Gremlin Literário

09-12-2019
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O Público é uma espécie de esgoto a céu aberto mediático que se faz notar principalmente quando as suiniculturas licenciadas para o utilizar, e destacam-se sempre as suiniculturas António & Pedro Nuno e Catarina & Mariana, fazem descargas. Estranhamos sempre, mas já estamos habituados ao cheiro. Apesar de o Passos Coelho andar relativamente sossegado, decidiram agora fazer-lhe uma descarga, por motivos que só eles saberão, regressando ao velho tema da Lista VIP. A informação que o fisco guarda sobre os contribuintes e a sua vida contributiva é útil, e até imprescindível, para perceber se eles cumprem integralmente as suas obrigações fiscais. Não serve para os funcionários vasculharem os rendimentos e o património dos vizinhos, nem para comissários políticos infiltrados na administração fiscal a poderem distribuir a quem entendam para finalidades de utilização no combate político em que participam. Como foi abundantemente utilizada na última legislatura, em que, nomeadamente, a vida contributiva do então primeiro-ministro Pedro Passos Coelho foi exaustivamente vasculhada e discutida, mesmo no parlamento, por dois dos partidos da oposição, o PS e o BE, o PCP costuma ter mais pudor a fazer oposição por essa via, talvez por ter sido em 1980 o precursor em Portugal da política de casos com o caso da dívida do Sá Carneiro à banca e de ter aprendido então, com o resultado da eleição que se seguiu em que a AD reforçou a maioria absoluta de 1979 por outra ainda mais clara em 1980, que a política de casos entusiasma os convencidos mas não necessariamente o eleitorado e não parece converter ninguém. Como, aliás, se veio a confirmar nas eleições de 2015, em que todo o investimento da oposição nos casos que envolveram o Passos Coelho, em que a mera menção da palavra "Tecnoforma" fazia salivar os cães de Pavlov socialistas e bloquistas convencidos que estavam prestes a capturar caça grossa, não evitou a sua vitória inesperada nas legislativas de 2015. Isto para dizer que, o conceito de Lista VIP é um instrumento valioso para detectar precocemente a consulta, que não seja por motivos processuais legítimos e verificáveis, a dados fiscais de alguns contribuintes específicos que, pelo seu relevo social, económico ou político, são alvo de uma curiosidade acrescida da comunicação social ou de adversários, políticos ou de outras naturezas, com vista à obtenção de vantagens que lhes possam advir do conhecimento desses dados; que eu próprio gostaria de fazer parte de uma qualquer Lista VIP que fizesse desencadear um alarme se algum hipotético vizinho meu funcionário do fisco que não simpatizasse comigo aproveitasse a possibilidade de acesso às bases de dados do fisco para vasculhar os meus impostos; mas que tenho a noção que se toda a gente, com grande ou com quase nula probabilidade de suscitar o interesse não profissional dos funcionários do fisco, fizesse parte da Lista VIP ela se tornaria inoperativa pelo excesso de alarmes, pelo que a sua existência é tanto mais útil quanto mais reduzida for a lista de contribuintes que suscitem esse interesse, mesmo que seja tão proibido vasculhar os meus dados como vasculhar os do presidente ou os de algum contribuinte que faça parte de alguma Lista VIP; e que os grandes detratores da Lista VIP não são os contribuintes alvo da desigualdade de não fazerem parte dela, nem os funcionários que deixam de poder preencher os seus tempos livres bisbilhotando o cadastro fiscal dos famosos, mas os comissários políticos que, devido à fiscalização acrescida que ela proporciona, se vêem impedidos de vasculhar os dados dos contribuintes integrados nela para os divulgar a quem entendam. Posto isto, o jornalismo de combate do Público regressou, pois, à Lista VIP, e esta vez ilustrada com histórias específicas, que depois de ler a notícia, apesar de extensa, se resumem a uma história. E qual é a melhor história que o Público encontrou para ilustrar o acesso não autorizado a dados de contribuintes detectado pelo sistema de alarmes da Lista VIP? Uma consulta ao IMI do Cavaco Silva por um costista funcionário do fisco para publicação no Público? Uma devassa de um sindicalista bloquista ao IRS do Passos Coelho para passar a informação ao grupo parlamentar do BE para entalar o primeiro-ministro no hemiciclo? Nada disso! Uma funcionária das finanças da Amadora, onde o Passos Coelho morou antes de se mudar para Massamá, e amiga pessoal dele, a quem ele telefonou para lhe pedir uma informação sobre a sua própria declaração de IRS, que ela consultou para lhe responder pelo telefone. O resto da notícia é uma misturada confusa e extensa de factos e relatos do que foi sendo explicado por inúmeros participantes sobre a origem, desenvolvimento e existência ou inexistência da Lista VIP, a quem a comunicação social e a política deram uma vida mais importante do que a devassa do sigilo fiscal dos contribuintes para finalidades de combate político. De uma penada, esta feliz ilustração do Público mata vários Coelhos. A Lista VIP destinava-se a impedir o acesso dos inimigos do Passos Coelho às suas informações fiscais dele para beneficiar politicamente os mandantes deles, mas afinal apanhou uma amiga dele a aceder aos dados dele a pedido dele, isentando de qualquer malfeitoria os adversários políticos que pretendia fiscalizar. Esta história é complicada demais para o leitor típico do Público, o consumidor mais típico da moderna verdade a que temos direito, a perceber, mas se é denunciada no Público, é sobre o Passos Coelho, e aparece misturada com a Lista VIP, malfeitoria destinada a esconder as infracções fiscais dos poderosos, significa certamente que o Passos Coelho fez alguma aldrabice conjuntamente com uma amiga que tinha na administração fiscal. É, portanto, uma boa descarga das suiniculturas que recorrem ao Público para se aliviarem delas. Contém frases como "Em pleno caso Tecnoforma, Passos ligou a uma funcionária do fisco sua amiga por causa do IRS. O acesso foi apanhado no alarme VIP e aparece no inquérito arquivado pelo Ministério Público. NIF de Paulo Núncio foi acrescentado à lista mas a razão é um mistério." cheias de palavras-chave como "Tecnoforma", "arquivado", ou "mistério", que exalam o mau-cheiro característico das descargas que elas têm sempre esperança de fazer colar aos visados. O motivo de as fazerem agora, consumindo matéria fecal que poderiam guardar para um dia mais tarde em que fosse mais necessária, não é claro? Tal como não é fácil perceber porque não aprendem com as experiências passadas, em que as descargas em que depositaram tantas esperanças afinal não conseguiram garantir-lhes o que ambicionavam, vitórias nas eleições, e continuam a fazê-las? Rotina? Instinto? Não se sabe. A verdade é que continuam a fazê-las regularmente. E que o Público é uma espécie de esgoto a céu aberto mediático que se faz notar principalmente quando as suiniculturas licenciadas para o utilizar, e destacam-se sempre as suiniculturas António & Pedro Nuno e Catarina & Mariana, fazem descargas, e que as estranhamos sempre mas já estamos habituados ao cheiro.

link do post | comentar publicado por Manuel Vilarinho Pires às 20:05

Antes de a esquerda, de toda a esquerda da moderada socialista à radical trotskista, incluindo os desertores do MES entretanto transferidos para partidos mainstream onde deixaram de combater a social-democracia para abraçar o conforto da proximidade do poder, se ter recentemente proclamado como a genuína herdeira política do Sá Carneiro e da social-democracia, montou-lhe a primeira grande campanha de assassinato de carácter da democracia portuguesa, orquestrada pel' O Diário, o jornal oficioso do PCP nessa época, ecoada por toda a imprensa, e multiplicada por milhares de paredes pintadas a exortá-lo "Sá, paga o que deves!", repescando um negócio que tinha corrido mal meia dúzia de anos antes. A campanha teve um impacto mediático estrondoso, tendo em conta a velocidade e débito a que a informação circulava nessa época em que não havia internet nem redes sociais. E tinha todos os ingredientes para resultar. Baseava-se num arrazoado de factos confusos e difíceis de relacionar e compreender claramente, e ainda mais difíceis de desmontar e refutar a conclusão proposta, que por isso impeliam os leitores, para não falar nos transeuntes que apenas liam os graffiti nas paredes, a formar as suas convicções, se acreditavam que os factos comprovavam um crime ou uma insinuação torpe?, através da sua preferência individual em acreditar ou não que o Sá Carneiro era um caloteiro. E assim foi. Quem achava que ele era o coveiro dos valores de Abril acreditou que era também caloteiro, quem depositava nele a esperança de erradicar os delírios revolucionários e finamente começar a construir uma democracia moderna que fizesse Portugal progredir acreditou que era inocente. Tinha todos os ingredientes para resultar, mas infelizmente não resultou. O Sá Carneiro foi re-eleito poucos meses depois com uma maioria absoluta ainda mais ampla do que a que tinha conquistado no ano anterior, e o seu ímpeto reformista só foi travado com o assassinato à bomba pouco depois destas segundas eleições. Foi o início de uma política de casos que tem perdurado durante décadas e não perece mostrar nenhuma tendência para esmorecer no seu ímpeto. Nestes anos todos a esquerda aprendeu a usurpar-lhe a identidade ideológica, mas de resto não aprendeu mais nada, e continua a repetir o que sempre fez, a fazer política através de sucessões de casos que procuram distrair os eleitores dos sucessos ou falências da governação do país para a difamação dos adversários políticos através da insinuação da prática de crimes em casos sustentados na revelação de factos de significado confuso sobre temáticas complexas e inacessíveis, às vezes até a cidadãos bem informados, onde é difícil perceber claramente se podem indiciar crimes ou não, e por isso impossíveis de desmontar e refutar as conclusões propostas pelos denunciantes. E sempre com resultados semelhantes. Perfeitamente ilustrada no caso montado para atacar a anterior ministra das finanças por estar a tentar resolver discretamente uns contratos de swap ruinosos celebrados ao longo da legislatura anterior, por ordem do governo socialista anterior, e com o objectivo de maquilhar as contas públicas, o mesmo partido que montou a campanha para a atacar. Sendo um assunto tecnicamente complexo que quase ninguém percebe, prestou-se perfeitamente a simplificações analíticas do tipo swap = vigarice e ministra que tem o problema dos swaps nas mãos = vigarista que deram a muita gente a fezada que a ministra era mesmo vigarista e um alvo fácil nas eleições. E mais uma vez com o resultado habitual: o partida da ministra veio a ganhar as eleições, ao contrário de todas as expectativas, incluindo as das sondagens. Agora que está determinado que o caso Lista VIP, tal como a generalidade dos múltiplos casos lançados à opinião pública maioritariamente pelo BE, na legislatura anterior, e pelo governo, nesta, foi um aborto jurídico, que tinha sido um aborto político já se tinha provado nas eleições realizadas poucos meses depois, vale a pena, mais do que rever tudo o que se disse e quem o disse na altura, subir pelo rio acima à procura da nascente do caso. E com quem se tinha reunido o então candidato socialista a primeiro-ministro exactamente um mês antes de o caso Lista VIP ser denunciado com estrondo? Com o presidente do Sindicato dos Trabalhadores dos Impostos, o incontornável bloquista Paulo Ralha que tem colaborado diligentemente em quase todos os casos lançados ao país desde que o António Costa passou a chefiar o PS. Uma mera coincidência, certamente...

Procurei no site da Comissão Nacional de Protecção de Dados mas não encontrei o Relatório de que toda a gente fala. Também só procurei por descargo de consciência - serviços públicos com sites que sirvam para mais alguma coisa do que para os dirigentes poderem falar com orgulho das novas tecnologias, da economia do conhecimento, da agilização de processos e da transparência da administração são mais difíceis de encontrar do que petróleo de xisto no Terreiro do Paço. Posteriormente, tropecei neste post e lá encontrei o link - há quem saiba procurar melhor do que eu, benza-a Deus, mas não me venham cá dizer que era fácil. A comunicação social, como de costume, não ajuda: os jornalistas chamam notícias às suas opiniões, que para o efeito travestem. E neste particular a opinião dominante, que a CNPD aparentemente subscreve, é que isto de certas pessoas, por ocuparem certos cargos, poderem ter uma protecção diferente, no que toca à confidencialidade dos dados sobre as suas situações fiscais, é um ilícito: "Não se compreende a adopção de um sistema exclusivo para controlo dos acessos a um grupo específico de contribuintes. Tal acção é geradora de discriminação ao nível das garantias oferecidas, sem que seja em si mesma impeditiva de eventuais acessos abusivos". Ou seja, o que a CNPD sobretudo censura não é o abuso em que descaradamente e há muito tempo vive a Administração Fiscal, quando todo o cão e gato que conheça o paquete da repartição local da Fazenda, ou de uma empresa que para ela trabalhe, pode ter acesso aos dados do vizinho, cujo carro novo inveja; mas sim o facto de estar a ser rodado um sistema que põe ao abrigo desta curiosidade malsã certos políticos. Como se o riscos de estes verem os seus dados pessoais expostos na comunicação social fossem iguais aos do eleitor comum, e este tivesse o direito de os conhecer. Esta confusão não é inocente; e traduz o desejo de que a real inexistência de sigilo fiscal, que é o regime em que vivemos, perdure, ou, se possível, tenha consagração legal, que é a intenção inconfessada de todo o ressentido e invejoso, todo o português que tem a mania que é nórdico, e todo o cidadão que, no café e na tasca, declara com o olho incendiado: Se alguém tem alguma coisa a esconder é porque não é sério! - a clássica desculpa de todos os estatistas, moralistas, bufos, e totalitários sortidos. Mas o Governo merece este escarcéu. Porque, logo que descobriu (acredito, chamem-me ingénuo, que não sabia o que um director-geral andava a fazer) a existência da lista VIP deveria ter dito: não fazíamos ideia, mas a iniciativa é excelente, pelo que vamos acelerá-la, testar e, se os resultados forem positivos, tornar o sistema extensivo à generalidade dos contribuintes; e, desde já, louvamos aquele excelente funcionário - precisamos de colaboradores que melhorem o desempenho da administração, ao serviço, no caso, de valores constitucionalmente protegidos. Como se sabe, não fez nada disto. E, pelo contrário, adoptou uma ingénua toada defensiva, como se alguma vez demonstrar medo fosse uma maneira de acalmar um cão que arreganha os dentes. O cão, agora, agarrou a canela - e não larga, até conseguir abocanhar outro bocado suculento. De hoje a oito dias haverá, espera-se, outra merda qualquer para incendiar os ânimos do país que se esganiça em declarações; os desaires da Selecção Nacional, as eructações do senhor Presidente do Sporting, ou outro notável da bola, e os vícios do sistema, que é assim que a corrupção no desporto é designada pelos que dela de momento não estão a beneficiar, continuarão a ocupar os corações clubistas, que são os de quase toda a gente lusa; e a lista VIP irá, com o relatório da CNPD, para a longa lista esquecida dos casos do dia da guerrilha partidária. É pena. Porque ficará por discutir se o combate à evasão fiscal, bandeira deste e de todos os governos anteriores, vale a pena se feito com atropelo de direitos de cidadania; se a igualdade dos cidadãos perante a lei é a mesma coisa que igualdade na impotência deles perante os abusos da Administração; se a condição de político deve implicar mais ou menos direitos do que a de privatus, e, em ambos os casos, porquê e como se casa o direito à privacidade dos eleitos com o direito ao escrutínio dos eleitores. Poderíamos talvez chegar à conclusão de que o melhor seria mesmo os candidatos a certos lugares, a começar pelos deputados, deverem abdicar por completo de qualquer sigilo fiscal; ou até, como decerto deseja o PCP e um ou outro alucinado que sonha com a social-democracia nórdica, essa abdicação ser obrigatória para todos os cidadãos. Em qualquer caso, cada um saberia com o que contar. Actualmente o que toda a gente sabe é que o sigilo fiscal existe, e os direitos dos contribuintes também - na Lei geral, que as leis avulsas e o espírito inquisitorial da Fazenda anulam. Na prática, o que existe é o abuso de quem pode - e o Estado pode quase sempre mais - e o esmagamento de quem não pode. Mas um sistema sem freios, e onde se acha bem que cada cidadão aja como fiscal da Fazenda, sob a promessa abjecta de receber, por sorteio, um Audi, acaba por, contraditoriamente, os tomar nos dentes. Foi o que aconteceu. E é, de certo modo, justo.

O Público é uma espécie de esgoto a céu aberto mediático que se faz notar principalmente quando as suiniculturas licenciadas para o utilizar, e destacam-se sempre as suiniculturas António & Pedro Nuno e Catarina & Mariana, fazem descargas. Estranhamos sempre, mas já estamos habituados ao cheiro. Apesar de o Passos Coelho andar relativamente sossegado, decidiram agora fazer-lhe uma descarga, por motivos que só eles saberão, regressando ao velho tema da Lista VIP. A informação que o fisco guarda sobre os contribuintes e a sua vida contributiva é útil, e até imprescindível, para perceber se eles cumprem integralmente as suas obrigações fiscais. Não serve para os funcionários vasculharem os rendimentos e o património dos vizinhos, nem para comissários políticos infiltrados na administração fiscal a poderem distribuir a quem entendam para finalidades de utilização no combate político em que participam. Como foi abundantemente utilizada na última legislatura, em que, nomeadamente, a vida contributiva do então primeiro-ministro Pedro Passos Coelho foi exaustivamente vasculhada e discutida, mesmo no parlamento, por dois dos partidos da oposição, o PS e o BE, o PCP costuma ter mais pudor a fazer oposição por essa via, talvez por ter sido em 1980 o precursor em Portugal da política de casos com o caso da dívida do Sá Carneiro à banca e de ter aprendido então, com o resultado da eleição que se seguiu em que a AD reforçou a maioria absoluta de 1979 por outra ainda mais clara em 1980, que a política de casos entusiasma os convencidos mas não necessariamente o eleitorado e não parece converter ninguém. Como, aliás, se veio a confirmar nas eleições de 2015, em que todo o investimento da oposição nos casos que envolveram o Passos Coelho, em que a mera menção da palavra "Tecnoforma" fazia salivar os cães de Pavlov socialistas e bloquistas convencidos que estavam prestes a capturar caça grossa, não evitou a sua vitória inesperada nas legislativas de 2015. Isto para dizer que, o conceito de Lista VIP é um instrumento valioso para detectar precocemente a consulta, que não seja por motivos processuais legítimos e verificáveis, a dados fiscais de alguns contribuintes específicos que, pelo seu relevo social, económico ou político, são alvo de uma curiosidade acrescida da comunicação social ou de adversários, políticos ou de outras naturezas, com vista à obtenção de vantagens que lhes possam advir do conhecimento desses dados; que eu próprio gostaria de fazer parte de uma qualquer Lista VIP que fizesse desencadear um alarme se algum hipotético vizinho meu funcionário do fisco que não simpatizasse comigo aproveitasse a possibilidade de acesso às bases de dados do fisco para vasculhar os meus impostos; mas que tenho a noção que se toda a gente, com grande ou com quase nula probabilidade de suscitar o interesse não profissional dos funcionários do fisco, fizesse parte da Lista VIP ela se tornaria inoperativa pelo excesso de alarmes, pelo que a sua existência é tanto mais útil quanto mais reduzida for a lista de contribuintes que suscitem esse interesse, mesmo que seja tão proibido vasculhar os meus dados como vasculhar os do presidente ou os de algum contribuinte que faça parte de alguma Lista VIP; e que os grandes detratores da Lista VIP não são os contribuintes alvo da desigualdade de não fazerem parte dela, nem os funcionários que deixam de poder preencher os seus tempos livres bisbilhotando o cadastro fiscal dos famosos, mas os comissários políticos que, devido à fiscalização acrescida que ela proporciona, se vêem impedidos de vasculhar os dados dos contribuintes integrados nela para os divulgar a quem entendam. Posto isto, o jornalismo de combate do Público regressou, pois, à Lista VIP, e esta vez ilustrada com histórias específicas, que depois de ler a notícia, apesar de extensa, se resumem a uma história. E qual é a melhor história que o Público encontrou para ilustrar o acesso não autorizado a dados de contribuintes detectado pelo sistema de alarmes da Lista VIP? Uma consulta ao IMI do Cavaco Silva por um costista funcionário do fisco para publicação no Público? Uma devassa de um sindicalista bloquista ao IRS do Passos Coelho para passar a informação ao grupo parlamentar do BE para entalar o primeiro-ministro no hemiciclo? Nada disso! Uma funcionária das finanças da Amadora, onde o Passos Coelho morou antes de se mudar para Massamá, e amiga pessoal dele, a quem ele telefonou para lhe pedir uma informação sobre a sua própria declaração de IRS, que ela consultou para lhe responder pelo telefone. O resto da notícia é uma misturada confusa e extensa de factos e relatos do que foi sendo explicado por inúmeros participantes sobre a origem, desenvolvimento e existência ou inexistência da Lista VIP, a quem a comunicação social e a política deram uma vida mais importante do que a devassa do sigilo fiscal dos contribuintes para finalidades de combate político. De uma penada, esta feliz ilustração do Público mata vários Coelhos. A Lista VIP destinava-se a impedir o acesso dos inimigos do Passos Coelho às suas informações fiscais dele para beneficiar politicamente os mandantes deles, mas afinal apanhou uma amiga dele a aceder aos dados dele a pedido dele, isentando de qualquer malfeitoria os adversários políticos que pretendia fiscalizar. Esta história é complicada demais para o leitor típico do Público, o consumidor mais típico da moderna verdade a que temos direito, a perceber, mas se é denunciada no Público, é sobre o Passos Coelho, e aparece misturada com a Lista VIP, malfeitoria destinada a esconder as infracções fiscais dos poderosos, significa certamente que o Passos Coelho fez alguma aldrabice conjuntamente com uma amiga que tinha na administração fiscal. É, portanto, uma boa descarga das suiniculturas que recorrem ao Público para se aliviarem delas. Contém frases como "Em pleno caso Tecnoforma, Passos ligou a uma funcionária do fisco sua amiga por causa do IRS. O acesso foi apanhado no alarme VIP e aparece no inquérito arquivado pelo Ministério Público. NIF de Paulo Núncio foi acrescentado à lista mas a razão é um mistério." cheias de palavras-chave como "Tecnoforma", "arquivado", ou "mistério", que exalam o mau-cheiro característico das descargas que elas têm sempre esperança de fazer colar aos visados. O motivo de as fazerem agora, consumindo matéria fecal que poderiam guardar para um dia mais tarde em que fosse mais necessária, não é claro? Tal como não é fácil perceber porque não aprendem com as experiências passadas, em que as descargas em que depositaram tantas esperanças afinal não conseguiram garantir-lhes o que ambicionavam, vitórias nas eleições, e continuam a fazê-las? Rotina? Instinto? Não se sabe. A verdade é que continuam a fazê-las regularmente. E que o Público é uma espécie de esgoto a céu aberto mediático que se faz notar principalmente quando as suiniculturas licenciadas para o utilizar, e destacam-se sempre as suiniculturas António & Pedro Nuno e Catarina & Mariana, fazem descargas, e que as estranhamos sempre mas já estamos habituados ao cheiro.

link do post | comentar publicado por Manuel Vilarinho Pires às 20:05

Antes de a esquerda, de toda a esquerda da moderada socialista à radical trotskista, incluindo os desertores do MES entretanto transferidos para partidos mainstream onde deixaram de combater a social-democracia para abraçar o conforto da proximidade do poder, se ter recentemente proclamado como a genuína herdeira política do Sá Carneiro e da social-democracia, montou-lhe a primeira grande campanha de assassinato de carácter da democracia portuguesa, orquestrada pel' O Diário, o jornal oficioso do PCP nessa época, ecoada por toda a imprensa, e multiplicada por milhares de paredes pintadas a exortá-lo "Sá, paga o que deves!", repescando um negócio que tinha corrido mal meia dúzia de anos antes. A campanha teve um impacto mediático estrondoso, tendo em conta a velocidade e débito a que a informação circulava nessa época em que não havia internet nem redes sociais. E tinha todos os ingredientes para resultar. Baseava-se num arrazoado de factos confusos e difíceis de relacionar e compreender claramente, e ainda mais difíceis de desmontar e refutar a conclusão proposta, que por isso impeliam os leitores, para não falar nos transeuntes que apenas liam os graffiti nas paredes, a formar as suas convicções, se acreditavam que os factos comprovavam um crime ou uma insinuação torpe?, através da sua preferência individual em acreditar ou não que o Sá Carneiro era um caloteiro. E assim foi. Quem achava que ele era o coveiro dos valores de Abril acreditou que era também caloteiro, quem depositava nele a esperança de erradicar os delírios revolucionários e finamente começar a construir uma democracia moderna que fizesse Portugal progredir acreditou que era inocente. Tinha todos os ingredientes para resultar, mas infelizmente não resultou. O Sá Carneiro foi re-eleito poucos meses depois com uma maioria absoluta ainda mais ampla do que a que tinha conquistado no ano anterior, e o seu ímpeto reformista só foi travado com o assassinato à bomba pouco depois destas segundas eleições. Foi o início de uma política de casos que tem perdurado durante décadas e não perece mostrar nenhuma tendência para esmorecer no seu ímpeto. Nestes anos todos a esquerda aprendeu a usurpar-lhe a identidade ideológica, mas de resto não aprendeu mais nada, e continua a repetir o que sempre fez, a fazer política através de sucessões de casos que procuram distrair os eleitores dos sucessos ou falências da governação do país para a difamação dos adversários políticos através da insinuação da prática de crimes em casos sustentados na revelação de factos de significado confuso sobre temáticas complexas e inacessíveis, às vezes até a cidadãos bem informados, onde é difícil perceber claramente se podem indiciar crimes ou não, e por isso impossíveis de desmontar e refutar as conclusões propostas pelos denunciantes. E sempre com resultados semelhantes. Perfeitamente ilustrada no caso montado para atacar a anterior ministra das finanças por estar a tentar resolver discretamente uns contratos de swap ruinosos celebrados ao longo da legislatura anterior, por ordem do governo socialista anterior, e com o objectivo de maquilhar as contas públicas, o mesmo partido que montou a campanha para a atacar. Sendo um assunto tecnicamente complexo que quase ninguém percebe, prestou-se perfeitamente a simplificações analíticas do tipo swap = vigarice e ministra que tem o problema dos swaps nas mãos = vigarista que deram a muita gente a fezada que a ministra era mesmo vigarista e um alvo fácil nas eleições. E mais uma vez com o resultado habitual: o partida da ministra veio a ganhar as eleições, ao contrário de todas as expectativas, incluindo as das sondagens. Agora que está determinado que o caso Lista VIP, tal como a generalidade dos múltiplos casos lançados à opinião pública maioritariamente pelo BE, na legislatura anterior, e pelo governo, nesta, foi um aborto jurídico, que tinha sido um aborto político já se tinha provado nas eleições realizadas poucos meses depois, vale a pena, mais do que rever tudo o que se disse e quem o disse na altura, subir pelo rio acima à procura da nascente do caso. E com quem se tinha reunido o então candidato socialista a primeiro-ministro exactamente um mês antes de o caso Lista VIP ser denunciado com estrondo? Com o presidente do Sindicato dos Trabalhadores dos Impostos, o incontornável bloquista Paulo Ralha que tem colaborado diligentemente em quase todos os casos lançados ao país desde que o António Costa passou a chefiar o PS. Uma mera coincidência, certamente...

Procurei no site da Comissão Nacional de Protecção de Dados mas não encontrei o Relatório de que toda a gente fala. Também só procurei por descargo de consciência - serviços públicos com sites que sirvam para mais alguma coisa do que para os dirigentes poderem falar com orgulho das novas tecnologias, da economia do conhecimento, da agilização de processos e da transparência da administração são mais difíceis de encontrar do que petróleo de xisto no Terreiro do Paço. Posteriormente, tropecei neste post e lá encontrei o link - há quem saiba procurar melhor do que eu, benza-a Deus, mas não me venham cá dizer que era fácil. A comunicação social, como de costume, não ajuda: os jornalistas chamam notícias às suas opiniões, que para o efeito travestem. E neste particular a opinião dominante, que a CNPD aparentemente subscreve, é que isto de certas pessoas, por ocuparem certos cargos, poderem ter uma protecção diferente, no que toca à confidencialidade dos dados sobre as suas situações fiscais, é um ilícito: "Não se compreende a adopção de um sistema exclusivo para controlo dos acessos a um grupo específico de contribuintes. Tal acção é geradora de discriminação ao nível das garantias oferecidas, sem que seja em si mesma impeditiva de eventuais acessos abusivos". Ou seja, o que a CNPD sobretudo censura não é o abuso em que descaradamente e há muito tempo vive a Administração Fiscal, quando todo o cão e gato que conheça o paquete da repartição local da Fazenda, ou de uma empresa que para ela trabalhe, pode ter acesso aos dados do vizinho, cujo carro novo inveja; mas sim o facto de estar a ser rodado um sistema que põe ao abrigo desta curiosidade malsã certos políticos. Como se o riscos de estes verem os seus dados pessoais expostos na comunicação social fossem iguais aos do eleitor comum, e este tivesse o direito de os conhecer. Esta confusão não é inocente; e traduz o desejo de que a real inexistência de sigilo fiscal, que é o regime em que vivemos, perdure, ou, se possível, tenha consagração legal, que é a intenção inconfessada de todo o ressentido e invejoso, todo o português que tem a mania que é nórdico, e todo o cidadão que, no café e na tasca, declara com o olho incendiado: Se alguém tem alguma coisa a esconder é porque não é sério! - a clássica desculpa de todos os estatistas, moralistas, bufos, e totalitários sortidos. Mas o Governo merece este escarcéu. Porque, logo que descobriu (acredito, chamem-me ingénuo, que não sabia o que um director-geral andava a fazer) a existência da lista VIP deveria ter dito: não fazíamos ideia, mas a iniciativa é excelente, pelo que vamos acelerá-la, testar e, se os resultados forem positivos, tornar o sistema extensivo à generalidade dos contribuintes; e, desde já, louvamos aquele excelente funcionário - precisamos de colaboradores que melhorem o desempenho da administração, ao serviço, no caso, de valores constitucionalmente protegidos. Como se sabe, não fez nada disto. E, pelo contrário, adoptou uma ingénua toada defensiva, como se alguma vez demonstrar medo fosse uma maneira de acalmar um cão que arreganha os dentes. O cão, agora, agarrou a canela - e não larga, até conseguir abocanhar outro bocado suculento. De hoje a oito dias haverá, espera-se, outra merda qualquer para incendiar os ânimos do país que se esganiça em declarações; os desaires da Selecção Nacional, as eructações do senhor Presidente do Sporting, ou outro notável da bola, e os vícios do sistema, que é assim que a corrupção no desporto é designada pelos que dela de momento não estão a beneficiar, continuarão a ocupar os corações clubistas, que são os de quase toda a gente lusa; e a lista VIP irá, com o relatório da CNPD, para a longa lista esquecida dos casos do dia da guerrilha partidária. É pena. Porque ficará por discutir se o combate à evasão fiscal, bandeira deste e de todos os governos anteriores, vale a pena se feito com atropelo de direitos de cidadania; se a igualdade dos cidadãos perante a lei é a mesma coisa que igualdade na impotência deles perante os abusos da Administração; se a condição de político deve implicar mais ou menos direitos do que a de privatus, e, em ambos os casos, porquê e como se casa o direito à privacidade dos eleitos com o direito ao escrutínio dos eleitores. Poderíamos talvez chegar à conclusão de que o melhor seria mesmo os candidatos a certos lugares, a começar pelos deputados, deverem abdicar por completo de qualquer sigilo fiscal; ou até, como decerto deseja o PCP e um ou outro alucinado que sonha com a social-democracia nórdica, essa abdicação ser obrigatória para todos os cidadãos. Em qualquer caso, cada um saberia com o que contar. Actualmente o que toda a gente sabe é que o sigilo fiscal existe, e os direitos dos contribuintes também - na Lei geral, que as leis avulsas e o espírito inquisitorial da Fazenda anulam. Na prática, o que existe é o abuso de quem pode - e o Estado pode quase sempre mais - e o esmagamento de quem não pode. Mas um sistema sem freios, e onde se acha bem que cada cidadão aja como fiscal da Fazenda, sob a promessa abjecta de receber, por sorteio, um Audi, acaba por, contraditoriamente, os tomar nos dentes. Foi o que aconteceu. E é, de certo modo, justo.

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