A catástrofe da eletricidade intermitente:da dívida tarifária à bomba de hidrogénio

29-06-2020
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A catástrofe da eletricidade intermitente:da dívida tarifária à bomba de hidrogénio
Apesar das pressões internacionais e de dois secretários de Estado da Energia que enfrentaram o problema, Henrique Gomes e Jorge Seguro Sanches, a dívida tarifária ascende neste momento a 3 mil milhões de euros!

A eletricidade intermitente é proveniente de fontes que ora existem, ora não existem, como o vento e a luz solar.
O sistema elétrico não pode depender duma tal intermitência, sob pena de a economia e a segurança das nossas vidas colapsarem, dado que a eletricidade não se pode armazenar.
Assim, quando o Governo Sócrates decidiu, em 2005, basear o sistema elétrico nas potências intermitentes eólicas e solares, criou para o efeito a figura contratual das FIT (feed-in tariffs), em que o custo de todo o backup necessário para evitar apagões ficou à responsabilidade dos consumidores.
Ou seja, para assegurar aos promotores dos parques eólicos e solares os elevados proveitos que exigiam para investir, o Governo decretou que todos os consumidores tinham de pagar os lucros previstos nas FIT.
Um tal sistema baseado na eletricidade intermitente é completamente ineficiente, pois provoca enormes desperdícios nas centrais de backup, pelo que, em 2008, os sobrecustos da produção de eletricidade levaram a ERSE a propor um aumento dos preços que o então ministro Manuel Pinho considerou politicamente insustentável.
Em vez de mudar a política ruinosa que estava a seguir, o Governo Sócrates decidiu manter as “ benesses decretinas” para os promotores de eletricidade intermitente, mas adiou para anos futuros o respetivo pagamento pelos consumidores.
Foi assim criada a “dívida tarifária” do setor elétrico, o que levou à demissão do então presidente da ERSE.
Na prática, a dívida tarifária é uma dívida cuja responsabilidade o Governo colocou nos consumidores e que representa a diferença entre aquilo que pagamos nas tarifas e aquilo que o Governo decidiu por decreto que os produtores elétricos têm direito a receber.
Esta situação absurda, bem ilustrada pelo facto de a dívida tarifária ascender já nessa altura a 2 mil milhões de euros, foi publicamente denunciada em janeiro de 2010 por um manifesto intitulado “O Futuro da Energia”, de que fui um dos 36 subscritores.
A troika considerou muito grave essa dívida tarifária e só aceitou não a considerar logo como dívida pública perante a promessa do Governo português de que esta seria anulada até 2020, através de sobrecustos a pagar nas tarifas pelos consumidores.
Mas, apesar das pressões internacionais e de dois secretários de Estado da Energia que enfrentaram o problema, Henrique Gomes e Jorge Seguro Sanches, a dívida tarifária ascende neste momento a 3 mil milhões de euros!
É que os graves problemas tecnológicos provocados pela eletricidade intermitente não se resolvem por decreto, mas sim com atuações tecnológicas eficazes, como o reforço das interligações elétricas entre a França e a Península Ibérica.
Por isso, o Presidente Macron, de França, participou na Cimeira de Lisboa, em 27 de julho de 2018, com os primeiros-ministros Pedro Sánchez, de Espanha, e António Costa, de Portugal, que aprovaram um apoio europeu de 580 milhões de euros para este reforço de interligações.
Mas, lamentavelmente, este projeto continua parado, o que constitui uma grave ameaça à sustentabilidade da economia e do emprego em Portugal.
E em vez de se enfrentar o problema da eletricidade intermitente com inteligência e eficácia, temos agora em consulta pública a Estratégia Nacional para o Hidrogénio, que propõe promover ainda mais potências intermitentes, pondo novamente os consumidores a pagar todos os custos e os promotores a ficarem com todos os benefícios.
O hidrogénio não é uma fonte de energia primária e, sendo um gás muito leve, exige pressões muito altas e temperaturas muito baixas para poder ser armazenado, o que implica custos e riscos muitíssimo elevados.
Tal como Sócrates e Pinho tinham feito em 2008, o pretexto mediático é que “Portugal vai salvar o planeta sozinho armazenando eletricidade através do hidrogénio”.
E, de novo, “os consumidores portugueses irão pagar por decreto o que for preciso por tecnologias que ainda não existem”, indo-se buscar aos fundos europeus, que se espera venham salvar a economia portuguesa, 7 mil milhões de euros para este “delírio tecnológico” que o próprio documento em consulta pública assume irá ter prejuízos até 2030.
Embora António Costa Silva tenha sido, em 2010, um dos defensores do lóbi das elétricas intermitentes, nomeadamente num artigo publicado no Expresso e intitulado “O plágio dos Orangotangos”, espera-se que, nas suas atuais funções de supervisor do plano económico para aplicar os fundos europeus, saiba defender o reforço das empresas de bens transacionáveis e não deixe que sejam utilizados num desastre tecnológico que põe em causa o que foi aprovado na Cimeira de Lisboa, em 2018.
Assim o exigem uma democracia de qualidade e o futuro da economia e da coesão social de Portugal.
 
Professor catedrático do Instituto Superior Técnico
Subscritor do “Manifesto: Por Uma Democracia de Qualidade”
 


A catástrofe da eletricidade intermitente:da dívida tarifária à bomba de hidrogénio
Apesar das pressões internacionais e de dois secretários de Estado da Energia que enfrentaram o problema, Henrique Gomes e Jorge Seguro Sanches, a dívida tarifária ascende neste momento a 3 mil milhões de euros!

A eletricidade intermitente é proveniente de fontes que ora existem, ora não existem, como o vento e a luz solar.
O sistema elétrico não pode depender duma tal intermitência, sob pena de a economia e a segurança das nossas vidas colapsarem, dado que a eletricidade não se pode armazenar.
Assim, quando o Governo Sócrates decidiu, em 2005, basear o sistema elétrico nas potências intermitentes eólicas e solares, criou para o efeito a figura contratual das FIT (feed-in tariffs), em que o custo de todo o backup necessário para evitar apagões ficou à responsabilidade dos consumidores.
Ou seja, para assegurar aos promotores dos parques eólicos e solares os elevados proveitos que exigiam para investir, o Governo decretou que todos os consumidores tinham de pagar os lucros previstos nas FIT.
Um tal sistema baseado na eletricidade intermitente é completamente ineficiente, pois provoca enormes desperdícios nas centrais de backup, pelo que, em 2008, os sobrecustos da produção de eletricidade levaram a ERSE a propor um aumento dos preços que o então ministro Manuel Pinho considerou politicamente insustentável.
Em vez de mudar a política ruinosa que estava a seguir, o Governo Sócrates decidiu manter as “ benesses decretinas” para os promotores de eletricidade intermitente, mas adiou para anos futuros o respetivo pagamento pelos consumidores.
Foi assim criada a “dívida tarifária” do setor elétrico, o que levou à demissão do então presidente da ERSE.
Na prática, a dívida tarifária é uma dívida cuja responsabilidade o Governo colocou nos consumidores e que representa a diferença entre aquilo que pagamos nas tarifas e aquilo que o Governo decidiu por decreto que os produtores elétricos têm direito a receber.
Esta situação absurda, bem ilustrada pelo facto de a dívida tarifária ascender já nessa altura a 2 mil milhões de euros, foi publicamente denunciada em janeiro de 2010 por um manifesto intitulado “O Futuro da Energia”, de que fui um dos 36 subscritores.
A troika considerou muito grave essa dívida tarifária e só aceitou não a considerar logo como dívida pública perante a promessa do Governo português de que esta seria anulada até 2020, através de sobrecustos a pagar nas tarifas pelos consumidores.
Mas, apesar das pressões internacionais e de dois secretários de Estado da Energia que enfrentaram o problema, Henrique Gomes e Jorge Seguro Sanches, a dívida tarifária ascende neste momento a 3 mil milhões de euros!
É que os graves problemas tecnológicos provocados pela eletricidade intermitente não se resolvem por decreto, mas sim com atuações tecnológicas eficazes, como o reforço das interligações elétricas entre a França e a Península Ibérica.
Por isso, o Presidente Macron, de França, participou na Cimeira de Lisboa, em 27 de julho de 2018, com os primeiros-ministros Pedro Sánchez, de Espanha, e António Costa, de Portugal, que aprovaram um apoio europeu de 580 milhões de euros para este reforço de interligações.
Mas, lamentavelmente, este projeto continua parado, o que constitui uma grave ameaça à sustentabilidade da economia e do emprego em Portugal.
E em vez de se enfrentar o problema da eletricidade intermitente com inteligência e eficácia, temos agora em consulta pública a Estratégia Nacional para o Hidrogénio, que propõe promover ainda mais potências intermitentes, pondo novamente os consumidores a pagar todos os custos e os promotores a ficarem com todos os benefícios.
O hidrogénio não é uma fonte de energia primária e, sendo um gás muito leve, exige pressões muito altas e temperaturas muito baixas para poder ser armazenado, o que implica custos e riscos muitíssimo elevados.
Tal como Sócrates e Pinho tinham feito em 2008, o pretexto mediático é que “Portugal vai salvar o planeta sozinho armazenando eletricidade através do hidrogénio”.
E, de novo, “os consumidores portugueses irão pagar por decreto o que for preciso por tecnologias que ainda não existem”, indo-se buscar aos fundos europeus, que se espera venham salvar a economia portuguesa, 7 mil milhões de euros para este “delírio tecnológico” que o próprio documento em consulta pública assume irá ter prejuízos até 2030.
Embora António Costa Silva tenha sido, em 2010, um dos defensores do lóbi das elétricas intermitentes, nomeadamente num artigo publicado no Expresso e intitulado “O plágio dos Orangotangos”, espera-se que, nas suas atuais funções de supervisor do plano económico para aplicar os fundos europeus, saiba defender o reforço das empresas de bens transacionáveis e não deixe que sejam utilizados num desastre tecnológico que põe em causa o que foi aprovado na Cimeira de Lisboa, em 2018.
Assim o exigem uma democracia de qualidade e o futuro da economia e da coesão social de Portugal.
 
Professor catedrático do Instituto Superior Técnico
Subscritor do “Manifesto: Por Uma Democracia de Qualidade”
 

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