Espaço Cinzento: Recorrente

08-03-2020
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(press play)Retirou a faca enquanto ouvia o som característico da lâmina dilacerando a carne. Olhou para o sangue vermelho e espesso que pingava abundantemente da sua arma. Tinha de admitir um certo prazer secreto em ver as pequenas gotas libertarem-se da lâmina e tombarem indefesas sobre o solo. Era um pequenino pormenor mas que era bem mais saboreado que a torrente de sangue que corria da ferida aberta. O mesmo acontecia com a vítima. Preferia sempre o momento em que chegava o último sopro de vida a todo o esgar de dor que sucedia até à altura em que tudo ficava inerte. E normalmente bastava apenas um gesto da sua lâmina. Não mais que um gesto. Não gostava de actos repetidos. Pelo menos não sobre o mesmo pobre coitado. Porque no fundo não passava disso mesmo, um acto de pena, ou melhor de compaixão. Sentia que a morte que a sua faca lhes trazia era uma espécie de redenção, um fim para todos os pecados imundos que tinham cometido durante as suas patéticas vidas. E no fim de contas era uma morte mais sublime do que uma estúpida bala entre os olhos. No início tinha sido assim, mas detestava toda a nuvem de restos de sangue e massa encefálica que todo o acto deixava por terra. E as lâminas tinham sido sempre o seu fascínio. E o sangue com que as brindava era uma obra de arte difícil de reproduzir. E em vez de servirem para cortar pulsos, serviam muito melhor para cortar aqueles estúpidos relacionamentos em que se deixava envolver, uma e outra vez. Ela sempre tinha adorado analogias...


(press play)Retirou a faca enquanto ouvia o som característico da lâmina dilacerando a carne. Olhou para o sangue vermelho e espesso que pingava abundantemente da sua arma. Tinha de admitir um certo prazer secreto em ver as pequenas gotas libertarem-se da lâmina e tombarem indefesas sobre o solo. Era um pequenino pormenor mas que era bem mais saboreado que a torrente de sangue que corria da ferida aberta. O mesmo acontecia com a vítima. Preferia sempre o momento em que chegava o último sopro de vida a todo o esgar de dor que sucedia até à altura em que tudo ficava inerte. E normalmente bastava apenas um gesto da sua lâmina. Não mais que um gesto. Não gostava de actos repetidos. Pelo menos não sobre o mesmo pobre coitado. Porque no fundo não passava disso mesmo, um acto de pena, ou melhor de compaixão. Sentia que a morte que a sua faca lhes trazia era uma espécie de redenção, um fim para todos os pecados imundos que tinham cometido durante as suas patéticas vidas. E no fim de contas era uma morte mais sublime do que uma estúpida bala entre os olhos. No início tinha sido assim, mas detestava toda a nuvem de restos de sangue e massa encefálica que todo o acto deixava por terra. E as lâminas tinham sido sempre o seu fascínio. E o sangue com que as brindava era uma obra de arte difícil de reproduzir. E em vez de servirem para cortar pulsos, serviam muito melhor para cortar aqueles estúpidos relacionamentos em que se deixava envolver, uma e outra vez. Ela sempre tinha adorado analogias...

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