Água é energia: como as renováveis vão transformar o dia-a-dia dos portugueses

09-11-2020
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A seca extrema de 2017 pôs os pontos nos is: as alterações climáticas obrigam a que os recursos sejam mais bem geridos. As casas e as cidades vão ter de mudar e os cidadãos têm de ser mobilizados para esta transformação. A Conferência Água&Energia ADENE/DN mostrou o caminho.

| foto Diana Quintela/ Global Imagens | foto Diana Quintela/ Global Imagens | foto Diana Quintela/ Global Imagens | foto Diana Quintela/ Global Imagens | foto Diana Quintela/ Global Imagens | foto Diana Quintela/ Global Imagens | foto Diana Quintela/ Global Imagens | foto Diana Quintela/Global Imagens | foto Diana Quintela/ Global Imagens | foto Diana Quintela/ Global Imagens | foto Diana Quintela/ Global Imagens | foto Diana Quintela/ Global Imagens | foto (Diana Quintela/ Global Imagens) | foto Diana Quintela/ Global Imagens | foto Diana Quintela/ Global Imagens

Podemos consumir a energia que queremos, mesmo que a possamos pagar? Não." O alerta é do ministro do Ambiente e da Transição Energética, João Pedro Matos Fernandes, e foi feito na Grande Conferência Água&Energia. O encontrou trouxe ao auditório do Museu do Oriente especialistas dos setores da água, da energia e da construção para falar sobre o nexo água-energia. O debate centrou-se precisamente neste binómio inseparável, e tantas vezes pouco percebido, e na importância da informação para que o cidadão comum entenda o que parece simples: é urgente gerir melhor os recursos de que dispomos, sobretudo os da água e da energia. A necessidade de uma literacia energética justificou o lançamento do Cinergia - Centro de Informação para a Energia, apresentado durante a conferência pelo secretário de Estado da Energia, João Galamba, e explicado ao pormenor por Miguel Sales Dias, administrador da ADENE - Agência para a Energia.

Literacia energética

Os portugueses reconhecem a importância da gestão deste recurso energético: 80% das pessoas têm consciência de que não podem consumir toda a água que desejam, aponta um estudo recente da Águas de Portugal sobre "Atitudes e comportamentos dos portugueses face à água". O ministro do Ambiente focou, neste contexto, a economia circular - um dos temas abordados durante a conferência -, que significa "usarmos cada vez mais recursos com eficácia energética para reduzir ao mínimo os desperdícios". É neste ponto que a educação se torna fundamental.

João Pedro Matos Fernandes recordou as metas de eficiência energética que Portugal se impôs: até 2030 será de 35% - é mais exigente do que a meta estipulada pela União Europeia (33%). Em 2040 todos os edifícios comerciais serão 100% descarbonizados - só usarão energia elétrica - e em 2050 essa meta será aplicada a todos os edifícios residenciais. Em pouco mais de três décadas tudo vai mudar: as cidades serão transformadas com objetivo de dependermos unicamente de fontes de energia renováveis.

"O objetivo para 2030 é que 45% da nossa energia tenha origem em fontes renováveis", reforçou o secretário de Estado da Energia, João Galamba, que revelou os números de 2018: "Trinta por cento da produção elétrica é gerada através de energia hídrica, que ainda representa 50% de toda a produção de eletricidade renovável. Somos conhecidos pelo país das eólicas, mas não das hídricas e mini-hídricas."

"Numa era em que tanto se fala do desafio do armazenamento das energias renováveis, as barragens reversíveis representam a única forma de o fazer no nosso país", acrescentou João Galamba. Aqui entra na equação um fator que não controlamos: a variação da pluviosidade. Depois da seca extrema que o país viveu em 2017 - e que se prevê que venha a acontecer com mais frequência e gravidade nos próximos anos -, o armazenamento de energias é crucial.

O último relatório do painel intergovernamental para as alterações climáticas salienta que o mundo terá de fazer alterações sem precedentes para atingir o objetivo de limitar o aquecimento global a 1,5 graus acima da era pré-industrial. E a solução está no armazenamento de energias renováveis - este é o caminho para libertar o país da dependência de combustíveis fósseis. "Três quartos da energia que consumimos ainda são importados", disse João Galamba, que reforçou a urgência de uma "estratégia clara e políticas de qualidade, além de cidadãos mobilizados para este desafio. Sem eles nada é possível fazer", frisou.

Água e energia, binómio essencial

A última frase abriu o debate moderado pela diretora executiva do Diário de Notícias, Catarina Carvalho. Para mobilizar as pessoas é necessário que saibam a relação entre água e energia, o que não acontece, como demonstrou um estudo da Deco. Isabel Oliveira, coordenadora de estudos técnicos da Deco Proteste, revelou parte desse inquérito. "A água é o bem pelo qual menos pessoas estão dispostas a abdicar, mas 40% não sabem que existe uma relação entre água e energia", disse. "Há um potencial de poupança que não está a ser aproveitado, a certificação energética dos edifícios é algo que ainda não pesa nas escolhas dos consumidores", revelou Isabel Oliveira.

Para João Mendes, administrador da Águas de Portugal (AdP), "as pessoas valorizam mas não dão valor ao bem água". O estudo da AdP após a seca de 2017 demonstrou que "as pessoas não estão disponíveis para pagar mais pela água que consomem", mas "é inevitável que se vá pagar mais por este bem no futuro".

Importante é saber que é possível poupar os recursos "e manter o conforto". Há várias soluções a serem testadas e pensadas, como apontou Nuno Lacasta, presidente do Conselho Diretivo da APA - Agência Portuguesa do Ambiente. "A ideia de criar fábricas de água - que no fundo é dar um outro nome às ETAR -, para que essas águas possam ser usadas para jardinagem e limpeza do espaço público, é um exemplo" de gestão mais eficiente dos recursos. O mesmo irá acontecer com os edifícios, que se querem "mais eficientes do ponto de vista energético".

As soluções no mercado já existem, como aliás confirmou na conferência Vítor Ferreira, o presidente do Cluster Habitat Sustentável. Um exemplo: "É possível poupar 75% da água da chuva em edifícios com coberturas ajardinadas. Há formas de reter a água e de a reutilizar." Autoclismos de dupla descarga, que foram inventados em Portugal, e outras fórmulas de reutilização são também essenciais.

A pergunta que fica no ar é se a tecnologia vai resolver tudo. Luís Seca, administrador do INESC - TEC, acredita que sim. Mas que apesar disso, e de já existirem soluções tecnológicas, o problema vai continuar a ser comportamental. Só que as pessoas "estão dispostas a gerir melhor o recurso água em prol do futuro e da sustentabilidade do planeta", sublinhou João Bernardo, diretor-geral da Direção-Geral de Energia e Geologia. Afinal, "os consumidores são o ponto de partida e de chegada e é através deles que a mudança pode acontecer", rematou Nuno Lacasta.

É preciso saber comunicar o valor da água

No futuro mais próximo, as cidades irão ser mais eficientes do ponto de vista energético. Sobre o caminho para lá chegar falou Maria João Coelho, vice-presidente da ADENE - Agência para a Energia, que apresentou um painel com soluções para a promoção da eficiência hídrica nos edifícios. A responsável frisou a importância da mudança na relação que as pessoas têm com o recurso água, uma vez que "o valorizam mas não refletem essa valorização em gestos diários", e de como é importante introduzir o conceito de "água renovável". O grupo de trabalho recolheu informação e percebeu que o desperdício é grande, mas que resulta essencialmente da falta de informação. "É preciso saber comunicar o valor da água, alertou Maria João Coelho, que define o processo como "um puzzle incompleto". "Há algumas peças deste puzzle que fomos identificando, mas há muitos por descobrir. Focamos este nexo água-energia, mas também existe a perspetiva da economia circular", disse. As regras estão definidas, os novos edifícios terão baixos consumos de energia e vão utilizar energias renováveis.

CINERGIA, o site que explica como funciona a energia do meu país

Antes mesmo de Miguel Sales Dias, administrador da ADENE, apresentar o CINERGIA - Centro de Informação para a Energia, o palco da Grande Conferência Água&Energia foi "invadido" por Giga, um pequeno robô que á mascote do site e que irá responder online às perguntas de alunos, professores e famílias. É este o público alvo do Cinergia. "O site explica como funciona a energia no meu país, em minha casa e a energia em mobilidade. Mostra ainda o ciclo da energia, que fontes de produção de energia existem, o ciclo do gás, etc.", descreveu o responsável. O CINERGIA tem ainda quizzes onde é possível testar os conhecimentos sobre esta temática. A ideia é que o quotidiano seja uma aprendizagem constante sobre gestão de recursos e é por isso que o CINERGIA inclui um simulador de mobilidade elétrica ou permite planear viagens calculando a pegada de carbono que deixamos. Há ainda o mapa energético por distrito e também por freguesias, rua e bairro, "uma informação que era pública mas não estava acessível e num só sítio", explicou Miguel Sales Dias.

A seca extrema de 2017 pôs os pontos nos is: as alterações climáticas obrigam a que os recursos sejam mais bem geridos. As casas e as cidades vão ter de mudar e os cidadãos têm de ser mobilizados para esta transformação. A Conferência Água&Energia ADENE/DN mostrou o caminho.

| foto Diana Quintela/ Global Imagens | foto Diana Quintela/ Global Imagens | foto Diana Quintela/ Global Imagens | foto Diana Quintela/ Global Imagens | foto Diana Quintela/ Global Imagens | foto Diana Quintela/ Global Imagens | foto Diana Quintela/ Global Imagens | foto Diana Quintela/Global Imagens | foto Diana Quintela/ Global Imagens | foto Diana Quintela/ Global Imagens | foto Diana Quintela/ Global Imagens | foto Diana Quintela/ Global Imagens | foto (Diana Quintela/ Global Imagens) | foto Diana Quintela/ Global Imagens | foto Diana Quintela/ Global Imagens

Podemos consumir a energia que queremos, mesmo que a possamos pagar? Não." O alerta é do ministro do Ambiente e da Transição Energética, João Pedro Matos Fernandes, e foi feito na Grande Conferência Água&Energia. O encontrou trouxe ao auditório do Museu do Oriente especialistas dos setores da água, da energia e da construção para falar sobre o nexo água-energia. O debate centrou-se precisamente neste binómio inseparável, e tantas vezes pouco percebido, e na importância da informação para que o cidadão comum entenda o que parece simples: é urgente gerir melhor os recursos de que dispomos, sobretudo os da água e da energia. A necessidade de uma literacia energética justificou o lançamento do Cinergia - Centro de Informação para a Energia, apresentado durante a conferência pelo secretário de Estado da Energia, João Galamba, e explicado ao pormenor por Miguel Sales Dias, administrador da ADENE - Agência para a Energia.

Literacia energética

Os portugueses reconhecem a importância da gestão deste recurso energético: 80% das pessoas têm consciência de que não podem consumir toda a água que desejam, aponta um estudo recente da Águas de Portugal sobre "Atitudes e comportamentos dos portugueses face à água". O ministro do Ambiente focou, neste contexto, a economia circular - um dos temas abordados durante a conferência -, que significa "usarmos cada vez mais recursos com eficácia energética para reduzir ao mínimo os desperdícios". É neste ponto que a educação se torna fundamental.

João Pedro Matos Fernandes recordou as metas de eficiência energética que Portugal se impôs: até 2030 será de 35% - é mais exigente do que a meta estipulada pela União Europeia (33%). Em 2040 todos os edifícios comerciais serão 100% descarbonizados - só usarão energia elétrica - e em 2050 essa meta será aplicada a todos os edifícios residenciais. Em pouco mais de três décadas tudo vai mudar: as cidades serão transformadas com objetivo de dependermos unicamente de fontes de energia renováveis.

"O objetivo para 2030 é que 45% da nossa energia tenha origem em fontes renováveis", reforçou o secretário de Estado da Energia, João Galamba, que revelou os números de 2018: "Trinta por cento da produção elétrica é gerada através de energia hídrica, que ainda representa 50% de toda a produção de eletricidade renovável. Somos conhecidos pelo país das eólicas, mas não das hídricas e mini-hídricas."

"Numa era em que tanto se fala do desafio do armazenamento das energias renováveis, as barragens reversíveis representam a única forma de o fazer no nosso país", acrescentou João Galamba. Aqui entra na equação um fator que não controlamos: a variação da pluviosidade. Depois da seca extrema que o país viveu em 2017 - e que se prevê que venha a acontecer com mais frequência e gravidade nos próximos anos -, o armazenamento de energias é crucial.

O último relatório do painel intergovernamental para as alterações climáticas salienta que o mundo terá de fazer alterações sem precedentes para atingir o objetivo de limitar o aquecimento global a 1,5 graus acima da era pré-industrial. E a solução está no armazenamento de energias renováveis - este é o caminho para libertar o país da dependência de combustíveis fósseis. "Três quartos da energia que consumimos ainda são importados", disse João Galamba, que reforçou a urgência de uma "estratégia clara e políticas de qualidade, além de cidadãos mobilizados para este desafio. Sem eles nada é possível fazer", frisou.

Água e energia, binómio essencial

A última frase abriu o debate moderado pela diretora executiva do Diário de Notícias, Catarina Carvalho. Para mobilizar as pessoas é necessário que saibam a relação entre água e energia, o que não acontece, como demonstrou um estudo da Deco. Isabel Oliveira, coordenadora de estudos técnicos da Deco Proteste, revelou parte desse inquérito. "A água é o bem pelo qual menos pessoas estão dispostas a abdicar, mas 40% não sabem que existe uma relação entre água e energia", disse. "Há um potencial de poupança que não está a ser aproveitado, a certificação energética dos edifícios é algo que ainda não pesa nas escolhas dos consumidores", revelou Isabel Oliveira.

Para João Mendes, administrador da Águas de Portugal (AdP), "as pessoas valorizam mas não dão valor ao bem água". O estudo da AdP após a seca de 2017 demonstrou que "as pessoas não estão disponíveis para pagar mais pela água que consomem", mas "é inevitável que se vá pagar mais por este bem no futuro".

Importante é saber que é possível poupar os recursos "e manter o conforto". Há várias soluções a serem testadas e pensadas, como apontou Nuno Lacasta, presidente do Conselho Diretivo da APA - Agência Portuguesa do Ambiente. "A ideia de criar fábricas de água - que no fundo é dar um outro nome às ETAR -, para que essas águas possam ser usadas para jardinagem e limpeza do espaço público, é um exemplo" de gestão mais eficiente dos recursos. O mesmo irá acontecer com os edifícios, que se querem "mais eficientes do ponto de vista energético".

As soluções no mercado já existem, como aliás confirmou na conferência Vítor Ferreira, o presidente do Cluster Habitat Sustentável. Um exemplo: "É possível poupar 75% da água da chuva em edifícios com coberturas ajardinadas. Há formas de reter a água e de a reutilizar." Autoclismos de dupla descarga, que foram inventados em Portugal, e outras fórmulas de reutilização são também essenciais.

A pergunta que fica no ar é se a tecnologia vai resolver tudo. Luís Seca, administrador do INESC - TEC, acredita que sim. Mas que apesar disso, e de já existirem soluções tecnológicas, o problema vai continuar a ser comportamental. Só que as pessoas "estão dispostas a gerir melhor o recurso água em prol do futuro e da sustentabilidade do planeta", sublinhou João Bernardo, diretor-geral da Direção-Geral de Energia e Geologia. Afinal, "os consumidores são o ponto de partida e de chegada e é através deles que a mudança pode acontecer", rematou Nuno Lacasta.

É preciso saber comunicar o valor da água

No futuro mais próximo, as cidades irão ser mais eficientes do ponto de vista energético. Sobre o caminho para lá chegar falou Maria João Coelho, vice-presidente da ADENE - Agência para a Energia, que apresentou um painel com soluções para a promoção da eficiência hídrica nos edifícios. A responsável frisou a importância da mudança na relação que as pessoas têm com o recurso água, uma vez que "o valorizam mas não refletem essa valorização em gestos diários", e de como é importante introduzir o conceito de "água renovável". O grupo de trabalho recolheu informação e percebeu que o desperdício é grande, mas que resulta essencialmente da falta de informação. "É preciso saber comunicar o valor da água, alertou Maria João Coelho, que define o processo como "um puzzle incompleto". "Há algumas peças deste puzzle que fomos identificando, mas há muitos por descobrir. Focamos este nexo água-energia, mas também existe a perspetiva da economia circular", disse. As regras estão definidas, os novos edifícios terão baixos consumos de energia e vão utilizar energias renováveis.

CINERGIA, o site que explica como funciona a energia do meu país

Antes mesmo de Miguel Sales Dias, administrador da ADENE, apresentar o CINERGIA - Centro de Informação para a Energia, o palco da Grande Conferência Água&Energia foi "invadido" por Giga, um pequeno robô que á mascote do site e que irá responder online às perguntas de alunos, professores e famílias. É este o público alvo do Cinergia. "O site explica como funciona a energia no meu país, em minha casa e a energia em mobilidade. Mostra ainda o ciclo da energia, que fontes de produção de energia existem, o ciclo do gás, etc.", descreveu o responsável. O CINERGIA tem ainda quizzes onde é possível testar os conhecimentos sobre esta temática. A ideia é que o quotidiano seja uma aprendizagem constante sobre gestão de recursos e é por isso que o CINERGIA inclui um simulador de mobilidade elétrica ou permite planear viagens calculando a pegada de carbono que deixamos. Há ainda o mapa energético por distrito e também por freguesias, rua e bairro, "uma informação que era pública mas não estava acessível e num só sítio", explicou Miguel Sales Dias.

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