Figueira da Foz Os Verões ao ritmo dos bailes no Casino

26-11-2019
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O jornal Público publica hoje uma listagem das melhores reportagens publicadas nos últimos anos. Destaco o excerto de uma dessas notícias que explica um pouco o crescimento da cidade da Figueira da Foz.

As três tribos

A vida mudou muito na Figueira? O Grande Hotel e a piscina continuam lá, tal como, em frente, a grande torre do relógio, marcando o perfil da marginal eternizado nos postais. Mas o areal cresceu imenso e os mais jovens, como João Galamba, filho de Jorge, preferem ir para outras praias fazer bodyboard e encontrar os amigos.

Tal como há 50 anos o pai tinha grupos de amigos (mais rapazes que raparigas, que a Figueira sempre foi conservadora), João, apesar de viver em Lisboa, mantém o seu grupo quando volta à Figueira no Verão.

Quando era pequeno, ia com a avó para a praia, logo à s nove da manhõ, e lembra-se dos grupos enormes a fazerem sardinhadas, e de à tarde se mudarem todos para a piscina. Depois, a partir dos 13 anos, deixou de ir com os avós e passou a frequentar as praias do Cabedelo ou da Cova-Gala. Mas, da sua experiência de Verão, acha que há coisas que não mudaram assim tanto. “No Verão sempre houve três tribos na Figueira”, conta. “Os que são da Figueira ou os que, não sendo, já conquistaram o título de cidadão honorário; os coimbrinhas; e os espanhóis.” E os grupos, que à noite se dividem por diferentes cafés, são, como em todo o lado, “uma desculpa para rituais de marialvismo”, provocações, “é pá, aquilo está cheio de coimbrinhas”, e outros gritos de guerra do género.

Muitos prédios novos, o abandono dos antigos (muitos deles alugados no Verão mas vazios durante todo o Inverno), o aparecimento do centro comercial, o desaparecimento de tasquinhas tradicionais, a transformação do Casino (onde João ainda se lembra de ver Eládio Clímaco a apresentar a Gala dos Pequenos Cantores), descaracterizaram muito a Figueira.

Mas as noites, no Verão, continuam a ser no chamado Picadeiro, onde ficam o Casino e os grandes cafés, para onde Jorge Galamba ia há 50 anos e para onde o filho vai hoje depois do jantar. É certo que os cinemas mudaram dali para o centro comercial, que o antigo Teatro Parque Cine-Centro de Diversões, apesar de manter a sua fachada com as letras redondas a anunciar Automóveis e Carrossel, está transformado num armazém, que a livraria Casa Havaneza, local de encontro da intelectualidade figueirense durante décadas (propriedade da família Santos Alves, e fundada em 1885), mudou de proprietários e é hoje diferente, que o velho café Nicola está transformado em Pizza Hut.

Mas como escreve António Pedro Pita num livro editado pela câmara municipal sobre a Havaneza, recordando o sítio onde “cada um de nós foi outro”: “O lugar deslocou-se para a memória. Pouco importa que ainda exista: já não existe.” Ou talvez exista, corrige mais à frente. “Um lugar só se desloca para a memória se alguma vez nos proporciona a experiência viva da alteridade. […] Pouco importa que já não exista: ainda existe. Sim. Enquanto existirem todos os outros de nós.”

O mesmo se podia dizer de tudo o que fez a Figueira de antigamente.

Este trabalho fazia parte de uma série sobre praias portuguesas

O jornal Público publica hoje uma listagem das melhores reportagens publicadas nos últimos anos. Destaco o excerto de uma dessas notícias que explica um pouco o crescimento da cidade da Figueira da Foz.

As três tribos

A vida mudou muito na Figueira? O Grande Hotel e a piscina continuam lá, tal como, em frente, a grande torre do relógio, marcando o perfil da marginal eternizado nos postais. Mas o areal cresceu imenso e os mais jovens, como João Galamba, filho de Jorge, preferem ir para outras praias fazer bodyboard e encontrar os amigos.

Tal como há 50 anos o pai tinha grupos de amigos (mais rapazes que raparigas, que a Figueira sempre foi conservadora), João, apesar de viver em Lisboa, mantém o seu grupo quando volta à Figueira no Verão.

Quando era pequeno, ia com a avó para a praia, logo à s nove da manhõ, e lembra-se dos grupos enormes a fazerem sardinhadas, e de à tarde se mudarem todos para a piscina. Depois, a partir dos 13 anos, deixou de ir com os avós e passou a frequentar as praias do Cabedelo ou da Cova-Gala. Mas, da sua experiência de Verão, acha que há coisas que não mudaram assim tanto. “No Verão sempre houve três tribos na Figueira”, conta. “Os que são da Figueira ou os que, não sendo, já conquistaram o título de cidadão honorário; os coimbrinhas; e os espanhóis.” E os grupos, que à noite se dividem por diferentes cafés, são, como em todo o lado, “uma desculpa para rituais de marialvismo”, provocações, “é pá, aquilo está cheio de coimbrinhas”, e outros gritos de guerra do género.

Muitos prédios novos, o abandono dos antigos (muitos deles alugados no Verão mas vazios durante todo o Inverno), o aparecimento do centro comercial, o desaparecimento de tasquinhas tradicionais, a transformação do Casino (onde João ainda se lembra de ver Eládio Clímaco a apresentar a Gala dos Pequenos Cantores), descaracterizaram muito a Figueira.

Mas as noites, no Verão, continuam a ser no chamado Picadeiro, onde ficam o Casino e os grandes cafés, para onde Jorge Galamba ia há 50 anos e para onde o filho vai hoje depois do jantar. É certo que os cinemas mudaram dali para o centro comercial, que o antigo Teatro Parque Cine-Centro de Diversões, apesar de manter a sua fachada com as letras redondas a anunciar Automóveis e Carrossel, está transformado num armazém, que a livraria Casa Havaneza, local de encontro da intelectualidade figueirense durante décadas (propriedade da família Santos Alves, e fundada em 1885), mudou de proprietários e é hoje diferente, que o velho café Nicola está transformado em Pizza Hut.

Mas como escreve António Pedro Pita num livro editado pela câmara municipal sobre a Havaneza, recordando o sítio onde “cada um de nós foi outro”: “O lugar deslocou-se para a memória. Pouco importa que ainda exista: já não existe.” Ou talvez exista, corrige mais à frente. “Um lugar só se desloca para a memória se alguma vez nos proporciona a experiência viva da alteridade. […] Pouco importa que já não exista: ainda existe. Sim. Enquanto existirem todos os outros de nós.”

O mesmo se podia dizer de tudo o que fez a Figueira de antigamente.

Este trabalho fazia parte de uma série sobre praias portuguesas

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