Fact Check. Não foram registadas mortes por pneumonia e gripe em Portugal em 2020?

01-01-2021
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Está a ser partilhada no Facebook uma imagem que refere que, em 2020, ninguém terá morrido com pneumonia ou gripe em Portugal. Pelo contrário, no ano passado, quando ainda não tinha surgido o novo coronavírus, vários milhares de pessoas terão sido vítimas destes dois problemas de saúde, alega esta mesma publicação. Esta informação não está correta, como veremos de seguida.

Os dados referidos na imagem terão sido retirados dos jornais Público e Correio da Manhã e da Direção-Geral da Saúde (DGS). São estas as fontes citadas pelo post. Relativamente aos dados com origem na DGS, estes só poderão dizer respeito ao novo coronavírus, uma vez que este organismo não fornece informações sobre a mortalidade associada à gripe ou pneumonia referentes a 2020. Em relação aos dois jornais, uma pesquisa nos respetivos sites permite concluir que, este ano, estes não publicaram nenhuma notícia que dissesse não ter havido mortes por pneumonia e gripe em Portugal.

Antes pelo contrário: logo em janeiro, uma notícia da Agência Lusa sobre o mais recente relatório do Observatório Nacional das Doenças Respiratórias (ONDR), publicada no Público, Correio da Manhã e noutros órgãos de comunicação, como o Observador, informava que a pneumonia comum matava, em média, pelo menos 16 pessoas todos os dias. Um número que coloca Portugal entre os países europeus onde mais se morre de pneumonia. As doenças respiratórias são, aliás, a terceira causa de morte entre os portugueses desde 2015, sendo responsáveis por 19% dos óbitos ocorridos todos os anos.

A notícia da Lusa fornecia também informações sobre as mortes por gripe no país. Segundo os dados do Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge (INSA), recolhidos pela agência de notícias, na época gripal de 2018/2019, morreram em Portugal cerca de três mil pessoas. Mais concretamente, houve 3.331 óbitos atribuíveis à epidemia da gripe durante este período, de acordo com o relatório do Programa Nacional de Vigilância da Gripe do INSA.

Relativamente à época gripal de 2019/2020, ainda não existem dados. Do mesmo modo, ainda não se sabem quais as causas de morte em Portugal no decorrer deste ano, com exceção dos óbitos por Covid-19, que todos os dias são atualizados pela DGS. O mais recente relatório do Instituto Nacional de Estatística (INE) sobre a mortalidade em Portugal no contexto da pandemia Covid-19, datado de 30 de outubro, também não especifica as razões das mortes registadas ao longo de 2020, referindo apenas aquelas que se deveram ao novo coronavírus (2.198, até 18 de outubro) e repetindo a ideia, já expressa noutras comunicações, de que houve um aumento do número total de mortes em relação aos cinco anos anteriores — “uma das consequências mais dramáticas dos efeitos da pandemia”.

De acordo com o INE, entre 2 de março, data em que foram diagnosticados os primeiros casos de Covid-19, e 18 de outubro, houve mais 7.936 óbitos do que a média, em período homólogo, dos últimos cinco anos. Até que ponto o novo coronavírus foi principal a causa deste excesso de mortalidade só se saberá mais à frente no tempo, provavelmente em 2021, quando as causas de morte forem analisadas.

É isso que Graça Freitas tem repetido quando confrontada com estes números na habitual conferência de imprensa sobre a situação epidemiológica em Portugal. Foi isso que disse, por exemplo, a 2 de novembro (“Certezas só se terão para o próximo ano”), ou antes disso, a 11 de setembro (“Quando acabarmos de codificar o ano de 2019, vamos começar o atual ano, 2020”). Em ambas ocasiões, a diretora-Geral da Saúde explicou que o processo de codificação das causas de morte é complexo e demorado, sendo realizado por uma equipa especializada do INE, de acordo com normas internacionais. “Exige formação específica e a utilização de uma classificação internacional complexa. Não é qualquer pessoa, são pessoas especialmente treinadas para fazer codificação das causas de morte”, afirmou a 11 de setembro, de acordo com a Renascença. Já esta semana, lembrou que é normal haver “uma demora” e que esta acontece em todos os países europeus.

Apesar de não existirem ainda números para a gripe, tudo indica que, antes de terem sido detetados os primeiros casos de Covid-19 em Portugal, terá existido um pico de óbitos relacionado com a época gripal. Numa peça do jornal Público, na qual se procurou explicar o acréscimo da mortalidade em relação à média dos últimos cinco anos, aponta-se que, na segunda e quinta semanas, que correspondem aos dias 6 a 12 de janeiro e 27 a 7 de fevereiro, houve um excesso de mortalidade que é sobreponível, em parte, com o período epidémico gripal.

Estes dados, referidos pela ministra da Saúde, Marta Temido, durante a conferência de imprensa sobre a Covid-19 de 18 de setembro, são corroborados pelos boletins de Vigilância Epidemiológica da Gripe, que são emitidos semanalmente pelo INSA. Apesar de não especificarem as mortes por gripe, colocam lado a lado a evolução semanal do número de óbitos por todas as causas (obtido através do Sistema de Vigilância Diária da Mortalidade, o Instituto dos Registos e Notariado e o Instituto de Gestão Financeira e Equipamentos da Justiça) e a taxa de incidência semanal provisória da gripe, permitindo fazer uma comparação.

No relatório relativo à segunda semana do ano — em que houve uma taxa de incidência de síndroma gripal de 44,64 por 100.000 habitantes —, o INSA concluiu que a “mortalidade observada” mantinha “valores de acordo com o esperado, embora com tendência crescente na maioria das regiões de Portugal Continental”. Na quinta semana — em que a taxa de incidência da gripe foi de 15,04 por 100.000 habitantes —, a mortalidade foi considerada dentro do expectável.

Conclusão

A informação divulgada no Facebook é enganadora, pois ainda não existem dados relativos às mortes por gripe ou pneumonia em Portugal em 2020. Assim, não é ainda possível compará-las aos óbitos por Covid-19 registados. As causas de morte em 2020 só se saberão, muito provavelmente, em 2021, quando estas foram codificadas por uma equipa especializada do INE. Mas tudo indica que, tal como nos anos anteriores, terão também sido registados óbitos devido à gripe nos primeiros dois meses do ano. Em relação a pneumonia, sabe-se que, em anos anteriores, morreram em média 16 pessoas por dia e que as doenças respiratórias são a terceira causa de morte em Portugal.

Assim, de acordo com a classificação do Observador, este conteúdo é:

ENGANADOR

Nota: este conteúdo foi selecionado pelo Observador no âmbito de uma parceria de fact-checking com o Facebook.

Está a ser partilhada no Facebook uma imagem que refere que, em 2020, ninguém terá morrido com pneumonia ou gripe em Portugal. Pelo contrário, no ano passado, quando ainda não tinha surgido o novo coronavírus, vários milhares de pessoas terão sido vítimas destes dois problemas de saúde, alega esta mesma publicação. Esta informação não está correta, como veremos de seguida.

Os dados referidos na imagem terão sido retirados dos jornais Público e Correio da Manhã e da Direção-Geral da Saúde (DGS). São estas as fontes citadas pelo post. Relativamente aos dados com origem na DGS, estes só poderão dizer respeito ao novo coronavírus, uma vez que este organismo não fornece informações sobre a mortalidade associada à gripe ou pneumonia referentes a 2020. Em relação aos dois jornais, uma pesquisa nos respetivos sites permite concluir que, este ano, estes não publicaram nenhuma notícia que dissesse não ter havido mortes por pneumonia e gripe em Portugal.

Antes pelo contrário: logo em janeiro, uma notícia da Agência Lusa sobre o mais recente relatório do Observatório Nacional das Doenças Respiratórias (ONDR), publicada no Público, Correio da Manhã e noutros órgãos de comunicação, como o Observador, informava que a pneumonia comum matava, em média, pelo menos 16 pessoas todos os dias. Um número que coloca Portugal entre os países europeus onde mais se morre de pneumonia. As doenças respiratórias são, aliás, a terceira causa de morte entre os portugueses desde 2015, sendo responsáveis por 19% dos óbitos ocorridos todos os anos.

A notícia da Lusa fornecia também informações sobre as mortes por gripe no país. Segundo os dados do Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge (INSA), recolhidos pela agência de notícias, na época gripal de 2018/2019, morreram em Portugal cerca de três mil pessoas. Mais concretamente, houve 3.331 óbitos atribuíveis à epidemia da gripe durante este período, de acordo com o relatório do Programa Nacional de Vigilância da Gripe do INSA.

Relativamente à época gripal de 2019/2020, ainda não existem dados. Do mesmo modo, ainda não se sabem quais as causas de morte em Portugal no decorrer deste ano, com exceção dos óbitos por Covid-19, que todos os dias são atualizados pela DGS. O mais recente relatório do Instituto Nacional de Estatística (INE) sobre a mortalidade em Portugal no contexto da pandemia Covid-19, datado de 30 de outubro, também não especifica as razões das mortes registadas ao longo de 2020, referindo apenas aquelas que se deveram ao novo coronavírus (2.198, até 18 de outubro) e repetindo a ideia, já expressa noutras comunicações, de que houve um aumento do número total de mortes em relação aos cinco anos anteriores — “uma das consequências mais dramáticas dos efeitos da pandemia”.

De acordo com o INE, entre 2 de março, data em que foram diagnosticados os primeiros casos de Covid-19, e 18 de outubro, houve mais 7.936 óbitos do que a média, em período homólogo, dos últimos cinco anos. Até que ponto o novo coronavírus foi principal a causa deste excesso de mortalidade só se saberá mais à frente no tempo, provavelmente em 2021, quando as causas de morte forem analisadas.

É isso que Graça Freitas tem repetido quando confrontada com estes números na habitual conferência de imprensa sobre a situação epidemiológica em Portugal. Foi isso que disse, por exemplo, a 2 de novembro (“Certezas só se terão para o próximo ano”), ou antes disso, a 11 de setembro (“Quando acabarmos de codificar o ano de 2019, vamos começar o atual ano, 2020”). Em ambas ocasiões, a diretora-Geral da Saúde explicou que o processo de codificação das causas de morte é complexo e demorado, sendo realizado por uma equipa especializada do INE, de acordo com normas internacionais. “Exige formação específica e a utilização de uma classificação internacional complexa. Não é qualquer pessoa, são pessoas especialmente treinadas para fazer codificação das causas de morte”, afirmou a 11 de setembro, de acordo com a Renascença. Já esta semana, lembrou que é normal haver “uma demora” e que esta acontece em todos os países europeus.

Apesar de não existirem ainda números para a gripe, tudo indica que, antes de terem sido detetados os primeiros casos de Covid-19 em Portugal, terá existido um pico de óbitos relacionado com a época gripal. Numa peça do jornal Público, na qual se procurou explicar o acréscimo da mortalidade em relação à média dos últimos cinco anos, aponta-se que, na segunda e quinta semanas, que correspondem aos dias 6 a 12 de janeiro e 27 a 7 de fevereiro, houve um excesso de mortalidade que é sobreponível, em parte, com o período epidémico gripal.

Estes dados, referidos pela ministra da Saúde, Marta Temido, durante a conferência de imprensa sobre a Covid-19 de 18 de setembro, são corroborados pelos boletins de Vigilância Epidemiológica da Gripe, que são emitidos semanalmente pelo INSA. Apesar de não especificarem as mortes por gripe, colocam lado a lado a evolução semanal do número de óbitos por todas as causas (obtido através do Sistema de Vigilância Diária da Mortalidade, o Instituto dos Registos e Notariado e o Instituto de Gestão Financeira e Equipamentos da Justiça) e a taxa de incidência semanal provisória da gripe, permitindo fazer uma comparação.

No relatório relativo à segunda semana do ano — em que houve uma taxa de incidência de síndroma gripal de 44,64 por 100.000 habitantes —, o INSA concluiu que a “mortalidade observada” mantinha “valores de acordo com o esperado, embora com tendência crescente na maioria das regiões de Portugal Continental”. Na quinta semana — em que a taxa de incidência da gripe foi de 15,04 por 100.000 habitantes —, a mortalidade foi considerada dentro do expectável.

Conclusão

A informação divulgada no Facebook é enganadora, pois ainda não existem dados relativos às mortes por gripe ou pneumonia em Portugal em 2020. Assim, não é ainda possível compará-las aos óbitos por Covid-19 registados. As causas de morte em 2020 só se saberão, muito provavelmente, em 2021, quando estas foram codificadas por uma equipa especializada do INE. Mas tudo indica que, tal como nos anos anteriores, terão também sido registados óbitos devido à gripe nos primeiros dois meses do ano. Em relação a pneumonia, sabe-se que, em anos anteriores, morreram em média 16 pessoas por dia e que as doenças respiratórias são a terceira causa de morte em Portugal.

Assim, de acordo com a classificação do Observador, este conteúdo é:

ENGANADOR

Nota: este conteúdo foi selecionado pelo Observador no âmbito de uma parceria de fact-checking com o Facebook.

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