Teletrabalho: “Não vamos poder esperar 2, 3, 4 anos para avançar numa regulação equilibrada”

01-01-2021
marcar artigo

É necessário acompanhar e regular dois dos fenómenos que mais se evidenciaram nas relações laborais nos meses de pandemia – o teletrabalho e as plataformas digitais de entregas e prestação de outros serviços –, sob pena de agravar o dualismo existente no mercado de trabalho em matéria de vínculos e formação, enfraquecer as economias urbanas e descaraterizar a vida em sociedade. O alerta foi deixado esta terça-feira pelos participantes da segunda mesa redonda realizada no âmbito da iniciativa “O Futuro do Trabalho”, promovida pela EXAME, onde se sublinhou ainda a importância da formação ao longo da vida profissional e o impacto da digitalização.

“Temos de conseguir criar as condições para evitar que estes dualismos, que nalguns casos vinham sendo esbatidos, se venham a exacerbar,” instou o secretário de Estado Adjunto do Trabalho e da Formação Profissional. Miguel Cabrita, um dos oradores do painel “Para onde vai o emprego”, salientou riscos e oportunidades do trabalho remoto, com a melhor conciliação entre emprego e vida familiar a opor-se à diluição dos tempos de trabalho e descanso, e sublinhou que será necessário agir em breve.

“Termos tido teletrabalho durante três ou seis meses não nos dá ideia das suas consequências a longo prazo. Mas não vamos poder esperar dois, três, quatro anos para discutir e tentar avançar numa regulação equilibrada,” acrescentou o responsável, na véspera de voltar a tornar-se obrigatório, sempre que possível, o trabalho a partir de casa para a população em 121 concelhos, como anunciado pelo Governo no âmbito do combate à segunda vaga da pandemia.

É inescapável regular melhor as plataformas. E é melhor, como País, que o façamos de forma regulada, planeada e discutida como fizemos com os TVDE Miguel Cabrita, secretário de Estado Adjunto do Trabalho e da Formação Profissional

Já antes o vice-presidente da CIP tinha avisado para o risco de o teletrabalho fazer regressar discriminações como as que no passado diferenciavam empregados e trabalhadores. “Há as pessoas que podem [trabalhar remotamente] e aquelas para quem isso é impossível. Cria uma sensação de diferenciação, de criação artificial de dois tipos de classes,” argumentou Rafael Campos Pereira. Para as empresas e trabalhadores dificulta a integração de talentos, o espírito de equipa, o trabalho em grupo e o cumprimento dos tempos de descanso; nas economias locais tira gente das ruas e arrisca asfixiar o pequeno comércio local “que depende da deslocação para os locais de trabalho,” exemplificou.

Há as pessoas que podem [trabalhar remotamente] e aquelas para quem isso é impossível. Cria uma sensação de diferenciação, de criação artificial de dois tipos de classes Rafael Campos Pereira, CIP

Outra frente que o Governo também já se mostrou disponível para regular é o das relações laborais no âmbito das plataformas digitais de entregas, reforçando os direitos e a proteção dos trabalhadores que usam estas ferramentas digitais da gig economy – o Expresso noticiou recentemente que o tema será levado este mês à concertação social. “É inescapável regular melhor as plataformas,” admitiu Miguel Cabrita. “E é melhor, como País, que o façamos de forma regulada, planeada e discutida como fizemos com os TVDE [plataformas eletrónicas de transporte, como a Uber]. Era preferível que tivéssemos um debate estruturado à procura do equilíbrio que resulte num reforço dos direitos dos trabalhadores,” insistiu o secretário de Estado.

Para o presidente do Turismo de Portugal, a crescente visibilidade destas soluções tecnológicas numa altura em que a pandemia desaconselha deslocações e contactos físicos resulta da “adaptação das plataformas ao que são as necessidades do mercado”. Na mesa redonda moderada por Nuno Aguiar, jornalista da EXAME, Luís Araújo destacou que 22% dos que trabalham no setor turístico fazem-no por conta própria e muitos dos que trabalham em plataformas como a Uber têm também empresas de animação turística.

O responsável salientou que o turismo, um dos setores que mais reforçaram o seu peso na economia na última década (apesar de a pandemia ter feito regredir o nível das receitas para 2010), cresceu também na medida do surgimento das empresas. “Há 10 anos tínhamos 6.000 de alojamento local e agora 89 mil; 800 empresas de animação turística e agora 9122; agências de viagens eram 600 e são agora mais de 2500,” enunciou, para ilustrar a capacidade de empreendedorismo e inovação do setor. Um cenário que também encerra incertezas: “Muitos trabalhadores por conta de outrem criaram a sua própria empresa [no turismo], o que é um grande desafio para os próximos anos,” admitiu.

Luís Araújo defendeu também o papel da formação num setor em que 60% dos trabalhadores tinham, em 2016, apenas o ensino básico como qualificação. “Se queremos aumentar a importância do setor temos de focar na formação,” disse, apontando as mais de 64 mil pessoas que, nos meses de pandemia, acederam a ensino online ministrado pela rede de escolas do Turismo de Portugal.

Muitos trabalhadores por conta de outrem criaram a sua própria empresa [no turismo], o que é um grande desafio para os próximos anos luís araújo, turismo de portugal

“Houve uma evolução substancial na forma como a formação é encarada. Nem nos lembramos do tempo em que a formação era encarada como um custo. Hoje é um investimento prioritário e está associado à necessidade de requalificação de muitos trabalhadores,” afirmou Rafael Campos Pereira. Para o vice-presidente da CIP, o acesso a conhecimento é a melhor forma de resolver os gaps entre gerações com níveis de competências e escolaridade muito diferentes e trabalhadores de segmentos com diferentes níveis de regulação.

Já Miguel Cabrita recusou a ideia de que a perspetiva de carreira, evolução ao longo de vários anos num mesmo domínio ou emprego, terminou. “Não é bom nem verdade, nem para as pessoas nem para as empresas, que precisam de pessoas com uma curva de aprendizagem,” disse o secretário de Estado. “Os modelos de negócio de pessoas que circulam de um emprego para outros criam um risco de polarização e de erosão das profissões e direitos associados a trabalhos menos qualificados,” concretizou.

Esta foi a segunda mesa redonda de uma série de debates e reflexões que se realizam esta semana, entre segunda e sexta-feira, 6 de novembro, no âmbito do evento “O Futuro do Trabalho.”

Os painéis, que se desenvolvem todos os dias às 11:00 e em alguns dias também às 12:00, podem ser consultados na imagem em baixo, tal como os protagonistas.

É necessário acompanhar e regular dois dos fenómenos que mais se evidenciaram nas relações laborais nos meses de pandemia – o teletrabalho e as plataformas digitais de entregas e prestação de outros serviços –, sob pena de agravar o dualismo existente no mercado de trabalho em matéria de vínculos e formação, enfraquecer as economias urbanas e descaraterizar a vida em sociedade. O alerta foi deixado esta terça-feira pelos participantes da segunda mesa redonda realizada no âmbito da iniciativa “O Futuro do Trabalho”, promovida pela EXAME, onde se sublinhou ainda a importância da formação ao longo da vida profissional e o impacto da digitalização.

“Temos de conseguir criar as condições para evitar que estes dualismos, que nalguns casos vinham sendo esbatidos, se venham a exacerbar,” instou o secretário de Estado Adjunto do Trabalho e da Formação Profissional. Miguel Cabrita, um dos oradores do painel “Para onde vai o emprego”, salientou riscos e oportunidades do trabalho remoto, com a melhor conciliação entre emprego e vida familiar a opor-se à diluição dos tempos de trabalho e descanso, e sublinhou que será necessário agir em breve.

“Termos tido teletrabalho durante três ou seis meses não nos dá ideia das suas consequências a longo prazo. Mas não vamos poder esperar dois, três, quatro anos para discutir e tentar avançar numa regulação equilibrada,” acrescentou o responsável, na véspera de voltar a tornar-se obrigatório, sempre que possível, o trabalho a partir de casa para a população em 121 concelhos, como anunciado pelo Governo no âmbito do combate à segunda vaga da pandemia.

É inescapável regular melhor as plataformas. E é melhor, como País, que o façamos de forma regulada, planeada e discutida como fizemos com os TVDE Miguel Cabrita, secretário de Estado Adjunto do Trabalho e da Formação Profissional

Já antes o vice-presidente da CIP tinha avisado para o risco de o teletrabalho fazer regressar discriminações como as que no passado diferenciavam empregados e trabalhadores. “Há as pessoas que podem [trabalhar remotamente] e aquelas para quem isso é impossível. Cria uma sensação de diferenciação, de criação artificial de dois tipos de classes,” argumentou Rafael Campos Pereira. Para as empresas e trabalhadores dificulta a integração de talentos, o espírito de equipa, o trabalho em grupo e o cumprimento dos tempos de descanso; nas economias locais tira gente das ruas e arrisca asfixiar o pequeno comércio local “que depende da deslocação para os locais de trabalho,” exemplificou.

Há as pessoas que podem [trabalhar remotamente] e aquelas para quem isso é impossível. Cria uma sensação de diferenciação, de criação artificial de dois tipos de classes Rafael Campos Pereira, CIP

Outra frente que o Governo também já se mostrou disponível para regular é o das relações laborais no âmbito das plataformas digitais de entregas, reforçando os direitos e a proteção dos trabalhadores que usam estas ferramentas digitais da gig economy – o Expresso noticiou recentemente que o tema será levado este mês à concertação social. “É inescapável regular melhor as plataformas,” admitiu Miguel Cabrita. “E é melhor, como País, que o façamos de forma regulada, planeada e discutida como fizemos com os TVDE [plataformas eletrónicas de transporte, como a Uber]. Era preferível que tivéssemos um debate estruturado à procura do equilíbrio que resulte num reforço dos direitos dos trabalhadores,” insistiu o secretário de Estado.

Para o presidente do Turismo de Portugal, a crescente visibilidade destas soluções tecnológicas numa altura em que a pandemia desaconselha deslocações e contactos físicos resulta da “adaptação das plataformas ao que são as necessidades do mercado”. Na mesa redonda moderada por Nuno Aguiar, jornalista da EXAME, Luís Araújo destacou que 22% dos que trabalham no setor turístico fazem-no por conta própria e muitos dos que trabalham em plataformas como a Uber têm também empresas de animação turística.

O responsável salientou que o turismo, um dos setores que mais reforçaram o seu peso na economia na última década (apesar de a pandemia ter feito regredir o nível das receitas para 2010), cresceu também na medida do surgimento das empresas. “Há 10 anos tínhamos 6.000 de alojamento local e agora 89 mil; 800 empresas de animação turística e agora 9122; agências de viagens eram 600 e são agora mais de 2500,” enunciou, para ilustrar a capacidade de empreendedorismo e inovação do setor. Um cenário que também encerra incertezas: “Muitos trabalhadores por conta de outrem criaram a sua própria empresa [no turismo], o que é um grande desafio para os próximos anos,” admitiu.

Luís Araújo defendeu também o papel da formação num setor em que 60% dos trabalhadores tinham, em 2016, apenas o ensino básico como qualificação. “Se queremos aumentar a importância do setor temos de focar na formação,” disse, apontando as mais de 64 mil pessoas que, nos meses de pandemia, acederam a ensino online ministrado pela rede de escolas do Turismo de Portugal.

Muitos trabalhadores por conta de outrem criaram a sua própria empresa [no turismo], o que é um grande desafio para os próximos anos luís araújo, turismo de portugal

“Houve uma evolução substancial na forma como a formação é encarada. Nem nos lembramos do tempo em que a formação era encarada como um custo. Hoje é um investimento prioritário e está associado à necessidade de requalificação de muitos trabalhadores,” afirmou Rafael Campos Pereira. Para o vice-presidente da CIP, o acesso a conhecimento é a melhor forma de resolver os gaps entre gerações com níveis de competências e escolaridade muito diferentes e trabalhadores de segmentos com diferentes níveis de regulação.

Já Miguel Cabrita recusou a ideia de que a perspetiva de carreira, evolução ao longo de vários anos num mesmo domínio ou emprego, terminou. “Não é bom nem verdade, nem para as pessoas nem para as empresas, que precisam de pessoas com uma curva de aprendizagem,” disse o secretário de Estado. “Os modelos de negócio de pessoas que circulam de um emprego para outros criam um risco de polarização e de erosão das profissões e direitos associados a trabalhos menos qualificados,” concretizou.

Esta foi a segunda mesa redonda de uma série de debates e reflexões que se realizam esta semana, entre segunda e sexta-feira, 6 de novembro, no âmbito do evento “O Futuro do Trabalho.”

Os painéis, que se desenvolvem todos os dias às 11:00 e em alguns dias também às 12:00, podem ser consultados na imagem em baixo, tal como os protagonistas.

marcar artigo