Portugal Global

24-06-2020
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A aplicação de uma
anunciada medida de resolução ao Banco Internacional do Funchal – S.A. suscita as
maiores dúvidas e justifica que o Ministério Público tome, com a maior
urgência, uma iniciativa, visando a investigação de todos os indícios de práticas
criminosas, que a própria realidade denuncia e que os particulares – os principais
visados pela medida – não têm nem meios nem capacidade para denunciar.

Nos termos do
disposto no Código de Processo Penal, o Ministério Público adquire notícia do
crime por conhecimento próprio, por intermédio dos órgãos de polícia criminal
ou mediante denúncia (artº 241º).

O que (até agora) se
conhece do “caso BANIF” indicia prejuízos efetivos para o Estado da ordem dos
4.100 milhões de euros e prejuízos de valor indeterminado para os particulares,
a começar pelos acionistas e pelos credores do banco.

Seguramente que ninguém
estará à espera de que os acionistas e os demais investidores do BANIF, a quem roubaram
o banco, fiquem de braços cruzados sem questionar a medida de resolução e,
sobretudo, a violação de obrigações legais por parte do regulador e,
eventualmente, do Estado, fundadora de responsabilidade civil.

Não há quaisquer provas
de que estamos perante uma gigantesca fraude, patrocinada pela própria União
Europeia e executada ao mais alto nível do Banco de Portugal. Mas não pode
descartar-se essa hipótese, do mesmo modo que não se pode descartar a hipótese
de homicídio perante o aparecimento de um cadáver esquartejado.

É claro e inequívoco que,
tal como aconteceu no caso BES, a comissão de inquérito não conduzirá a
qualquer conclusão útil e que mereça crédito, porque são pouco relevantes as
questões políticas, quando o essencial é jurídico e tem a ver com princípios
axiais dos ordenamentos português e europeu.

O princípio e o fim...

A República Portuguesa deu uma
ajuda ao BANIF, do montante de 1.100 milhões de euros, em 2013, na sequência de
um processo especial de auxilio de estado, aprovado pela Comissão Europeia.

As coisas não terão corrido bem;
por isso, tendo dúvidas sobre a legalidade do auxilio de estado, a Comissão Europeia
abriu um procedimento relativo à execução da politica de concorrência, tendo
notificado a República Portuguesa para prestar esclarecimentos, em 24 de julho
de 2015.

Porque o governo não respondeu,
em 18 de dezembro de 2015, a Comissão Europeia fez publicar no Jornal Oficial
um anúncio público, que conclui nos termos seguintes:

“A Comissão conclui que, com base na informação
disponível à data da presente decisão, tem dúvidas quanto à compatibilidade com
o mercado interno do auxílio estatal recebido pelo Banif.

À luz das conclusões aqui expostas, a Comissão, agindo
ao abrigo do procedimento previsto no artigo 108º, nº 3, do Tratado sobre o
Funcionamento da União Europeia, solicita a Portugal que apresente as
respetivas observações e forneça toda e qualquer informação que possa
contribuir para apreciar a compatibilidade do auxílio, no prazo de um mês a
contar da receção da presente carta.

A Comissão solicita às autoridades portuguesas que encaminhem
imediatamente uma cópia da presente carta para o potencial beneficiário do
auxílio.

A Comissão faz ainda saber às autoridades portuguesas
que informará as partes interessadas através da publicação da presente carta e
de um resumo significativo da mesma no Jornal Oficial da União Europeia.

Informará igualmente as partes interessadas dos países
da EFTA signatários do Acordo EEE, mediante a publicação de uma comunicação no
suplemento EEE do Jornal Oficial da União Europeia, bem como o Órgão de
Fiscalização da EFTA, através do envio de uma cópia da presente carta. Todas as
partes interessadas serão convidadas a apresentar as suas observações no prazo
de um mês a contar da data dessa publicação.»

Nenhuma sanção foi aprovada nem
estava em perspetiva.

O teor desta comunicação não se
afasta muito dos sucessivos avisos, feitos pela Comissão, relativamente ao
incumprimento dos compromisso assumidos em 2013, quando da aprovação da medida
de auxilio ao BANIF.

Apesar de estarmos perante um
processo extremamente complexo, as “autoridades portuguesas” ou, pura e
simplesmente, o Banco de Portugal montaram num fim de semana uma operação que
conduziu à concessão de ajudas adicionais do estado do montante de cerca de
3.000 milhões de euros, visando a viabilização da venda do BANIF ao Banco
Santander Totta.

O problema da ajuda de estado eventualmente
incompatível com o mercado interno desapareceu, porque a Comissão Europeia o “apagou”.

E criou-se um problema adicional
de uma ajuda de estado incompatível com o mercado interno de 3.000 milhões de
euros.

Ou seja: em bom rigor jurídico
havia um problema de  1.100 milhões de euros;
e passou a haver um problema de 4.100 milhões de euros.

É importante questionar, antes de
tudo, se a concessão de uma ajuda de estado de 4.100 milhões de euros para
viabilizar a venda de um banco português a um banco português, porém  de capital espanhol,  por 150 milhões é compatível com o mercado
externo, à luz do direito da União.

Mas, mais do que isso, é
indispensável questionar estas ajudas no plano da responsabilidade civil e
criminal dos diversos intervenientes, nomeadamente dos funcionários da União
Europeia envolvidos neste processo.

Portugal tinha arriscado, em
condições que são muito duvidosas, 1.100 milhões de euros, em janeiro de 2013.

Agora perdeu, em condições
absolutamente obscuras, pelo menos, 4.100 milhões de euros.

Uma pipa de massa, como diria
Durão Barroso. E o que parece ser um grande
palmada, para favorecer os interesses do Banco Santander Totta, que comprou
o BANIF por uma tuta e meia.

Antecedentes

A comunicação social tem
apontado como causa principal da medida de resolução aplicada ao BANIF um
alegado incumprimento, por parte deste banco ,relativamente a compromissos
conexos com uma ajuda do estado eventualmente incompatível com o mercado
interno.

Em janeiro de 2013, a Comissão Europeia autorizou o Estado Português a
prestar um auxílio ao BANIF, do montante de 1.100 milhões de euros.

A República Portuguesa –
e não o BANIF -  comprometeu-se a
apresentar um plano de reestruturação até 31 de março de 2013, tendo sido
estabelecido, desde logo, que a Comissão tomaria, depois de tal apresentação, “uma decisão
definitiva sobre a compatibilidade da injeção de capital com as regras em
matéria de auxílios estatais da UE.”

Em 1 de janeiro de 2013, Portugal
informou a Comissão  de que as medidas de recapitalização, consistiriam
na subscrição de ações emitidas pelo Banif num montante de 700 milhões de euros
e em valores mobiliários híbridos no montante de 400 milhões de euros.

A
propósito da proposta portuguesa, afirmou, então, o comissário espanhol Joaquin
Almunia:

 «A
recapitalização de 1,1 mil milhões de euros permite que o BANIF respeite os
rácios de capital regulamentar. Neste momento, Portugal necessita
urgentemente de elaborar um plano de reestruturação aprofundado, reorientando o
BANIF para as suas atividades principais na Madeira e nos Açores e preparando
uma significativa redução das suas operações».

Muita água correu sob as pontes
até ao dia 18 de dezembro de 2015, data em que foi publicada, no Jornal Oficial
da União Europeia, a carta enviada pela Comissão ao governo português,
em 24 de junho de 2015.

Nesta data, a 18 de dezembro de
2015, a Comissão anunciou urbi et orbi  - no Jornal Oficial - que  naquela data
notificou a República Portuguesa da decisão de dar inicio ao procedimento
previsto no artigo 108º-2, do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia,
relativamente à medida de auxílio acima mencionada.

Lê-se no relatório agora
publicado:

“O plano de restruturação (do BANIF) tem de estar em
conformidade com a Comunicação relativa à reestruturação, segundo a qual a
viabilidade a longo prazo está garantida se o banco puder competir no mercado
com vista à obtenção de capitais com base nos seus próprios méritos, em
conformidade com os requisitos regulamentares relevantes. Ao banco cabe cobrir
todos os seus custos e garantir uma rendibilidade adequada dos seus capitais
próprios tendo em conta o seu perfil de risco, devendo ainda reembolsar ou
remunerar de forma adequada o auxílio que recebeu do Estado. O regresso à
viabilidade deve ser conseguido essencialmente à custa de medidas internas,
devendo também ser identificadas as causas das dificuldades e os pontos fracos
e explicado de que forma a restruturação vai atacar esta situação.”

Dito isto no contexto de uma
iniciativa para “apresentação de observações nos termos do artigo 108º, nº 2,
do TFUE”, parece-nos que todos nós, cidadãos e empresas, temos o direito de
intervir nesse processo, visto o que foi, entretanto feito pelo Banco de
Portugal,  cumprindo o velho brocardo de
que é pior a emenda de que o soneto.

A questão axial do caso BANIF é a
de saber se o auxilio do Estado, autorizado em janeiro de 2013 é ou não
conforme com o mercado interno.

A resposta objetiva a essa
questão foi uma solução que ofende ainda mais profundamente as regras que
haviam sido questionadas pela Comissão.

Ou seja: o Estado concedeu um
auxílio ao BANIF, do montante de 1.100 milhões de euros, não cumpriu a
obrigação de apresentação de um plano de reestruturação, que teria que ser
aprovado pelo Banco de Portugal, nos termos do disposto no artº 142º do RGICSF
e quando a Comissão, que foi de uma extrema tolerância, tornou pública a
iniciativa de abrir uma investigação sobre a conformidade do auxilio com o
disposto no artº 107 do TFUE, o Banco de Portugal tomou a iniciativa de aplicar
uma medida de resolução ao BANIF que é muito mais violadora dessa disposição do
Tratado do que o fora o próprio auxilio estatal.

O paradoxo da incompatibilidade da medida de resolução
com o mercado interno

Temos como adquirido que, na base
de todo este processo, está a ajuda de 1.100 milhões de euros ao BANIF, por
parte da República Portuguesa, considerado de compatibilidade duvidosa com o
TFUE, por não ter sido apresentado um plano de reestruturação aceitável.

Dispõe o artº 107º,1 do Tratado,
onde radica toda a problemática do BANIF:

“(...) São incompatíveis com o mercado interno, na
medida em que afetem as trocas comerciais entre os Estados-Membros, os auxílios
concedidos pelos Estados ou provenientes de recursos estatais, independentemente
da forma que assumam, que falseiem ou ameacem falsear a concorrência,
favorecendo certas empresas ou certas produções.”

A incompatibilidade com o mercado
interno deriva do facto de os recursos usados na ajuda ao BANIF serem públicos
e de um montante relevante.

Analisando o processo espelhado
no relatório da Comissão agora publicado,
dúvidas não podem suscitar-se relativamente à tolerância do executivo
comunitário relativamente ao processo BANIF.

É certo que a República
Portuguesa foi notificada para dar esclarecimentos em 24 de julho de 2015 e não
terá adotado os procedimentos adequados.

Mas nem por isso o processo
estava encerrado e nem por isso adviria algum mal ao Estado, por não ter sido
encontrada uma solução tempestiva.

Estava em causa uma ajuda de
Estado de 1.100 milhões de euros.

O que passa a estar em causa, com
a medida de resolução adotada, é uma ajuda de Estado muito maior e uma operação
claramente perturbadora do mercado interno, que não pode deixar de suscitar
suspeitas.

Tendo em consideração os valores
que o artº 107º do Tratado procura proteger, temos que considerar como muito
mais perturbadora a venda apressada do melhor do BANIF ao Banco Santander por
150 milhões de euros, depois de uma autentica recapitalização de 3.000 milhões,
elevando as ajudas estatais para 4.100 milhões de euro do que a aplicação de 1.100
milhões de euros na subscrição de ações do banco e na concessão de crédito, por
via de valores mobiliários híbridos.

Os documentos que se conhecem são
muito pouco precisos mas apontam para auxílios de Estado adicionais daqueles
valores, que têm que se entender como apoios da República Portuguesa ao banco
espanhol: mais do dobro do que foi aplicado no banco português.

No seu comunicado de 20 de dezembro, o Banco de
Portugal afirma que a operação envolve um apoio público estivados em 2.255
milhões de euros, “que visam cobrir contingências futuras, das quais 489 milhões
pelo Fundo de Resolução e 1.766 diretamente pelo Estado Português.”

Porém, o comunicado da Comissão do dia 21 de dezembro
diz outra coisa, aumentando substancialmente os números.

O comunicado diz, em título, que a
“Comissão
aprova um auxílio adicional até 3 mil milhões de euros  para a resolução do banco português Banif e a
venda de ativos ao Banco Santander Totta”, explicando que, para além das verbas
que foram anunciadas pelo Banco de Portugal, a Comissão autorizou uma “margem adicional de segurança sob
a forma de uma garantia do Estado para prever eventuais alterações recentes no
valor da parte vendida ao Banco Santander Totta, o que eleva o total das
potenciais medidas de auxílio para quase 3 mil milhões de euros.”

Este
comunicado não deixa quaisquer dúvidas de que aprovou um auxilio de Estado que
não é de 2.255 milhões mas de 2.677 milhões de euros, a que acrescem ainda os
1.100 milhões aplicados em 2013 e uma garantia de valor não determinado “para
prever eventuais alterações recentes no valor da parte adquirida pelo Banco
Santander”.

Diz,
expressamente o comunicado:

“As autoridades portuguesas
notificaram a Comissão dos planos de concessão de 2.255 mil milhões de EUR em
medidas de auxílio destinadas a apoiar a venda de ativos e passivos do Banif ao
comprador, bem como um auxílio no valor de 422 milhões de euros destinado
à transferência de ativos para o veículo de gestão de ativos.

É aprovada também uma margem
adicional de segurança sob a forma de uma garantia do Estado para prever
eventuais alterações recentes no valor da parte adquirida pelo Banco Santander
Totta, o que eleva o total das potenciais medidas de auxílio para quase 3 mil
milhões de EUR.”

Para além disso, estando a correr
um procedimento, anunciado no jornal oficial de 18 de dezembro, para a recolha
de observações acerca de um auxilio de estado eventualmente incompatível com o
mercado interno, em que estavam em causa 1.100 milhões de euros, o que a Comissão
fez, segundo o comunicado foi legalizar essa ajuda de 1.100 milhões de euros,
sem que houvesse qualquer dado adicional que tocasse nos argumentos trazidos a
público, como, para além disso, aprovar ajudas estatais que podem elevar-se aos
3.000 milhões de euros, adicionais.

Tudo para vender o melhor do
banco BANIF ao Santander Totta por apenas 150 milhões de euros.

Estamos perante um inaceitável
paradoxo que justificaria que o Estado Português questionasse a postura da
Comissão no Tribunal de Justiça, na base do entendimento de que a exigência de
prestação de auxílios de Estado à autoridade de resolução com vista a facilitar
a venda de um banco a uma “entidade bancária forte” é, ela sim, violadora do
artº 107º do Tratado.

Importa saber se é verdade...

O Ministro das Finanças, Mário
Centeno, revelou na Comissão de Finanças da Assembleia da República, que o governo pretendia adotar outra solução para
o Banif, diferente da que foi adotada pelo Banco de Portugal.

"O governo preferia a recapitalização do Banif,
seguida de uma fusão com a Caixa Geral de Depósitos, mas foi impossível devido
às ajudas estatais."

Não se alcança
facilmente por que razão a Comissão pode autorizar um auxilio estatal de cerca
de 3.000 milhões de euros para viabilizar a venda do BANIF por apenas 150
milhões ao Banco Santander Totta e não podia autorizar uma simples operação de
capitalização, que permitisse a viabilização do BANIF, para o que seriam
necessários muito menos recursos, com perspetivas de recuperação dos capitais
investidos pelo Estado, por via da fusão com a Caixa Geral de Depósitos, de que
o Estado é o único acionista.

O que é incompatível com
o mercado interno, não o sendo, porém com o interesse dos lobistas financiados
pelo Santander, é a aprovação de ajudas colossais, a fundo perdido, que
implicam uma perda para a República Portuguesa de mais de 4.100 milhões de
euros e um favorecimento do Santander Totta em montante não determinado mas
determinável.

A liberal Margrethe
Vestager, Comissária responsável pela política da concorrência, afirmou, na
sequência da medida de resolução: 

«Os
bancos não podem ser mantidos artificialmente no mercado com o dinheiro dos
contribuintes. Embora o Banif já tivesse recebido auxílios estatais
significativos, não conseguiu regressar à viabilidade por si só. As medidas
hoje aprovadas permitem ao Banif sair do mercado de uma forma ordenada e que um
banco sólido adquira uma grande parte das suas atividades sem que tal acarrete
um prejuízo para os clientes do Banif.”

Esta declaração constitui
uma contradição nos seus próprios termos e é, em si mesma, um demonstração de
falta de seriedade ou de incompetência da comissária.

Como pode aceitar-se
que a comissária da concorrência defenda a injeção de dinheiros públicos de montante
muito superior ao que havia sido questionado, para favorecer a saída do BANIF,
de forma ordenada, para um banco forte, que é o Santander Totta?

E como é possível que
se considere compatível com o mercado interno a concessão de uma ajuda de
estado para a venda ao desbarato a um banco de capital estrangeiro estrangeiro
e não para a venda a um banco nacional, nomeadamente ao banco público do estado
financiador?

O jornal Expresso escreveu na sua edição eletrónica
o seguinte:

“O Ministro das Finanças afirmou (...) no Parlamento que o
Governo “preferia outra solução” para o Banif. Essa solução “passava pela
recapitalização do Banif e a sua fusão com a Caixa Geral de Depósitos”.

O
ministro das Finanças adiantou ainda que essa solução, “por restrições legais,
não foi implementável”, acrescentando que as dificuldades estão associadas às
“ajudas de Estado existentes, quer ao Banif, quer à Caixa Geral de Depósitos”.
As declarações foram feitas na comissão de Orçamento, Finanças e Modernização
Administrativa, que decorreu esta terça-feira no âmbito da discussão do
Orçamento Retificativo, que surge na sequência do resgate ao Banif.”

O jornal escreve que também o secretário de
Estado adjunto do Tesouro e das Finanças, Ricardo Mourinho Félix, presente na
audição, sublinhou que essa era solução que o PS preferia e que foi discutida
com a Comissão Europeia, tendo sido recusada.

É preciso averiguar se
isto é verdade ou não.

Se for verdade, parece
tratar-se de uma postura incompatível com as normas europeias da concorrência e
com os princípios reguladores do mercado interno.

Porque razão pode ser
organizado um procedimento para a venda do banco BANIF a um banco de capital estrangeiro,
pelo montante irrisório de 150 milhões de euros, sem que o estado possa reaver
um cêntimo do que investiu e o mesmo negócio não possa ser feito  com um banco público?

Uma medida de resolução que é um novo assalto a um banco

Temos qualificado a medida
de resolução aplicada ao Banco Espírito Santo como um ato administrativo de
efeito equivalente a um assalto a um banco.

Justifica-se por isso, em toda a plenitude,
que a Comissão abra um procedimento para averiguação da compatibilidade da
medida de resolução aplicada pelo Banco de Portugal ao BANIF é, nos termos em
que foi desenhada – e implicando uma ajuda de estado de valor superior a 4.100
milhões de euros, compatível com o mercado interno, com todas as consequências
previstas nos tratados.

Justifica-se, outrossim, que o Parlamento promova
o inquérito judicial já anunciado.

Mas, mais do que isso, justifica-se que os
lesados questionem a legalidade da medida de resolução e que os cidadãos se
organizem para peticionar nos tribunais a anulação da medida e a adoção de
providências adequadas a evitar a injeção de mais recursos públicos nesta
negociata.

A medida de resolução, tal como foi
desenhada, prejudica, de forma grotesta todos os investidores do BANIF, de
qualquer natureza, porque ofende o princípio de que os acionistas e os demais
credores não podem receber, no quadro da resolução menos qo que receberiam num
quadro de liquidação. E aqui, como está desenhada a medida de resolução nada
receberão-

Prejudica-nos a todos pois que, dividindo o
montante de 4.100 milhões pela população ativa obriga a um sacrifício de 785
euros per capital.

Trata-se de um desastre colossal, pelo qual
não podem ser responsabilizados os cidadãos.

Um novo falhanço do Banco
de Portugal?

Estaremos perante um novo falhanço do Banco
de Portugal ou perante uma fraude conscientemente planeada e desenvolvida,
visando o enriquecimento ilegítimo dos intervenientes, do beneficiário do
negócio e de terceiros?

Não é possível extrair conclusões, antes
que se proceda a uma aturada investigação de tudo o que se passou.

O que se conhece é, por si só, suficiente
para que o Governo – se estiver de mãos limpas – declare a perda de confiança
na administração do Banco de Portugal, sob pena de ser corresponsável pela sua
atividade.

Aqui estamos no domínio da política. E se,
de um ponto de vista jurídico a lei é especialmente restritiva que se refere à
demissão dos administradores do Banco de Portugal, nenhuma limitação existe, de
um ponto de vista político, relativamente a declaração de perda de confiança
por parte do Governo, relativamente aos administradores do Banco de Portugal.

Nos termos do artº 33º da Lei Orgânica
do Banco de Portugal, “os membros do conselho de administração são inamovíveis, só
podendo ser exonerados dos seus cargos caso se verifique alguma das
circunstâncias previstas no n.º 2 do artigo 14.º dos Estatutos do SEBC/BCE.”

Esta disposição diz o seguinte:

“14.º-1. De acordo com o disposto no artigo 131.º do Tratado sobre o
Funcionamento da União Europeia, cada Estado-Membro assegura a compatibilidade
da respetiva legislação nacional, incluindo os estatutos do seu banco central
nacional, com os Tratados e com os presentes Estatutos.

14.º-2. Os estatutos dos bancos centrais nacionais devem prever,
designadamente, que o mandato de um governador de um banco central nacional não
seja inferior a cinco anos.

Um governador só pode ser demitido das
suas funções se deixar de preencher os requisitos necessários ao exercício das
mesmas ou se tiver cometido falta grave. O governador em causa ou o Conselho do
BCE podem interpor recurso da decisão de demissão para o Tribunal de Justiça
com fundamento em violação dos Tratados ou de qualquer norma jurídica relativa
à sua aplicação. Esses recursos devem ser interpostos no prazo de dois meses a
contar, conforme o caso, da publicação da decisão ou da sua notificação ao
recorrente ou, na falta desta, do dia em que o recorrente tiver tomado
conhecimento da decisão.

14.º-3. Os bancos centrais nacionais constituem parte integrante
do SEBC, devendo atuar em conformidade com as orientações e instruções do BCE.
O Conselho do BCE tomará as medidas adequadas para assegurar o cumprimento das
orientações e instruções do BCE e pode exigir que lhe seja prestada toda a
informação necessária.

14.º-4. Os bancos centrais nacionais podem exercer outras funções,
além das referidas nos presentes Estatutos, salvo se o Conselho do BCE decidir,
por maioria de dois terços dos votos expressos, que essas funções interferem
com os objetivos e atribuições do SEBC. Cabe aos bancos centrais nacionais a
responsabilidade e o risco pelo exercício dessas funções, que não são
consideradas funções do SEBC.”

Do nosso ponto de vista, o
governador do Banco de Portugal e os demais administradores têm cometido, ao
longo do seu mandato, faltas gravíssimas, que justificam uma fundamentada
declaração política de desconfiança e a abertura, de forma leal e concertada
com o Banco Central Europeu, dos procedimentos adequados à demonstração de
faltas graves, para efeitos de exoneração.

Depois
do apuramento das faltas graves, deverá o Conselho de Ministros revolver a
exoneração,  nos termos do disposto no
artº 33º,4 da Lei Orgânica.

O
que é insustentável é a continuidade de um governo do Banco de Portugal que em
menos de dois anos, em razão de um exercício desastroso da supervisão bancária,
causou ao país prejuízos de dezenas de milhões de euros.

No
caso BANIF, o investimento de 2013 foi anunciado pelo próprio governador como um
investimento altamente lucrativo para o Estado.

Incumbia
ao Banco de Portugal aprovar, em conformidade com o que foi negociado com a
União Europeia, um plano de reestruturação adequado à dar cumprimento ao que
havia sido decidido, em termos de ajudas de estado.

Na
verdade, em conformidade com o disposto no artº 141º, 1 al b) e 142º do RGICSF
é ao Banco de Portugal que compete aprovar, com poderes amplíssimos de
imposição de alterações, os planos de reestruturação que forem exigidos no
quadro das medidas de intervenção corretiva.

A
primeira análise dos documentos conhecidos, relativos á resolução aplicada ao
Banco BANIF sugere que falhou em toda a linha a supervisão do Banco de
Portugal, o que indicia falta grave de todos os seus administradores, que
causou ao país o brutal prejuízo de mais de 4.100 milhões de euros, para além
de terem envolvido a República em ações que, inequivocamente, ofendem os
tratados, máxime o artº 107º do TFUE.

A aplicação de uma
anunciada medida de resolução ao Banco Internacional do Funchal – S.A. suscita as
maiores dúvidas e justifica que o Ministério Público tome, com a maior
urgência, uma iniciativa, visando a investigação de todos os indícios de práticas
criminosas, que a própria realidade denuncia e que os particulares – os principais
visados pela medida – não têm nem meios nem capacidade para denunciar.

Nos termos do
disposto no Código de Processo Penal, o Ministério Público adquire notícia do
crime por conhecimento próprio, por intermédio dos órgãos de polícia criminal
ou mediante denúncia (artº 241º).

O que (até agora) se
conhece do “caso BANIF” indicia prejuízos efetivos para o Estado da ordem dos
4.100 milhões de euros e prejuízos de valor indeterminado para os particulares,
a começar pelos acionistas e pelos credores do banco.

Seguramente que ninguém
estará à espera de que os acionistas e os demais investidores do BANIF, a quem roubaram
o banco, fiquem de braços cruzados sem questionar a medida de resolução e,
sobretudo, a violação de obrigações legais por parte do regulador e,
eventualmente, do Estado, fundadora de responsabilidade civil.

Não há quaisquer provas
de que estamos perante uma gigantesca fraude, patrocinada pela própria União
Europeia e executada ao mais alto nível do Banco de Portugal. Mas não pode
descartar-se essa hipótese, do mesmo modo que não se pode descartar a hipótese
de homicídio perante o aparecimento de um cadáver esquartejado.

É claro e inequívoco que,
tal como aconteceu no caso BES, a comissão de inquérito não conduzirá a
qualquer conclusão útil e que mereça crédito, porque são pouco relevantes as
questões políticas, quando o essencial é jurídico e tem a ver com princípios
axiais dos ordenamentos português e europeu.

O princípio e o fim...

A República Portuguesa deu uma
ajuda ao BANIF, do montante de 1.100 milhões de euros, em 2013, na sequência de
um processo especial de auxilio de estado, aprovado pela Comissão Europeia.

As coisas não terão corrido bem;
por isso, tendo dúvidas sobre a legalidade do auxilio de estado, a Comissão Europeia
abriu um procedimento relativo à execução da politica de concorrência, tendo
notificado a República Portuguesa para prestar esclarecimentos, em 24 de julho
de 2015.

Porque o governo não respondeu,
em 18 de dezembro de 2015, a Comissão Europeia fez publicar no Jornal Oficial
um anúncio público, que conclui nos termos seguintes:

“A Comissão conclui que, com base na informação
disponível à data da presente decisão, tem dúvidas quanto à compatibilidade com
o mercado interno do auxílio estatal recebido pelo Banif.

À luz das conclusões aqui expostas, a Comissão, agindo
ao abrigo do procedimento previsto no artigo 108º, nº 3, do Tratado sobre o
Funcionamento da União Europeia, solicita a Portugal que apresente as
respetivas observações e forneça toda e qualquer informação que possa
contribuir para apreciar a compatibilidade do auxílio, no prazo de um mês a
contar da receção da presente carta.

A Comissão solicita às autoridades portuguesas que encaminhem
imediatamente uma cópia da presente carta para o potencial beneficiário do
auxílio.

A Comissão faz ainda saber às autoridades portuguesas
que informará as partes interessadas através da publicação da presente carta e
de um resumo significativo da mesma no Jornal Oficial da União Europeia.

Informará igualmente as partes interessadas dos países
da EFTA signatários do Acordo EEE, mediante a publicação de uma comunicação no
suplemento EEE do Jornal Oficial da União Europeia, bem como o Órgão de
Fiscalização da EFTA, através do envio de uma cópia da presente carta. Todas as
partes interessadas serão convidadas a apresentar as suas observações no prazo
de um mês a contar da data dessa publicação.»

Nenhuma sanção foi aprovada nem
estava em perspetiva.

O teor desta comunicação não se
afasta muito dos sucessivos avisos, feitos pela Comissão, relativamente ao
incumprimento dos compromisso assumidos em 2013, quando da aprovação da medida
de auxilio ao BANIF.

Apesar de estarmos perante um
processo extremamente complexo, as “autoridades portuguesas” ou, pura e
simplesmente, o Banco de Portugal montaram num fim de semana uma operação que
conduziu à concessão de ajudas adicionais do estado do montante de cerca de
3.000 milhões de euros, visando a viabilização da venda do BANIF ao Banco
Santander Totta.

O problema da ajuda de estado eventualmente
incompatível com o mercado interno desapareceu, porque a Comissão Europeia o “apagou”.

E criou-se um problema adicional
de uma ajuda de estado incompatível com o mercado interno de 3.000 milhões de
euros.

Ou seja: em bom rigor jurídico
havia um problema de  1.100 milhões de euros;
e passou a haver um problema de 4.100 milhões de euros.

É importante questionar, antes de
tudo, se a concessão de uma ajuda de estado de 4.100 milhões de euros para
viabilizar a venda de um banco português a um banco português, porém  de capital espanhol,  por 150 milhões é compatível com o mercado
externo, à luz do direito da União.

Mas, mais do que isso, é
indispensável questionar estas ajudas no plano da responsabilidade civil e
criminal dos diversos intervenientes, nomeadamente dos funcionários da União
Europeia envolvidos neste processo.

Portugal tinha arriscado, em
condições que são muito duvidosas, 1.100 milhões de euros, em janeiro de 2013.

Agora perdeu, em condições
absolutamente obscuras, pelo menos, 4.100 milhões de euros.

Uma pipa de massa, como diria
Durão Barroso. E o que parece ser um grande
palmada, para favorecer os interesses do Banco Santander Totta, que comprou
o BANIF por uma tuta e meia.

Antecedentes

A comunicação social tem
apontado como causa principal da medida de resolução aplicada ao BANIF um
alegado incumprimento, por parte deste banco ,relativamente a compromissos
conexos com uma ajuda do estado eventualmente incompatível com o mercado
interno.

Em janeiro de 2013, a Comissão Europeia autorizou o Estado Português a
prestar um auxílio ao BANIF, do montante de 1.100 milhões de euros.

A República Portuguesa –
e não o BANIF -  comprometeu-se a
apresentar um plano de reestruturação até 31 de março de 2013, tendo sido
estabelecido, desde logo, que a Comissão tomaria, depois de tal apresentação, “uma decisão
definitiva sobre a compatibilidade da injeção de capital com as regras em
matéria de auxílios estatais da UE.”

Em 1 de janeiro de 2013, Portugal
informou a Comissão  de que as medidas de recapitalização, consistiriam
na subscrição de ações emitidas pelo Banif num montante de 700 milhões de euros
e em valores mobiliários híbridos no montante de 400 milhões de euros.

A
propósito da proposta portuguesa, afirmou, então, o comissário espanhol Joaquin
Almunia:

 «A
recapitalização de 1,1 mil milhões de euros permite que o BANIF respeite os
rácios de capital regulamentar. Neste momento, Portugal necessita
urgentemente de elaborar um plano de reestruturação aprofundado, reorientando o
BANIF para as suas atividades principais na Madeira e nos Açores e preparando
uma significativa redução das suas operações».

Muita água correu sob as pontes
até ao dia 18 de dezembro de 2015, data em que foi publicada, no Jornal Oficial
da União Europeia, a carta enviada pela Comissão ao governo português,
em 24 de junho de 2015.

Nesta data, a 18 de dezembro de
2015, a Comissão anunciou urbi et orbi  - no Jornal Oficial - que  naquela data
notificou a República Portuguesa da decisão de dar inicio ao procedimento
previsto no artigo 108º-2, do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia,
relativamente à medida de auxílio acima mencionada.

Lê-se no relatório agora
publicado:

“O plano de restruturação (do BANIF) tem de estar em
conformidade com a Comunicação relativa à reestruturação, segundo a qual a
viabilidade a longo prazo está garantida se o banco puder competir no mercado
com vista à obtenção de capitais com base nos seus próprios méritos, em
conformidade com os requisitos regulamentares relevantes. Ao banco cabe cobrir
todos os seus custos e garantir uma rendibilidade adequada dos seus capitais
próprios tendo em conta o seu perfil de risco, devendo ainda reembolsar ou
remunerar de forma adequada o auxílio que recebeu do Estado. O regresso à
viabilidade deve ser conseguido essencialmente à custa de medidas internas,
devendo também ser identificadas as causas das dificuldades e os pontos fracos
e explicado de que forma a restruturação vai atacar esta situação.”

Dito isto no contexto de uma
iniciativa para “apresentação de observações nos termos do artigo 108º, nº 2,
do TFUE”, parece-nos que todos nós, cidadãos e empresas, temos o direito de
intervir nesse processo, visto o que foi, entretanto feito pelo Banco de
Portugal,  cumprindo o velho brocardo de
que é pior a emenda de que o soneto.

A questão axial do caso BANIF é a
de saber se o auxilio do Estado, autorizado em janeiro de 2013 é ou não
conforme com o mercado interno.

A resposta objetiva a essa
questão foi uma solução que ofende ainda mais profundamente as regras que
haviam sido questionadas pela Comissão.

Ou seja: o Estado concedeu um
auxílio ao BANIF, do montante de 1.100 milhões de euros, não cumpriu a
obrigação de apresentação de um plano de reestruturação, que teria que ser
aprovado pelo Banco de Portugal, nos termos do disposto no artº 142º do RGICSF
e quando a Comissão, que foi de uma extrema tolerância, tornou pública a
iniciativa de abrir uma investigação sobre a conformidade do auxilio com o
disposto no artº 107 do TFUE, o Banco de Portugal tomou a iniciativa de aplicar
uma medida de resolução ao BANIF que é muito mais violadora dessa disposição do
Tratado do que o fora o próprio auxilio estatal.

O paradoxo da incompatibilidade da medida de resolução
com o mercado interno

Temos como adquirido que, na base
de todo este processo, está a ajuda de 1.100 milhões de euros ao BANIF, por
parte da República Portuguesa, considerado de compatibilidade duvidosa com o
TFUE, por não ter sido apresentado um plano de reestruturação aceitável.

Dispõe o artº 107º,1 do Tratado,
onde radica toda a problemática do BANIF:

“(...) São incompatíveis com o mercado interno, na
medida em que afetem as trocas comerciais entre os Estados-Membros, os auxílios
concedidos pelos Estados ou provenientes de recursos estatais, independentemente
da forma que assumam, que falseiem ou ameacem falsear a concorrência,
favorecendo certas empresas ou certas produções.”

A incompatibilidade com o mercado
interno deriva do facto de os recursos usados na ajuda ao BANIF serem públicos
e de um montante relevante.

Analisando o processo espelhado
no relatório da Comissão agora publicado,
dúvidas não podem suscitar-se relativamente à tolerância do executivo
comunitário relativamente ao processo BANIF.

É certo que a República
Portuguesa foi notificada para dar esclarecimentos em 24 de julho de 2015 e não
terá adotado os procedimentos adequados.

Mas nem por isso o processo
estava encerrado e nem por isso adviria algum mal ao Estado, por não ter sido
encontrada uma solução tempestiva.

Estava em causa uma ajuda de
Estado de 1.100 milhões de euros.

O que passa a estar em causa, com
a medida de resolução adotada, é uma ajuda de Estado muito maior e uma operação
claramente perturbadora do mercado interno, que não pode deixar de suscitar
suspeitas.

Tendo em consideração os valores
que o artº 107º do Tratado procura proteger, temos que considerar como muito
mais perturbadora a venda apressada do melhor do BANIF ao Banco Santander por
150 milhões de euros, depois de uma autentica recapitalização de 3.000 milhões,
elevando as ajudas estatais para 4.100 milhões de euro do que a aplicação de 1.100
milhões de euros na subscrição de ações do banco e na concessão de crédito, por
via de valores mobiliários híbridos.

Os documentos que se conhecem são
muito pouco precisos mas apontam para auxílios de Estado adicionais daqueles
valores, que têm que se entender como apoios da República Portuguesa ao banco
espanhol: mais do dobro do que foi aplicado no banco português.

No seu comunicado de 20 de dezembro, o Banco de
Portugal afirma que a operação envolve um apoio público estivados em 2.255
milhões de euros, “que visam cobrir contingências futuras, das quais 489 milhões
pelo Fundo de Resolução e 1.766 diretamente pelo Estado Português.”

Porém, o comunicado da Comissão do dia 21 de dezembro
diz outra coisa, aumentando substancialmente os números.

O comunicado diz, em título, que a
“Comissão
aprova um auxílio adicional até 3 mil milhões de euros  para a resolução do banco português Banif e a
venda de ativos ao Banco Santander Totta”, explicando que, para além das verbas
que foram anunciadas pelo Banco de Portugal, a Comissão autorizou uma “margem adicional de segurança sob
a forma de uma garantia do Estado para prever eventuais alterações recentes no
valor da parte vendida ao Banco Santander Totta, o que eleva o total das
potenciais medidas de auxílio para quase 3 mil milhões de euros.”

Este
comunicado não deixa quaisquer dúvidas de que aprovou um auxilio de Estado que
não é de 2.255 milhões mas de 2.677 milhões de euros, a que acrescem ainda os
1.100 milhões aplicados em 2013 e uma garantia de valor não determinado “para
prever eventuais alterações recentes no valor da parte adquirida pelo Banco
Santander”.

Diz,
expressamente o comunicado:

“As autoridades portuguesas
notificaram a Comissão dos planos de concessão de 2.255 mil milhões de EUR em
medidas de auxílio destinadas a apoiar a venda de ativos e passivos do Banif ao
comprador, bem como um auxílio no valor de 422 milhões de euros destinado
à transferência de ativos para o veículo de gestão de ativos.

É aprovada também uma margem
adicional de segurança sob a forma de uma garantia do Estado para prever
eventuais alterações recentes no valor da parte adquirida pelo Banco Santander
Totta, o que eleva o total das potenciais medidas de auxílio para quase 3 mil
milhões de EUR.”

Para além disso, estando a correr
um procedimento, anunciado no jornal oficial de 18 de dezembro, para a recolha
de observações acerca de um auxilio de estado eventualmente incompatível com o
mercado interno, em que estavam em causa 1.100 milhões de euros, o que a Comissão
fez, segundo o comunicado foi legalizar essa ajuda de 1.100 milhões de euros,
sem que houvesse qualquer dado adicional que tocasse nos argumentos trazidos a
público, como, para além disso, aprovar ajudas estatais que podem elevar-se aos
3.000 milhões de euros, adicionais.

Tudo para vender o melhor do
banco BANIF ao Santander Totta por apenas 150 milhões de euros.

Estamos perante um inaceitável
paradoxo que justificaria que o Estado Português questionasse a postura da
Comissão no Tribunal de Justiça, na base do entendimento de que a exigência de
prestação de auxílios de Estado à autoridade de resolução com vista a facilitar
a venda de um banco a uma “entidade bancária forte” é, ela sim, violadora do
artº 107º do Tratado.

Importa saber se é verdade...

O Ministro das Finanças, Mário
Centeno, revelou na Comissão de Finanças da Assembleia da República, que o governo pretendia adotar outra solução para
o Banif, diferente da que foi adotada pelo Banco de Portugal.

"O governo preferia a recapitalização do Banif,
seguida de uma fusão com a Caixa Geral de Depósitos, mas foi impossível devido
às ajudas estatais."

Não se alcança
facilmente por que razão a Comissão pode autorizar um auxilio estatal de cerca
de 3.000 milhões de euros para viabilizar a venda do BANIF por apenas 150
milhões ao Banco Santander Totta e não podia autorizar uma simples operação de
capitalização, que permitisse a viabilização do BANIF, para o que seriam
necessários muito menos recursos, com perspetivas de recuperação dos capitais
investidos pelo Estado, por via da fusão com a Caixa Geral de Depósitos, de que
o Estado é o único acionista.

O que é incompatível com
o mercado interno, não o sendo, porém com o interesse dos lobistas financiados
pelo Santander, é a aprovação de ajudas colossais, a fundo perdido, que
implicam uma perda para a República Portuguesa de mais de 4.100 milhões de
euros e um favorecimento do Santander Totta em montante não determinado mas
determinável.

A liberal Margrethe
Vestager, Comissária responsável pela política da concorrência, afirmou, na
sequência da medida de resolução: 

«Os
bancos não podem ser mantidos artificialmente no mercado com o dinheiro dos
contribuintes. Embora o Banif já tivesse recebido auxílios estatais
significativos, não conseguiu regressar à viabilidade por si só. As medidas
hoje aprovadas permitem ao Banif sair do mercado de uma forma ordenada e que um
banco sólido adquira uma grande parte das suas atividades sem que tal acarrete
um prejuízo para os clientes do Banif.”

Esta declaração constitui
uma contradição nos seus próprios termos e é, em si mesma, um demonstração de
falta de seriedade ou de incompetência da comissária.

Como pode aceitar-se
que a comissária da concorrência defenda a injeção de dinheiros públicos de montante
muito superior ao que havia sido questionado, para favorecer a saída do BANIF,
de forma ordenada, para um banco forte, que é o Santander Totta?

E como é possível que
se considere compatível com o mercado interno a concessão de uma ajuda de
estado para a venda ao desbarato a um banco de capital estrangeiro estrangeiro
e não para a venda a um banco nacional, nomeadamente ao banco público do estado
financiador?

O jornal Expresso escreveu na sua edição eletrónica
o seguinte:

“O Ministro das Finanças afirmou (...) no Parlamento que o
Governo “preferia outra solução” para o Banif. Essa solução “passava pela
recapitalização do Banif e a sua fusão com a Caixa Geral de Depósitos”.

O
ministro das Finanças adiantou ainda que essa solução, “por restrições legais,
não foi implementável”, acrescentando que as dificuldades estão associadas às
“ajudas de Estado existentes, quer ao Banif, quer à Caixa Geral de Depósitos”.
As declarações foram feitas na comissão de Orçamento, Finanças e Modernização
Administrativa, que decorreu esta terça-feira no âmbito da discussão do
Orçamento Retificativo, que surge na sequência do resgate ao Banif.”

O jornal escreve que também o secretário de
Estado adjunto do Tesouro e das Finanças, Ricardo Mourinho Félix, presente na
audição, sublinhou que essa era solução que o PS preferia e que foi discutida
com a Comissão Europeia, tendo sido recusada.

É preciso averiguar se
isto é verdade ou não.

Se for verdade, parece
tratar-se de uma postura incompatível com as normas europeias da concorrência e
com os princípios reguladores do mercado interno.

Porque razão pode ser
organizado um procedimento para a venda do banco BANIF a um banco de capital estrangeiro,
pelo montante irrisório de 150 milhões de euros, sem que o estado possa reaver
um cêntimo do que investiu e o mesmo negócio não possa ser feito  com um banco público?

Uma medida de resolução que é um novo assalto a um banco

Temos qualificado a medida
de resolução aplicada ao Banco Espírito Santo como um ato administrativo de
efeito equivalente a um assalto a um banco.

Justifica-se por isso, em toda a plenitude,
que a Comissão abra um procedimento para averiguação da compatibilidade da
medida de resolução aplicada pelo Banco de Portugal ao BANIF é, nos termos em
que foi desenhada – e implicando uma ajuda de estado de valor superior a 4.100
milhões de euros, compatível com o mercado interno, com todas as consequências
previstas nos tratados.

Justifica-se, outrossim, que o Parlamento promova
o inquérito judicial já anunciado.

Mas, mais do que isso, justifica-se que os
lesados questionem a legalidade da medida de resolução e que os cidadãos se
organizem para peticionar nos tribunais a anulação da medida e a adoção de
providências adequadas a evitar a injeção de mais recursos públicos nesta
negociata.

A medida de resolução, tal como foi
desenhada, prejudica, de forma grotesta todos os investidores do BANIF, de
qualquer natureza, porque ofende o princípio de que os acionistas e os demais
credores não podem receber, no quadro da resolução menos qo que receberiam num
quadro de liquidação. E aqui, como está desenhada a medida de resolução nada
receberão-

Prejudica-nos a todos pois que, dividindo o
montante de 4.100 milhões pela população ativa obriga a um sacrifício de 785
euros per capital.

Trata-se de um desastre colossal, pelo qual
não podem ser responsabilizados os cidadãos.

Um novo falhanço do Banco
de Portugal?

Estaremos perante um novo falhanço do Banco
de Portugal ou perante uma fraude conscientemente planeada e desenvolvida,
visando o enriquecimento ilegítimo dos intervenientes, do beneficiário do
negócio e de terceiros?

Não é possível extrair conclusões, antes
que se proceda a uma aturada investigação de tudo o que se passou.

O que se conhece é, por si só, suficiente
para que o Governo – se estiver de mãos limpas – declare a perda de confiança
na administração do Banco de Portugal, sob pena de ser corresponsável pela sua
atividade.

Aqui estamos no domínio da política. E se,
de um ponto de vista jurídico a lei é especialmente restritiva que se refere à
demissão dos administradores do Banco de Portugal, nenhuma limitação existe, de
um ponto de vista político, relativamente a declaração de perda de confiança
por parte do Governo, relativamente aos administradores do Banco de Portugal.

Nos termos do artº 33º da Lei Orgânica
do Banco de Portugal, “os membros do conselho de administração são inamovíveis, só
podendo ser exonerados dos seus cargos caso se verifique alguma das
circunstâncias previstas no n.º 2 do artigo 14.º dos Estatutos do SEBC/BCE.”

Esta disposição diz o seguinte:

“14.º-1. De acordo com o disposto no artigo 131.º do Tratado sobre o
Funcionamento da União Europeia, cada Estado-Membro assegura a compatibilidade
da respetiva legislação nacional, incluindo os estatutos do seu banco central
nacional, com os Tratados e com os presentes Estatutos.

14.º-2. Os estatutos dos bancos centrais nacionais devem prever,
designadamente, que o mandato de um governador de um banco central nacional não
seja inferior a cinco anos.

Um governador só pode ser demitido das
suas funções se deixar de preencher os requisitos necessários ao exercício das
mesmas ou se tiver cometido falta grave. O governador em causa ou o Conselho do
BCE podem interpor recurso da decisão de demissão para o Tribunal de Justiça
com fundamento em violação dos Tratados ou de qualquer norma jurídica relativa
à sua aplicação. Esses recursos devem ser interpostos no prazo de dois meses a
contar, conforme o caso, da publicação da decisão ou da sua notificação ao
recorrente ou, na falta desta, do dia em que o recorrente tiver tomado
conhecimento da decisão.

14.º-3. Os bancos centrais nacionais constituem parte integrante
do SEBC, devendo atuar em conformidade com as orientações e instruções do BCE.
O Conselho do BCE tomará as medidas adequadas para assegurar o cumprimento das
orientações e instruções do BCE e pode exigir que lhe seja prestada toda a
informação necessária.

14.º-4. Os bancos centrais nacionais podem exercer outras funções,
além das referidas nos presentes Estatutos, salvo se o Conselho do BCE decidir,
por maioria de dois terços dos votos expressos, que essas funções interferem
com os objetivos e atribuições do SEBC. Cabe aos bancos centrais nacionais a
responsabilidade e o risco pelo exercício dessas funções, que não são
consideradas funções do SEBC.”

Do nosso ponto de vista, o
governador do Banco de Portugal e os demais administradores têm cometido, ao
longo do seu mandato, faltas gravíssimas, que justificam uma fundamentada
declaração política de desconfiança e a abertura, de forma leal e concertada
com o Banco Central Europeu, dos procedimentos adequados à demonstração de
faltas graves, para efeitos de exoneração.

Depois
do apuramento das faltas graves, deverá o Conselho de Ministros revolver a
exoneração,  nos termos do disposto no
artº 33º,4 da Lei Orgânica.

O
que é insustentável é a continuidade de um governo do Banco de Portugal que em
menos de dois anos, em razão de um exercício desastroso da supervisão bancária,
causou ao país prejuízos de dezenas de milhões de euros.

No
caso BANIF, o investimento de 2013 foi anunciado pelo próprio governador como um
investimento altamente lucrativo para o Estado.

Incumbia
ao Banco de Portugal aprovar, em conformidade com o que foi negociado com a
União Europeia, um plano de reestruturação adequado à dar cumprimento ao que
havia sido decidido, em termos de ajudas de estado.

Na
verdade, em conformidade com o disposto no artº 141º, 1 al b) e 142º do RGICSF
é ao Banco de Portugal que compete aprovar, com poderes amplíssimos de
imposição de alterações, os planos de reestruturação que forem exigidos no
quadro das medidas de intervenção corretiva.

A
primeira análise dos documentos conhecidos, relativos á resolução aplicada ao
Banco BANIF sugere que falhou em toda a linha a supervisão do Banco de
Portugal, o que indicia falta grave de todos os seus administradores, que
causou ao país o brutal prejuízo de mais de 4.100 milhões de euros, para além
de terem envolvido a República em ações que, inequivocamente, ofendem os
tratados, máxime o artº 107º do TFUE.

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