Gremlin Literário

07-03-2020
marcar artigo

Ontem, em mais uma acção de rua da campanha eleitoral da candidatura que integro, em que paramos para conversar com todas as pessoas que conversam connosco quando as cumprimentamos e lhes distribuimos um prospecto informativo da candidatura ou simplesmente quando vêem que estamos a fazer uma campanha eleitoral e nos interpelam espontaneamente, veio à conversa connosco um eleitor habitual do PNR.

[Para os que não sabem, filiei-me no PSD a seguir às eleições de Outubro de 2015, no dia em que percebi que o golpe constitucional do António Costa com o BE e o PCP seria juridicamente blindado e que sustê-lo forçando um governo formado por quem ganhou as eleições seria politicamente insustentável, com chumbos no parlamento que paralizariam a governação, e quando fui convidado por pessoas íntegras, trabalhadoras e capazes para integrar a lista de candidatos da coligação PSD/CDS à Junta de Freguesia da Venteira, concelho da Amadora, não fui nem seria capaz de dizer que não.]

Não é nenhum cabeça rapada dos que vão para o Bairro Alto agredir africanos pacíficos. É um pai de família, deve andar por volta dos quarenta, trabalhador que se pode designar de operário especializado, com um discurso de conservador, de pessoa que respeita princípios como o trabalho a família e a decência, chamemos-lhe assim porque honra é um termo em desuso. E é natural de Rio Maior, se bem que more e vote na Amadora, e, sendo demasiado jovem para ter vivido o PREC em Rio Maior, tem bem presentes os testemunhos da família sobre o que fizeram, e para resistir a quê, os Riomaiorenses.

E anda chateado.

Anda chateado com o milagre da reposição de rendimentos a quem nunca os chegou a perder, porque nunca teve sequer que se interrogar se num fim de mês qualquer chegaria a receber o salário, ele, que nunca chegou a perder o emprego mas, no pico da crise, chegou a estar três meses sem receber porque a empresa para quem trabalha não tinha dinheiro para pagar salários.

E sobre políticas de rendimentos tem ideias tão claras e cristalinas como qualquer catedrático de Economia que mereça o título que detém. Tem bem claro que austeridade não é uma opção que se toma para fazer mal às pessoas, mas o estado natural quando se acaba o dinheiro. Tem bem claro que a austeridade em Portugal não resultou da má vontade das autoridades europeias, mas do facto de o governo anterior ter estoirado o dinheiro até ao fim e de nos ter colocado à mercê das condições impostas por quem esteve disposto a resolver-nos esse problema emprestando-nos dinheiro que mais ninguém emprestava. Tem bem claro que os cortes de rendimentos resguardaram na medida do possível as pessoas de rendimentos mais baixos e foram violentos essencialmente para pessoas de rendimentos altos ou muito altos, mas de emprego e rendimento garantido todos os fins de mês, e tem bem claro que são estes os maiores beneficiários da reposição de rendimentos. Se um dia houver uma subscrição pública para financiar a construção de uma estátua ao Pedro Passos Coelho pelo modo como salvou Portugal da bancarrota, ele contribuirá na medida das suas possibilidades sem a mais pequena dúvida.

Anda chateado com os grevistas da Autoeuropa que, usufruindo de salários e regalias que mais nenhuns operários usufruem em Portugal, a começar por ele próprio, e acomodados a usufruirem deles em toda a segurança apenas por lá estarem e sem terem que dar o litro para os merecerem, querem recusar adaptar os seus horários de trabalho às necessidades de sucesso e mesmo de sobrevivência futura da empresa, mesmo que essa adaptação implique receberem substancialmente mais sem aumentarem o horário de trabalho.

Anda chateado com o CDS, o seu partido natural de voto alternativo ao PNR, por ter desfeito a coligação em Loures por causa de o candidato do PSD André Ventura ter feito afirmações que ele considera de mera constatação da realidade e de apelo ao cumprimento da lei, ele e a maioria das pessoas, até eleitores do BE, inquiridas numa sondagem de opinião.

Anda chateado por ver perseguidas pelas autoridades e mesmo criminalizadas opiniões que ele tem e que considera tão legítimas e respeitáveis como as opiniões opostas que tendencialmente têm vindo a ganhar terreno como únicas o obrigatórias, como, por exemplo, as do comentador que disse que não queria as bloquistas para casar, nem dadas, ou as do André Ventura sobre a impunidade de facto que é tolerada aos membros da comunidade cigana que não cumprem a lei.

Anda chateado porque sente que a sociedade, empurrada por uma pequeníssima elite minoritária que sempre teve tudo sem conquistar nada e é desproporcionalmente acolhida, acarinhada e exibida na comunicação social, e com uma capacidade de intervenção política ainda ampliada pela configuração actual da base de sustentação do governo, anda a ignorar, encurralar e perseguir gente como ele que, em bom Português, se pode designar como a regular, decent, working, God believing, family guy.

Anda chateado, e com razão.

Da conversa connosco resultou ele ter acabado por afirmar que votaria na coligação PSD/CDS nas eleições autárquicas do dia 1 de Outubro, ficando cá nesse fim-de-semana em de o ir passar à sua amada terra. Não por ter assumido que estava a falar com racistas, xenófobos, sexistas, homofóbicos, nacionalistas ou adeptos da ditadura, os lugares-comuns que a opinião pública dominante politicamente correcta cola automaticamente a qualquer eleitor habitual do PNR sem sequer procurar saber o que ele pensa, mas simplesmente por ter sido escutado com atenção e respeito, e acordo naquilo que suscitou acordo em quem falou com ele.

E da conversa com ele resultou também uma certeza. Gente mais do que normal que se anda a sentir ignorada, encurralada e mesmo perseguida por uma sociedade manipulada por elites minoritárias com quem a esmagadora maioria da sociedade nem sequer se identifica, se não se vir minimamente escutada e respeitada pelos partidos do sistema, quer por lhes ignorarem as preocupações, quer por simplesmente os ambicionarem erradicar, vira-se para os partidos dos extremismos, que se apercebem da sua existência e do seu descontentamento, quando não medo, e se posicionam com oportunismo em posição de o canalizar para conquistarem um poder que depois não têm competência nem capacidade para exercer. Gente mais do que normal, repito.

E eu, que não sou trumpófilo, nem sequer moderado, gostava que a estupidez dos extremistas do politicamente correcto que, por trás de uma fachada de luta pelo direito à diferença andam de facto a lutar pela imposição de ser igual, fosse moderada, em vez de encorajada por oportunismo político, pelo bom-senso dos moderados, pelo menos dos que o têm, que no PS parecem escassear cada vez mais, mas no PSD e no CDS deviam ser mais assertivos do que têm sido, para não parecerem menos representativos do que são.

Ontem, em mais uma acção de rua da campanha eleitoral da candidatura que integro, em que paramos para conversar com todas as pessoas que conversam connosco quando as cumprimentamos e lhes distribuimos um prospecto informativo da candidatura ou simplesmente quando vêem que estamos a fazer uma campanha eleitoral e nos interpelam espontaneamente, veio à conversa connosco um eleitor habitual do PNR.

[Para os que não sabem, filiei-me no PSD a seguir às eleições de Outubro de 2015, no dia em que percebi que o golpe constitucional do António Costa com o BE e o PCP seria juridicamente blindado e que sustê-lo forçando um governo formado por quem ganhou as eleições seria politicamente insustentável, com chumbos no parlamento que paralizariam a governação, e quando fui convidado por pessoas íntegras, trabalhadoras e capazes para integrar a lista de candidatos da coligação PSD/CDS à Junta de Freguesia da Venteira, concelho da Amadora, não fui nem seria capaz de dizer que não.]

Não é nenhum cabeça rapada dos que vão para o Bairro Alto agredir africanos pacíficos. É um pai de família, deve andar por volta dos quarenta, trabalhador que se pode designar de operário especializado, com um discurso de conservador, de pessoa que respeita princípios como o trabalho a família e a decência, chamemos-lhe assim porque honra é um termo em desuso. E é natural de Rio Maior, se bem que more e vote na Amadora, e, sendo demasiado jovem para ter vivido o PREC em Rio Maior, tem bem presentes os testemunhos da família sobre o que fizeram, e para resistir a quê, os Riomaiorenses.

E anda chateado.

Anda chateado com o milagre da reposição de rendimentos a quem nunca os chegou a perder, porque nunca teve sequer que se interrogar se num fim de mês qualquer chegaria a receber o salário, ele, que nunca chegou a perder o emprego mas, no pico da crise, chegou a estar três meses sem receber porque a empresa para quem trabalha não tinha dinheiro para pagar salários.

E sobre políticas de rendimentos tem ideias tão claras e cristalinas como qualquer catedrático de Economia que mereça o título que detém. Tem bem claro que austeridade não é uma opção que se toma para fazer mal às pessoas, mas o estado natural quando se acaba o dinheiro. Tem bem claro que a austeridade em Portugal não resultou da má vontade das autoridades europeias, mas do facto de o governo anterior ter estoirado o dinheiro até ao fim e de nos ter colocado à mercê das condições impostas por quem esteve disposto a resolver-nos esse problema emprestando-nos dinheiro que mais ninguém emprestava. Tem bem claro que os cortes de rendimentos resguardaram na medida do possível as pessoas de rendimentos mais baixos e foram violentos essencialmente para pessoas de rendimentos altos ou muito altos, mas de emprego e rendimento garantido todos os fins de mês, e tem bem claro que são estes os maiores beneficiários da reposição de rendimentos. Se um dia houver uma subscrição pública para financiar a construção de uma estátua ao Pedro Passos Coelho pelo modo como salvou Portugal da bancarrota, ele contribuirá na medida das suas possibilidades sem a mais pequena dúvida.

Anda chateado com os grevistas da Autoeuropa que, usufruindo de salários e regalias que mais nenhuns operários usufruem em Portugal, a começar por ele próprio, e acomodados a usufruirem deles em toda a segurança apenas por lá estarem e sem terem que dar o litro para os merecerem, querem recusar adaptar os seus horários de trabalho às necessidades de sucesso e mesmo de sobrevivência futura da empresa, mesmo que essa adaptação implique receberem substancialmente mais sem aumentarem o horário de trabalho.

Anda chateado com o CDS, o seu partido natural de voto alternativo ao PNR, por ter desfeito a coligação em Loures por causa de o candidato do PSD André Ventura ter feito afirmações que ele considera de mera constatação da realidade e de apelo ao cumprimento da lei, ele e a maioria das pessoas, até eleitores do BE, inquiridas numa sondagem de opinião.

Anda chateado por ver perseguidas pelas autoridades e mesmo criminalizadas opiniões que ele tem e que considera tão legítimas e respeitáveis como as opiniões opostas que tendencialmente têm vindo a ganhar terreno como únicas o obrigatórias, como, por exemplo, as do comentador que disse que não queria as bloquistas para casar, nem dadas, ou as do André Ventura sobre a impunidade de facto que é tolerada aos membros da comunidade cigana que não cumprem a lei.

Anda chateado porque sente que a sociedade, empurrada por uma pequeníssima elite minoritária que sempre teve tudo sem conquistar nada e é desproporcionalmente acolhida, acarinhada e exibida na comunicação social, e com uma capacidade de intervenção política ainda ampliada pela configuração actual da base de sustentação do governo, anda a ignorar, encurralar e perseguir gente como ele que, em bom Português, se pode designar como a regular, decent, working, God believing, family guy.

Anda chateado, e com razão.

Da conversa connosco resultou ele ter acabado por afirmar que votaria na coligação PSD/CDS nas eleições autárquicas do dia 1 de Outubro, ficando cá nesse fim-de-semana em de o ir passar à sua amada terra. Não por ter assumido que estava a falar com racistas, xenófobos, sexistas, homofóbicos, nacionalistas ou adeptos da ditadura, os lugares-comuns que a opinião pública dominante politicamente correcta cola automaticamente a qualquer eleitor habitual do PNR sem sequer procurar saber o que ele pensa, mas simplesmente por ter sido escutado com atenção e respeito, e acordo naquilo que suscitou acordo em quem falou com ele.

E da conversa com ele resultou também uma certeza. Gente mais do que normal que se anda a sentir ignorada, encurralada e mesmo perseguida por uma sociedade manipulada por elites minoritárias com quem a esmagadora maioria da sociedade nem sequer se identifica, se não se vir minimamente escutada e respeitada pelos partidos do sistema, quer por lhes ignorarem as preocupações, quer por simplesmente os ambicionarem erradicar, vira-se para os partidos dos extremismos, que se apercebem da sua existência e do seu descontentamento, quando não medo, e se posicionam com oportunismo em posição de o canalizar para conquistarem um poder que depois não têm competência nem capacidade para exercer. Gente mais do que normal, repito.

E eu, que não sou trumpófilo, nem sequer moderado, gostava que a estupidez dos extremistas do politicamente correcto que, por trás de uma fachada de luta pelo direito à diferença andam de facto a lutar pela imposição de ser igual, fosse moderada, em vez de encorajada por oportunismo político, pelo bom-senso dos moderados, pelo menos dos que o têm, que no PS parecem escassear cada vez mais, mas no PSD e no CDS deviam ser mais assertivos do que têm sido, para não parecerem menos representativos do que são.

marcar artigo