Fact Check. O CDS não assinou acordo com o Chega, como disse Francisco Rodrigues dos Santos?

01-01-2021
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A 12 de novembro, e naquela que foi a primeira vez que falou publicamente sobre a solução de governo à direita encontrada nos Açores, Francisco Rodrigues dos Santos foi perentório a afirmar que o CDS não tinha assinado nenhum acordo com o Chega nos Açores — apenas com o PSD e o PPM. “O CDS celebrou um acordo para a formação de governo apenas com o PSD e com o PPM, isto que fique muito claro”, disse numa conferência de imprensa, na sede dos democratas-cristãos em Lisboa. Para o presidente do CDS, o Chega “está de fora, não pertence” à solução de governo que recupera a herança da AD de Sá Carneiro, Freitas do Amaral e Ribeiro Telles, “uma verdadeira aliança democrática”. Mas foi mesmo assim? É só isso que está em causa?

O CDS, de facto, só assinou acordo para a formação de governo com aqueles dois partidos (PSD e PPM). No entanto, o partido também assinou um acordo de incidência parlamentar com o Chega, num documento conjunto onde estavam também PSD e PPM. O único partido que ficou de fora da fotografia foi a Iniciativa Liberal que entendeu assinar um acordo apenas com o PSD (sem CDS, Chega e PPM). O presidente do CDS foi, por isso, enganador nas declarações que fez aos jornalistas.

A história do acordo nos Açores tem de ser contada em três atos diferentes. E a prová-lo estão os três diferentes acordos que foram assinados, em dias diferentes. Primeiro, a 2 de novembro, cinco dias antes de o líder do PSD/Açores ter sido indigitado para formar Governo, é formalizada a chamada coligação da Aliança Democrática: PSD, CDS e PPM assinam um “Acordo Político para um Novo Governo – Um Compromisso com os Açores”, com o horizonte de duas legislaturas, que pode ser lido na íntegra aqui. Foi esse acordo que permitiu à direita chegar-se à frente, no sentido em que passou a ter mais deputados regionais (26) do que o PS (que conseguiu eleger apenas 25). Mas, para a direita conseguir a maioria absoluta de deputados (29), ainda faltavam três.

E é aí que se dá o segundo ato. A 6 de novembro, na véspera de o representante da República indigitar José Manuel Bolieiro para formar Governo, dá-se a ratificação e assinatura de um segundo acordo. Trata-se de um “acordo de incidência parlamentar“, e não de um acordo para a formação de governo, como tinha sido o primeiro, que garante que haverá entre os partidos que o assinam um entendimento para toda a legislatura nos documentos mais importantes — desde a viabilização do programa de Governo, aos planos e orçamentos regionais, passando por eventuais apreciações de moções de confiança ou de censura. Ora, quem assina este acordo regional é PSD, CDS, PPM e Chega. Ou seja, ao contrário do que sugeriu Francisco Rodrigues dos Santos, o CDS deu de facto luz verde ao entendimento com o Chega que dá viabilidade ao novo Governo Regional dos Açores.

Francisco Rodrigues dos Santos tinha afirmado com clareza cristalina que o CDS “apenas” tinha firmado acordo com o PSD e o PPM. E disse mais: “Coube ao PSD conseguir viabilizar parlamentarmente o governo de aliança democrática e, como vimos, isso aconteceu através de uma manobra escapatória que o Chega encontrou para identificar nos programas do PSD medidas com as quais concorda”. Ou seja, Francisco Rodrigues dos Santos quis com isto dizer que o CDS apenas fez uma coligação de governo com os sociais-democratas e os monárquicos e que, o resto — a tarefa de conseguir o apoio dos três deputados que faltavam –, coube apenas ao PSD. Não foi assim. Como se pode ver no acordo — que pode ser consultado na íntegra aqui — o acordo com o Chega é assinado pelos quatro: PSD, CDS, PPM e Chega.

O único partido que ficou de fora desse acordo foi a Iniciativa Liberal (IL). E é aqui que entra o terceiro ato. No dia 7 de novembro, dia em que o representante da República nos Açores terminou a ronda de audições aos partidos e tomou a decisão de indigitar José Manuel Bolieiro para formar governo, dá-se ainda a assinatura do terceiro e último acordo que faltava para a direita conseguir os 29 deputados — a desejada maioria absoluta na Assembleia Legislativa Regional.

Mas esse acordo tem uma particularidade: é apenas assinado pelo IL e pelo PSD. Ou seja, o partido de João Cotrim de Figueiredo (coordenado nos Açores por Nuno Barata), é o único que pode dizer que não assinou nenhum acordo com o Chega nos Açores, porque se recusou a aparecer naquela fotografia de família. Em vez disso, assinou um acordo só com o PSD regional, onde vincula o PSD à ideia de reduzir o peso da máquina do Estado no arquipélago, falando nomeadamente em privatizações (“alienação das participações”) ou mesmo em “extinção de empresas”. Esse acordo, também de incidência parlamentar, pode ser consultado na íntegra aqui.

Nas mesmas declarações, no Largo do Caldas, Francisco Rodrigues dos Santos procurava explicar, por um lado, que o CDS nada tinha a ver com o assunto ‘Chega’, e, por outro, que o PSD não se tinha mexido “um milímetro” para se aproximar do Chega — André Ventura é que se viu numa “encruzilhada” e deu o dito pelo não dito para se aproximar da governação do PSD nos Açores.

Para o líder do CDS, as medidas que o Chega pôs em cima da mesa para a governação dos Açores são “absolutamente inócuas” e “já constavam do programa do PSD”, como é o caso da proposta de redução do número de deputados — medida com a qual o CDS nunca concordou. Pelo caminho, Francisco Rodrigues dos Santos ainda atirou contra as personalidades que, à direita, “preferem os salões do Bairro Alto ou do Príncipe Real”, em vez de quererem responder a uma “vocação de mudança de uma direita real que existe no nosso país”, saindo aqui em defesa dos votos arrecadados pelo Chega nos Açores e sugerindo que esses eleitores devem ser considerados eleitores de “direita real” e, dessa forma, englobados neste bolo maior com vista a uma maioria de direita nos Açores.

Conclusão

É verdade que o acordo de governação que permitiu ao líder do PSD/Açores ser indigitado para formar Governo foi assinado apenas pelos três velhos partidos da Aliança Democrática: PSD, CDS e PPM. Mas não é verdade que o CDS não tenha assinado um acordo com o Chega nos Açores. Uma coisa é a assinatura de um acordo de governo, outra coisa é a viabilidade para governar. Aquele governo — PSD, CDS e PPM — não tinha maioria para aprovar os documentos essenciais. Seria um governo minoritário. Com vista a essa maioria, o PSD, mas também o CDS e o PPM, assinaram um acordo de incidência parlamentar com o Chega que lhes permitiu garantir o voto a favor de mais dois deputados nos momentos definidores da governação.

Como fica provado pelas assinaturas, esse acordo de incidência parlamentar não foi apenas assinado pelo PSD e Chega, como Francisco Rodrigues dos Santos leva a crer, mas também pelo CDS regional e pelo PPM. Só a Iniciativa Liberal ficou de fora, tendo optado por assinar um acordo apenas com o PSD.

Assim, no sistema de classificação do Observador, é:

ENGANADOR

A 12 de novembro, e naquela que foi a primeira vez que falou publicamente sobre a solução de governo à direita encontrada nos Açores, Francisco Rodrigues dos Santos foi perentório a afirmar que o CDS não tinha assinado nenhum acordo com o Chega nos Açores — apenas com o PSD e o PPM. “O CDS celebrou um acordo para a formação de governo apenas com o PSD e com o PPM, isto que fique muito claro”, disse numa conferência de imprensa, na sede dos democratas-cristãos em Lisboa. Para o presidente do CDS, o Chega “está de fora, não pertence” à solução de governo que recupera a herança da AD de Sá Carneiro, Freitas do Amaral e Ribeiro Telles, “uma verdadeira aliança democrática”. Mas foi mesmo assim? É só isso que está em causa?

O CDS, de facto, só assinou acordo para a formação de governo com aqueles dois partidos (PSD e PPM). No entanto, o partido também assinou um acordo de incidência parlamentar com o Chega, num documento conjunto onde estavam também PSD e PPM. O único partido que ficou de fora da fotografia foi a Iniciativa Liberal que entendeu assinar um acordo apenas com o PSD (sem CDS, Chega e PPM). O presidente do CDS foi, por isso, enganador nas declarações que fez aos jornalistas.

A história do acordo nos Açores tem de ser contada em três atos diferentes. E a prová-lo estão os três diferentes acordos que foram assinados, em dias diferentes. Primeiro, a 2 de novembro, cinco dias antes de o líder do PSD/Açores ter sido indigitado para formar Governo, é formalizada a chamada coligação da Aliança Democrática: PSD, CDS e PPM assinam um “Acordo Político para um Novo Governo – Um Compromisso com os Açores”, com o horizonte de duas legislaturas, que pode ser lido na íntegra aqui. Foi esse acordo que permitiu à direita chegar-se à frente, no sentido em que passou a ter mais deputados regionais (26) do que o PS (que conseguiu eleger apenas 25). Mas, para a direita conseguir a maioria absoluta de deputados (29), ainda faltavam três.

E é aí que se dá o segundo ato. A 6 de novembro, na véspera de o representante da República indigitar José Manuel Bolieiro para formar Governo, dá-se a ratificação e assinatura de um segundo acordo. Trata-se de um “acordo de incidência parlamentar“, e não de um acordo para a formação de governo, como tinha sido o primeiro, que garante que haverá entre os partidos que o assinam um entendimento para toda a legislatura nos documentos mais importantes — desde a viabilização do programa de Governo, aos planos e orçamentos regionais, passando por eventuais apreciações de moções de confiança ou de censura. Ora, quem assina este acordo regional é PSD, CDS, PPM e Chega. Ou seja, ao contrário do que sugeriu Francisco Rodrigues dos Santos, o CDS deu de facto luz verde ao entendimento com o Chega que dá viabilidade ao novo Governo Regional dos Açores.

Francisco Rodrigues dos Santos tinha afirmado com clareza cristalina que o CDS “apenas” tinha firmado acordo com o PSD e o PPM. E disse mais: “Coube ao PSD conseguir viabilizar parlamentarmente o governo de aliança democrática e, como vimos, isso aconteceu através de uma manobra escapatória que o Chega encontrou para identificar nos programas do PSD medidas com as quais concorda”. Ou seja, Francisco Rodrigues dos Santos quis com isto dizer que o CDS apenas fez uma coligação de governo com os sociais-democratas e os monárquicos e que, o resto — a tarefa de conseguir o apoio dos três deputados que faltavam –, coube apenas ao PSD. Não foi assim. Como se pode ver no acordo — que pode ser consultado na íntegra aqui — o acordo com o Chega é assinado pelos quatro: PSD, CDS, PPM e Chega.

O único partido que ficou de fora desse acordo foi a Iniciativa Liberal (IL). E é aqui que entra o terceiro ato. No dia 7 de novembro, dia em que o representante da República nos Açores terminou a ronda de audições aos partidos e tomou a decisão de indigitar José Manuel Bolieiro para formar governo, dá-se ainda a assinatura do terceiro e último acordo que faltava para a direita conseguir os 29 deputados — a desejada maioria absoluta na Assembleia Legislativa Regional.

Mas esse acordo tem uma particularidade: é apenas assinado pelo IL e pelo PSD. Ou seja, o partido de João Cotrim de Figueiredo (coordenado nos Açores por Nuno Barata), é o único que pode dizer que não assinou nenhum acordo com o Chega nos Açores, porque se recusou a aparecer naquela fotografia de família. Em vez disso, assinou um acordo só com o PSD regional, onde vincula o PSD à ideia de reduzir o peso da máquina do Estado no arquipélago, falando nomeadamente em privatizações (“alienação das participações”) ou mesmo em “extinção de empresas”. Esse acordo, também de incidência parlamentar, pode ser consultado na íntegra aqui.

Nas mesmas declarações, no Largo do Caldas, Francisco Rodrigues dos Santos procurava explicar, por um lado, que o CDS nada tinha a ver com o assunto ‘Chega’, e, por outro, que o PSD não se tinha mexido “um milímetro” para se aproximar do Chega — André Ventura é que se viu numa “encruzilhada” e deu o dito pelo não dito para se aproximar da governação do PSD nos Açores.

Para o líder do CDS, as medidas que o Chega pôs em cima da mesa para a governação dos Açores são “absolutamente inócuas” e “já constavam do programa do PSD”, como é o caso da proposta de redução do número de deputados — medida com a qual o CDS nunca concordou. Pelo caminho, Francisco Rodrigues dos Santos ainda atirou contra as personalidades que, à direita, “preferem os salões do Bairro Alto ou do Príncipe Real”, em vez de quererem responder a uma “vocação de mudança de uma direita real que existe no nosso país”, saindo aqui em defesa dos votos arrecadados pelo Chega nos Açores e sugerindo que esses eleitores devem ser considerados eleitores de “direita real” e, dessa forma, englobados neste bolo maior com vista a uma maioria de direita nos Açores.

Conclusão

É verdade que o acordo de governação que permitiu ao líder do PSD/Açores ser indigitado para formar Governo foi assinado apenas pelos três velhos partidos da Aliança Democrática: PSD, CDS e PPM. Mas não é verdade que o CDS não tenha assinado um acordo com o Chega nos Açores. Uma coisa é a assinatura de um acordo de governo, outra coisa é a viabilidade para governar. Aquele governo — PSD, CDS e PPM — não tinha maioria para aprovar os documentos essenciais. Seria um governo minoritário. Com vista a essa maioria, o PSD, mas também o CDS e o PPM, assinaram um acordo de incidência parlamentar com o Chega que lhes permitiu garantir o voto a favor de mais dois deputados nos momentos definidores da governação.

Como fica provado pelas assinaturas, esse acordo de incidência parlamentar não foi apenas assinado pelo PSD e Chega, como Francisco Rodrigues dos Santos leva a crer, mas também pelo CDS regional e pelo PPM. Só a Iniciativa Liberal ficou de fora, tendo optado por assinar um acordo apenas com o PSD.

Assim, no sistema de classificação do Observador, é:

ENGANADOR

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