Greve, combustíveis, escassez e racionamento

05-06-2020
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Greve, combustíveis, escassez e racionamento

On Abril 19, 2019Abril 19, 2019 Por BZIn Economia, Energia, Janela Indiscreta, Media, Portugal

Lição para o futuro. Em apenas quatro dias (entre a segunda-feira e quinta-feira antes da festividade da Páscoa) uma greve dos motoristas de matérias perigosas – especialmente combustíveis – lançou o caos em Portugal.
Pessoalmente, como muitos outros condutores, eu nem sequer sabia da greve. Até à manhã de terça-feira, quando se noticiou que aeroportos estavam a ficar sem combustível e que postos de abastecimento poderiam ir pelo mesmo caminho… Nesse dia, a incerteza dos portugueses quanto a potenciais limitações à continuação da mobilidade automóvel levou-os em massa a encher depósitos dos seus automóveis. Que provocou o efeito pretendido pelos grevistas: escassez da disponibilidade de combustível. Como muitos, ao final do dia já não consegui abastecer.
A solução do governo de António Costa foi declarar “crise energética” e estipular serviços mínimos bem como recorrer à requisição civil (suspeito que seria a solução de qualquer outro partido da Assembleia). E, para fazer face à corrida aos combustíveis, alguns postos limitaram os litros que consumidores podiam abastecer.
Mas havia melhor solução para gerir a escassez de combustíveis: preços!!!
Considerem o seguinte cenário: cientes que haveria greve a partir do dia 15 de Abril (sindicato deu pré-aviso a 1 de Abril), postos notificavam consumidores que, caso greve fosse efectivada, os preços iriam aumentar, por exemplo, 25 cêntimos. Em resposta a esse aviso, muitos condutores iriam abastecer nas semanas anteriores à greve a preço “normal” e empresas fornecedoras poderiam encher tanques para responder ao acréscimo de procura. Ainda, na(s) semana(s) de greve – e com preços mais altos – apenas iria abastecer quem realmente tivesse necessidade de o fazer. É que vi exemplos de condutores na fila dos postos a dizerem que tinham ainda metade do depósito mas estavam ali para encher o restante por precaução. Involuntariamente, “ajudaram” a que escassez fosse maior.
Ainda, ao contrário de limites quantitativos ao abastecimento (ex: litros por carro) preço também é melhor forma racionar o consumo. Quando se impõe uma quantidade máxima por consumidor não há forma de saber se 10 litros para determinado condutor são mais valiosos que para outro condutor no fim da fila que, quando chegar a sua vez, poderá não conseguir comprar combustível. Preço obriga a selecção mais justa.
Também, a acrescida margem financeira resultante de mais altos preços dos combustíveis, iria contribuir para pagar prémio aos motoristas que não fizessem greve, ajudando a mitigar consequências da mesma.
Porque postos não optaram por esta solução? Poderia ser por ignorância económica destes sobre o papel dos preços na gestão de escassez. Mas aposto que se trata mais da ignorância dos consumidores que, certamente, não iriam perceber os benefícios elencados acima e ainda iriam acusar aquelas empresas de exploração/especulação. Prova disso é imagem que circulou nas redes sociais de posto em Sintra a vender gasolina €1,809 o litro e que entretanto foi desmascarada pelo jornal Polígrafo (tratava-se do preço normal da gasolina premium).

No entanto, um facto que pareceu escapar aos jornalistas e aos milhares de internautas que partilharam esta imagem: naquele posto havia este tipo de gasolina. Sim! E isso só foi possível porque preço era mais alto. Muitos outros postos podiam ainda ter gasolina e gasóleo disponível se, durante período de greve, tivessem aumentado preços dos combustíveis, obrigando consumidores a gerir melhor os seus consumos.
Lição para o futuro? Gostava que portugueses aprendessem com erros do passado e cenário descrito neste post fosse realidade aquando da próxima “crise energética”. Mas minhas expectativas são baixas.

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Greve, combustíveis, escassez e racionamento

On Abril 19, 2019Abril 19, 2019 Por BZIn Economia, Energia, Janela Indiscreta, Media, Portugal

Lição para o futuro. Em apenas quatro dias (entre a segunda-feira e quinta-feira antes da festividade da Páscoa) uma greve dos motoristas de matérias perigosas – especialmente combustíveis – lançou o caos em Portugal.
Pessoalmente, como muitos outros condutores, eu nem sequer sabia da greve. Até à manhã de terça-feira, quando se noticiou que aeroportos estavam a ficar sem combustível e que postos de abastecimento poderiam ir pelo mesmo caminho… Nesse dia, a incerteza dos portugueses quanto a potenciais limitações à continuação da mobilidade automóvel levou-os em massa a encher depósitos dos seus automóveis. Que provocou o efeito pretendido pelos grevistas: escassez da disponibilidade de combustível. Como muitos, ao final do dia já não consegui abastecer.
A solução do governo de António Costa foi declarar “crise energética” e estipular serviços mínimos bem como recorrer à requisição civil (suspeito que seria a solução de qualquer outro partido da Assembleia). E, para fazer face à corrida aos combustíveis, alguns postos limitaram os litros que consumidores podiam abastecer.
Mas havia melhor solução para gerir a escassez de combustíveis: preços!!!
Considerem o seguinte cenário: cientes que haveria greve a partir do dia 15 de Abril (sindicato deu pré-aviso a 1 de Abril), postos notificavam consumidores que, caso greve fosse efectivada, os preços iriam aumentar, por exemplo, 25 cêntimos. Em resposta a esse aviso, muitos condutores iriam abastecer nas semanas anteriores à greve a preço “normal” e empresas fornecedoras poderiam encher tanques para responder ao acréscimo de procura. Ainda, na(s) semana(s) de greve – e com preços mais altos – apenas iria abastecer quem realmente tivesse necessidade de o fazer. É que vi exemplos de condutores na fila dos postos a dizerem que tinham ainda metade do depósito mas estavam ali para encher o restante por precaução. Involuntariamente, “ajudaram” a que escassez fosse maior.
Ainda, ao contrário de limites quantitativos ao abastecimento (ex: litros por carro) preço também é melhor forma racionar o consumo. Quando se impõe uma quantidade máxima por consumidor não há forma de saber se 10 litros para determinado condutor são mais valiosos que para outro condutor no fim da fila que, quando chegar a sua vez, poderá não conseguir comprar combustível. Preço obriga a selecção mais justa.
Também, a acrescida margem financeira resultante de mais altos preços dos combustíveis, iria contribuir para pagar prémio aos motoristas que não fizessem greve, ajudando a mitigar consequências da mesma.
Porque postos não optaram por esta solução? Poderia ser por ignorância económica destes sobre o papel dos preços na gestão de escassez. Mas aposto que se trata mais da ignorância dos consumidores que, certamente, não iriam perceber os benefícios elencados acima e ainda iriam acusar aquelas empresas de exploração/especulação. Prova disso é imagem que circulou nas redes sociais de posto em Sintra a vender gasolina €1,809 o litro e que entretanto foi desmascarada pelo jornal Polígrafo (tratava-se do preço normal da gasolina premium).

No entanto, um facto que pareceu escapar aos jornalistas e aos milhares de internautas que partilharam esta imagem: naquele posto havia este tipo de gasolina. Sim! E isso só foi possível porque preço era mais alto. Muitos outros postos podiam ainda ter gasolina e gasóleo disponível se, durante período de greve, tivessem aumentado preços dos combustíveis, obrigando consumidores a gerir melhor os seus consumos.
Lição para o futuro? Gostava que portugueses aprendessem com erros do passado e cenário descrito neste post fosse realidade aquando da próxima “crise energética”. Mas minhas expectativas são baixas.

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