de terem arrancado estas cedências a um PS muito relutante, agora querem ir mais longe. O PCP, por exemplo, reclama que a idade legal de reforma volte a ser fixa e regresse aos 65 anos. Depois, tanto comunistas como bloquistas querem que o famoso fator de sustentabilidade, criado em 2007 pelo atual ministro Vieira da Silva, quando também foi titular da pasta, seja revogado, deixando de penalizar quem resolve antecipar a sua reforma. Os dois partidos querem prosseguir a trajetória de aumento real das pensões, como aconteceu nos últimos quatro anos. Os planos são ambiciosos e voltam a colidir com as intenções do PS, mas José Soeiro acredita que isso está longe de os condenar à partida: “Não é grande surpresa o facto de o PS não querer estas medidas.” Mas, tal como aconteceu na legislatura passada, “na próxima legislatura estas medidas dependerão muito mais da força relativa que a esquerda tenha do que da vontade do PS”, diz ao Expresso o deputado do BE. DIREITA ALINHADA COM O PS: PENSÕES NÃO SÃO PARA MEXER Se, porventura, o PS conseguir ir fazendo arranjos com os partidos à sua direita, António Costa, terá, então, aliados para contrariar as pretensões da esquerda. No programa eleitoral, os socialistas só se comprometem a atualizar as pensões de acordo com as regras em vigor (à inflação ou pouco mais) e a avançar com a reforma a tempo parcial, uma promessa que herda da última legislatura. O CDS/PP não tem propostas para esta área, uma ausência também notada no programa do PSD, e que é deliberada: “Numa sociedade em que estamos a envelhecer, é mais importante pensar nas formas como o Estado apoia o envelhecimento e a natalidade do que fazer exercícios que podem não ser necessários e podem ser desestabilizadores”, explica António Tavares, porta-voz de Rui Rio para a área social.

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